Apostolicam actuositatem 13

O apostolado social

13 O apostolado no meio social, isto é, o empenho em informar de espírito cristão a mentalidade e os costumes, as leis e estruturas da comunidade em que se vive, são incumbência e encargo de tal modo próprios dos leigos que nunca poderão ser plenamente desempenhados por outros. Neste campo, podem os leigos exercer um apostolado de semelhante para com semelhante. Aí completam o testemunho da vida pelo testemunho da palavra (9). Nesse campo do trabalho, da profissão, do estudo, da residência, do tempo livre ou da associação, são eles os mais aptos para ajudar os seus irmãos.

Os leigos realizam esta missão da Igreja no mundo, antes de tudo, por aquela coerência da vida com a fé, pela qual se tornam luz do mundo; pela honestidade nos negócios, com a qual a todos atraem ao amor da verdade e do bem e, finalmente, a Cristo e à Igreja; pela caridade fraterna que, fazendo-os participar das condições de vida, dos trabalhos, dos sofrimentos e aspirações de seus irmãos, prepara insensivelmente todos os corações para a acção da graça salutar; por aquela plena consciência da participação que devem ter na construção da sociedade, a qual os leva a esforçarem-se por desempenhar com magnanimidade cristã a actividade doméstica, social e profissional. Assim, o seu modo de agir penetra pouco a pouco no meio de vida e de trabalho.

Este apostolado deve abranger todos aqueles que aí se encontram e não excluir nenhum bem espiritual ou temporal que possam fazer. Mas os verdadeiros apóstolos não se contentam só com esta acção e esforçam-se por anunciar Cristo ao próximo também por meio da palavra. E que muitos homens só por meio de seus companheiros leigos podem ouvir o Evangelho e conhecer Cristo.

9. Cfr. Pio XI, Enciclica Quadragesimo anno, 15 maio 1931: AAS 23 (1931), p. 225-226.


O apostolado na ordem nacional e internacional

14 Um imenso campo de apostolado se abre na ordem nacional e internacional, em que são sobretudo os leigos os administradores da sabedoria cristã. Os católicos sintam-se obrigados a promover o bem comum na dedicação à pátria e no fiel cumprimento dos deveres civis, e façam valer o peso da sua opinião de modo a que o poder civil se exerça com justiça e as leis correspondam aos preceitos morais e ao bem comum. Os católicos peritos nos negócios públicos e firmes, como devem ser, na fé e doutrina cristã, não recusem participar neles uma vez que, exercendo-os dignamente, podem atender ao bem comum e, ao mesmo tempo, abrir caminho ao . Evangelho.

Empenhem-se os católicos em cooperar. com todos os homens de boa vontade para promover tudo o que é verdadeiro, tudo o que é justo, tudo o que é santo, tudo o que é digno de ser amado (cfr.
Ph 4,8). Dialoguem com eles, indo ao seu encontro com prudência e bondade. E investiguem em conjunto o modo de organizar as instituições sociais e públicas segundo o espírito do Evangelho.

Entre os sinais do nosso tempo, é digno de especial menção aquele crescente e inelutável sentido de solidariedade entre todos os povos que o apostolado dos leigos tem por encargo promover activamente e converter em sincero e verdadeiro afecto fraternal. Além disso, devem os leigos ter consciência da realidade internacional e das questões e soluções, doutrinais ou práticas, que nela se originam, sobretudo quanto aos povos em desenvolvimento (10).

Lembrem-se todos aqueles que trabalham em nações estrangeiras ou lhes prestam auxílio, que as relações entre os povos devem ser um verdadeiro convívio fraterno em que ambas as partes simultânamente dão e recebem. Aqueles, porém, que viajam ou por causa de obras internacionais, ou por negócios ou por motivo de descanso, lembrem-se que são também, em toda a parte, pregoeiros itinerantes de Cristo e procedam como tais.

10. Cfr. João XXIII, Encíclica (Mater et Magistra, 15 maio 1961: AAS 53 (1961), p. MM 448-450.


CAPÍTULO IV

AS VÁRIAS FORMAS DO APOSTOLADO


Introdução: apostolado individual ou associado

15 Os leigos podem exercer a sua acção apostólica quer como indivíduos quer unidos em diversas comunidades e associações.


Necessidade e natureza do apostolado individual

16 O apostolado individual que deriva com abundância da fonte de uma vida verdadeiramente cristã (cfr. Jn 4,14), é origem e condição de todo o apostolado dos leigos, mesmo do associado, nem nada o pode substituir.

A este apostolado, sempre e em toda aparte proveitoso e em certas circunstâncias o único conveniente e possível, são chamados e, por isso, obrigados todos os leigos, de qualquer condição; ainda que não se lhes proporcione ocasião ou possibilidade de cooperar nas associações.

São muitas as formas de apostolado pelas quais os leigos edificam a Igreja, santificam o mundo e o vivificam em Cristo.

A forma peculiar do apostolado individual, e sinal muito acomodado também aos nossos tempos, porque manifesta Cristo vivo nos seus fiéis, é o testemunho de toda a vida laical que flui da fé, esperança e caridade. Porém, pelo apostolado da palavra, em certas circunstâncias absolutamente necessário, os leigos anunciam a Cristo, expõem a sua doutrina, difundem-na segundo a sua própria condição e capacidade, e professam-na com fidelidade.

Além disso, como cidadãos deste mundo, os leigos, ao cooperarem na construção e governo da ordem temporal, devem, na vida familiar, profissional, cultural e social, buscar, à luz da fé, normas de acção mais elevadas e manifestá-las aos outros oportunamente, conscientes de que assim se tornam cooperadores de Deus criador, redentor e santificador, e Lhe dão glória.

Finalmente, vivifiquem os leigos a sua vida com a caridade e mostrem-no por obras na medida do possível.

Lembrem-se todos que pelo culto público e pela oração, pela penitencia, pelos trabalhos e livre aceitação das agruras da vida; pelas quais se conformam a Cristo paciente (cfr. 2Co 4,10 Col 1,24), podem atingir todos os homens e contribuir para a salvação de todo o mundo.


O apostolado individual em circunstâncias especiais

17 Este apostolado individual é urgentemente necessário naquelas regiões em que a liberdade da Igreja é gravemente impedida. Nestas circunstâncias dificílimas, os leigos, suprindo, na medida do possível, o sacerdote, põem em risco a própria liberdade e, às vezes, a vida. Ensinam aos que os cercam a doutrina cristã, formam-nos na vida religiosa e na mentalidade católica, induzem-nos a frequência dos sacramentos e fomentam a piedade, sobretudo a eucarística (1). O sagrado Concílio dá graças dc fundo do coração a Deus que não deixa de suscitar, também em nossos dias, leigos de fortaleza heróica no meio das perseguições, e abraça-os com afecto paterno e ânimo agradecido.

O apostolado individual tem especial campo de acção nas regiões onde os católicos são poucos e dispersos. Os leigos, que exercem nelas só apostolado individual pelas causas acima mencionadas ou por razões especiais, mesmo nascidas da própria actividade profissional, reunam-se oportunamente para dialogar em grupos menores, sem forma estrita de instituição ou organização, de modo que sempre se manifeste aos outros o sinal da comunidade da Igreja como verdadeiro testemunho de amor. Deste modo, pela amizade e pela comunicação de experiências e com a , ajuda espiritual mútua, fortalecem-se para superar as dificuldades da vida e da acção demasiado isolada e produzir mais abundantes frutos de apostolado.

1. Cfr. Pio XII, aloc. ao I Congresso mundial do Apostolado dos leigos, 14, out. 1951: AAS 43 (1951), p. 788.


Importância das formas associadas

18 Os fiéis são chamados a exercer o apostolado individual nas diversas condições da sua vida. Lembrem-se, contudo, que o homem é, por natureza, social, e que aprouve ao Senhor unir um Povo de Deus (cfr. 1P 2,5-10) e num corpo (cfr. 1Co 12,12) os que crêem em Cristo. Portanto, o apostolado em associação responde com fidelidade à exigência humana e cristã dos fiéis e é, ao mesmo tempo, sinal da comunhão e da unidade da Igreja em Cristo que disse: «Onde estão dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles (Mt 18,20).

Os fiéis exerçam, por conseguinte, o seu apostolado trabalhando para um só fim (2). Sejam apóstolos assim nas suas comunidades familiares como nas paróquias e dioceses, as quais exprimem a índole comunitária do apostolado. Exerçam-no também nas associações livres que resolverem formar.

O apostolado em associação é de grande importância também porque, nas comunidades eclesiais e nos vários meios, o apostolado exige com frequência ser realizado mediante a acção comum. As associações criadas para a acção apostólica comum fortalecem os seus membros e formam-nos para o apostolado. Além disso, distribuem ordenadamente e orientam o seu trabalho apostólico, de modo que se podem esperar daí frutos muito mais abundantes do que se agisse cada um por sua conta.

Nas circunstâncias presentes, porém, é absolutamente necessário que se robusteça a forma associada e organizada do apostolado no campo de actividade dos leigos. É que só a estreita união das forças é capaz de conseguir plenamente os fins do apostolado de hoje e de defender com eficácia os seus bens (3). Neste ponto é particularmente importante que o apostolado atinja também a mentalidade comum e as condições sociais daqueles a quem se dirige. Doutro modo, não poderão, muitas vezes, resistir à pressão da opinião pública ou das instituições.

2. Cfr. Pio XII, aloc. ao I Congresso mundial do Apostolado dos leigos, 15 out. 1951: AAS 43 (1951), p. 787-788.
3. Cfr. Pio XII, Encíclica Le pèlerinage de Lourdes, 2 julho 1957: AAS 49 (1957), p. 615.


Multiplicidade de formas do apostolado associado

19 Há uma grande variedade de associações de apostolado (4). Umas propõem-se o fim apostólico geral da Igreja. Outras, de modo particular, fins de evangelização e santificação. Outras, ainda, têm como fim animar cristãmente a ordem temporal. Finalmente, algumas dão testemunho de Cristo, de modo especial, pelas obras de misericórdia e de caridade.

Entre estas associações são de considerar, antes de mais, aquelas que fomentam e promovem uma unidade mais íntima entre a vida prática dos membros e a sua fé. As associações não têm em si o seu fim, mas devem servir à missão que a Igreja tem de cumprir para com o mundo. A sua força apostólica depende da conformidade com os fins da Igreja e do testemunho cristão e espírito evangélico de cada um dos membros e de toda a associação.

O dever universal da missão da Igreja, dado o progresso das instituições e, ao mesmo tempo, o impulso do desenvolvimento da sociedade moderna, exige que as iniciativas apostólicas dos católicos aperfeiçoem cada vez mais as formas associadas no campo internacional. As Organizações Católicas Internacionais conseguirão melhor o seu fim se as associações que as formam e os seus membros a elas se unirem mais intimamente.

Respeitada a devida relação com a autoridade eclesiásticas (5), os leigos têm o direito de fundar associações (6), governá-las, e, uma vez fundadas, dar-lhes um nome. Deve-se, contudo, evitar a dispersão de forças que se verifica se se promovem, sem razão suficiente, novas associações e obras, ou se se mantêm, sem utilidade, associações ou métodos obsoletos. Nem sempre será oportuno que formas criadas numa nação sejam trasladadas, sem critério, para outras (7).

4. Cfr. Pio XII, aloc. ao Conselho da Federação internacional dos homens católicos, 8 dez. 1956: AAS 49 (1957), p. 26-27.
5. Cfr. Cap. V, n. 24.
6. Cfr. Sagrada Congregação do Concílio, resolução Corrienten., 13 nov. 1920: AAS 13 (1921), p. 139.
7. Cfr. João XXIII, Encíclica Princeps pastorum, 10 dez. 1959: AAS 51 (1959), p. 856.


A acção católica

20 Há não poucos decénios, em muitas nações, os leigos, cada vez mais consagrados ao apostolado, uniram-se em várias formas de acção e associação que, em união mais estreita com a Hierarquia, se dedicaram e dedicam a fins especificamente apostólicos. Entre estas e outras instituições semelhantes mais antigas, merecem especial menção as que, seguindo embora diferentes métodos de acção, tendo sido justamente recomendadas e fomentadas pelos Sumos Pontífices e por muitos Bispos, receberam deles o nome de Acção Católica e, com muita frequência, foram declaradas como cooperação dos leigos no apostolado hierárquico(8).

Quer tenham o nome de Acção Católica quer outro, estas formas de apostolado que exercem em nossos dias uma valiosa acção apostólica são constituídas pelo conjunto das seguintes características:

a) O fim imediato de tais organizações é o fim apostólico da Igreja, isto é, ordenam-se à evangelização e santificação dos homens e à formação cristã da sua consciência, de modo a poderem imbuir do espírito do evangelho as várias comunidades e os vários meios.

b) Os leigos, cooperando a seu modo com a Hierarquia, contribuem com a sua experiência e assumem a sua responsabilidade no governo destas organizações, no estudo das condições em que a acção pastoral da Igreja se deve exercer e na elaboração e execução dos planos a realizar.

c) Os leigos agem unidos como um corpo orgânico, para que se manifeste com maior evidência a comunidade da Igreja e o apostolado seja mais eficaz.

d) Os leigos, quer se ofereçam espontâneamente quer sejam convidados à acção e directa colaboração com o apostolado hierárquico, trabalham sob a superior orientação da mesma Hierarquia, a qual pode sancionar essa cooperação com um mandato explícito.

As organizações nas quais, a juízo da Hierarquia, se encontram estas características tomadas em conjunto, devem ser consideradas Acção Católica, ainda que, por exigências de lugar ou de povos, assumam formas e nomes diversos.

O sagrado Concílio recomenda insistentemente estas instituições que correspondem, certamente, às necessidades do apostolado da Igreja em muitas nações. E convida os sacerdotes e leigos que nelas trabalham a tornarem cada vez mais realidade as características acima mencionadas e a cooperarem sempre fraternalmente, na Igreja, com as outras formas de apostolado.

8. Cfr. Pio XI, carta Quae nobis, ao Cardeal Bertram, 13 nov. 1928: AAS 20 (1928), p. 385. Cfr. também Pio XII, aloc. à Acção Católica italiana, 4 set. 1940: AAS 32 (1940), p. 362.


Apreço das associações

21 Tenham-se na devida estima todas as associações de apostolado. Mas aquelas que a Hierarquia, segundo as necessidades do tempo e do lugar, louvar, recomendar ou mandar instituir como mais urgentes, devem ser tidas em alto apreço e ser promovidas pelos sacerdotes, religiosos e leigos, segundo a maneira que lhes é própria. Entre elas, porém, devem-se hoje contar sobretudo as associações ou agrupamentos internacionais de católicos.


Leigos que se entregam com título especial ao serviço da Igreja

22 São dignos de especial honra e recomendação na Igreja aqueles leigos, solteiros ou casados, que se dedicam, perpétua ou temporàriamente, com a sua competência profissional, ao serviço das instituições e suas actividades. É de grande alegria para a Igreja que cresça cada vez mais o número de leigos que prestam o seu serviço às associações e obras de apostolado dentro da própria nação, ou no campo internacional ou, sobretudo, nas comunidades católicas das missões e das Igrejas mais recentes.

Recebam os pastores da Igreja estes leigos de bom grado e com ânimo reconhecido e esforcem-se por que a sua condição corresponda, quanto possível, às exigências da justiça, da equidade e da caridade, principalmente no que respeita ao seu honesto sustento e das suas famílias e por que recebam a necessária formação e sintam consolação e estímulo espiritual.


CAPÍTULO V

A ORDEM A GUARDAR NO APOSTOLADO


Introdução: o apostolado hierárquico, necessário na Igreja

23 O apostolado dos leigos, quer ele seja exercido pelos fiéis individualmente quer em associação, deve-se integrar ordenadamente no apostolado de toda a Igreja. Mais ainda, a união com aqueles que o Espírito Santo pôs à frente da Igreja de Deus (cfr. Ac 20,28) constitui elemento essencial do apostolado cristão. E não é menos necessária a cooperação entre as diversas iniciativas apostólicas, que devem ser convenientemente dirigidas pela Hierarquia.

Com efeito, para promover o espírito de união, que fará brilhar em todo o apostolado da Igreja a caridade fraterna e levará à consecução dos fins comuns evitando as emulações tão perniciosas, requere-se a estima recíproca de todas as formas de apostolado na Igreja, e a sua apta coordenação no respeito pela índole própria de cada uma (1).

Isto é da máxima conveniência, quando uma determinada acção na Igreja requer a harmonia e cooperação apostólica de ambos os cleros, dos religiosos e dos leigos.

1. Cfr. Pio XI, Encíclica Quamvis nostrae, 30 abril 1936: AAS 28 (1936) p. 160-161.


Relações com a Hierarquia

24 Compete à Hierarquia fomentar o apostolado dos leigos, fornecer os princípios e os auxílios espirituais, ordenar para bem comum da Igreja o exercício do mesmo apostolado, e vigiar para que se conservem a doutrina e a ordem.

O apostolado dos leigos admite diversos modos de relação com a Hierarquia, segundo as suas várias formas e seus objectivos.

Assim, existem na Igreja muitas iniciativas apostólicas nascidas da livre escolha dos leigos e dirigidas com o seu prudente critério. Em determinadas circunstâncias, a missão da Igreja pode realizar-se melhor por meio de tais iniciativas, e daí o serem com frequência louvadas e recomendadas pela Hierarquia (2). No entanto, nenhuma iniciativa apostólica se pode chamar católica se não tiver a aprovação da legítima autoridade eclesiástica.

Certas formas de apostolado dos leigos são expressamente reconhecidas pela Hierarquia, de diversos modos.

Além disso, a autoridade eclesiástica, tendo em conta as exigências do bem comum da Igreja, pode escolher de entre as várias associações e iniciativas apostólicas com um fim directamente espiritual, algumas em particular, e promovê-las dum modo especial, assumindo sobre elas uma maior responsabilidade. Deste modo, a Hierarquia, ordenando o apostolado de diversas maneiras segundo as circunstâncias, vai unindo mais intimamente ao seu próprio múnus apostólico uma ou outra das suas formas, respeitando, porém, sempre a natureza e a distinção de ambas as partes, e sem com isso se tirar aos leigos a necessária liberdade de acção. Em vários documentos eclesiásticos se dá a este acto da Hierarquia o nome de mandato.

Finalmente, a Hierarquia confia aos leigos certas tarefas mais intimamente ligadas ao múnus pastoral, como exemplo, no ensino da doutrina cristã, nalguns actos litúrgicos e na cura de almas. Em virtude desta missão, os leigos ficam plenamente sujeitos à superior direcção eclesiástica, no respeitante ao desempenho desse encargo.

Quanto às obras e instituições da ordem temporal, pertence à Hierarquia eclesiástica ensinar e interpretar autênticamente os princípios morais que se devem aplicar nos assuntos temporais. Compete-lhe igualmente julgar, depois de bem considerar todas as coisas, e servindo-se do auxílio dos peritos, da conformidade de tais obras e instituições com os princípios morais e determinar o que for necessário para conservar e promover os bens de ordem sobrenatural.

2. Cfr. Sagrada Congregação do Concílio, resolução Corrienten., 13, nov. 1920: AAS 13 (1921) p. 137-140.


Ajuda que deve prestar o clero ao apostolado dos leigos

25 Tanto os Bispos como os párocos e demais sacerdotes de ambos os cleros, devem ter presente que o direito e dever de exercer o apostolado são comuns a todos os fiéis, clérigos e leigos, e que também estes últimos têm um papel a desempenhar na edificação da Igreja (3). Tratem, pois, fraternalmente com os leigos na Igreja e para a Igreja, e tenham deles cuidado especial nas suas obras apostólicas (4).

Para ajudar os leigos nas suas diversas formas de apostolado, escolham-se diligentemente sacerdotes idóneos e bem formados (5). Os que se consagram a este ministério, por missão recebida da Hierarquia, representam-na na sua acção pastoral. Fomentem, pois, as convenientes relações dos leigos com a mesma, permanecendo sempre fiéis ao espírito e doutrina da Igreja. Dediquem-se a fomentar a vida espiritual e o sentido apostólico das associações católicas que lhes foram confiadas. Assistam com prudente conselho as suas actividades apostólicas e favoreçam as suas iniciativas. Investiguem atentamente por meio do diálogo contínuo com os leigos quais as formas de tornar mais frutuosa a sua acção apostólica; e promovam o espírito de união dentro da mesma associação, e desta com as demais.

Finalmente, os religiosos e as religiosas tenham em apreço as obras apostólicas dos leigos; consagrem-se de boa vontade a promover as obras destes, segundo o espírito e normas dos próprios Institutos (6); e procurem apoiar, auxiliar, e completar as funções sacerdotais.

3. Cfr. Pio XII, Discurso ao II Congresso mundial do Apostolado dos leigos, 5 out. 1957: AAS 49 (1957) p. 927.
4. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium
LG 37: AAS 57 (1965), p. 42-43.
5. Cfr. Pio XII, Exortação apostólica Menti nostrae, 23 set. 1950: AAS 42 (1950), p. 660.
6. Cfr. Conc. Vat. II, decreto De accomodata renovatione vitae religiosae, n. PC 8.


Certos meios que servem para a mútua cooperação

26 Enquanto for possível, haja em todas as dioceses conselhos que ajudem a obra apostólica da Igreja, quer no campo da evangelização e santificação quer no campo caritativo, social e outros, onde os clérigos e os religiosos colaborem dum modo conveniente com os leigos. Tais órgãos poderão servir para coordenar as diversas associações de leigos e suas iniciativas apostólicas, respeitando a índole e autonomia própria de cada uma (7).

Se for possível, haja também organismos semelhantes no âmbito paroquial, interparoquial, interdiocesano, bem como no plano nacional ou internacional (8).

Além disso, crie-se junto da santa Sé algum Secretariado especial para ajudar e impulsionar o apostolado dos leigos, como centro que, por meios aptos, forneça informações sobre as várias iniciativas apostólicas dos leigos, se dedique a investigar os problemas actuais neste campo, e preste ajuda com o seu conselho à Hierarquia e aos leigos, nas suas obras de apostolado. Neste Secretariado deverão participar os diversos movimentos e iniciativas apostólicas de leigos existentes em todo o mundo, colaborando com os leigos também os clérigos e religiosos.

7. Cfr. Bento XIV, De Synodo dioecesano, 1. III, c. IX, n. VII-VIII: Opera omnia in tomos XVII distributa, tomo 11 (Prato, 1844), pg.76-77.
8. Cfr. Pio XI, Encíclica Quamvis nostra, 30 abril 1936: AAS 28 (1936), p. 160-161.


Cooperação com outros cristãos e não-cristãos

27 O comum património evangélico, e o dever comum do testemunho cristão que daí nasce, aconselham e com frequência exigem a colaboração dos católicos com os outros cristãos. Esta há-de exercer-se pelos indivíduos e pelas comunidades, em actuações singulares e em associações, tanto no plano nacional como no internacional (9).

Os valores humanos comuns pedem com frequência uma cooperação semelhante dos cristãos, que procuram fins apostólicos, com outros que, embora não professem a religião cristã, reconhecem, contudo, esses valores.

Por meio desta cooperação dinâmica e prudente (10), de grande importância nas actividades temporais, dão os leigos testemunho de Cristo, Salvador do mundo, e da unidade da família humana.

9. Cfr. João XXIII, Encíclica (Mater et Magistra 15 maio 1961: AAS 53 (1961), p.
MM 456-457; cfr. Concilio Vaticano II, Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio UR 12: AAS 57 (1965), p. 99-100.
10. Cfr. Concilio Vaticano II, Decreto de Oecumenismo, Unitatis Redintegratio UR 12: AAS 57 (1965), p. 100; cfr. também a Constituição dogm. De Ecclesia, Lumen gentium LG 15: AAS 57 (1965), p. 19-20.


CAPÍTULO VI

A FORMAÇÃO PARA O APOSTOLADO


Necessidade da formação para o apostolado

28 A plena eficácia do apostolado só se pode alcançar com uma formação multiforme e integral. Exigem-na tanto o contínuo progresso espiritual e doutrinal do próprio leigo, como as diversas circunstâncias de coisas, pessoas e encargos a que a sua actividade se deve acomodar. Esta formação deve-se apoiar sobre os fundamentos afirmados e expostos por este sagrado Concílio noutros lugares(1). Além da formação comum a todos os cristãos, não poucas formas de apostolado requerem uma formação peculiar e específica, por causa da diversidade de pessoas e circunstâncias.

1. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia, Lumen gentium, cap. II, IV, V
LG 9-17 LG 30-38 LG 39-42: AAS 57 (1965), p. 12-21; 37-49; cfr. também Decreto De Oecumenismo, Unitatis Redintegratio UR 4 UR 6 UR 7 UR 12: AAS 57 (1965), p. 94, 96, 97, 99, 100; cfr, também acima, n. AA 4.


Princípios da formação dos leigos para o apostolado

29 Uma vez que os leigos têm um modo próprio de participar na missão da Igreja, a sua formação apostólica recebe uma característica especial que lhe vem da mesma índole secular própria do laicado e da sua espiritualidade.

A preparação para o apostolado supõe uma formação humana completa e adaptada à maneira de ser e circunstâncias próprias de cada um. Com efeito, o leigo, conhecendo bem o mundo actual, deve ser um membro da sociedade em que vive e ao nível da sua cultura.

Primeiro que tudo, aprenda o leigo a realizar a missão de Cristo e da Igreja, vivendo da fé no mistério divino da criação e da redenção, guiado pelo Espírito Santo vivificador do Povo de Deus, que impele todos os homens a amar a Deus Pai, e n'Ele, o mundo e os homens. Esta formação deve ser considerada como fundamento e condição de todo e qualquer apostolado fecundo.

Além da formação espiritual, requere-se uma sólida preparação doutrinal, teológica, ética e filosófica, de harmonia com a idade, condição e capacidade. Nem se descure de modo nenhum a importância da cultura geral e da formação prática e técnica.

Para cultivar as boas relações humanas, é necessário promover os valores verdadeiramente humanos, a começar pela arte de conviver e cooperar fraternalmente, bem como a de estabelecer diálogo com os outros.

Visto que a formação para o apostolado não pode consistir ùnicamente na instrução teórica, devem ir aprendendo gradual e prudentemente, desde o começo da formação, a ver, julgar e agir todas as coisas à luz da fé, a formar-se e aperfeiçoar-se com os outros por meio da acção e a entrar assim ao serviço activo da Igreja (2). Esta formação, que deve aperfeiçoar-se continuamente por causa da crescente maturidade da pessoa humana e em razão da evolução dos problemas, exige um conhecimento cada vez mais profundo e uma acção adaptada. Ao realizar todas estas eigências da formação, devem ter-se sempre em conta a unidade e a integridade da pessoa humana, de tal modo que se ressalve e desenvolva a sua harmonia e equilíbrio.

Deste modo, o leigo insere-se profunda e activamente na própria ordem temporal, assumindo com eficiência a sua parte na solução dos seus problemas; ao mesmo tempo, como membro vivo e testemunha da Igreja, torna-a presente e activa no meio das coisas temporais (3).

2. Cfr. Pio XII, alocução à I Conferência internacional de escuteiros, 6 junho 1952: AAS 44 (1952), p. 579-580; João XXIII, Encíclica (Mater et Magistra 15 maio 1961; AAS 53 (1961), p.
MM 456.
3. Cfr. Concílio Vaticano II, Constituição dogmática De Ecclesia Lumen gentium LG 33: AAS 57 (1965), p. 39.


A quem pertence formar para o apostolado

30 A formação para o apostolado deve começar desde os princípios da educação infantil. Sejam, porém, iniciados no apostolado e imbuídos deste espírito particularmente os adolescentes e os jovens. Esta formação deve ser aperfeiçoada durante toda a vida, de acordo com as exigências dos encargos assumidos. E claro, portanto, que aqueles a quem compete educar cristãmente têm igualmente o dever de formar em ordem ao apostolado.

Pertence aos pais ir dispondo os filhos, desde a infância, para conhecerem o amor de Deus por todos os homens, e ir-lhes inculcando pouco a pouco, sobretudo com o exemplo, a preocupação pelas necessidades materiais e espirituais do próximo. Que toda a família se torne, pois, na. sua vida íntima, como que um estágio do apostolado.

Além disso, as crianças devem ser educadas de tal modo que, transcendendo os limites da família, se abram tanto às comunidades eclesiais como às civis. Sejam de tal modo integradas na comunidade local da paróquia que nela possam tomar consciência da sua qualidade de membros vivos e activos do Povo de Deus. Os sacerdotes, porém, na catequese e na pregação, na direcção espiritual, bem como em outras actividades pastorais, tenham em conta a formação em ordem ao apostolado.

Compete também às escolas, colégios e outras instituições católicas destinadas à formação, fomentar nos jovens o sentido católico e a acção apostólica. No caso de faltar esta formação, quer seja porque os jovens não frequentam essas escolas, quer por outra causa, então cuidem mais dela os pais, os pastores de almas e as associações apostólicas. Os professores, porém, e os educadores, que, por vocação e ofício, exercem uma superior forma de apostolado dos leigos, estejam impregnados da ciência necessária e das técnicas pedagógicas, para poder realizar eficazmente essa educação.

Do mesmo modo, os grupos e as associações de leigos, quer se dediquem ao apostolado, quer a outros fins sobrenaturais, devem fomentar com diligência e assiduidade a formação para o apostolado, segundo o próprio fim e modalidades (4). São elas, muitas vezes, o caminho ordinário duma preparação conveniente em ordem ao apostolado. Com efeito, nelas se realiza uma formação doutrinal, espiritual e prática. Os seus membros, constituindo pequenos grupos com os companheiros e amigos, consideram os métodos e os frutos da sua actividade apostólica, e confrontam com o Evangelho a sua vida quotidiana.

Deve-se orientar esta formação de modo a ter-se em conta todo o apostolado dos leigos, que deverá ser exercido não só entre os grupos das associações, mas também em todas as circunstâncias, através de toda a vida, sobretudo profissional e social. Mais ainda: cada um deve preparar-se activamente para o apostolado, o que se torna mais urgente na idade adulta. Com efeito, à medida que se avança na idade, revela-se mais cada um e assim pode descobrir melhor os talentos com que Deus enriqueceu a sua alma, e exercitar mais eficazmente os carismas que lhe foram dados pelo Espírito Santo para bem dos seus irmãos.

4. Cfr. João XXIII, Encíclica (Mater et Magistra 15 maio 1961; AAS 53 (1961), p.
MM 455.


Formação específica para o apostolado

31 As diversas formas de apostolado exigem também uma preparação particularmente adequada.

a) Quanto ao apostolado em ordem à evangelização e santificação dos homens, devem os leigos receber uma formação especial para estabelecerem o diálogo com os outros, quer crentes quer não crentes, e comunicarem a todos a mensagem de Cristo(5).

Como, porém, em nossos dias se vão espalhando largamente por toda a parte várias formas de materialismo, até mesmo entre os católicos, convém que os leigos não só aprendam com maior diligência a doutrina católica, especialmente aqueles pontos que são objecto de controvérsia, mas também dêem testemunho de vida evangélica contra qualquer forma de materialismo.

b) Quanto à edificação cristã da ordem temporal, sejam os leigos bem instruídos sobre o verdadeiro significado e valor dos bens temporais, quer em si mesmos considerados, quer no que diz respeito a todos os fins da pessoa humana. Exercitem-se no recto uso das coisas e na organização das instituições, atendendo sempre ao bem comum segundo os princípios da doutrina moral e social da Igreja. Aprendam os leigos, antes de mais, os princípios da doutrina social e as suas conclusões, de modo a tornarem-se aptos quer para prestarem o seu contributo ao progresso da doutrina quer para aplicá-los convenientemente aos casos particulares (6).

c) Visto que as obras de caridade e misericórdia dão um esplêndido testemunho de vida cristã, deve também a formação apostólica levar ao seu exercício, para que os fiéis aprendam, logo desde a infância, a compadecer-se dos pobres e necessitados e a ajudá-los com generosidade(7).

5. Cfr. Pio XII, Carta encícl. Sertum laetitiae, 1 nov. 1939: AAS 31 (1939), p. 635-644; cfr. Idem, alocução aos laureados da Acção Católica Italiana, 24 maio 1953.
6. Cfr. Pio XII, Discurso ao Congresso da Federação Mundial da JCF., 18 abril 1952: AAS 44 (1952), p. 414-419. Cfr. Idem, Discurso à Associação Cristã de Operários de Itália (A. C. L. L), 1 maio 1955: AAS 47,(1955), p. 403-404.
7. Cfr. Pio XII, alocução aos Delegados do Congresso das Associações de caridade, 27 abril 1952: AAS 44 (1952), p, 470-471,



Apostolicam actuositatem 13