Discursos Bento XVI 22

AO SENHOR VLADO BUCHKOVSKI, PRIMEIRO-MINISTRO DA EX-REPÚBLICA JUGOSLAVA DA MACEDÓNIA Segunda-feira, 30 de Maio de 2005


22 Senhor Primeiro-Ministro
Senhoras e Senhores

É com grande alegria que vos saúdo, por ocasião da festa dos Santos Cirilo e Metódio, e que vos exprimo o meu agradecimento por esta agradável visita. Saúdo de maneira particular o Primeiro-Ministro e o seu Séquito. É com o mesmo afecto que dou as boas-vindas à Delegação eclesiástica. Aproveito com prazer esta oportunidade para transmitir os meus bons votos a todos os habitantes do seu amado país.

Quando recebi o novo Embaixador, há poucos dias, desejei reconhecer quão fortemente as tradições e a cultura do povo macedónio reflectem os valores que imbuem o espírito da Europa. Os Santos Irmãos Cirilo e Metódio, Apóstolos dos povos eslavos, contribuíram significativamente para a sua formação. A sua actividade humana e cristã deixou traços indeléveis na história do vosso país. A peregrinação que vós realizais todos os anos ao túmulo de São Cirilo oferece uma ocasião propícia para voltar às raízes da vossa história. Cirilo e Metódio, originários de Salonica, enviados em missão para junto dos povos eslavos pela Igreja de Bizâncio, lançaram os fundamentos de uma autêntica cultura cristã e, ao mesmo tempo, deram passos concretos em vista de criar condições para a paz entre todas as diversificadas populações. Os valores da paz e da fraternidade, que estes Santos Padroeiros da Europa juntamente com São Bento defenderam de maneira incansável, permanecem como elementos indispensáveis para a construção de comunidades de solidariedade, abertas ao progresso humano integral, no respeito pela dignidade de cada um e de todos os seres humanos.

Estou convicto de que o modo de dar vida a uma sociedade genuinamente atenta ao bem comum consiste em buscar no Evangelho as raízes dos valores conjuntos, como no-lo demonstra a experiência dos Santos Cirilo e Metódio. Este é o desejo ardente da Igreja Católica, que não tem outro interesse, a não ser o de propagar e dar testemunho das palavras de esperança e de amor de Jesus Cristo, palavras de vida que, ao longo dos séculos, inspiraram numerosos mártires e confessores da fé. Espero sinceramente que a vossa peregrinação hodierna contribua para conservar vibrantes em toda a Nação estes elevados ideais humanos e cristãos. Rezo também para que o vosso país se abra com confiança à Europa, contribuindo assim de maneira significativa para edificar o seu futuro, inspirando-se nos vossos valores religiosos e na vossa herança cultural.

Gostaria de acrescentar a certeza das minhas preces pelo querido povo macedónio, a fim de que ele possa progredir rumo a um futuro de esperança cada vez mais firme, assistido por todos os elementos da sociedade civil e religiosa. Por isso, invoco as bênçãos celestiais dos Santos Cirilo e Metódio. Que Deus abençoe e proteja sempre o vosso país e todo o seu povo.


AOS BISPOS DE BURUNDI POR OCASIÃO DA VISITA "AD LIMINA APOSTOLORUM" Sábado, 28 de Maio de 2005

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Queridos Irmãos no Episcopado!

É com grande alegria que vos recebo, a vós Pastores da Igreja no Burundi, que viestes em peregrinação a Roma para vos recolher junto dos túmulos dos Apóstolos, e para vos encontrardes com o Sucessor de Pedro e com os seus colaboradores. Desejo que esta experiência de comunhão na caridade vos encoraje na vossa missão de servos do Evangelho de Cristo, para a esperança do mundo. Exprimo a minha gratidão a D. Jean Ntagwarara, Bispo de Bubanza, Presidente da vossa Conferência Episcopal, pelas amáveis palavras que acaba de me dirigir em vosso nome. Elas manifestam a vitalidade espiritual e missionária das vossas comunidades diocesanas, às quais dirijo, assim como a todos os burundianos, as minhas saudações afectuosas. Juntamente convosco, desejo recordar também D. Michael A. Courtney, que foi fiel até à doação da sua vida à missão que o Santo Padre lhe tinha confiado ao serviço do vosso amado país e da Igreja local.

Nos vossos relatórios quinquenais, realçais a parte activa que a Igreja católica desempenha na promoção da paz e da reconciliação no país, sobretudo neste período de prazos eleitorais. Os sofrimentos suportados no tempo sombrio da guerra, durante a qual, é preciso repeti-lo, numerosos cristãos testemunharam de modo heróico a sua fé, não extinguiram o desejo de trabalhar pela fraternidade e pela unidade entre todos, no seguimento de Cristo e em seu nome. Faço votos por que o plano de acção pastoral elaborado para esta finalidade, assim como os sínodos diocesanos que o irão pôr em prática localmente, contribuam para anunciar o Evangelho, para curar as memórias e os corações, para favorecer a solidariedade entre todos os burundianos, eliminando o espírito de vingança e de ressentimento, e convidando incansavelmente ao perdão e à reconciliação.

Celebramos este ano o décimo aniversário da exortação apostólica pós-sinodal Ecclesia in Africa, promulgada pelo meu predecessor o Papa João Paulo II. Que ela permaneça a carta do vosso compromisso na missão que vos está confiada, em comunhão com as outras Igrejas locais! Encorajo-vos em particular a dedicar uma renovada atenção a todos os fiéis, para que vivam cada vez mais intensamente as exigências do seu baptismo. Muitos conhecem a grande pobreza e a angústia interior, e sentem-se tentados a voltar a práticas antigas não purificadas pelo Espírito do Senhor ou de se dirigirem às seitas. Ocupai-vos deles, dando-lhes uma sólida formação cristã, sem esquecer os esforços da inculturação, sobretudo no campo da tradução da Bíblia e dos textos do Magistério. Isto consentirá "assimilar cada vez melhor a mensagem evangélica, continuando, no entanto, fiéis a todos os valores africanos autênticos" (Ecclesia in Africa ).

23 No final do nosso encontro, amados Irmãos no Episcopado, tenho a ocasião de dar graças pelos esforços apostólicos feitos, muitas vezes em condições difíceis, pelos sacerdotes, religiosos e religiosas das vossas dioceses, autóctones ou provenientes de outras partes. Não me esqueço dos catequistas, preciosos colaboradores do apostolado, assim como de todos os fiéis que participam no desenvolvimento do homem e da sociedade, no âmbito das obras da Igreja para a promoção social, para o serviço no mundo da educação e da saúde. Ao invocar sobre todos vós, bem como sobre os vossos diocesanos, o Espírito que fortalece a fé, reaviva a esperança e ampara a caridade, concedo-vos de coração uma afectuosa Bênção Apostólica.



AOS PARTICIPANTES NA 54ª ASSEMBLEIA GERAL DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL ITALIANA Segunda-feira, 30 de Maio de 2005


Queridos Irmãos Bispos italianos, estou feliz por vos encontrar aqui esta manhã, reunidos na vossa Assembleia Geral, depois de ter celebrado ontem com muitos de vós em Bari a Santa Missa conclusiva do Congresso Eucarístico Nacional. Saúdo o vosso Presidente, Cardeal Camillo Ruini, ao qual agradeço as calorosas palavras que me dirigiu em vosso nome. Saúdo os três Vice-Presidentes, o Secretário-Geral e cada um de vós, e desejo expressar-vos sentimentos de profunda comunhão e de afecto sincero.

Transcorreram poucas semanas desde a minha eleição e estão muito vivos em nós aqueles sentimentos que nos acomunaram nos dias do sofrimento e da morte do meu venerado Predecessor, o Servo de Deus João Paulo II, para cada um de nós um pai, um exemplo e um amigo. Estou-vos particularmente grato porque sinto que me acolheis com o mesmo espírito com que o acompanhastes durante os vinte e seis anos do seu Pontificado.

Queridos irmãos, o nosso vínculo tem uma raiz clara, ou seja, a que une todos os Bispos do mundo ao Sucessor de Pedro, mas que nesta nação assume um vigor especial porque o Papa é Bispo de Roma e Primaz da Itália. A história mostrou, já ao longo de vinte séculos, quantos grandes frutos de bem este peculiar vínculo tenha dado, quer para a vida de fé e para o florescimento da civilização do povo italiano quer para o ministério do próprio Sucessor de Pedro. Por conseguinte, começo um serviço novo e inesperado ao qual o Senhor me chamou sentindo-me intimamente confortado pela vossa proximidade e solidariedade: juntos poderemos cumprir a missão que Jesus Cristo nos confiou, juntos poderemos testemunhar Cristo e torná-lo presente hoje, não menos que ontem, nas casas e nos corações dos italianos.

De facto, a relação da Itália com a fé cristã, não só remonta à geração apostólica, à pregação e ao martírio de Pedro e Paulo, mas actualmente também é profundo e vivo. Sem dúvida, aquela forma de cultura, baseada numa racionalidade meramente funcional, que contradiz e tende para excluir o cristianismo e em geral as tradições religiosas e morais da humanidade, está presente e actuante na Itália, como um pouco em toda a Europa. Mas aqui a sua hegemonia não é total e muito menos incontrastada: são muitos, também entre os que não partilham ou não praticam a nossa fé, os que sentem como uma tal forma de cultura constitua na realidade uma funesta mutilação do homem e da sua própria razão. E sobretudo, na Itália, a Igreja conserva uma presença minuciosa, entre o povo de todas as idades e condições, e por conseguinte, pode propor nas situações mais diversas a mensagem de salvação que o Senhor lhe confiou.

Queridos irmãos, conheço o vosso compromisso para manter viva esta presença e para incrementar o seu dinamismo missionário. Nas Orientações pastorais que entregastes às Dioceses italianas para este primeiro decénio do novo século, retomando os ensinamentos de João Paulo II na Novo millennio ineunte, colocais justamente na base de tudo a contemplação de Jesus Cristo e, n'Ele, do verdadeiro rosto de Deus Pai, a relação viva e quotidiana com Ele. De facto, encontra-se aqui a alma e a energia secreta da Igreja, a fonte da eficiência do nosso apostolado. Sobretudo no ministério da Eucaristia, nós próprios, os nossos sacerdotes e todos os nossos fiéis podemos viver em plenitude esta relação com Cristo: aqui Ele torna-se tangível entre nós, doa-se sempre de novo, torna-se nosso para que nós nos tornemos seus e aprendamos o seu amor. O Ano da Eucaristia e o Congresso que acabamos de celebrar em Bari são estímulos que nos ajudam a entrar mais profundamente neste Mistério.

Ao contemplar o rosto de Cristo, e em Cristo o rosto do Pai, Maria Santíssima precede-nos, ampara-nos e acompanha-nos. O amor e a devoção à Mãe do Senhor, tão difundidos e radicados no povo italiano, são uma herança preciosa que devemos cultivar sempre e um grande recurso também em vista da evangelização. Sobre estas bases, queridos irmãos, podemos verdadeiramente propor a nós mesmos e aos nossos fiéis a vocação à santidade, como "medida alta da vida cristã ordinária", segundo a feliz expressão de João Paulo II na Novo millennio ineunte (NM 37): de facto, o Espírito Santo vem até nós, de Cristo e do Pai, precisamente para nos introduzir no mistério da vida e do amor de Deus, além de qualquer força e expectativa humana.

Concretamente, a presença da Igreja entre a população italiana caracteriza-se antes de tudo pela rede espessa das paróquias e pela vitalidade que elas ainda exprimem, mesmo nas grandes mudanças da sociedade e da cultura. Numa vossa recente Nota pastoral (O rosto missionário das paróquias num mundo em mudança) preocupastes-vos sabiamente por apoiar as paróquias, reafirmando o seu valor e a sua função e encorajando assim de modo particular os sacerdotes que têm as pesadas responsabilidades de párocos. Mas também realçastes a necessidade de que as paróquias assumam uma atitude mais missionária na pastoral quotidiana e, por conseguinte, se abram a uma colaboração mais intensa com todas as forças activas de que a Igreja hoje dispõe. É muito importante, em relação a isto, que se fortaleça a comunhão entre as estruturas paroquiais e as várias realidades "carismáticas" que surgiram nos últimos decénios e que estão amplamente presentes na Itália, para que a missão possa alcançar todos os ambientes de vida. Para a mesma finalidade, um contributo precioso provém certamente da presença das comunidades religiosas, na Itália ainda numerosas, não obstante a escassez das vocações.

Um terreno decisivo, para o futuro da fé e para a orientação geral da vida de uma nação, é sem dúvida o da cultura. Portanto, peço-vos que deis continuidade ao trabalho que empreendestes para que a voz dos católicos esteja constantemente presente no debate cultural italiano, e ainda antes, para que se fortaleçam as capacidades de elaborar racionalmente, na luz da fé, os numerosos interrogativos que se apresentam nos vários âmbitos do saber e nas grandes opções de vida. Hoje a cultura e os modelos comportamentais são também cada vez mais condicionados e caracterizados pelas representações que a mídia propõe: portanto, é benemérito o esforço da vossa Conferência por ter também neste nível uma capacidade adequada de expressão, a fim de poder oferecer a todos uma interpretação cristã dos acontecimentos e dos problemas.

A situação efectiva da Igreja na Itália confirma e justifica a atenção e as expectativas que muitas Igrejas irmãs na Europa e no mundo têm em relação a ela. Como realçou várias vezes o meu Predecessor João Paulo II, a Itália pode e deve desempenhar um importante papel no testemunho comum de Jesus Cristo nosso único Salvador e para que seja encontrada em Cristo a medida do verdadeiro humanismo, tanto para a consciência das pessoas como para a ordem da vida social.

24 Uma questão nevrálgica, que requer a maior atenção pastoral, é a da família. Na Itália, ainda mais do que em outros países, a família representa verdadeiramente a célula fundamental da sociedade, está profundamente radicada no coração das jovens gerações e enfrenta numerosos problemas, oferecendo apoio e remédio a situações que, de outra forma, seriam desesperadas. E contudo, também na Itália a família está exposta, no actual clima cultural, a numerosos riscos e ameaças que todos conhecemos. De facto, à fragilidade e instabilidade interna de muitas uniões conjugais junta-se a tendência, difundida na sociedade e na cultura, a contestar o carácter único e a missão própria da família fundada no matrimónio. Depois, precisamente a Itália é uma das nações em que a escassez dos nascimentos é mais grave e persistente, com consequências já pesadas sobre todo o corpo social. Por isso, desde há muito tempo vós, Bispos italianos, unistes a vossa voz à de João Paulo II, em primeiro lugar na defesa da sacralidade da vida humana e do valor da instituição matrimonial, mas também na promoção do papel da família na Igreja e na sociedade, pedindo medidas económicas e legislativas que apoiem as jovens famílias na geração e na educação dos filhos. Com o mesmo espírito, estais actualmente comprometidos a iluminar e motivar as opções dos católicos e de todos os cidadãos sobre os referendum já iminentes em relação à lei sobre a procriação assistida: precisamente na sua clareza e consistência este vosso compromisso é sinal da solicitude dos Pastores por todos os seres humanos, que jamais podem ser reduzidos a um meio, mas são sempre um fim, como nos ensina nosso Senhor Jesus Cristo no seu Evangelho e como nos diz a própria razão humana. Neste compromisso, e em toda a numerosa obra que faz parte da missão e do dever dos Pastores, estou próximo de vós com a palavra e com a oração, confiando na luz e na graça do Espírito que age nas consciências e nos corações.

A mesma solicitude pelo verdadeiro bem do homem que nos estimula a ocupar-nos do destino das famílias e do respeito pela vida humana exprime-se na atenção aos pobres que temos entre nós, aos doentes, aos imigrados, aos povos dizimados pelas doenças, pelas guerras e pela fome.

Queridos irmãos Bispos italianos, desejo agradecer-vos, assim como aos vossos fiéis, a grandeza da vossa caridade, que contribui para fazer com que a Igreja seja concretamente aquele povo novo no qual ninguém é estrangeiro. Recordemo-nos sempre das palavras do Senhor: aquilo que fizerdes "a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes" (
Mt 25,40).

Em Agosto, como sabeis, irei a Colónia para a Jornada Mundial da Juventude e espero encontrar-me de novo com muitos de vós, acompanhados por um grande número de jovens italianos.

Gostaria de acrescentar uma palavra precisamente em relação aos jovens, à sua formação, à sua relação com o Senhor e com a Igreja. De facto, eles são, como afirmou repetidas vezes João Paulo II, a esperança da Igreja, mas estão também, no mundo de hoje, particularmente expostos ao perigo de serem "batidos pelas ondas e levados por qualquer vento da doutrina" (Ep 4,14).

Portanto, têm necessidade de ser ajudados a crescer e a amadurecer na fé: este é o primeiro serviço que devem receber da Igreja, e especialmente de nós Bispos e dos nossos sacerdotes.

Sabemos bem que muitos deles não estão em condições de compreender e de acolher imediatamente todo o ensinamento da Igreja, mas precisamente por isso é importante despertar neles a intenção de crer com a Igreja, a confiança que esta Igreja, animada e guiada pelo Espírito, é o verdadeiro sujeito da fé, e, ao inserir-nos nele entramos e participamos na comunhão da fé. Para que isto se possa verificar, os jovens devem sentir-se amados pela Igreja, amados concretamente por nós, Bispos e sacerdotes. Assim, poderão conhecer na Igreja a amizade e o amor que o Senhor lhes tem, compreenderão que em Cristo a verdade coincide com o amor e aprenderão por sua vez a amar o Senhor e a ter confiança no seu corpo que é a Igreja. Queridos Irmãos Bispos italianos, este é hoje o ponto central do grande desafio da transmissão da fé às jovens gerações.

Garanto-vos a minha oração quotidiana pelas vossas pessoas e pelas vossas Igrejas, por toda a amada nação italiana, pelo seu presente e pelo seu futuro cristão, pela tarefa que ela está chamada a desempenhar na Europa e no mundo, e concedo com afecto uma especial Bênção Apostólica a vós, aos vossos sacerdotes e a cada família italiana.



SAUDAÇÃO NA CONCLUSÃO DA RECITAÇÃO DO ROSÁRIO NA GRUTA DE LOURDES NOS JARDINS DO VATICANO Terça-feira, 31 de Maio de 2005


Prezados Irmãos e Irmãs

É com grande alegria que me uno a vós no final deste encontro de oração, promovido pelo Vicariato da Cidade do Vaticano. Vejo com prazer que vos reunistes em grande número nos Jardins do Vaticano, para a conclusão do mês de Maio. Em particular, entre vós há muitas pessoas que vivem ou trabalham no Vaticano, juntamente com as suas famílias. Saúdo-vos todos cordialmente, de modo especial os Senhores Cardeais e os Bispos, a começar por D. Angelo Comastri, que presidiu a este encontro de oração. Além disso, saúdo os sacerdotes, os religiosos e as religiosas presentes, e dirijo um pensamento também às Irmãs contemplativas do Mosteiro Mater Ecclesiae, que estão espiritualmente unidas a nós.

25 Estimados amigos, subistes até à Gruta de Lourdes, recitando o santo Rosário, como que respondendo ao convite da Virgem a elevar o espírito ao Céu. Nossa Senhora acompanha-nos todos os dias na nossa oração. No especial Ano da Eucaristia, que estamos a viver, Maria ajuda-nos sobretudo a descobrir cada vez mais o grande sacramento da Eucaristia. O amado Papa João Paulo II, na sua última Encíclica Ecclesia de Eucharistia apresentou-a como "mulher eucarística" em toda a sua vida (cf. EE 53). "Mulher eucarística" em profundidade, a partir da sua atitude interior: da Anunciação, quando se ofereceu a si mesma para a encarnação do Verbo de Deus, até à cruz e à ressurreição; "mulher eucarística" no período depois do Pentecostes, quando recebeu no Sacramento aquele Corpo que Ela concebeu e levou no seio.

Em particular hoje, com a liturgia, detemo-nos para meditar sobre o mistério da Visitação da Virgem a Santa Isabel. Maria, trazendo no seio Jesus recém-concebido, vai visitar a prima Isabel, que todos consideravam estéril e que, contudo, tinha chegado ao sexto mês de uma gravidez concedida por Deus (cf. Lc 1,36). É uma jovem, mas não tem medo, porque Deus está com Ela, dentro dela. De certo modo, podemos dizer que a sua viagem foi apraz-nos sublinhá-lo neste Ano da Eucaristia a primeira "procissão eucarística" da história. Maria, tabernáculo vivo de Deus que se fez carne, é a arca da Aliança, em que o Senhor visitou e redimiu o seu povo. A presença de Jesus enche-a de Espírito Santo. Quando entra na casa de Isabel, a sua saudação é transbordante de graça: João estremece no seio da mãe, como se tivesse sentido a vinda daquele que no futuro ele deverá anunciar a Israel. Os filhos exultam, as mães regozijam-se. Este encontro, impregnado da alegria do Espírito, encontra a sua expressão no cântico do Magnificat.

Não é, porventura, também esta a alegria da Igreja, que acolhe incessantemente Cristo na sagrada Eucaristia e O leva ao mundo com o testemunho da caridade concreta, imbuída de fé e de esperança? Sim, acolher Jesus e levá-lo aos outros é o verdadeiro júbilo do cristão! Dilectos Irmãos e Irmãs, continuemos a imitar Maria, uma alma profundamente eucarística, e toda a nossa vida poderá tornar-se um Magnificat (cf. Ecclesia de Eucharistia EE 58), um louvor a Deus. Seja esta a graça que, nesta tarde pedimos em conjunto à Virgem Santíssima, na conclusão do mês de Maio. Concedo-vos a todos a minha bênção.



                                                                  Juhno 2005




A UMA PEREGRINAÇÃO DA DIOCESE DE VERONA Sábado, 4 de Junho de 2005


Queridos irmãos e irmãs
da Diocese de Verona!

Obrigado pelo vosso entusiasmo. Obrigado pela vossa alegria que é expressão e fruto da fé. Sinto-me feliz por vos receber nesta vossa peregrinação aos Túmulos dos Apóstolos. Saúdo todos vós cordialmente, começando pelo vosso Bispo, ao qual agradeço por se ter feito intérprete dos sentimentos comuns. Saúdo os sacerdotes, os religiosos e as religiosas, os responsáveis das associações e dos movimentos eclesiais, assim como as autoridades civis que quiseram estar presentes neste encontro. Com a peregrinação de hoje à Sé Apostólica, desejais expressar, no final do Sínodo diocesano, os vínculos de comunhão que ligam a Comunidade diocesana de Verona à Igreja de Roma, e reafirmar a vossa plena adesão ao magistério do Sucessor de Pedro, constituído por Cristo "pastor de todos os fiéis para promover quer o bem comum da Igreja universal, quer o bem de cada uma das Igrejas particulares" (Decr. Christus Dominus CD 2). Viestes para ser confirmados na fé e eu, chamado recentemente para esta grave tarefa, sinto-me feliz por saudar, através de vós, uma antiga e insigne Comunidade eclesial como a de São Zeno, muito venerado também na minha terra, e de vos encorajar a perseverar no compromisso de testemunho cristão no mundo de hoje.

O vosso Sínodo, que iniciou há três anos, conheceu a sua fase culminante no Ano da Eucaristia. Esta feliz coincidência ajuda a compreender melhor que a Eucaristia é o coração da Igreja e da vida cristã. "Ecclesia de Eucharistia" "a Igreja vive da Eucaristia" assim nos deixou escrito o Servo de Deus João Paulo II na sua última Encíclica. A vossa Diocese deve viver da Eucaristia em todas as suas expressões: das famílias, pequenas igrejas domésticas, a qualquer órgão social e pastoral das paróquias e do território. "Na Eucaristia quis recordar em Bari no domingo passado, no final do Congresso Eucarístico Nacional Cristo está realmente presente entre nós. A sua presença não é estática. É uma presença dinâmica, que nos atrai para nos fazer seus, para nos tornar semelhantes a ele. Cristo atrai para si, faz-nos sair de nós mesmos para fazer de todos nós uma só coisa com Ele. Desta forma Ele insere-nos também na comunidade dos irmãos e a comunhão com o Senhor é sempre e também comunhão com as irmãs e os irmãos". É verdade: a nossa vida espiritual depende essencialmente da Eucaristia. Sem ela a fé e a esperança esvaecem, a caridade arrefece. Por isso, queridos amigos, exorto-vos a cuidar cada vez mais a qualidade das celebrações eucarísticas, especialmente do domingo, para que seja deveras o Dia do Senhor e confira plenitude de significado às vicissitudes e às actividades de todos os dias mostrando a alegria e a beleza da fé.

A família é justamente um dos temas principais tanto do vosso Sínodo, como das orientações pastorais da Igreja, na Itália e no mundo inteiro. De facto, na vossa Diocese, como em todas as partes, aumentaram os divórcios e as uniões irregulares, o que constitui para os cristãos uma chamada urgente a proclamar e testemunhar em toda a sua inteireza o evangelho da vida e da família. A família está chamada a ser "comunidade íntima de vida e de amor" (Const. Gaudium et spes GS 48), porque está fundada no matrimónio indissolúvel. Apesar das dificuldades e dos condicionamentos sociais e culturais do actual momento histórico, os esposos cristãos não deixem de ser com a sua vida o sinal do amor fiel de Deus; colaborem activamente com os sacerdotes na pastoral dos noivos, dos jovens casais, das famílias e na educação das novas gerações.

Queridos irmãos e irmãs, celebrámos ontem a solenidade do Sagrado Coração de Jesus: só desta fonte inexaurível de amor podereis haurir a energia necessária para a vossa missão. Do Coração do Redentor, do seu lado trespassado nasceu a Igreja, que se renova incessantemente mediante os Sacramentos. Que a vossa preocupação seja alimentar-vos espiritualmente com a oração e com uma vida sacramental intensa; aprofundai o conhecimento pessoal de Cristo e tendei com todos os esforços para aquela "medida alta da vida cristã" que é a santidade, como amava dizer o querido João Paulo II. Maria Santíssima, de cujo Coração Imaculado hoje fazemos memória, obtenha como dom para todos os membros da vossa Diocese a fidelidade total a Cristo e à sua Igreja.

26 Confio o caminho pós-sinodal que vos espera à intercessão da celeste Mãe do Redentor e ao amparo dos santos e beatos da vossa Terra. Quanto a mim, garanto-vos uma recordação na oração, enquanto concedo com afecto ao vosso Bispo, a vós e a toda a Comunidade diocesana uma especial Bênção Apostólica.




NA ABERTURA DO CONGRESSO ECLESIAL DIOCESANO NA BASÍLICA DE SÃO JOÃO DE LATRÃO Segunda-feira, 6 de Junho de 2005


Queridos irmãos e irmãs

Aceitei de muito bom grado o convite para iniciar com uma reflexão minha este nosso Congresso Diocesano, em primeiro lugar porque isto me dá a possibilidade de me encontrar convosco, de ter um contacto directo convosco, e também porque vos posso ajudar a aprofundar o sentido e a finalidade do caminho pastoral que a Igreja de Roma está a percorrer.

Saúdo com afecto cada um de vós, Bispos, sacerdotes, diáconos, religiosos e religiosas, e em particular vós, leigos e famílias que assumis conscientemente aquelas tarefas de compromisso e testemunho cristão que têm a sua raiz no sacramento do baptismo e, para quantos são casados, no do matrimónio. Agradeço de coração ao Cardeal Vigário e ao casal Luca e Adriana Pasquale as palavras que me quiseram dirigir em nome de todos vós.

Este Congresso, e o ano pastoral ao qual ele fornecerá as linhas-guia, constituem uma nova etapa do percurso que a Igreja de Roma iniciou, com base no Sínodo Diocesano, com a Missão da Cidade querida pelo nosso tão amado Papa João Paulo II, em preparação para o Grande Jubileu do ano 2000. Naquela Missão todas as realidades da nossa Diocese paróquias, comunidades religiosas, associações e movimentos se mobilizaram, não só numa missão para o povo de Roma, mas para serem elas mesmas "povo de Deus em missão", pondo em prática a feliz expressão de João Paulo II, "paróquia, procura-te a ti mesma e encontra-te a ti própria fora de ti mesma": isto é, nos lugares onde o povo vive. Assim, durante a Missão da Cidade, muitos milhares de cristãos de Roma, em grande parte leigos, fizeram-se missionários e levaram a palavra da fé primeiro às famílias dos vários bairros da cidade e depois aos diversos lugares de trabalho, aos hospitais, às escolas e às universidades, aos espaços da cultura e do tempo livre.

Depois do Ano Santo, o meu amado Predecessor pediu-vos para não interromperdes este caminho e para não dispersardes as energias apostólicas suscitadas e os frutos de graça recolhidos. Por isso, a partir de 2001, a orientação fundamental da Diocese foi dar forma permanente à missão, caracterizando em sentido mais decididamente missionário a vida e as actividades das paróquias e de qualquer outra realidade eclesial. Desejo dizer-vos antes de mais que pretendo confirmar plenamente esta opção: de facto, ela revela-se cada vez mais necessária e sem alternativas, num contexto social e cultural no qual estão a agir numerosas forças que tendem a afastar-nos da fé e da vida cristã.

Desde há já dois anos o compromisso missionário da Igreja de Roma concentrou-se sobretudo sobre a família, não só porque esta realidade humana fundamental hoje é submetida a numerosas dificuldades e ameaças e, por conseguinte, tem particular necessidade de ser evangelizada e apoiada concretamente, mas também porque as famílias cristãs constituem um recurso decisivo para a educação na fé, para a edificação da Igreja como comunhão e para a sua capacidade de presença missionária nas situações mais diversificadas da vida, além de fermentar em sentido cristão a cultura difundida e as estruturas sociais. Prosseguiremos nestas linhas também no próximo ano pastoral e por isso o tema do nosso Congresso é "Família e comunidade cristã: formação da pessoa e transmissão da fé".

O pressuposto do qual é necessário partir, para poder compreender a missão da família na comunidade cristã e as suas tarefas de formação da pessoa e transmissão da fé, permanece sempre o do significado que o matrimónio e a família revestem no desígnio de Deus, criador e salvador. Isto constituirá portanto o núcleo da minha reflexão desta tarde, tomando como ponto de referência o ensinamento da Exortação Apostólica Familiaris consortio (Segunda parte, FC 12-16).

Matrimónio e família não são, na realidade, uma construção sociológica casual, fruto de particulares situações históricas e económicas. Ao contrário, a questão da justa relação entre o homem e a mulher afunda as suas raízes dentro da essência mais profunda do ser humano e pode encontrar a sua resposta só a partir dela. Isto é, não pode estar separada da pergunta antiga e sempre nova do homem sobre si mesmo: quem sou? O que é o homem? E esta pergunta, por sua vez, não pode ser separada da interrogação acerca de Deus: Deus existe? E quem é Deus? Qual é verdadeiramente o seu rosto? A resposta da Bíblia a estas duas interrogações é unitária e consequencial: o homem é criado à imagem de Deus, e o próprio Deus é amor. Por isso a vocação para o amor é aquilo que faz com que o homem seja a autêntica imagem de Deus: ele torna-se semelhante a Deus na medida em que ama.

Deste vínculo fundamental entre Deus e o homem tem origem outro: o vínculo indissolúvel entre espírito e corpo: de facto, o homem é alma que se exprime no corpo e corpo que é vivificado por um espírito imortal. Também o corpo do homem e da mulher tem, por conseguinte, por assim dizer, um carácter teológico, não é simplesmente corpo, e o que é biológico no homem não é só biológico, mas expressão e cumprimento da nossa humanidade. De igual modo, a sexualidade humana não está ao lado do nosso ser pessoa, mas pertence-lhe. Só quando a sexualidade se integra na pessoa, consegue dar um sentido a si mesma.

27 Assim, dos dois vínculos, do homem com Deus e, no homem, do corpo com o espírito, brota um terceiro: o vínculo entre pessoa e instituição. A totalidade do homem inclui de facto a dimensão do tempo, e o "sim" do homem é um ir além do momento presente: na sua inteireza, o "sim" significa "sempre", constitui o espaço da fidelidade. Só dentro dele pode crescer aquela fé que dá um futuro e permite que os filhos, fruto do amor, creiam no homem e no seu futuro em tempos difíceis. Por conseguinte, a liberdade do "sim" revela-se liberdade capaz de assumir o que é definitivo: a maior expressão da liberdade não é então a busca do prazer, sem jamais alcançar uma verdadeira decisão. Aparentemente esta abertura permanente parece ser a realização da liberdade, mas não é verdade: a verdadeira expressão da liberdade é a capacidade de decidir por uma doação definitiva, na qual a liberdade, doando-se, se reencontra plenamente a si mesma.

Em concreto, o "sim" pessoal e recíproco do homem e da mulher abre o espaço para o futuro, para a autêntica humanidade de cada um, e ao mesmo tempo está destinado à doação de uma nova vida. Por isso, este "sim" pessoal não pode deixar de ser um "sim" também publicamente responsável, com o qual os cônjuges assumem a responsabilidade pública da fidelidade que garante também o futuro para a comunidade. Com efeito, nenhum de nós pertence exclusivamente a si mesmo: portanto, cada um está chamado a assumir no mais íntimo de si a própria responsabilidade pública. O matrimónio como instituição não é, por conseguinte, uma ingerência indevida da sociedade ou da autoridade, a imposição externa de uma forma na realidade mais privada que é a vida; ao contrário, é exigência intrínseca do pacto de amor conjugal e da profundidade da pessoa humana.

As várias formas hodiernas de dissolução do matrimónio, como as uniões livres e o "matrimónio de prova", até ao pseudomatrimónio entre pessoas do mesmo sexo, são ao contrário, expressões de uma liberdade anárquica, que se faz passar indevidamente por verdadeira libertação do homem. Uma tal pseudoliberdade funda-se sobre uma banalização do corpo, que inevitavelmente inclui a banalização do homem. O seu pressuposto é que o homem pode fazer de si o que quer: o seu corpo torna-se assim uma coisa secundária, manipulável sob o ponto de vista humano, a ser utilizado como se deseja. O libertinismo, que se faz passar por descoberta do corpo e do seu valor, é na realidade um dualismo que torna o corpo desprezível, colocando-o por assim dizer fora do ser autêntico e da dignidade da pessoa.

A verdade do matrimónio e da família, que afunda as suas raízes na verdade do homem, encontrou actuação na história da salvação, em cujo centro está a palavra: "Deus ama o seu povo". A revelação bíblica, de facto, é antes de tudo expressão de uma história de amor, a história da aliança de Deus com os homens: por isso, a história do amor e da união de um homem e de uma mulher na aliança do matrimónio pôde ser assumida por Deus como símbolo da história da salvação. O facto inexprimível, o mistério do amor de Deus pelos homens, recebe a sua forma linguística do vocabulário do matrimónio e da família, em positivo e em negativo: de facto, o aproximar-se de Deus ao seu povo é apresentado na linguagem do amor esponsal, enquanto que a infidelidade de Israel, a sua idolatria, é designada como adultério e prostituição.

No Novo Testamento Deus radicaliza o seu amor até se tornar Ele mesmo, no seu Filho, carne da nossa carne, verdadeiro homem. Desta forma, a união de Deus com o homem assumiu a sua forma suprema, irreversível e definitiva. Assim, é traçada também para o amor humano a sua forma definitiva, aquele "sim" recíproco que não pode ser revogado: ela não aliena o homem, mas liberta-o das alienações da história para o conduzir à verdade da criação. A sacramentalidade que o matrimónio assume em Cristo significa portanto que o dom da criação foi elevado à graça de redenção. A graça de Cristo não se acrescenta de fora à natureza do homem, não lhe faz violência, mas liberta-a e restaura-a, precisamente ao elevá-la acima dos seus próprios limites. Assim como a encarnação do Filho de Deus revela o seu verdadeiro significado na cruz, também o amor humano autêntico é doação de si, e não pode existir se pretender subtrair-se à cruz.

Queridos irmãos e irmãs, este vínculo profundo entre Deus e o homem, entre o amor de Deus e o amor humano, encontra confirmação também em algumas tendências e desenvolvimentos negativos, dos quais todos sentimos o peso. O aviltamento do amor humano, a supressão da autêntica capacidade de amar revela-se de facto, no nosso tempo, a arma mais apropriada e mais eficaz para afastar Deus do homem, para afastar Deus do olhar e do coração do homem. Analogamente, a vontade de "libertar" a natureza de Deus leva a perder de vista a própria realidade da natureza, inclusive da natureza do homem, reduzindo-a a um conjunto de funções, das quais dispor a seu bel-prazer para construir um suposto mundo melhor e uma suposta humanidade mais feliz; ao contrário, destrói-se o desígnio do Criador e também a verdade da nossa natureza.

Também na geração dos filhos o matrimónio reflecte o seu modelo divino, o amor de Deus pelo homem. No homem e na mulher a paternidade e a maternidade, como o corpo e como o amor, não se deixam circunscrever no biológico: a vida só é dada totalmente quando, com o nascimento, são dados também o amor e o sentido que fazem com que seja possível dizer sim a esta vida. Precisamente disto se torna totalmente evidente como é contrário ao amor humano, à vocação profunda do homem e da mulher, fechar sistematicamente a própria união à doação da vida, e ainda mais suprimir ou violar a vida que nasce.

Contudo, nenhum homem e nenhuma mulher, sozinhos e unicamente com as próprias forças, podem dar aos filhos de maneira adequada o amor e o sentido da vida. De facto, para poder dizer a alguém "a tua vida é boa, mesmo se eu não conheço o teu futuro", são necessárias uma autoridade e uma credibilidade superiores às que o indivíduo pode ter sozinho. O cristão sabe que esta autoridade é conferida àquela família mais vasta que Deus, através do seu Filho Jesus Cristo e da doação do Espírito Santo, criou na história dos homens, isto é, a Igreja. Aqui ele reconhece a obra daquele amor eterno e indestrutível que garante à vida de cada um de nós um sentido permanente, mesmo se não conhecemos o futuro. Por este motivo, a edificação de cada família cristã individualmente coloca-se no contexto da família mais ampla da Igreja, que a ampara e a leva consigo e garante que existe o sentido e que haverá também no seu futuro o "sim" do Criador. E reciprocamente a Igreja é edificada pelas famílias, "pequenas Igrejas domésticas", como lhes chamou o Concílio Vaticano II (Lumen gentium
LG 11 Apostolicam actuositatem AA 11), redescobrindo uma antiga expressão patrística (São João Crisóstomo, In Genesim serm. VI, 2; VII, 1). No mesmo sentido a Familiaris consortio afirma que "o matrimónio cristão... constitui o lugar natural onde se cumpre a inserção da pessoa humana na grande família da Igreja" (FC 15).

De tudo isto surge uma consequência evidente: a família e a Igreja, em concreto, as paróquias e as outras formas de comunidade eclesial, estão chamadas à colaboração mais estreita naquela tarefa fundamental que é constituída, inseparavelmente, pela formação da pessoa e pela transmissão da fé. Sabemos bem que para uma autêntica obra educativa não é suficiente uma teoria justa ou uma doutrina a ser comunicada. Há necessidade de algo muito maior e humano, daquela proximidade, quotidianamente vivida, que é própria do amor e que encontra o seu espaço mais propício na comunidade familiar, e depois também numa paróquia, movimento ou associação eclesial, em que se encontrem pessoas que se ocupam dos irmãos, em particular das crianças, mas também dos adultos, dos idosos, dos doentes, das próprias famílias, porque, em Cristo, os amam. O grande Padroeiro dos educadores, São João Bosco, recordava aos seus filhos espirituais que "a educação é algo do coração e que só Deus é o seu dono" (Epistolário, 4, 209).

Central na obra educativa, e especialmente na educação para a fé, que é o vértice da formação da pessoa e o seu horizonte mais adequado, é em concreto a figura da testemunha: ela torna-se ponto de referência precisamente enquanto sabe dizer a razão da esperança que anima a sua vida (cf. 1P 3,15), e está pessoalmente comprometida com a verdade que propõe. Por outro lado, a testemunha nunca se propõe a si mesma como ponto de referência, mas propõe algo, ou melhor Alguém maior do que ela que encontrou e de quem experimentou a bondade confiante. Assim, cada educador e testemunha encontra o seu modelo insuperável em Jesus Cristo, a grande testemunha do Pai, que nada dizia de si mesmo, mas falava como o Pai lhe tinha ensinado (cf. Jn 8,28).

Este é o motivo pelo qual na base da formação da pessoa cristã e da transmissão da fé está necessariamente a oração, a amizade pessoal com Cristo e a contemplação n'Ele do rosto do Pai. Evidentemente, o mesmo é válido para qualquer nosso compromisso missionário, em particular para a pastoral familiar: a Família de Nazaré seja, portanto, para as nossas famílias e para as nossas comunidades, objecto de oração constante e confiante, além de ser modelo de vida.
28 Queridos irmãos e irmãs, e sobretudo vós, queridos sacerdotes, conheço a generosidade e a dedicação com que servis o Senhor e a Igreja. O vosso trabalho quotidiano na formação para a fé das novas gerações, em estreita ligação com os sacramentos da iniciação cristã, como também pela preparação para o matrimónio e para o acompanhamento das famílias no seu caminho, com frequência não fácil, sobretudo na grande tarefa da educação dos filhos, é a via fundamental para regenerar sempre de novo a Igreja e também para vivificar o tecido social desta nossa amada cidade de Roma.

Por conseguinte, continuai sem vos deixardes desencorajar pelas dificuldades que encontrais. A relação educativa é por sua natureza uma coisa delicada: de facto, ela chama em causa a liberdade do outro que, mesmo se docemente, é contudo sempre provocada a uma decisão. Nem os pais, nem os sacerdotes ou os catequistas, nem os outros educadores se podem substituir à liberdade da criança, do adolescente ou do jovem a quem se dirigem. E especialmente a proposta cristã interpela profundamente a liberdade, chamando-a à fé e à conversão. Hoje, um obstáculo particularmente insidioso à obra educativa é constituído pela presença maciça, na nossa sociedade e cultura, daquele relativismo que, nada reconhecendo como definitivo, deixa sozinho, como última medida, o próprio eu com as suas decisões, e sob a aparência da liberdade torna-se para cada um uma prisão, porque separa uns dos outros, reduzindo cada um a permanecer fechado dentro do seu "Eu". Dentro de um horizonte relativista como este não é possível, portanto, uma verdadeira educação: sem a luz da verdade; mais cedo ou mais tarde cada pessoa está, de facto, condenada a duvidar da bondade da sua própria vida e das relações que a constituem, do valor do seu compromisso para construir com os outros algo em comum.

Por conseguinte, é claro que não só devemos procurar superar o relativismo no nosso trabalho de formação das pessoas, mas estamos chamados também a contrastar o seu predomínio destruidor na sociedade e na cultura. Por isso, é muito importante que, paralelamente com a palavra da Igreja, haja o testemunho e o compromisso público das famílias cristãs, especialmente para reafirmar a intangibilidade da vida humana desde a sua concepção até ao seu fim natural, o valor único e insubstituível da família fundada no matrimónio e a necessidade de disposições legislativas e administrativas que defendam as famílias na tarefa de gerar e educar os filhos, tarefa essencial para o nosso futuro comum. Também por este compromisso vos digo um obrigado cordial.

Uma última mensagem que gostaria de vos confiar refere-se à solicitude pelas vocações ao sacerdócio e à vida consagrada: todos sabemos quanto a Igreja tem necessidade deles! Para que estas vocações nasçam e alcancem a maturação, para que as pessoas chamadas se mantenham sempre dignas da sua vocação, é decisiva antes de tudo a oração, que nunca deve faltar em cada família e comunidade cristã. Mas é também fundamental o testemunho de vida dos sacerdotes, dos religiosos e das religiosas, a alegria que eles exprimem por terem sido chamados pelo Senhor. E também é fundamental o exemplo que os filhos recebem no âmbito da própria família e a convicção das próprias famílias de que, também para eles, a vocação dos próprios filhos é um grande dom do Senhor. A opção da virgindade por amor de Deus e dos irmãos, que é exigida para o sacerdócio e para a vida consagrada, de facto, caminha juntamente com a valorização do matrimónio cristão: um e outro, de duas maneiras diferentes e complementares, tornam de alguma forma visível o mistério da aliança entre Deus e o seu povo.

Queridos irmãos e irmãs, confio-vos estas reflexões como contributo ao vosso trabalho nas tardes do Congresso e depois, durante o próximo ano pastoral. Peço ao Senhor que vos conceda coragem e entusiasmo, para que esta nossa Igreja de Roma, cada uma das paróquias, comunidades religiosas, associações ou movimentos participem mais intensamente da alegria e das canseiras da missão e assim cada família e toda a comunidade cristã redescubram no amor do Senhor a chave que abre a portados corações e que torna possível uma verdadeira educação para a fé e a formação das pessoas. O meu afecto e a minha bênção acompanham-vos hoje e no futuro.





Discursos Bento XVI 22