2Samuel (CNB) 11

 Segunda campanha amonita. Davi e Betsabéia

11 1 No início do ano, na época em que os reis costumavam partir para a guerra, Davi enviou Joab com os seus oficiais e todo o Israel, e eles devastaram a terra dos amonitas e sitiaram Rabá. Entretanto, Davi ficou em Jerusalém.
2
Certo dia, ao entardecer, levantando-se de sua cama, Davi pôs-se a passear pelo terraço de sua casa e avistou dali uma mulher que se banhava. Era uma mulher muito bonita. 3 Davi procurou saber quem era essa mulher e disseram-lhe que era Betsabéia, filha de Eliam e mulher de Urias, o heteu. 4 Então Davi mandou que a trouxessem. Ela veio e ele deitou-se com ela, que tinha acabado de se purificar da menstruação. 5 E ela voltou para casa. 5Tendo ficado grávida, mandou dizer a Davi: “Estou grávida”.
6
Davi mandou esta ordem a Joab: “Manda-me Urias, o heteu”. E ele mandou Urias a Davi. 7 Quando Urias chegou, Davi pediu-lhe notícias de Joab, do exército e da guerra. 8 E depois disse-lhe: “Desce à tua casa, toma um bom banho e descansa” . Urias saiu do palácio do rei, que ainda mandou um presente régio atrás dele. 9 Mas Urias dormiu à porta do palácio com os outros servos do seu amo, e não foi para casa.
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Contaram então a Davi: “Urias não foi para sua casa”. Davi perguntou-lhe: “Não voltaste porventura de uma viagem? Por que não desceste à tua casa?” 11 Urias respondeu a Davi: “A arca, Israel e Judá habitam debaixo de tendas, e o meu senhor Joab e os oficiais do meu senhor dormem sobre a terra dura, e eu deveria ir para minha casa, comer e beber e dormir com minha mulher? Por tua vida, a vida de tua pessoa, \juro que não farei tal coisa!” 12 Davi disse então a Urias: “Fica aqui ainda hoje, e amanhã te mandarei de volta”. E Urias ficou em Jerusalém naquele dia e no dia seguinte. 13 Davi convidou-o para comer e beber à sua mesa e o embriagou. Mas, ao entardecer, ele retirou-se e para dormir numa esteira, em companhia dos oficiais do seu senhor, em vez de descer para a sua casa.
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Na manhã seguinte, Davi escreveu uma carta a Joab e mandou-a pelas mãos de Urias. 15 Nela dizia: “Colocai Urias na frente, onde o combate for mais violento, e abandonai-o para que seja ferido e morra”. 16 Joab, que sitiava a cidade, colocou Urias no lugar onde ele sabia estarem os guerreiros mais valentes. 17 Os que defendiam a cidade saíram para atacar Joab, e morreram alguns do exército, da guarda de Davi. E morreu também Urias, o heteu.
18
Joab mandou comunicar a Davi tudo sobre a batalha. 19 Instruiu ao mensageiro: “Quando tiveres acabado de contar ao rei tudo sobre a batalha, 20 vais ver que ficará nervoso e dirá: ‘Por que vos aproximastes da cidade para lutar? Ignoráveis que iriam atirar dardos do alto da muralha? 21 Quem matou Abimelec filho de Jerobaal? Não foi uma mulher que atirou sobre ele uma pedra de moinho de cima da muralha, matando-o em Tebes? Por que vos aproximastes da muralha?” Então dize: “Também o teu servo Urias, o heteu, morreu”.
22
O mensageiro saiu e foi contar a Davi tudo o que Joab lhe tinha instruído. 23 O mensageiro disse a Davi: “Os inimigos prevaleceram contra nós e saíram em nossa direção no campo. Mas nós reagimos e os perseguimos até as portas da cidade. 24 Os arqueiros dirigiram suas flechas contra teus servos de cima do muro. Morreram alguns dos oficiais do rei e o teu servo Urias, o heteu, morreu também”. 25 Davi respondeu ao mensageiro: “Diz a Joab: ‘Não te aflijas com isto. O sucesso na guerra varia, a espada devora ora aqui, ora ali. Reforça o ataque à cidade para destruí-la’. E tu, anima-o”.
26
Ao saber da morte de seu marido, a mulher de Urias o chorou. 27 Terminados os dias de luto, Davi mandou buscá-la e recolheu-a em sua casa. Tomou-a por esposa e ela deu-lhe um filho. Mas o que Davi tinha feito desagradou ao Senhor.

 O profeta Natã censura Davi

12 1 O Senhor mandou o profeta Natã a Davi. Chegando a ele disse-lhe: “Numa cidade havia dois homens, um rico e outro pobre. 2 O rico possuía ovelhas e bois em grande número. 3 O pobre só possuía uma ovelha pequenina, que tinha comprado e criado. Ela crescera em sua casa junto com seus filhos, comendo do seu pão, bebendo do mesmo copo, dormindo no seu regaço. Era para ele como uma filha. 4 Chegou um hóspede à casa do homem rico. Este não quis tomar uma das suas ovelhas ou um dos seus bois para preparar um banquete e dar de comer ao hóspede que chegara. Pegou a ovelhinha do pobre e preparou-a para o visitante”. 5 Davi ficou indignado contra esse homem e disse a Natã: “Pela vida do Senhor, o homem que fez isso merece a morte! 6 Pagará quatro vezes o valor da ovelha, por tal falta de consideração”.
7
Natã disse a Davi: “Esse homem és tu! Assim fala o Senhor, o Deus de Israel: Eu te ungi como rei de Israel e salvei-te das mãos de Saul. 8 Dei-te a casa do teu senhor e pus nos teus braços as mulheres do teu senhor. Entreguei-te a casa de Israel e de Judá. E, se isso te parecer pouco, vou acrescentar outros favores. 9 Por que desprezaste a palavra do Senhor, fazendo o que lhe desagrada? Feriste à espada Urias, o heteu, fazendo-o morrer pela espada dos amonitas, para fazer de sua mulher a tua esposa. 10 Por isso, a espada jamais se afastará de tua casa, porque me desprezaste e tomaste a mulher de Urias, o heteu, para fazer dela a tua esposa. 11 Assim diz o Senhor: Da tua própria casa farei surgir o mal contra ti. Tomarei as tuas mulheres sob os teus olhos e as darei a um outro, que se aproximará das tuas mulheres à luz deste sol. 12 Tu fizeste tudo às escondidas. Eu, porém, farei o que digo diante de todo o Israel, e o farei à luz do sol”.
13
Davi disse a Natã: “Pequei contra o Senhor”. Natã respondeu-lhe: “De sua parte, o Senhor perdoou o teu pecado: não precisas morrer! 14 Entretanto, por teres assim causado desprezo da parte dos inimigos do Senhor, o filho que te nasceu vai morrer”. 15 E Natã voltou para a sua casa.

 Luto de Davi por seu filho

O Senhor feriu o filho que a mulher de Urias tinha dado a Davi, e ele adoeceu gravemente. 16 Davi implorou a Deus pelo menino e fez um grande jejum. Voltando para casa, passou a noite deitado no chão. 17 Os anciãos do palácio insistiam com ele para que se levantasse do chão; mas ele não o quis fazer, nem tomar com eles alimento algum. 18 Ora, no sétimo dia, a criança morreu. Os servos de Davi tinham medo de anunciar-lhe a morte do menino. Disseram-lhe: “Quando a criança ainda vivia e nós queríamos falar com ele, nem nos ouvia. Como diremos agora que o menino está morto? Ele fará ainda pior!” 19 Mas Davi percebeu os comentários de seus servos e entendeu que o menino estava morto. Disse-lhes: “O menino está morto?” Eles responderam: “Sim, está morto”.
20
Davi então levantou-se do chão, lavou-se e se ungiu. Mudou de traje, entrou na casa do Senhor e prostrou-se. Depois voltou para sua casa e pediu que lhe servissem pão e comeu. 21 Disseram-lhe os seus servos: “Que estás fazendo? Enquanto a criança ainda vivia, jejuaste e choraste por ela. Agora que está morta, te levantaste e comeste pão”. 22 Davi respondeu: “Enquanto a criança ainda vivia jejuei e chorei, pois pensava: Quem sabe se talvez meu Senhor tenha piedade de mim e a criança viva? 23 Agora, porém, que está morta, por que jejuaria? Poderei fazê-la voltar? Antes irei eu até ela do que ela volte para mim”.
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Depois Davi consolou sua mulher Betsabéia e deitou-se com ela. Ela concebeu um filho, que recebeu o nome de Salomão. E o Senhor mostrou amor por ele 25 e enviou o profeta Natã para dar-lhe o nome de Jedidias, “amável ao Senhor” .

 Conquista de Rabá

26 Entretanto Joab lutou contra Rabá de Amon e tomou a cidadela do rei. 27 Joab enviou mensageiros a Davi, dizendo: “Ataquei Rabá e tomei a cidade das águas. 28 Agora mobiliza o resto do exército, sitia a cidade e toma-a, para que não seja tomada por mim e atribuída a meu nome”. 29 Davi mobilizou todo o exército e marchou contra Rabá. Lutou contra a cidade e tomou-a. 30 Tomou o diadema da cabeça de Melcom, de trinta e cinco quilos de ouro e ornado de uma gema preciosíssima. O diadema foi posto sobre a cabeça de Davi. Levou da cidade muitos despojos. 31 Retirou seus habitantes e condenou-os a serrar pedras nas pedreiras e a manejar o machado e a picareta de ferro. Também os pôs a fabricar tijolos. Assim fez a todas as cidades dos amonitas. E Davi e todo o exército voltaram a Jerusalém.

 Amnon e Tamar

13 1 Certo tempo depois, aconteceu o seguinte. Absalão filho de Davi tinha uma irmã, que era muito bonita e se chamava Tamar. Amnon, outro filho de Davi, enamorou-se dela. 2 Amnon se agoniava e ficava doente de paixão por Tamar, sua meia-irmã. Mas ela era virgem, e por isso parecia-lhe difícil conseguir algo com ela. 3 Amnon tinha um amigo, que era muito esperto, de nome Jonadab, filho de Sama, irmão de Davi. 4 Este lhe disse: “Por que, filho do rei, vais emagrecendo dia após dia? Por que não me dizes o que há?” Disse-lhe Amnon: “Eu amo Tamar, irmã de Absalão, meu irmão”. 5 Respondeu-lhe Jonadab: “Deita-te na tua cama e finge estar doente. Quando teu pai vier visitar-te, dize-lhe: ‘Peço que Tamar, minha irmã, venha dar-me comida, que ela prepare o prato na minha presença, para que eu a veja e coma de sua mão’”. 6 Amnon então deitou-se e fingiu estar doente. Quando o rei veio para visitá-lo, disse Amnon ao rei: “Peço que Tamar, minha irmã, venha e prepare na minha presença dois pastéis, para que eu receba o alimento de suas mãos”.
7
Davi mandou chamar Tamar em casa, dizendo: “Vem à casa de Amnon, teu irmão, e prepara-lhe um prato”. 8 Tamar foi à casa de Amnon, seu irmão, que estava deitado. Tomou farinha, misturou-a e preparou pastéis na frente dele, e os fez cozinhar. 9 Depois tomou a frigideira e colocou diante dele o que havia cozido, mas ele não quis comer. Amnon disse: “Saiam todos daqui!” Depois que todos saíram, 10 Amnon disse a Tamar: “Traze o prato até à alcova, para que eu coma de tua mão”. Tamar tomou os pastéis que fizera e levou-os a Amnon na alcova. 11 Mas quando ela lhe trouxe o alimento, agarrou-a e disse: “Vem! Deita-te comigo, minha irmã”. 12 Ela respondeu: “Não, meu irmão, não me violentes. Isto não se faz em Israel. Não cometas tal infâmia. 13 Aonde poderei ir na minha vergonha? E tu serás um insensato em Israel. Antes, fala ao rei, ele não me negará a ti”. 14 Mas ele não quis ouvir seus pedidos. Dominou-a com violência e deitou-se com ela. 15 E logo Amnon começou a odiá-la com ódio maior do que o amor com que antes a amara. Disse-lhe: “Levanta-te, vai embora!” 16 Ela lhe respondeu: “Não, meu irmão, pois maior é o mal que fazes contra mim, mandando-me embora, do que o que me fizeste antes”. Mas ele não lhe deu ouvidos. 17 Chamou um criado que o servia e disse-lhe: “Leva-a para fora daqui e fecha a porta às suas costas”. 18 Ela estava vestida com uma túnica comprida, o traje que costumavam usar as donzelas filhas do rei. O criado a pôs para fora e fechou a porta às suas costas.
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Ela derramou cinza sobre sua cabeça, rasgou a túnica, pôs as mãos sobre a cabeça e saiu dando gritos. 20 Disse-lhe Absalão, seu irmão: “Teu meio-irmão Amnon esteve contigo? Cala-te agora, minha irmã. Ele é teu irmão. Que teu coração não se aflija por isto”. Ficou, pois, Tamar desolada na casa de Absalão, seu irmão.
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Quando o rei Davi ouviu tudo isso, ficou muito irado, mas não quis magoar Amnon, seu filho, pois o amava por ser o primogênito. 22 Absalão não disse nada a Amnon, nem de mau nem de bom, mas ele odiava Amnon por ter violado Tamar, sua irmã.

 Absalão manda matar Amnon

23 Passados dois anos, estavam tosquiando as ovelhas de Absalão em Baalasor, perto de Efraim. Absalão chamara a todos os filhos do rei. 24 Ele foi até o rei e disse-lhe: “Estão tosquiando as ovelhas do teu servo. Que o rei e seu pessoal venham à casa de seu servo”. 25 Disse o rei a Absalão: “Não, meu filho, não me peças isto, pois indo todos, seremos pesados para ti”. Ele insistiu, mas Davi não quis ir e deu a Absalão uma bênção de despedida. 26 Disse Absalão: “Se tu não queres vir, peço-te que ao menos venha conosco meu irmão Amnon”. Disse-lhe o rei: “Por que iria contigo?” 27 Mas Absalão insistiu com ele, e ele enviou Amnon e todos os filhos do rei com ele.
Absalão preparou um banquete quase como um banquete real. 28
Ordenou aos seus criados: “Quando Amnon estiver embriagado de vinho, e eu vos disser: ‘Feri Amnon e matai-o!’, não temais, pois sou eu que estou ordenando. Coragem! Mostrai-vos valentes”. 29 Os criados agiram contra Amnon como lhes havia ordenado Absalão. Todos os filhos do rei levantaram-se, cada um montou em sua mula, e fugiram.
30
Enquanto estavam a caminho, chegou aos ouvidos de Davi a notícia: “Absalão matou todos os filhos do rei, não restando nenhum sequer”. 31 O rei então ergueu-se, rasgou suas vestes e prostrou-se por terra, e todos os oficiais da corte rasgaram suas vestes. 32 Jonadab filho de Sama, irmão de Davi, disse: “Não pense meu senhor que todos os filhos do rei foram mortos. Apenas Amnon foi morto, pois assim decidira Absalão no dia em que ele violentara Tamar, sua irmã. 33 Não fique, pois, o Senhor meu rei com esta idéia em seu coração: ‘Todos os jovens filhos do rei foram mortos’, pois apenas Amnon foi morto”. 34 Entretanto, Absalão fugiu.
O jovem que estava de sentinela, levantando seus olhos, viu uma grande multidão de gente que vinha pelo caminho de Horonaim, descendo do lado do monte. A sentinela veio avisar ao rei, dizendo-lhe: “Vejo homens no caminho de Horonaim”. 35
Jonadab disse ao rei: “Aí vêm os filhos do rei. Aconteceu como disse o teu servo”. 36 Quando acabou de falar, apareceram os filhos do rei, e entrando, gritaram e choraram. Também o rei e todos os seus oficiais choraram muito alto.
37
Absalão fugiu para junto de Tolmai filho de Amiud, rei de Gessur. Davi chorava por seu filho todos os dias. 38 Absalão ficou refugiado em Gessur por três anos. 39 Então o espírito do rei deixou de estar contra Absalão, porque já se tinha consolado da morte de Amnon.

 Joab reconduz Absalão. A mulher de Técua

14 1 Quando percebeu que o coração do rei se inclinava para Absalão, Joab filho de Sárvia 2 mandou buscar em Técua uma mulher conhecida por sua sabedoria. Joab disse-lhe: “Finge estar de luto. Usa um vestido de luto, não te perfumes. Tens de parecer uma mulher que chora um morto há muito tempo. 3 Deves ir ao rei e falar-lhe da seguinte maneira”. E explicou-lhe o que falar.
4
A mulher de Técua foi ao rei, prostrou-se com o rosto por terra e disse: “Salva-me, ó rei!” 5 O rei perguntou: “O que tens?” Ela respondeu: “Ai de mim, pobre viúva. Meu marido está morto. 6 Tua serva tinha dois filhos, os quais tiveram uma briga no campo, e não havia ninguém que os pudesse apartar. Um feriu o outro e o matou. 7 Então toda a família levantou-se contra tua serva, dizendo: ‘Entrega-o a nós, pois matou seu irmão. Nós vamos matá-lo por causa da vida de seu irmão, a quem matou. Vamos acabar com o herdeiro!’ Assim pretendiam extinguir a única faísca que ainda me resta. Não que­riam que se conserve o nome de meu marido, nem resto algum sobre a terra”. 8 O rei disse à mulher: “Volta para a tua casa, que eu tratarei do teu caso”. 9 Disse a mulher de Técua ao rei: “Recaia a iniqüidade sobre mim, senhor meu rei, e sobre a casa de meu pai. Mas o rei e seu trono sejam inocentes”. 10 O rei disse: “Se alguém te contradisser, traze-o a mim, e não mais te importunará”. 11 Ela disse: “Recorde-se o rei do Senhor seu Deus, para que o vingador do sangue não aumente a desgraça e de modo algum matem o meu filho”. Disse ele: “Pela vida do Senhor, \eu juro, nenhum cabelo da cabeça de teu filho cairá sobre a terra”.
12
Disse então a mulher: “Que tua serva possa dizer ainda uma palavra ao senhor meu rei”. Ele disse: “Fala!” 13 A mulher disse: “Por que pensaste uma coisa semelhante contra o povo de Deus? Pelas palavras que disseste, parece um crime que o rei não queira receber de volta o seu desterrado. 14 Todos temos de morrer, somos como a água que corre sobre a terra e não se pode mais recolher. Mas Deus não quer que nenhuma vida pereça, pelo contrário, concebe meios para que não se extravie dele quem foi banido. 15 Agora, pois, vim dizer estas palavras ao meu senhor o rei, porque o povo me fez temer. Tua serva disse a si mesma: ‘Vou falar ao rei, e talvez ele faça segundo o meu pedido’. 16 E de fato, o rei ouviu e livrou sua serva da mão daquele que queria apagar da herança de Deus a mim e a meu filho. 17 Disse, pois, a tua serva: ‘A palavra do senhor meu rei me deixará sossegada. Assim como um anjo de Deus é o senhor meu rei, pois ouve o bem e o mal. Que o Senhor teu Deus esteja contigo!”
18
O rei respondeu à mulher: “Não me escondas o que te vou perguntar”. Disse a mulher: “Fala, senhor meu rei”. 19 E disse o rei: “Não está a mão de Joab contigo em tudo isto?” A mulher respondeu: “Pela salvação da tua alma, senhor meu rei, é impossível escapar, nem pela direita nem pela esquerda, de tudo o que disse o senhor meu rei. Foi teu servo Joab que me instruiu e pôs todas essas palavras na boca da tua serva. 20 Teu servo Joab me fez apresentar o assunto disfarçadamente. Mas tu és sábio, meu senhor, como um anjo tem a sabedoria de Deus, para entenderes tudo o que acontece sobre a terra”.
21
O rei disse então a Joab: “Eu executo este pedido. Vai e chama o jovem Absalão”. 22 Joab prostrou-se por terra em veneração e bendisse o rei. E dizia: “Hoje teu servo entendeu que encontrou graça aos teus olhos, senhor meu rei. Fizeste segundo as palavras de teu servo”. 23 Joab ergueu-se, foi a Gessur e trouxe Absalão para Jerusalém. 24 Disse o rei: “Que ele volte para a sua casa sem se apresentar a mim”. Absalão então voltou à sua casa, sem se apresentar ao rei.

 Absalão obtém perdão

25 Não havia em todo o Israel homem formoso como Absalão. Era muito elogiado. Da planta dos pés ao alto da cabeça não havia nele nenhum defeito. 26 Uma vez ao ano cortava o cabelo, quando ficava muito pesado, e então os cabelos cortados pesavam uns dois quilos. 27 Nasceram a Absalão três filhos e uma filha, de nome Tamar, de aspecto lindíssimo.
28
Absalão permaneceu em Jerusalém por dois anos, sem poder apresentar-se ao rei. 29 Mandou pedir a Joab que viesse para levá-lo ao rei, mas Joab não quis vir a ele. Mandou chamá-lo uma segunda vez, mas como ele não quis vir, 30 disse aos seus servos: “Ao lado do meu campo está o campo de Joab, coberto de cevada. Ide e ateai fogo nele”. Os servos de Absalão foram e atearam-lhe fogo. Os servos de Joab, chegando, rasgaram sua vestes e disseram: “Os servos de Absalão atearam fogo ao campo!” 31 Joab se pôs a caminho, foi à casa de Absalão e disse: “Por que teus servos atearam fogo a meu campo?” 32 Absalão respondeu: “Mandei pedir-te que viesses a mim para enviar-te ao rei e perguntar: ‘Por que voltei de Gessur? Melhor seria para mim estar ainda lá’. Peço para poder apresentar-me ao rei. Se sou culpado de crime, que me mate”. 33 Joab foi ao rei e contou-lhe tudo. Absalão foi chamado ao rei e prostrou-se por terra diante dele, e o rei beijou Absalão.

 Revolta de Absalão

15 1 Depois disso, Absalão adquiriu para si um carro de guerra, cavalos e uma escolta de cinqüenta homens. 2 Levantando-se pela manhã, Absalão punha-se junto ao caminho da porta e chamava todo homem que tinha algum negócio para o tribunal do rei, dizendo-lhe: “Tu és de que cidade?” Quando o homem então respondia: “Eu, teu servo, sou de tal tribo de Israel”, 3 Absalão observava: “Olha, tuas palavras são boas e justas, mas não há ninguém constituído pelo rei para ouvir-te”. E continuava: 4 “Ah! Se eu fosse juiz nesta terra, todos os que têm assuntos para serem julgados viriam a mim, e eu lhes faria justiça!” 5 E quando alguém se aproximava para prostrar-se diante dele, estendia-lhe a mão, abraçava-o e beijava-o. 6 Assim fazia com todos os israelitas que vinham ao tribunal para ser ouvido pelo rei e seduzia o coração dos israelitas.
7
Após quatro anos, Absalão disse ao rei: “Peço que me deixes ir a Hebron cumprir os votos que fiz ao Senhor. 8 Teu servo fez votos quando estava em Gessur de Aram, dizendo: ‘Se o Senhor me fizer voltar a Jerusalém, oferecerei um sacrifício ao Senhor’”. 9 Disse-lhe o rei: “Vai em paz”. E ele se pôs a caminho e foi a Hebron.
10
Absalão enviou emissários a todas as tribos de Israel, dizendo: “Assim que ouvirdes o som da trombeta, dizei: ‘Absalão é rei em Hebron’”. 11 Duzentos homens de Jerusalém acompanharam Absalão de boa fé, porque os convidara, sem que soubessem de seus planos. 12 Absalão mandou chamar, na cidade de Gilo, a Aquitofel, o gilonita, conselheiro de Davi, e com ele ofereceu os sacrifícios. Assim consolidou-se a conjuração e crescia o número dos que estavam com Absalão.

 Fuga de Davi

13 Um mensageiro veio dizer a Davi: “As simpatias de todo o Israel estão com Absalão”. 14 Davi disse aos servos que estavam com ele em Jerusalém: “Fujamos depressa, porque, de outro modo, não conseguiremos escapar de Absalão! Apressai-vos em partir, para que não aconteça que, ao chegar, nos apanhe, traga sobre nós a ruína e passe a cidade ao fio da espada”.
15
Os servos do rei disseram-lhe: “Qualquer que seja a decisão que o senhor nosso rei tomar, eis que teus servos estão contigo”. 16 Assim saiu o rei e toda sua casa atrás dele. O rei deixou dez concubinas para cuidarem da casa. 17 O rei saiu, e o povo todo atrás dele. Na última casa fizeram uma parada. 18 Iam junto dele todos os seus servos; e todos os cereteus e feleteus, como também todos os gateus (os seiscentos homens que o tinham seguido desde Gat), iam adiante do rei.
19
Disse o rei a Etai, o gateu: “Por que vens conosco? Volta e fica com o rei, pois és estrangeiro e exilado da tua terra. 20 Ontem chegaste, e hoje eu já te obrigaria a vagar conosco? Eu vou \sem saber para onde vou. Volta e leva contigo teus irmãos, e que o Senhor tenha para contigo misericórdia e fidelidade”. 21 Etai respondeu ao rei: “\Juro pela vida do Senhor e pela do senhor meu rei, aonde quer que vá o senhor meu rei, seja para a morte, seja para a vida, aí estará o teu servo”. 22 Disse Davi a Etai: “Vem e passa!” E Etai, o gateu, passou com todos os seus homens e com todas as crianças que estavam com ele. 23 E todos choravam em alta voz, enquanto todo o povo passava. O rei atravessou a torrente do Cedron, e todo o povo tomou o caminho do deserto.
24
Veio também Sadoc e com ele todos os levitas, carregando a arca da aliança de Deus. Depuseram a arca de Deus, e Abiatar ofereceu sacrifícios, até que o povo terminasse de sair da cidade. 25 Disse então o rei a Sadoc: “Reconduze a arca de Deus à cidade. Se eu achar graça aos olhos do Senhor, ele me reconduzirá e me deixará ver de novo a sua arca e o lugar da sua habitação. 26 Se, porém, me disser: ‘Tu não me agradas’, então ponho-me em suas mãos. Que me faça o que parecer bem a seus olhos”. 27 O rei disse ainda ao sacerdote Sadoc: “Estás vendo? Voltai em paz para a cidade, tu com teu filho Aquimaas, e Abiatar com seu filho Jônatas. Vossos filhos fiquem convosco. 28 Vede, eu vou esconder-me no deserto, à espera de que me mandeis notícias”. 29 Sadoc e Abiatar reconduziram a arca de Deus para Jerusalém e lá ficaram.

 Conspiração de Aquitofel. Cusai, agente duplo

30 Davi caminhava chorando, enquanto subia o monte das Oliveiras, com a cabeça coberta e os pés descalços. E todo o povo que o acompanhava subia também chorando, com a cabeça coberta. 31 Avisaram a Davi que também Aquitofel estava na conjuração com Absalão. Disse Davi: “Peço-te, Senhor, faze os conselhos de Aquitofel virar loucura!”
32
Chegando Davi ao cume do monte, lá onde se adora Deus, veio a seu encontro Cusai, o araquita, com as vestes rasgadas e a cabeça cheia de terra. 33 Disse-lhe Davi: “Se vieres comigo, ficará mais difícil para mim. 34 Mas se voltas à cidade e dizes a Absalão: ‘Serei teu servo, ó rei! Antes fui servo de teu pai, mas agora sou teu servo’, então poderás confundir os conselhos de Aquitofel. 35 Tens contigo os sacerdotes Sadoc e Abiatar. Toda palavra que ouvires da casa do rei, comunica aos sacerdotes Sadoc e Abiatar. 36 Estão com eles os dois filhos, Aquimaas de Sadoc e Jônatas de Abiatar. Através deles comuni­cai-me tudo o que ouvirdes. 37 E quando Cusai, o amigo de Davi, entrou na cidade, também Absalão estava entrando em Jerusalém.

 Davi e Siba

16 1 Tendo Davi passado um pouco adiante do cume, apareceu Siba, o servo de Meribaal, vindo em sua direção com dois asnos carregados com duzentos pães e cem cachos de uvas passas, cem pencas de frutas da estação e um odre de vinho. 2 Disse o rei a Siba: “Que queres fazer com isso?” Respondeu Siba: “Os asnos servirão de montaria aos empregados do rei, os pães e as frutas da estação são para os teus servos, o vinho é para que o beba quem se achar fraco no deserto”. 3 Disse o rei: “Onde está o filho de teu senhor?” Siba respondeu ao rei: “Ficou em Jerusalém, dizendo: ‘Hoje a casa de Israel vai restituir-me o reino de meu pai’”. 4 Disse o rei a Siba: “Tudo o que foi de Meribaal é teu”. Disse Siba: “Prostro-me diante de ti. Que eu encontre graça diante­ de ti, meu rei”.

 Semei amaldiçoa Davi

5 Quando o rei chegou a Baurim, saiu de lá um homem da parentela de Saul, chamado Semei filho de Gera. Ele se aproximava proferindo maldições 6 e, a despeito de toda a tropa e os guerreiros de elite agrupados à direita e à esquerda do rei Davi, atirava pedras contra Davi e contra todos os servos do rei. 7 Andava gritando suas maldições: “Vai-te embora! Vai-te embora, assassino, vadio! 8 O Senhor fez cair sobre ti todo o sangue da casa de Saul, cujo trono usurpaste, e entregou o trono a teu filho Absalão. És vítima da tua própria maldade, pois és um assassino”. 9 Então Abisai filho de Sárvia disse ao rei: “Por que esse cão morto continuaria amaldiçoando o senhor meu rei? Deixa-me passar para lhe cortar a cabeça”. 10 Mas o rei respondeu: “Não te intrometas, filho de Sárvia! Se ele amaldiçoa porque o Senhor o mandou maldizer a Davi, quem poderia dizer-lhe: ‘Por que fazes isso?’” 11 E Davi disse a Abisai e a todos os seus servos: “Vede: se meu filho, que saiu das minhas entranhas, atenta contra a minha vida, com mais razão esse filho de Benjamim. Deixai-o amaldiçoar, conforme o Senhor lhe disse. 12 Talvez o Senhor leve em conta a minha miséria, restituindo-me a ventura em lugar da maldição de hoje”. 13 E Davi e seus homens seguiram adiante, enquanto Semei caminhava no flanco do monte e o acompanhava, proferindo maldições, atirando-lhe pedras e espalhando poeira no ar. 14 O rei e todo o povo que estava com ele chegaram enfim, exaustos, às águas, onde se refizeram.

 Cusai, Aquitofel e Absalão

15 Absalão e todo o seu exército de israelitas entraram em Jerusalém, e Aquitofel com ele. 16 Cusai, o araquita, amigo de Davi, foi a Absalão e disse-lhe: “Viva o rei! Viva o rei!” 17 Disse-lhe Absalão: “É tal a tua gratidão para com teu amigo? Por que não foste com o teu amigo?” 18 “De modo algum”, respondeu Cusai a Absalão. “Eu estarei com aquele que o Senhor e este povo e todo o Israel escolheram, e com ele ficarei. 19 Além disso, a quem devo servir? Não é ao filho do rei? Como servi a teu pai, assim te servirei”.
20
Disse Absalão a Aquitofel: “Deliberai sobre o que devemos fazer”. 21 Aquitofel disse a Absalão: “Aproxima-te das concubinas de teu pai, que ele deixou para cuidarem da casa. Assim, sabendo todo o Israel que te tornaste odioso a teu pai, os que estão contigo sentirão mais firmeza”. 22 Armaram uma tenda para Absalão no terraço. E ele aproximou-se das concubinas de seu pai diante de todo o Israel. 23 Os conselhos que Aquitofel dava naqueles dias eram como se fossem oráculos pedidos a Deus. Assim eram todos os conselhos de Aquitofel, quer quando estava com Davi, quer quando estava com Absalão.

17 1 Disse Aquitofel a Absalão: “Vou escolher doze mil homens para mim e esta noite sairei para perseguir Davi. 2 Cansado e com as mãos trêmulas como está, vou cair sobre ele e aterrorizá-lo, e todo o povo que está com ele vai fugir. Então matarei o rei abandonado. 3 Reconduzirei todo o povo a ti como uma esposa que retorna ao seu marido. Tu mandas tirar a vida de apenas um homem, e todo o povo estará em paz”. 4 A idéia agradou a Absalão e a todos os anciãos de Israel.
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Disse então Absalão: “Chamai também Cusai, o araquita, para que ouçamos o que ele diz”. 6 Chegando Cusai, Absalão lhe disse: “Aquitofel falou desta maneira. Devemos fazer o que ele diz, ou não? Fala!” 7 Cusai ponderou a Absalão: “Não é bom o conselho que Aquitofel deu esta vez”. 8 E acrescentou: “Tu conheces teu pai e os homens que estão com ele. São de grande valentia e têm o coração amargurado, como uma ursa no bosque à qual tiraram os filhotes. Além disso, teu pai é guerreiro e não vai deixar sua tropa descansar de noite. 9 Deve estar agora escondido em alguma caverna ou em algum outro lugar. Se ao primeiro choque perecer um dos teus, isso se tornará conhecido e dirão: ‘Foi derrotada a gente que seguia Absalão’. 10 E mesmo aquele que tem o coração forte como o do leão, desfalecerá de medo. Todo o povo de Israel sabe que teu pai é corajoso e que os homens que estão com ele são valentes. 11 Eis o conselho que a mim parece certo: reúne ao teu redor todo o Israel, desde Dã até Bersabéia, inumerável como a areia do mar, e tu mesmo marcharás para a batalha. 12 Poderemos abater-nos sobre ele onde quer que se encontre; cairemos sobre ele como o orvalho cai sobre a terra, e não restará nem um sequer de sua tropa e dos que estão com ele. 13 E se ele se retirar em alguma cidade, levaremos cordas àquela cidade e a traremos até a torrente, para que dela não reste uma pedrinha sequer”. 14 Absalão e todos os homens de Israel disseram: “O conselho de Cusai, o araquita, é melhor que o de Aquitofel”. Pois o Senhor tinha determinado que o conselho útil de Aquitofel fosse abandonado, para trazer desgraça sobre Absalão.

 Ajuda de Sadoc e Abiatar

15 Cusai disse aos sacerdotes Sadoc e a Abiatar: “Aquitofel deu determinado conselho a Absalão e aos anciãos de Israel, mas eu aconselhei bem outra coisa. 16 Mandai imediatamente alguém dizer a Davi: ‘Não fiques esta noite nos vaus que dão acesso ao deserto, mas passa para o outro lado, para que não sejam tragados o rei e todos que estão com ele’”. 17 Jônatas e Aquimaas se encontravam perto da fonte do Pisoeiro. Uma criada foi dar-lhes a notícia, e eles partiram para comunicar a mensagem ao rei Davi. Não podiam entrar na cidade, para não serem vistos. 18 Um jovem, porém, os viu e avisou Absalão. Mas eles apertaram o passo e entraram na casa de certo homem em Baurim, que tinha uma cisterna na entrada de sua casa, e nela se esconderam. 19 A mulher pegou um pedaço de pano, estendeu-o sobre a boca do poço, espalhou cevada pilada por cima e assim os escondeu. 20 Quando os servos de Absalão chegaram, disseram à mulher que estava na casa: “Onde estão Aquimaas e Jônatas?” A mulher respondeu: “Passaram por aqui em direção às águas”. E os que os procuravam, não os tendo encontrado, voltaram a Jerusalém.
21
Depois que os investigadores foram embora, os dois saíram do poço e, seguindo caminho, levaram a mensagem ao rei Davi; disseram-lhe: “Ponde-vos a caminho e atravessai depressa o rio Jordão, porque Aquitofel armou tal plano contra vós”. 22 Davi e todo o povo que estava com ele se puseram a caminho e atravessaram o Jordão antes do amanhecer. Não ficou um sequer que não atravessasse o rio.
23
Aquitofel, vendo que seu conselho não era seguido, aparelhou seu asno, pôs-se a caminho e foi para sua casa, em sua cidade, pôs ordem em seus negócios, enforcou-se e morreu. Foi sepultado no túmulo de seu pai.

 Davi em Maanaim

24 Depois que Davi chegou a Maanaim, Absalão atravessou o rio Jordão, e todos os homens de Israel com ele. 25 Absalão tinha constituído Amasa sobre o exército, no lugar de Joab. Amasa era filho de um homem chamado Jetra, ismaelita, que tinha se unido a Abigail, filha de Isai, irmã de Sárvia, mãe de Joab. 26 Israel acampou com Absalão na terra de Galaad. 27 Quando Davi chegou a Maanaim, Sobi filho de Naás, de Rabá-Amon, Maquir filho de Amiel, de Lodabar, e Berzelai, galaadita de Roguelim, 28 ofereceram-lhe camas e tapetes, bacias e vasos de barro, trigo e cevada e farinha, grão torrado, favas e lentilhas, 29 mel e manteiga, ovelhas e novilhos gordos. Deram tudo de comer a Davi e ao povo que estava com ele, pois achavam que o povo devia estar fatigado pela fome e sede no deserto.

 Morte de Absalão


2Samuel (CNB) 11