2 der Makkabäer (BAV) 1





II Livro dos Macabeus

I - INTRODUÇÃO. DOCUMENTOS (1-2)

Carta aos judeus do Egito

1 1 Saúde aos nossos irmãos judeus que estão no Egito. Seus irmãos, os judeus residentes em Jerusalém e no país de Judá, auguram-lhes uma paz venturosa.
2
Deus vos acumule de bens, e que ele se lembre de sua aliança com Abraão, Isaac e Jacó, seus fiéis servidores.
3
Que ele disponha vossa alma à piedade e à observância dos seus mandamentos com um coração generoso e uma fervente submissão!
4
Que ele abra vosso coração à sua lei e aos seus preceitos e que vos estabeleça na paz!
5
Que ele ouça vossas súplicas, vos seja misericordioso e não vos abandone nas provações!
6
Nós daqui rezamos por vós.
7
Sob o reinado de Demétrio, pelo ano cento e sessenta e nove, nós, judeus, vos escrevemos na tribulação e na aflição em que nos achávamos nessa época, desde o dia em que Jasão e seus companheiros abandonaram a terra santa e o reino.
8
A porta do templo foi incendiada e derramado o sangue inocente; mas nós suplicamos ao Senhor, e ele nos ouviu: oferecemos o sacrifício e a flor da farinha, acendemos as lâmpadas e expusemos os pães.
9
Celebrai, portanto, agora, a festa da cenopégia no mês de Casleu.

Carta a Aristóbulo

10 No ano cento e oitenta e oito. Os habitantes de Jerusalém e da Judéia, o senado e Judas, a Aristóbulo, conselheiro do rei Ptolomeu, da linhagem dos sacerdotes consagrados, como também aos judeus do Egito, saúde e prosperidade!
11
Libertados por Deus de inauditos perigos, nós lhe rendemos grandes ações de graças, porque tivemos um rei a combater.
12
Mas Deus rejeitou aqueles que haviam atacado a cidade santa.
13
Seu chefe, chegado à Pérsia com um exército aparentemente irresistível, pereceu no templo de Manéia, vítima de um ardil dos sacerdotes da deusa.
14
Com razão, sob o pretexto de esposar aquela, chegou com seus amigos para apoderar-se de suas riquezas, a título de dote.
15
Os sacerdotes expuseram o tesouro, e ele mesmo, com alguns dos seus, penetrou no recinto sagrado, enquanto eles fechavam as portas;
16
mas, quando Antíoco entrou no interior, abriram uma porta secreta na abóbada e esmagaram o príncipe sob uma saraivada de pedras. Esquartejaram, em seguida, os corpos e degolaram as cabeças, lançando-as aos que estavam do lado de fora.
17
Louvado seja nosso Deus em todas as coisas, porque entregou os ímpios à morte.

O fogo sagrado

18 Em vésperas de celebrarmos, dia vinte e cinco de Casleu, a purificação do templo, julgamos oportuno certificar-vos disso, a fim de que vós também celebreis a festa da cenopégia e a comemoração do fogo que apareceu quando Neemias ofereceu o sacrifício, após ter reconstruído o templo e o altar.
19
Na verdade, quando nossos pais foram levados à Pérsia, os sacerdotes de então, inflamados de piedade, tomaram secretamente o fogo sagrado do altar e o esconderam no fundo de um poço seco, onde eles o ocultaram tão cuidadosamente, que o lugar permaneceu desconhecido de todos.
20
Decorreram muitos anos e, quando aprouve a Deus, Neemias, salvo pelo rei da Pérsia, enviou, para retomar o fogo, os descendentes dos próprios sacerdotes que o haviam ocultado. Ora, segundo a explicação que eles nos deram, não encontraram o fogo, mas um líquido espesso.
21
Neemias ordenou-lhes que o tirassem e o trouxessem. Uma vez preparada a matéria do sacrifício, disse Neemias aos sacerdotes que derramassem a água sobre a madeira e sobre o que estava ali colocado.
22
A ordem foi executada, e veio o momento em que o sol, a princípio encondido, pôs-se a brilhar, então um grande fogo se acendeu e maravilhou todos os espectadores.
23
Enquanto se consumiu o sacrifício, os sacerdotes puseram-se a rezar, e todos rezavam com eles; Jônatas entoava, e os outros, como Neemias, juntavam sua voz à dele.
24
Eis a oração: Senhor, Senhor, Deus, criador de todas as coisas, terrível e forte, justo e misericordioso, que sois o rei único e bom,
25
o único generoso, o único justo, todo-poderoso e eterno, vós que livrastes Israel de todo o mal, que fizestes de nossos pais vossos escolhidos e os santificastes,
26
aceitai este sacrifício, oferecido por todo o vosso povo de Israel, guardai vossa parte de eleição e santificai-a.
27
Congregai nossos irmãos dispersos, devolvei a liberdade aos que são escravos entre os pagãos, deitai vosso olhar sobre os que são desprezados e abominados, e que as nações saibam que sois nosso Deus.
28
Castigai os que nos oprimem e nos ultrajam com seu orgulho.
29
Plantai, como disse Moisés, vosso povo na vossa terra santa.
30
Os sacerdotes então cantaram os hinos.
31
Quando foi consumido o sacrifício, Neemias mandou que se espalhasse o líquido restante sobre grandes pedras.
32
Depois de feito isso, uma chama cintilou, mas se consumiu, enquanto o fogo que se erguia no altar continuava a brilhar.
33
O acontecimento foi logo divulgado, e contaram ao rei da Pérsia que era no lugar onde os sacerdotes levados ao cativeiro tinham ocultado o fogo sagrado, que havia aparecido a água com a qual Neemias e seus companheiros obtiveram o fogo purificador das oferendas.
34
Ordenou o rei que se murasse o lugar e o considerassem como sagrado, após ter-se certificado da exatidão do acontecido.
35
O rei tinha por hábito tomar posse de muitas coisas, das quais dava uma parte a quem ele queria ser agradável.
36
Os companheiros de Neemias chamaram isso de Neftar, que quer dizer purificação, mas a maioria o chama de Neftaí.


2 1 Acha-se escrito nos documentos relativos ao profeta Jeremias, que foi ele quem ordenou aos cativos tomar o fogo, como se acaba de contar,
2
e que o profeta, dando-lhes um exemplar da lei, lhes recomendou não esquecerem os mandamentos do Senhor e não se deixarem seduzir à vista dos ídolos de ouro e prata, ou dos ornamentos dos quais estavam ornados.
3
Conjurou-os, entre outros avisos, a não afastarem a lei de seu coração.
4
O escrito mencionava também como o profeta, pela fé da revelação, havia desejado fazer-se acompanhar pela arca e pelo tabernáculo, quando subisse a montanha que subiu Moisés para contemplar a herança de Deus.
5
No momento em que chegou, descobriu uma vasta caverna, na qual mandou depositar a arca, o tabernáculo e o altar dos perfumes; em seguida, tapou a entrada.
6
Alguns daqueles que o haviam acompanhado voltaram para marcar o caminho com sinais, mas não puderam achá-lo.
7
Quando Jeremias soube, repreendeu-os e disse-lhes que esse lugar ficaria desconhecido, até que Deus reunisse seu povo e usasse com ele de misericórdia.
8
Então revelará o Senhor o que ele encerra e aparecerá a glória do Senhor como uma densa nuvem, semelhante à que apareceu sobre Moisés e quando Salomão rezou para que o templo recebesse uma consagração magnífica.
9
Estava também relatado como esse sábio ofereceu o sacrifício da dedicação e da conclusão do santuário,
10
como também, à semelhança de Moisés que orou ao Senhor e obteve que o fogo do céu descesse e consumisse as ofertas, Salomão pôs-se a rezar e o fogo desceu do alto para queimar os holocaustos.
11
Moisés disse: Por não ter sido comido, o sacrifício pelo pecado foi consumido.
12
Também Salomão prolongou por oito dias a dedicação.
13
Nas relações e nas memórias do tempo de Neemias, contavam-se os mesmos feitos e como também ele formou uma biblioteca, reunindo tudo o que se referia aos reis e aos profetas, as obras de Davi e as cartas dos reis a respeito das ofertas.
14
Do mesmo modo, Judas reuniu todos os livros espalhados pelas guerras que nos sobrevieram, e essa coleção se encontra em nosso poder.
15
Por conseguinte, se tendes necessidade de um desses livros, enviai-nos mensageiros que vo-los levarão.
16
Nós vamos, pois, celebrar a purificação do templo e é por isso que vos escrevemos: seria bom que também celebrásseis essas festas.
17
Foi Deus quem salvou todo o seu povo, e quem deu a todos a herança, o reino, o sacerdócio e a santificação,
18
como havia prometido pela lei. Este Deus, em quem esperamos, sem dúvida terá logo piedade de nós e de toda a terra, reunir-nos-á no solo sagrado: porque já nos livrou de grandes males e purificou o templo.

Prólogo do autor

19 Os acontecimentos efetuados no tempo de Judas Macabeu e de seus irmãos, a purificação do augusto templo e a dedicação do altar,
20
como também as guerras sustentadas contra Antíoco Epífanes e contra seu filho Eupator,
21
as manifestações celestes sobrevindas em favor dos bravos, que pelejaram corajosamente pelo judaísmo e que, apesar de seu número reduzido, se tornaram senhores de todo o país, puseram em fuga as hordas bárbaras,
22
recobraram a posse do templo famoso em todo o universo, livraram a cidade e restabeleceram as leis em vias de abolição, tudo isso, graças ao Senhor que lhes foi misericordioso:
23
eis o que Jasão de Cirene narra em cinco livros que vamos tentar resumir em um só.
24
Considerando a multidão das letras e a dificuldade que em vista da abundância dos assuntos experimentam aqueles que desejam penetrar no estudo das narrativas históricas,
25
temo-nos preocupado em agradar aos que apenas desejam lê-las, em facilitar aos que procuram retê-las e em ser úteis a todos em geral.
26
Para nós que empreendemos este trabalho de resumir, não é coisa fácil, mas uma questão de suores e vigílias.
27
No entanto, como aquele que prepara um festim, procurando satisfazer aos outros, assume uma tarefa penosa, assim nós, de boa vontade, tomamos a nós este trabalho, para obter a gratidão de muitos.
28
E deixando para o autor o cuidado de tratar cada assunto em seus detalhes, nós nos esforçamos em expô-los com auxílio de fórmulas resumidas.
29
Assim como para uma casa nova cabe ao arquiteto preocupar-se com o conjunto da construção, enquanto aquele que está encarregado dos afrescos e das pinturas só se ocupa com a decoração, assim, me parece, é o que cabe a nós.
30
Ao autor de uma história toca aprofundar tudo, dissertar sobre tudo, procurar todos os detalhes,
31
mas o que resume deve, ao contrário, procurar condensar a narrativa e evitar a minúcia na exposição dos fatos.
32
Agora, após tão longos prolegômenos, comecemos nossa relação, porque seria absurdo ser prolixo antes da história, e breve na própria história.

II - PERSEGUIÇÕES RELIGIOSAS (3-7)

Deus protege visivelmente o tesouro do templo

3 1 Enquanto os habitantes de Jerusalém gozavam de uma paz perfeita, por causa da piedade e retidão do sumo sacerdote Onias, na exata observância das leis,
2
o templo era respeitado, mesmo pelos reis estrangeiros. Estes honravam o santuário com os mais ricos presentes,
3
a tal ponto que Seleuco, rei da Ásia, subministrava com suas rendas pessoais toda a despesa necessária à liturgia dos sacrifícios.
4
Todavia, certo Simão, da tribo de Belga, nomeado prefeito do templo, entrou em desacordo com o sumo sacerdote quanto à inspeção do mercado público.
5
Como não pudesse vencer Onias, foi procurar Apolônio de Társis, então governador militar da Celesíria e da Fenícia.
6
Declarou-lhe que o tesouro do templo transbordava de indizíveis riquezas, a não poder enumerá-las; que nada tinham a ver com os sacrifícios, e que ele daria um jeito de fazê-las passar ao erário real.
7
Tendo uma audiência com o rei, Apolônio o advertiu sobre as riquezas que lhe haviam sido declaradas, e este, tomando uma decisão, enviou seu intendente Heliodoro com a ordem de trazer as ditas riquezas.
8
Imediatamente, Heliodoro pôs-se a caminho, simulando visitas às cidades da Celesíria e da Fenícia; na realidade, porém, era para executar a ordem do rei.
9
Tendo chegado a Jerusalém e sendo recebido pelo sumo sacerdote da cidade com amabilidade, transmitiu-lhe as revelações recebidas e comunicou-lhe o sentido de sua visita; contudo, indagou se tudo isso correspondia à realidade.
10
O sumo sacerdote fez-lhe ver que se tratava do depósito das viúvas e dos órfãos;
11
que somente um dos depósitos pertencia a Hircano, filho de Tobias, varão muito eminente; que não era como o pretendiam as calúnias do ímpio Simão, mas que tudo se reduzia a uma soma de quatrocentos talentos de prata e duzentos talentos de ouro.
12
Era completamente impossível defraudar os que haviam depositado confiança na santidade do lugar e no caráter sagrado e inviolável do templo venerado no mundo inteiro.
13
Firme nas ordens do rei, Heliodoro respondeu que essas riquezas deveriam ser transportadas absolutamente para o tesouro real
14
e, num dia por ele fixado, entrou com a intenção de organizar o inventário. A partir dessa hora, uma grande inquietude se espalhou pela cidade toda.
15
Revestidos de suas vestes sacerdotais e prostrados diante do altar, os sacerdotes suplicavam ao céu e imploravam ao Autor da lei acerca dos depósitos, rogando-lhe que os conservasse intactos para aqueles que lhos tinham confiado.
16
Já o aspecto do sumo sacerdote causava pena ver, do mesmo modo seu semblante; e a alteração de seus traços manifestava sua angústia interior.
17
O susto que o havia tolhido agitava seu corpo com um tremor, que mostrava o sofrimento íntimo de sua alma.
18
Diante da profanação que ameaçava o templo, o povo se precipitava em multidão para fora das casas, a fim de se ajuntarem à prece comum.
19
As mulheres cingidas com sacos pela altura dos seios enchiam as ruas, e quanto às jovens, retidas nas casas, corriam umas para as portas, outras para as muralhas, outras ainda se debruçavam nas janelas;
20
todas erguiam as mãos para o céu com gritos de súplica.
21
Causava dó observar toda a confusão desse povo abatido e a angústia em que jazia o sumo sacerdote.
22
Enquanto suplicavam assim a proteção do todo-poderoso para que conservasse invioláveis os depósitos que lhes haviam sido confiados,
23
Heliodoro executava o seu intento.
24
Já se achava ali, com seus homens armados, quando o Senhor dos espíritos e soberano detentor de todo o poder suscitou uma tal aparição que todos os que haviam ousado vir ali desfaleceram de espanto, atingidos de pavor ante a majestade de Deus.
25
Viram eles, montado num cavalo ricamente ajaezado e guiado furiosamente, um cavaleiro de terrível aspecto, que lançava em Heliodoro as patas dianteiras do cavalo. O que vinha nele montado parecia ter uma armadura de ouro.
26
Ao mesmo tempo, apareceram-lhe outros dois jovens, cheios de força extraordinária, fulgurantes de luz, ricamente vestidos; colocando-se dos dois lados, puseram-se eles a açoitá-lo sem interrupção e descarregaram sobre ele uma saraivada de golpes.
27
Atirado logo por terra, Heliodoro foi envolvido por espessas trevas; seus companheiros ergueram-no e depositaram-no numa liteira.
28
E ele, que vinha para penetrar no mencionado tesouro com uma escolta numerosa e guardas pessoais, incapaz de se ajudar a si mesmo, foi levado por pessoas que reconheciam o manifesto poder de Deus.
29
Enquanto ele se achava estendido e ferido pela força de Deus, sem fala e sem esperança alguma de salvação,
30
os habitantes de Jerusalém bendiziam o Senhor que havia glorificado seu templo. O santuário, que pouco antes estava cheio de confusão e de tumulto, logo que o Senhor manifestou sua onipotência encheu-se de regozijo e de alegria.
31
Todavia, alguns dos companheiros de Heliodoro suplicavam logo a Onias que rezasse ao todo-poderoso, para restituir-lhe a vida, prestes, na verdade, a apagar-se.
32
Receando que o rei suspeitasse de que os judeus houvessem organizado um atentado contra Heliodoro, o sumo sacerdote ofereceu um sacrifício por ele.
33
Ora, enquanto o pontífice executava a cerimônia expiatória, os mesmos jovens apareceram a Heliodoro, revestidos das mesmas vestes. Achegaram-se a ele e disseram-lhe: Sê reconhecido ao sumo sacerdote, porque é por causa dele que Deus te dá a vida.
34
Proclama diante de todos seu grande poder, tu que foste açoitado por Deus. Ditas estas palavras, desapareceram.
35
Após ter oferecido um sacrifício ao Senhor, erguido abundantes preces ao que lhe havia poupado a vida, e agradecido a Onias, Heliodoro regressou com suas tropas para junto do rei.
36
Testemunhava, diante de todos, os prodígios operados pelo Grande Deus, aos seus olhos
37
e, como o rei lhe perguntasse que homem julgava ele que pudesse enviar ainda uma vez a Jerusalém, respondeu:
38
Se tens algum inimigo, ou alguém que maquina contra ti, envia-o para lá, e encontrá-lo-ás ferido, se ainda viver, porque há verdadeiramente, naquele lugar, uma força divina.
39
O que habita no céu zela por aquele templo. Protege-o e arruína mortalmente os que aí vêm com más intenções.
40
Foi assim que se passaram estas coisas a respeito de Heliodoro e do tesouro sagrado que foi protegido.


4 1 O dito Simão, delator do tesouro e de sua pátria, caluniava Onias, dizendo que era ele quem se tinha lançado sobre Heliodoro e que era ele o autor de seus males:
2
ousava chamar de inimigo do Estado o benfeitor da cidade, o defensor de seus concidadãos, o ardoroso observante das leis.
3
Este ódio foi tão longe que um dos partidários de Simão cometeu até mesmo assassinatos.
4
Considerando o lado lamentável dessa questão e vendo o governador da Celesíria, Apolônio, filho de Menesteu, excitar a malícia de Simão,
5
dirigiu-se Onias para junto do rei, não que ele tivesse a intenção de acusar seus concidadãos, mas para advertir acerca dos interesses públicos e privados de todo o seu povo.
6
Via muito bem que, sem uma intervenção do rei, seria impossível restabelecer a paz e pôr termo aos desatinos de Simão.
7
Após a morte de Seleuco e tendo subido ao trono Antíoco Epífanes, Jasão, irmão de Onias, usurpou fraudulentamente o cargo de sumo sacerdote.
8
Numa entrevista com o rei, ele lhe prometeu trezentos e sessenta talentos de prata e oitenta talentos excedentes.
9
Prometia-lhe, além disso, pagar outros cento e cinqüenta talentos, se lhe fosse dado o poder de fundar um ginásio e uma efebia e de receber as inscrições dos antioquenos de Jerusalém.

Jasão favoresce o helenismo

10 O rei consentiu. Logo que subiu ao poder, Jasão arrastou seus concidadãos para o helenismo.
11
Apesar dos privilégios obtidos do poder real por João, o pai de Eupolemo, que foi enviado aos romanos para concluir um pacto de aliança e de amizade, ele introduziu ímpios costumes, desdenhando as leis nacionais.
12
Foi com alegria que fundou um ginásio ao pé da própria acrópole, alistou os mais nobres jovens e os educou ao pétaso.
13
Por causa da perversidade inaudita do ímpio Jasão, que não era de modo algum pontífice, obteve o helenismo tal êxito e os costumes pagãos uma atualidade tão crescente,
14
que os sacerdotes descuidavam o serviço do altar, menosprezavam o templo, negligenciavam os sacrifícios, corriam, fascinados pelo disco, a tomar parte na palestra e nos jogos proibidos.
15
Não faziam caso das honras da pátria e amavam muito mais os títulos helênicos.
16
Foi por essa razão que logo uma atmosfera penosa os cercou, porque naqueles mesmos, cuja forma de vida invejavam e a quem ambicionavam igualar-se em tudo, encontraram inimigos e os instrumentos para seu castigo.
17
O seguinte fato mostrará que não foi fácil violar as leis divinas.
18
Como em Tiro se celebrassem os jogos qüinqüenais, em presença do rei,
19
o ímpio Jasão mandou um grupo de antioquenos de Jerusalém levar trezentas dracmas de prata para o sacrifício de Hércules, mas os próprios portadores acharam a coisa inconveniente e julgaram melhor empregá-las em outras despesas.
20
A vontade de Jasão era de que elas fossem destinadas ao sacrifício de Hércules mas, por causa dos que as levavam, foram destinadas à construção das galeras.
21
Tendo sido enviado ao Egito Apolônio, filho de Menesteu, por ocasião da posse do rei Filometor, soube Antíoco que este rei se lhe tornara hostil e procurou pôr-se em segurança. Veio, pois, a Jope e de lá dirigiu-se a Jerusalém.
22
Recebido magnificamente por Jasão e por toda a cidade, fez sua entrada à luz de fachos, entre aclamações. Depois disso transportou o seu acampamento para a Fenícia.

Menelau suplanta Jasão

23 Três anos mais tarde, Jasão enviou Menelau, irmão de Simão, acima mencionado, para levar o dinheiro ao rei e lembrar-lhe os negócios urgentes;
24
mas, uma vez admitido à presença do rei, cumulou-o de encômios sobre a extensão do seu poder e, oferecendo trezentos talentos a mais que Jasão, obteve para si mesmo o pontificado.
25
Recebidas as ordens do rei, voltou, nada tendo em si que fosse digno do pontificado, mas excitado por sentimentos de um desumano tirano e de uma besta feroz.
26
Desse modo Jasão, que havia suplantado seu próprio irmão, suplantado por sua vez, viu-se forçado a exilar-se no país dos amonitas.
27
Quanto a Menelau, achava-se bem na posse da dignidade, mas não entregava de modo algum ao rei o dinheiro prometido,
28
se bem que ele lhe fosse reclamado por Sóstrato, governador da Acrópole, encarregado das cobranças dos impostos; por esse motivo ambos foram chamados a comparecer diante do rei.
29
Menelau designou para substituí-lo como sumo sacerdote seu irmão Lisímaco; Sóstrato deixou Cratos, comandante dos cipriotas.

Assassinato de Onias

30 Entrementes, os habitantes de Tarso e de Malos se revoltaram, porque sua cidade havia sido entregue a Antioquides, concubina do rei.
31
Partiu pois este a toda a pressa, para restabelecer a calma, deixando como seu lugar-tenente Andrônico, um de seus dignitários.
32
Menelau viu que a circunstância lhe era favorável e se reconciliou com Andrônico por meio de objetos de ouro roubados ao templo; chegou igualmente a vendê-los em Tiro e nas cidades vizinhas.
33
Quando soube disso com clareza, Onias repreendeu-o, conservando-se retirado no território inviolável de Dafné, perto de Antioquia.
34
Por causa disso, Menelau tomou à parte Andrônico, e induziu-o a matar Onias. Andrônico dirigiu-se, pois, para junto dele, enganou-o com astúcia, deu-lhe garantias, que confirmou por juramento, levou-o a deixar seu esconderijo e matou-o no mesmo instante, sem nenhuma atenção à justiça.
35
Não só os judeus, mas também muitos estrangeiros ficaram indignados e consternados com esse assassínio iníquo
36
e, quando o rei entrou nas cidades de Cilícia, tanto os judeus da cidade, como também os gregos contrários à violência, vieram perquirir o motivo do assassinato inescusável de Onias.
37
Antíoco ficou profundamente abatido e, tocado de compaixão, chorou ao lembrar-se da sabedoria e da grande moderação do finado.
38
Excitado assim por uma cólera violenta, despojou imediatamente Andrônico de suas púrpuras, rasgou-lhe as vestes, mandou que levassem através de toda a cidade, até o lugar onde havia lançado a mão sacrílega sobre Onias, e ali acabou com a vida do homicida. Assim o Senhor deu-lhe o merecido castigo.

Outros delitos de Menelau

39 Ora, em Jerusalém, Lisímaco, de acordo com Menelau, multiplicou os roubos sacrílegos e, divulgado o rumor, o povo acabou por amotinar-se contra ele, porque muitos objetos de ouro haviam sido levados.
40
Como a multidão se houvesse sublevado em cólera, Lisímaco equipou perto de três mil homens e deu o sinal para uma injusta repressão, sob a chefia de certo Auranos, homem avançado em idade e não menos em loucura.
41
Todavia, o povo tomou conhecimento da trama de Lisímaco: uns se armaram com pedras, outros com paus, alguns ajuntaram o pó da terra e se arremessaram contra os homens de Lisímaco.
42
Desse modo, muitos foram os feridos, alguns mortos e os restantes postos em fuga; quanto ao próprio sacrílego, mataram-no junto ao tesouro.
43
Por todas essas desordens, foi instaurado um processo contra Menelau.
44
Quando o rei veio a Tiro, três enviados da assembléia dos anciãos sustentaram a acusação diante dele.
45
Mas Menelau, que se julgava já derrotado, prometeu grande soma de dinheiro a Ptolomeu, filho de Diomedes, para que ele lhe granjeasse o favor do rei.
46
Ptolomeu conduziu pois o rei para debaixo de um peristilo, como se fosse para tomar ar fresco, e fê-lo mudar de sentimento,
47
de modo que Menelau, posto que responsável por todo o mal, foi considerado pelo rei inocente de todas as acusações que pesavam sobre ele, e condenou à morte os infelizes que teriam sido julgados inocentes, mesmo se tivessem pleiteado diante dos citas.
48
Assim, os que só tinham tomado a palavra para defender os interesses da cidade, do povo e dos objetos sagrados sofreram essa pena injusta.
49
Por isso, os próprios tírios ficaram de tal maneira encolerizados com esse crime, que subvencionaram magnificamente os gastos de suas sepulturas.
50
Quanto a Menelau, por causa da cobiça dos poderosos, conservou seu cargo, mas cresceu em malícia e tornou-se o verdadeiro inimigo de seus concidadãos.

Fim miserável de Jasão

5 1 Por essa ocasião, Antíoco organizou sua segunda expedição ao Egito.
2
Aconteceu que em toda a cidade e por mais de quarenta dias apareceram, correndo pelos ares, cavaleiros vestidos de ouro e armados com lanças, coortes armadas, espadas desembainhadas,
3
esquadrões alinhados para a batalha, perseguições e choques de um lado e de outro, movimentos de escudos, florestas de lanças, tiros de dardos, armaduras de ouro resplandecentes e couraças de todo o gênero.
4
Por isso, todos rezavam para que tais aparições produzissem felizes resultados.
5
Espalhando-se a notícia, aliás falsa, da morte de Antíoco, Jasão tomou consigo ao menos mil homens e atacou a cidade de improviso. Travou-se o combate sobre os muros e a cidade estava já tomada, quando Menelau fugiu para a Acrópole.
6
Jasão massacrou sem piedade seus próprios concidadãos, esquecendo-se de que uma vitória ganha sobre compatriotas é a maior das desgraças, e agiu como se alcançasse um troféu dos seus inimigos e não dos seus congêneres.
7
Todavia, não lhe foi possível conquistar o poder, e só recolhendo de sua maquinação a vergonha, fugiu de novo para a terra dos amonitas.
8
Pereceu, enfim, miseravelmente, porque, acusado junto de Aretas, rei dos árabes, fugiu de cidade em cidade e, perseguido por todos, detestado como violador de leis, desprezado como carrasco de sua pátria e de seus concidadãos, foi levado para o Egito.
9
Aquele que tinha lançado fora de sua pátria tanta gente pereceu numa terra estrangeira, tendo ido para junto dos espartanos, com a esperança de ali encontrar refúgio, por causa de uma origem comum
10
e, após ter lançado por terra tantos homens, sem sepultá-los, não foi chorado por ninguém, não recebeu as honras dos funerais e nem um lugar no túmulo de seus pais.
11
Quando a notícia desses acontecimentos chegou aos ouvidos do rei, ele concluiu que a Judéia queria desertar. Trazendo seu exército do Egito, com o ânimo enfurecido, conquistou a cidade de assalto,
12
e ordenou aos soldados que matassem sem compaixão aqueles que caíssem em suas mãos e que degolassem os que se refugiassem nas casas.
13
Houve, pois, mortandade de jovens e de velhos, carnificina de homens, de mulheres e de crianças, massacre de donzelas e de meninos.
14
Em três dias houve oitenta mil vítimas, das quais quarenta mil foram mortas e outras tantas vendidas como escravas.
15
Não satisfeito com isso, o rei ousou penetrar no templo, o mais santo de toda a terra, conduzido por Menelau, que foi infiel às leis e à pátria.
16
Tomou com as mãos profanas os vasos sagrados e com mãos impuras apoderou-se das oferendas feitas pelos reis anteriores, para proveito, honra e glória do templo.
17
Antíoco enchia-se de orgulho, mas não percebia que o Senhor momentaneamente se havia irritado por causa dos pecados dos habitantes da cidade: daí essa indiferença pelo templo,
18
porque, se os judeus não fossem por demais culpáveis, a exemplo de Heliodoro, enviado pelo rei Seleuco para inspecionar o tesouro, ele teria sido flagelado logo que chegou, e dissuadido de sua audácia.
19
Na verdade, Deus não escolheu o povo por causa do templo, mas escolheu o templo por causa do povo;
20
foi por isso que aquele, depois de ter participado dos males do povo, teve em seguida parte com ele nos favores divinos e, desamparado no tempo da cólera, foi restaurado com toda a sua glória por ocasião da reconciliação com o soberano Senhor.
21
Tendo Antíoco roubado ao templo mil e oitocentos talentos, voltou sem demora para Antioquia. Com o espírito exaltado, ele cria, em sua soberba, poder navegar sobre a terra e caminhar sobre o mar.
22
Contudo, por motivo de seu ódio para com os judeus, deixou atrás de si oficiais com a incumbência de molestar o povo: em Jerusalém, Filipe, da Frígia, mais bárbaro ainda que seu senhor;
23
no monte Garizim, Andrônico e, adjunto a estes, Menelau, que se encarniçava contra seus concidadãos de modo mais terrível que os outros.
24
Enviou também o misarca Apolônio à frente de um poderoso exército de vinte e dois mil homens, com a ordem de matar todos os adultos e de vender as mulheres e as crianças.
25
Chegou pois este a Jerusalém, fingindo intenções pacíficas; esperou até o dia santo de sábado e, apanhando os judeus desocupados, ordenou às suas tropas pegarem em armas.
26
Todos os que saíram para ver o espetáculo foram massacrados e, percorrendo a cidade com seus soldados, matou um grande número de pessoas.

Judas Macabeu

27 Judas Macabeu retirou-se com um grupo de outros homens para o deserto, vivendo com os seus companheiros nas montanhas como animais selvagens e alimentando-se de plantas para não se contaminarem.

Aumento da perseguição

6 1 Pouco tempo depois, um velho ateniense foi enviado pelo rei para forçar os judeus a abandonar os costumes dos antepassados, banir as leis de Deus da cidade,
2
macular o templo de Jerusalém, dedicá-lo a Júpiter Olímpico e consagrar o do monte Garizim, segundo o caráter dos habitantes do lugar, a Júpiter Hospitaleiro.
3
Dura e penosa foi para todos essa avalanche de mal.
4
O templo encheu-se de lascívias e das orgias dos gentios que se divertiam com meretrizes, unindo-se às mulheres nos átrios sagrados e introduzindo coisas ilegais.
5
O altar estava coberto de vítimas impuras, interditas pelas leis.
6
Não se permitia mais a observância do sábado, a celebração das antigas festas, nem mesmo confessar-se judeu.
7
Em cada mês, no dia natalício do rei, realizava-se um sacrifício; os judeus eram odiosamente forçados a tomar parte no banquete ritual e, por ocasião das festas em honra de Dionísio, deviam forçosamente acompanhar o cortejo de Baco, coroados com hera.
8
Por instigação dos ptolomeus, foi publicado um decreto que obrigava as cidades helênicas dos arredores a tratar os judeus do mesmo modo e levá-los à participação nos banquetes rituais, com a ordem de matar os que se recusassem a adotar os costumes helênicos.
9
Podiam-se, pois, prever as aflições que os aguardavam.
10
Assim, duas mulheres foram acusadas de circuncidarem suas crianças: foram arrastadas publicamente pela cidade, com seus filhinhos pendurados aos peitos e precipitadas do alto das muralhas.
11
Outros se haviam retirado às cavernas vizinhas para aí celebrarem secretamente o dia de sábado. Denunciados a Filipe, foram todos queimados, pois não ousaram defender-se, por respeito à santidade do dia.

Reflexões morais

12 Suplico aos que lerem este livro, que não se deixem abater por esses tristes acontecimentos, mas que considerem que esses castigos tiveram em mira não a ruína, mas a correção de nossa raça;
13
porque é sinal de uma grande benevolência a seu respeito o fato de não suportar por muito tempo os maus e de, ao contrário, castigá-los sem tardança.
14
Quanto às outras nações, o Senhor espera pacientemente, antes de puni-las, que tenham enchido a medida de suas iniqüidades; a nós, porém, ele prefere não nos tratar assim,
15
com receio de ter que nos punir mais tarde, quando tivermos pecado demasiadamente.
16
Assim, não nos retire ele jamais a sua misericórdia e não abandone seu povo, no momento em que o corrige pela adversidade!
17
Mas que tudo isso seja dito apenas a título de lembrança, e, com estas palavras, voltemos à narração.

Martírio de Eleazar

18 Havia certo homem já de idade avançada e de bela aparência, Eleazar, que se sentava no primeiro lugar entre os doutores da lei. Queriam coagi-lo a comer carne de porco, abrindo-lhe a boca à força.


19 Mas ele, cuspindo e preferindo morrer com honra a viver na infâmia,
20
caminhou voluntariamente para o instrumento de tortura, como devem caminhar os que têm a coragem de rejeitar o que não é permitido comer por amor à vida.


21 Ora, os encarregados desse ímpio banquete ritual, já desde muito tempo possuíam relações de amizade com Eleazar. Tomaram-no à parte e rogaram-lhe que fizesse trazer as carnes permitidas, que ele mesmo tivesse preparado, para comê-las como se fossem carnes do sacrifício, conforme ordenara o rei.


22 Desse modo, ele seria preservado da morte, e granjearia sua benevolência em vista da antiga amizade.
23
Mas Eleazar, tomando uma bela resolução, digna de sua idade, da autoridade que lhe conferia sua velhice, do prestígio que lhe outorgavam seus cabelos brancos, da vida íntegra conservada desde a infância, digna sobretudo das sagradas leis estabelecidas por Deus, preferiu ser conduzido à morte.


24 Não é próprio da nossa idade, respondeu ele, usar de tal fingimento, para não acontecer que muitos jovens suspeitem de que Eleazar, aos noventa anos, tenha passado aos costumes estrangeiros.
25
Eles mesmos, após o meu gesto hipócrita, e por um pouco de vida, se deixariam arrastar por causa de mim, e isso seria para a minha velhice a desonra e a vergonha.
26
E mesmo se eu me livrasse agora dos castigos dos homens, não poderia escapar, nem vivo nem morto, das mãos do Todo-poderoso.
27
Sendo assim, se eu morrer agora corajosamente, mostrar-me-ei digno de minha velhice, e terei deixado aos jovens um nobre exemplo de zelo generoso, segundo o qual é preciso dar a vida pelas santas e veneráveis leis.
28
Ditas estas palavras, ele dirigiu-se ao suplício.
29
Aqueles que o levavam transformaram em dureza a benevolência, que pouco antes haviam tido para com ele, julgando insensatas suas palavras.
30
E quando ele estava prestes a morrer sob os golpes, exclamou entre suspiros: O Senhor que possui a ciência santíssima o vê: podendo eu livrar-me da morte, sofro em meu corpo os tormentos cruéis dos açoites, mas os suporto com alma alegre porque é a ele que temo.
31
Dessa maneira passou à outra vida, deixando com sua morte não somente aos jovens, mas também a toda a sua gente, um exemplo de coragem e um memorial de virtude.


2 der Makkabäer (BAV) 1