Sagesse (SAV) 13

Insensatez da idolatria

13 1 São insensatos por natureza todos os que desconheceram a Deus, e, através dos bens visíveis, não souberam conhecer Aquele que é, nem reconhecer o Artista, considerando suas obras.
2
Tomaram o fogo, ou o vento, ou o ar agitável, ou a esfera estrelada, ou a água impetuosa, ou os astros dos céus, por deuses, regentes do mundo.
3
Se tomaram essas coisas por deuses, encantados pela sua beleza, saibam, então, quanto seu Senhor prevalece sobre elas, porque é o criador da beleza que fez estas coisas.
4
Se o que os impressionou é a sua força e o seu poder, que eles compreendam, por meio delas, que seu criador é mais forte;
5
pois é a partir da grandeza e da beleza das criaturas que, por analogia, se conhece o seu autor.
6
Contudo, estes só incorrem numa ligeira censura, porque, talvez, eles caíram no erro procurando Deus e querendo encontrá-lo:
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vivendo entre suas obras, eles as observam com cuidado, e porque eles as consideram belas, deixam-se seduzir pelo seu aspecto.
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Ainda uma vez, entretanto, eles não são desculpáveis,
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porque, se eles possuíram luz suficiente para poder perscrutar a ordem do mundo, como não encontraram eles mais facilmente aquele que é seu Senhor?


10 Mas são desgraçados e esperam em mortos, aqueles que chamaram de deuses a obras de mãos humanas: o ouro, a prata, artisticamente trabalhados, figuras de animais, alguma pedra inútil, a que, outrora, certa mão deu forma.
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Assim, um lenhador cortou e serrou uma árvore fácil de manejar. Habilmente ele lhe tirou toda a casca, e com a habilidade do seu ofício, fez dela um móvel útil para seu uso.
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Com as sobras de seu trabalho, cozinhou comida, com que se saciou.
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O que ainda lhe restava, não era bom para nada, não passando de madeira torcida e toda cheia de nós; contudo, ele a tomou e consagrou suas horas de lazer a talhá-la; ele a trabalhou com toda a arte que adquirira, e lhe deu a semelhança de um homem,
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ou o aspecto de algum vil animal. Pôs-lhe vermelhão, uma demão de uma tinta encarnada, e encobriu-lhe cuidadosamente todo defeito.
15
Em seguida, preparou-lhe um nicho digno dele. e o fixou à parede, segurando-o com um prego:
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foi por medo que caísse, que tomou este cuidado, porque sabe muito bem que ele não pode ajudar-se a si mesmo, pois não passa de uma estátua que tem necessidade de um apoio.
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Mas quando lhe implora por seus bens, seus casamentos, seus filhos, não se envergonha de falar ao que é inanimado, e pede saúde ao que é desprezível.
18
Reclama a vida ao que é morto, e procura socorro no que é débil; e para uma viagem, invoca o que não pode andar;
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para um lucro, um trabalho, o bom êxito de uma obra de suas mãos, pede a força ao que nem é capaz de mover as mãos.


14 1 Outro, por sua vez, que quer navegar e se prepara para atravessar as impetuosas ondas, invoca um madeiro de pior qualidade que o navio que o leva;
2
porque o desejo do lucro inventou o navio, e uma hábil sabedoria dirigiu sua construção.
3
Mas sois vós, Pai, que o governais pela vossa Providência, porque, se abristes caminho, mesmo no mar, e uma rota segura no meio das ondas -
4
mostrando por aí que vós podeis tirar do perigo aquele que as afronta mesmo sem meios -,
5
quereis entretanto que não sejam inúteis as obras de vossa sabedoria. Por isso os homens confiam a própria vida a um pouco de madeira e atravessam em segurança as ondas num navio.
6
Assim, com efeito, quando na origem dos tempos fizestes perecer gigantes orgulhosos, a esperança do universo, refugiando-se num barco, que vossa mão governava, conservou para o mundo o germe de uma geração.
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Porque é bendito o madeiro pelo qual se opera a justiça,
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mas maldito é o ídolo, ele e o que o fez; este porque o formou, aquele porque, sendo corruptível, leva o nome de deus.
9
Com efeito, Deus odeia tanto o ímpio quanto sua impiedade,
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e a obra sofrerá o mesmo castigo que o autor.
11
Este é o motivo porque também os ídolos das nações serão julgados, porque, na criação de Deus, eles se tornaram uma abominação, objetos de escândalo para os homens, e laços para os pés dos insensatos.

Origem da idolatria

12 É pela idealização dos ídolos que começou a apostasia, e sua invenção foi a perda dos humanos.
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Eles não existiam no princípio e não durarão para sempre;
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a vaidade dos homens os introduziu no mundo. E, por causa disso, Deus decidiu a sua destruição para breve.
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Um pai aflito por um luto prematuro, tendo mandado fazer a imagem do filho, tão cedo arrebatado, honrou, em seguida, como a um deus aquele que não passava de um morto, e transmitiu, aos seus, certos ritos secretos e cerimônias.
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Este costume ímpio, tendo-se firmado com o tempo, foi depois observado como lei.
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Foi também em conseqüência das ordens dos príncipes que se adoraram imagens esculpidas, porque aqueles que não podiam honrar pessoalmente, porque moravam longe deles, fizeram representar o que se achava distante, e expuseram publicamente a imagem do rei venerado, a fim de lisonjeá-lo de longe com seu zelo, como se estivesse presente.
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Isto contribuiu ainda para o estabelecimento deste culto, mesmo entre os que não conheciam o rei; foi a ambição do artista,
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que, talvez, querendo agradar ao soberano, deu-lhe, por sua arte, a semelhança do belo;
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e a multidão, seduzida pelo encanto da obra, em breve tomou por deus aquele que tinham honrado como homem.
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E isto foi uma cilada para a humanidade: os homens, sujeitando-se à lei da desgraça e da tirania, deram à pedra e à madeira o nome incomunicável.

Consequencias da idolatria

22 Como se não bastasse terem errado acerca do conhecimento de Deus, embora passando a vida numa longa luta de ignorância, eles dão o nome de paz a um estado tão infeliz.
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Com efeito, sacrificando seus filhos, celebrando mistérios ocultos, ou entregando-se a orgias desenfreadas de religiões exóticas,
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eles já não guardam a honestidade nem na vida nem no casamento, mas um faz desaparecer o outro pelo ardil, ou o ultraja pelo adultério.
25
Tudo está numa confusão completa - sangue, homicídio, furto, fraude, corrupção, deslealdade, revolta, perjúrio,
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perseguição dos bons, esquecimento dos benefícios, contaminação das almas, perversão dos sexos, instabilidade das uniões, adultérios e impudicícias -
27
porque o culto de inomináveis ídolos é o começo, a causa e o fim de todo o mal.
28
(Seus adeptos) incitam o prazer até a loucura, ou fazem vaticínios falsos, ou vivem na injustiça, ou, sem escrúpulo, juram falso,
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porque, confiando em ídolos inanimados, esperam não ser punidos de sua má fé.
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Contudo, o castigo os atingirá por duplo motivo: porque eles desconheceram a Deus, afeiçoando-se aos ídolos, e porque são culpados, por desprezo à santidade da religião, de ter feito juramentos enganadores.
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Pois não é o poder dos ídolos invocados, mas o castigo reservado ao pecador, que sempre persegue as faltas dos maus.

Paralelo entre os adoradores do verdadeiro Deus e os idólatras

15 1 Mas vós, Deus nosso, sois benfazejo e verdadeiro, vós sois paciente e tudo governais com misericórdia;
2
com efeito, mesmo se pecamos, somos vossos, porque conhecemos vosso poder; mas não pecaremos, cientes de que somos considerados como vossos.
3
Porque conhecer-vos é a perfeita justiça, e conhecer vosso poder é a raiz da imortalidade.
4
Não fomos seduzidos pelas invenções da arte corruptora dos homens nem pelo vão trabalho dos pintores: borrada figura de cores misturadas,
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cuja vista excita os desejos dos insensatos, fantasma inanimado de uma imagem sem vida que provoca a paixão!
6
Cativados pelo mal, não merecem esperar senão o mal, os que o fazem, os que o amam e os que o veneram.
7
Eis, portanto, um oleiro que amassa laboriosamente a terra mole, e forma diversos objetos para nosso uso, mas da mesma argila faz vasos destinados a fins nobres e outros, indiferentemente, para usos opostos. Para qual destes usos cada vaso será aplicado? O oleiro será o juiz.
8
Do mesmo barro, forma também, como obreiro perverso, uma vã divindade, ele que, ainda há pouco, nasceu da terra, e em breve voltará a ela, de onde foi tirado, quando lhe serão pedidas as contas de sua vida.
9
Ele mesmo não tem preocupação alguma com o próprio desfalecimento, nem com a brevidade da vida; ele rivaliza, pelo contrário, com aqueles que trabalham o ouro e a prata, imita os que trabalham o cobre.
10
Pó é o seu coração, mais vil que a terra sua esperança, e põe sua glória em fabricar objetos enganadores. E mais desprezível que o barro é sua vida,
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porque não reconheceu aquele que o formou, aquele que lhe inspirou uma alma ativa e lhe insuflou o espírito vital.
12
Para ele a vida é um divertimento, e nossa existência um mercado lucrativo, porque, diz ele, é preciso aproveitar-se de tudo, mesmo do mal.
13
Mais que qualquer outro, esse homem sabe que peca, fazendo do mesmo barro vasos frágeis e ídolos.
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Ora, verdadeiramente, muito insensatos, mais infortunados que a alma da criança, são os inimigos de vosso povo, que o oprimiram,
15
porque eles também tiveram por deuses todos os ídolos das nações, que não podem servir-se de seus olhos para ver, que não têm nariz para aspirar o ar, nem ouvidos para ouvir, nem os dedos das mãos para apalpar, e cujos pés são incapazes de andar;
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foi, com efeito, um homem que os fez, formou-os alguém que recebeu a alma de empréstimo. Nenhum homem pode fazer um deus, mesmo semelhante a si próprio,
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porque, sendo ele próprio mortal, morto é tudo que produz com suas mãos ímpias. De fato, ele vale mais que os objetos que venera; ele, pelo menos, tem vida, enquanto os ídolos não a têm.
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Chega-se até a adorar os mais odiosos animais, que são piores ainda que os outros animais irracionais,
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que nem mesmo possuem o que outros seres vivos possuem: bastante beleza para serem amados, e que foram excluídos da aprovação e da bênção de Deus.

Deus trata cada um segundo seus méritos

16 1 Por isso foram justamente castigados por animais dessa espécie e atormentados por uma multidão de animais;
2
em vez de feri-lo assim, vós favorecíeis vosso povo, satisfazendo por um alimento surpreendente o ardor de seu apetite, e oferecendo-lhe por alimento codornizes.
3
De tal modo que aqueles, mau grado sua fome, diante do aspecto hediondo de animais enviados contra eles, experimentaram a náusea; estes, após uma curta privação, receberam um alimento maravilhoso.
4
Pois era preciso que os primeiros, os opressores, fossem oprimidos por uma inexorável fome, e que aos outros fossem apenas mostrados os tormentos suportados por seus inimigos.
5
Efetivamente, quando o cruel furor dos animais os atingiu também, e quando pereceram com a mordedura de sinuosas serpentes, vossa cólera não durou até o fim.
6
Foram por pouco tempo atormentados, para sua correção: eles possuíram um sinal de salvação que lhes lembrava o preceito de vossa lei.
7
E quem se voltava para ele era salvo, não em vista do objeto que olhava, mas por vós, Senhor, que sois o salvador de todos.
8
Com isso mostráveis a vossos inimigos, que sois vós que livrais de todo o mal.
9
Quanto a eles as mordeduras dos gafanhotos e das moscas os matavam e não se encontrou remédio para salvar sua vida, porque mereciam ser castigados por tais instrumentos;
10
mas a vossos filhos, mesmo os dentes de serpentes venenosas não os puderam vencer, porque sobrevindo a vossa misericórdia curou-os.
11
Eram picados, para que se lembrassem de vossas palavras, e, em seguida, ficavam curados, para que não viessem a esquecê-las completamente e a subtraírem-se a si mesmos de vossos benefícios.
12
Não foi uma erva nem algum ungüento que os curou, mas a vossa palavra que cura todas as coisas, Senhor.
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Porque vós sois senhor da vida e da morte. Vós conduzis às portas do Hades e de lá tirais;
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enquanto o homem, se pode matar por sua maldade, não pode fazer voltar o espírito uma vez saído, nem chamar de volta a alma que o Hades já recebeu.
15
Escapar à vossa mão é impossível,
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e os ímpios, que recusaram conhecer-vos, foram fustigados pela força de vosso braço, perseguidos por chuvas extraordinárias, saraivas e implacáveis tempestades, e consumidos pelo fogo dos raios.
17
O que havia de mais admirável ainda, é que, na água que tudo extingue, o fogo tomava mais violência, porque o universo toma a defesa dos justos.
18
Ora, a chama temperava seu ardor para não queimar os animais enviados contra os ímpios, para que estes se apercebessem e reconhecessem que eram perseguidos pelo julgamento de Deus.
19
Ora, excedendo sua força habitual, o fogo ardia mesmo no meio da água para destruir os frutos de uma terra iníqua...
20
Mas, pelo contrário, foi com o alimento dos anjos que alimentastes vosso povo, e foi do céu que, sem fadiga, vós lhe enviastes um pão já preparado, contendo em si todas as delícias e adaptando-se a todos os gostos.
21
Esta substância que dáveis se parecia com a doçura que mostráveis a vossos filhos. Ela se adaptava ao desejo de quem a comia, e transformava-se naquilo que cada qual desejava.
22
(Embora fosse como) neve e gelo, ela suportava o fogo sem se fundir, para mostrar que era para os inimigos que o fogo destruía as colheitas, quando ardia, apesar da saraiva, e brilhava debaixo de chuvas,
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enquanto que, quando se tratava de alimentar os justos, até perdia sua natural violência.
24
A criatura que vos é submissa, a vós, seu Criador, aumenta sua força para castigar os maus, e os modera para o bem dos que puseram em vós sua fé.
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Do mesmo modo, transformada em tudo que se queria, servia à vossa generosidade que a todos alimenta, segundo a vontade dos que dela tinham necessidade,
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para que os filhos que vós amais, Senhor, aprendessem que não são os frutos da terra que alimentam o homem, mas é vossa palavra que conserva em vida aqueles que crêem em vós.
27
O que não era destruído pelo fogo, fundia-se ao simples calor de um raio de sol,
28
para que se soubesse que é preciso antecipar-se ao sol para vos agradecer, e que é preciso adorar-vos antes de raiar o dia;
29
porque a esperança do ingrato é como a geleira do inverno, que se derramará como água inútil.

A praga das trevas. A consciência atormenta também os idólatras

17 1 Em verdade, grandes e impenetráveis são vossos juízos, Senhor; por isso as almas grosseiras caíram no erro.
2
Por terem acreditado que podiam oprimir a santa nação, os ímpios, prisioneiros das trevas e encarcerados por uma longa noite, jaziam encerrados nas suas casas, tentando escapar à vossa incessante vigilância.
3
Depois de terem imaginado que, com seus secretos pecados, ficariam escondidos sob o sombrio véu do esquecimento, eles se viram dispersados, como presa de um terrível espanto, e amedrontados por alucinações.
4
Mesmo o canto mais afastado em que se abrigavam não os punha ao abrigo do terror: ruídos aterradores ressoavam em torno deles, e taciturnos espectros de lúgubre aspecto lhes apareciam.
5
Nenhuma chama, por intensa que fosse, chegava a iluminar. E a luz brilhante dos astros era impotente para alumiar esta noite sombria.
6
Mas aparecia-lhes de súbito nada mais que uma chama aterradora, e, tomados de terror por esta visão fugitiva, julgavam essas aparições mais terríveis ainda.
7
A arte dos mágicos se mostrou ilusória, e esta sabedoria, a que eles pretendiam, evidenciou-se vergonhosamente como falsidade.
8
Aqueles que se jactavam de banir das almas doentes o terror e a perturbação, eram eles mesmos atormentados por um ridículo temor.
9
Mesmo quando nada de mais grave os aterrorizava, a passagem dos animais e o silvo das serpentes punham-nos fora de si, e eles morriam de medo. Recusavam até mesmo contemplar essa atmosfera à qual nada podia escapar;
10
porque a maldade, condenada por seu próprio testemunho, é medrosa, e, sob o peso da consciência, supõe sempre o pior,
11
pois o temor não é outra coisa que a privação dos socorros trazidos pela reflexão,
12
porque, quanto menor for em sua alma a esperança de auxílio, tanto mais penosa é a ignorância daquilo de que se tem medo.
13
Eles, durante essa noite de impotência, saída dos recantos do Hades impotente, dormiam num mesmo sono,
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agitados, de um lado, pelo terror dos espectros, e paralisados, de outro, pelo desfalecimento da alma; pois era um pavor repentino e inesperado o que se abatera sobre eles.
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E todo aquele que caía sem força, ficava como que preso e encerrado num cárcere sem ferros.
16
Fosse ele camponês ou pastor, ou o operário que se afadiga sozinho no seu trabalho, uma vez surpreendido, tinha de suportar a inevitável necessidade, porque todos estavam ligados por uma mesma cadeia de trevas.
17
O silvo do vento, o canto harmonioso dos passarinhos nos ramos espessos, o murmúrio da água correndo precipitadamente, o estrondo das rochas que se despenhavam,
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a carreira invisível dos animais que saltavam, os urros dos animais selvagens, o eco que repercutia nas cavidades dos montes: tudo os paralisava de terror.
19
Enquanto o mundo inteiro era alumiado de uma brilhante luz, e sem obstáculo se entregava às suas ocupações,
20
somente sobre eles se estendia uma pesada noite, imagem das trevas que mais tarde os deviam acolher; e eram para si mesmos um peso mais insuportável que esta escuridão.


18 1 Contudo, para vossos santos havia uma luz brilhantíssima. Sem verem seus semblantes, os outros ouviam-lhes a voz, e julgavam-nos felizes por não sofrerem os mesmos tormentos.
2
Davam-lhes graças, porque não se vingavam dos maus tratos suportados, e pediam-lhes perdão de sua inimizade.
3
Pelo contrário, vós destes uma coluna luminosa para guiá-los na sua marcha para o desconhecido, como um sol que sem incomodá-los alumiava seu glorioso êxodo.
4
Mas eles bem mereciam ser privados da luz e aprisionados nas trevas, eles, que tinham encerrado em prisões os vossos filhos, através dos quais a incorruptível luz da lei se devia comunicar ao mundo.

A morte dos primogênitos

5 Também tinham resolvido levar à morte os filhos dos santos, mas um deles foi exposto e salvo, e para puni-los fizestes perecer em multidão os seus filhos, e, todos juntos, vós os aniquilastes na profundeza das águas.


6 Esta mesma noite tinha sido conhecida de antemão por nossos pais, para que, conhecendo bem em que juramentos confiavam, ficassem cheios de coragem.
7
Assim vosso povo esperava tanto a salvação dos justos como a perdição dos ímpios,
8
e pelo mesmo fato de terdes destruído nossos inimigos, vós nos convidastes a ser vossos e nos honrastes.
9
Por isso, os santos filhos dos justos ofereciam secretamente um sacrifício; de comum acordo estabeleciam o pacto divino: que os santos participariam dos mesmos bens e correriam os mesmos perigos; e entoavam já os hinos de seus pais,


10 quando se elevaram os gritos confusos dos inimigos e se espalharam as lamentações dos que choravam seus filhos.
11
Uma mesma sentença feria o escravo e o senhor, o homem do povo sofria o mesmo castigo que o rei.
12
Todos igualmente tinham um número incalculável de mortos abatidos da mesma maneira; os sobreviventes não eram suficientes para sepultá-los. porque, num instante, sua melhor geração era exterminada.
13
Depois de terem permanecido incrédulos por causa de seus sortilégios, reconheceram, vendo morrer seus primogênitos, que esse povo era verdadeiramente filho de Deus,


14 porque, quando um profundo silêncio envolvia todas as coisas, e a noite chegava ao meio de seu curso,
15
vossa palavra todo-poderosa desceu dos céus e do trono real, e, qual um implacável guerreiro, arremessou-se sobre a terra condenada à ruína.
16
De pé, ela tudo encheu de morte, e, pisando a terra, tocava os céus.


17 No mesmo instante, visões e sonhos terríveis os perturbaram, e temores inesperados os assaltaram;
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tombando aqui e acolá, semimortos, revelavam a causa da morte que os atingia;
19
porque os sonhos que os tinham agitado tinham-nos informado antecipadamente, para que eles não perecessem sem conhecer a causa de sua desgraça.
20
Verdade é que a prova da morte feriu também os justos, e numerosos foram os que ela abateu no deserto, mas a ira de Deus não durou muito tempo;
21
porque um homem irrepreensível se apressou a tomar sua defesa, servindo-se das armas de seu ministério pessoal, a oração e o sacrifício expiatório do incenso. Opôs-se à ira, e pôs fim ao flagelo, mostrando que era vosso servo.
22
Dominou a revolta, não pela força física, nem pela força das armas, mas pela sua palavra deteve aquele que castigava, relembrando-lhe os juramentos feitos aos antepassados e a aliança estabelecida.
23
Já os mortos se amontoavam uns sobre os outros, quando ele interveio, deteve a cólera e afastou-a dos vivos.
24
Na sua longa vestimenta estava representado o universo inteiro; nas quatro fileiras de pedras os nomes gloriosos dos patriarcas; e no diadema de sua cabeça vossa Majestade.
25
Diante destas coisas cedeu o exterminador e foi diante destas coisas que retrocedeu: porque a simples demonstração de vossa ira era suficiente.

A passagem do mar Vermelho

19 1 Quanto aos ímpios, inexorável foi a ira que os perseguiu até o fim: porque Deus previa o que eles haveriam de fazer,
2
isto é, depois de terem deixado partir (os justos), instando mesmo que fossem embora, mudariam de opinião e os perseguiriam.
3
Na verdade, eles estavam ainda enlutados, e gemiam ainda sobre a tumba de seus mortos, quando loucamente tomaram outra resolução e perseguiram, como a fugitivos, aqueles aos quais tinham rogado que partissem.
4
Um merecido destino os impelia a esse proceder extremo, e os atirava no olvido dos acontecimentos passados, para que sofressem, em meio a tormentos, um castigo completo,
5
e fossem feridos de uma morte insólita, enquanto vosso povo tentava uma extraordinária passagem.


6 É que toda a criação, obedecendo às vossas ordens, foi remodelada em sua natureza, para que vossos filhos fossem conservados ilesos.
7
Foi vista uma nuvem cobrir o acampamento, e a terra seca surgir do que tinha sido água, um caminho viável formar-se no mar Vermelho, e um campo verdejante emergir das ondas impetuosas.
8
Por aí passou toda ela, a nação dos que vossa mão protegia, e que viram singulares prodígios.
9
Iam como cavalos conduzidos à pastagem, e saltavam como cordeiros, glorificando-vos a vós, Senhor, seu libertador,


10 porque eles se lembravam ainda do que tinha acontecido na terra estrangeira: como a terra, contrariando a geração dos vivos, tinha produzido moscas, e como o rio, em lugar de peixes, tinha lançado fora uma multidão de rãs.
11
Mais tarde, viram ainda nascer uma nova espécie de pássaros, quando, premidos pela cobiça, pediram manjares delicados, porquanto, para satisfazê-los, codornizes subiram do mar.
12
Os castigos não surpreenderam os pecadores, sem que fossem antes advertidos pela violência dos raios.
13
Suportavam justamente o castigo de sua própria maldade, porque tinham mostrado excessivo ódio pelo estrangeiro.
14
Houve muitos que não quiseram receber hóspedes desconhecidos, mas estes reduziram à escravidão hóspedes que tinham sido benfeitores.
15
E isso não é tudo; haverá algo a mais que um castigo qualquer para aqueles que acolheram mal os estrangeiros:
16
mas estes, a princípio, receberam bem seus hóspedes, e concederam-lhes a participação em seus direitos. Em seguida, eles os encheram de males.
17
Do mesmo modo, foram feridos de cegueira, como aqueles homens, às portas do justo, quando, envolvidos por uma profunda escuridão, procuravam, cada um de seu lado, o caminho para suas casas.

Conclusão

18 Assim, os elementos mudavam suas propriedades entre si, como na harpa os sons mudam de ritmo, conservando a mesma tonalidade. É o que se pode verificar perfeitamente quando se consideram esses acontecimentos.
19
Os seres terrestres tornavam-se aquáticos, os que nadam passavam à terra,
20
o fogo era mais violento debaixo da chuva, e a água esquecia a propriedade que tem de extingui-lo.
21
Além disso, as chamas não ofendiam as carnes dos frágeis animais que as atravessavam, e não liqüefaziam esse alimento celeste, semelhante ao gelo e inteiramente capaz de se derreter.
22
É que em tudo, Senhor, engrandecestes e glorificastes vosso povo, e não vos dedignastes de assisti-lo em todo o tempo e em todo o lugar.

Sagesse (SAV) 13