Discursos Bento XVI 38705

NA CHEGADA AO PALÁCIO PONTIFÍCIO DE CASTEL GANDOLFO Castel Gandolfo, 28 de Julho de 2005

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Queridos irmãos e irmãs!

Acabei agora de chegar do Vale de Aosta. Transcorri duas semanas muito agradáveis na montanha, mas agora sinto-me feliz por estar aqui convosco, aqui no Castelo dos Papas.

Serei por mais de um mês vosso concidadão e é grande para mim a alegria de me encontrar nesta bonita e pequena cidade, viver convosco e ver todas as belezas que se encontram nas redondezas da antiga Roma.

Obrigado pelo vosso afecto e pela vossa amizade. Concedo a minha Bênção Apostólica.

Depois de ter concedido a Bênção, acrescentou:

Obrigado por este acolhimento. Ver-nos-emos com frequência. Obrigado e até breve!



VIAGEM APOSTÓLICA A COLÓNIA POR OCASIÃO DA XX JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE


CERIMÓNIA DE BOAS-VINDAS NO AEROPORTO INTERNACIONAL DE COLÓNIA/BONN Quinta-feira, 18 de Agosto de 2005

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Senhor Presidente da República
Ilustres Autoridades políticas e civis
Senhores Cardeais
Venerados Irmãos no Episcopado
Caros Cidadãos da República Federal
Caríssimos Jovens

É com profunda alegria que me encontro hoje aqui pela primeira vez, depois da minha eleição à Cátedra de Pedro, na minha querida Pátria, a Alemanha. Só posso reiterar aquilo que afirmei durante uma entrevista por mim concedida à Rádio Vaticano: considero um amoroso gesto de reconciliação o facto de que, sem o ter desejado, a minha primeira visita fora da Itália se realiza na minha pátria: aqui em Colónia, e num momento, num lugar e numa ocasião em que se encontram jovens do mundo inteiro, de todos os continentes, em que desaparecem as fronteiras entre os continentes, as culturas, as raças e as nações, porque todos nós somos uma só coisa, graças à estrela que brilhou para nós: a estrela da fé em Jesus Cristo, que nos une e nos indica o caminho, de tal forma que todos nós possamos constituir uma grande força de paz, para além de todos os confins e de todas as divisões. Por isso, dou graças de coração a Deus, que me concedeu começar aqui na minha pátria e numa ocasião tão propiciadora de paz. Por conseguinte, chego a Colónia com uma continuidade mais profunda, como Vossa Excelência disse, Senhor Presidente, com o meu grande e amado predecessor João Paulo II, que teve esta intuição, diria esta inspiração, das Jornadas Mundiais da Juventude, e que deste modo não criou somente uma ocasião de extraordinário significado religioso e eclesial, mas também humano, que impele os homens para além das fronteiras recíprocas e contribui para edificar um futuro comum. Estou sinceramente grato a todos vós aqui presentes, pelo caloroso acolhimento que me foi reservado. Dirijo a minha deferente saudação, em primeiro lugar, ao Presidente da República Federal, Sua Ex.cia o Senhor Horst Köhler. Agradeço-lhe as amáveis palavras que me transmitiu do íntimo do seu coração. Não sabia que um economista podia ser inclusive um filósofo e um teólogo! Obrigado de coração!

Estendo também o meu respeitoso e grato pensamento aos Representantes do Governo, aos Membros do Corpo Diplomático e às Autoridades civis e militares, ao Chanceler Federal, ao Presidente do Estado da Renânia do Norte-Vestefália e a todas as Autoridades aqui presentes.
Saúdo com afecto fraterno o Pastor da Arquidiocese de Colónia, o Cardeal Joachim Meisner. Juntamente com ele, cumprimento os demais Bispos com o Presidente da Conferência Episcopal Alemã, o Cardeal Lehmann, os sacerdotes, os religiosos, as religiosas e quantos prestam a sua preciosa colaboração às diferentes actividades pastorais nas Dioceses de língua alemã. Neste momento, desejo abraçar com o pensamento e com o afecto todos os habitantes dos vários Estados da República Federal da Alemanha.

Nestes dias de mais intensa preparação para a Jornada Mundial da Juventude, as Dioceses da Alemanha, e em particular a Arquidiocese e a Cidade de Colónia animaram-se com a presença de numerosos jovens, provenientes de diversas regiões do mundo. Agradeço a quantos ofereceram a sua competente e generosa colaboração para a organização deste acontecimento eclesial, de alcance mundial. Dirijo o meu pensamento reconhecido às paróquias, aos institutos religiosos, às associações, às organizações civis e aos cidadãos individualmente, pela sensibilidade que demonstraram ao oferecer uma calorosa e adequada hospitalidade aos milhares de peregrinos aqui reunidos, provenientes dos vários continentes. É bonito ver que em tais circunstâncias a virtude quase desaparecida da hospitalidade, que pertence às qualidades originárias do homem, volta a viver e desta maneira podem encontrar-se pessoas de todas as condições.

58 A Igreja que vive na terra alemã e toda a população da República Federal da Alemanha podem orgulhar-se de uma vasta e consolidada tradição de abertura à mundialidade, como testemunham, entre outras, as numerosas iniciativas de solidariedade, em particular a favor dos países em vias de desenvolvimento.

Com este espírito de sensibilidade e de acolhimento para com aqueles que provêm de diferentes tradições e culturas, preparamo-nos para viver em Colónia a Jornada Mundial da Juventude. O encontro de tantos jovens com o Sucessor de Pedro constitui um sinal da vitalidade da Igreja. Estou feliz por me encontrar no meio dos jovens, para confirmar a sua fé e, se Deus quiser, animar a sua esperança. Ao mesmo tempo, estou persuadido de que também eu receberei algo dos jovens, o facto de que o seu entusiasmo, a sua sensibilidade e a sua disponibilidade me sustentarão e me ajudarão a coragem para continuar ao longo do caminho, ao serviço da Igreja como Sucessor de Pedro, e para enfrentar os desafios do futuro. A todos vós, que estais aqui presentes, e a quantos durante estes dias repletos de acontecimentos, acolheram pessoas de outras regiões do mundo, dirijo desde já a minha mais cordial saudação. Além dos intensos momentos de oração, de reflexão e de festa, juntamente com os jovens e com quantos hão-de participar nas diversas manifestações, terei a oportunidade de me encontrar com os Bispos, aos quais dirijo desde agora a minha fraterna saudação. Sucessivamente, encontrar-me-ei com os representantes das outras Igrejas e Comunidades eclesiais. Terei a honra de visitar a sinagoga, que muito aprecio, para me encontrar com a comunidade judaica e acolherei também os representantes de algumas comunidades muçulmanas. Trata-se de encontros importantes, para intensificar o caminho de diálogo e de cooperação, no comum compromisso em prol da construção de um porvir mais justo e fraterno, que seja verdadeiramente à medida do homem. Todos nós sabemos como é necessário buscar este caminho, como temos necessidade deste diálogo e desta cooperação!

Durante a presente Jornada Mundial da Juventude, reflectiremos em conjunto sobre o tema: "Viemos adorá-lo" (
Mt 2,2). Trata-se de uma oportunidade que não podemos perder, em vista de aprofundar o significado da existência humana como "peregrinação", como caminho percorrido sob a orientação da "estrela", em busca do Senhor. Contemplaremos em conjunto as figuras dos Magos, que nunca poderiam imaginar que se tornariam peregrinos também depois da morte, e que um dia as suas relíquias seriam levadas em peregrinação a Colónia. Contemplaremos estas figuras que, provenientes de diversas terras, foram as primeiras a reconhecer em Jesus Cristo, no Filho da Virgem Maria, o Messias prometido, e a prostrar-se diante dele (cf. Mt 2,1-12). À memória destas figuras emblemáticas estão particularmente vinculadas a Comunidade eclesial e a Cidade de Colónia. Assim como os Magos, também todos os fiéis, em particular os jovens, são chamados a enfrentar o caminho da vida em busca da verdade, da justiça e do amor. Temos o dever de buscar esta estrela, devemos segui-la. Trata-se de um caminho, cuja meta resolutiva só se pode descobrir mediante a descoberta de Cristo, um encontro que não se realiza sem a fé. Neste caminho interior podem servir de ajuda os múltiplos sinais que a longa e rica tradição cristã deixou de maneira indelével nesta terra da Alemanha: dos grandes monumentos históricos às inúmeras obras de arte espalhadas pelo território, dos documentos conservados nas bibliotecas às tradições vividas com a intensa participação popular, do pensamento filosófico à reflexão teológica dos seus numerosos pensadores, da herança espiritual à experiência mística de uma plêiade de santos. Trata-se de um preciosíssimo património cultural e espiritual que ainda hoje, no coração da Europa, dá testemunho da fecundidade da fé e da tradição cristã, e que devemos fazer reviver, porque contém em si uma nova força para o futuro. A Arquidiocese e a Região de Colónia, em particular, conservam a memória viva de grandes testemunhas que, por assim dizer, estão presentes na peregrinação iniciada com os três Magos. Penso em São Bonifácio, em Santa Úrsula, em Santo Alberto Magno e, mais recentemente, em Santa Teresa Benedita da Cruz (Edith Stein) e no Beato Adolfo Kolping. Estes nossos ilustres irmãos na fé, que ao longo dos séculos conservaram alta a chama da santidade, tornaram-se pessoas que viram a estrela e a indicaram aos outros. Estas figuras sejam modelos e padroeiros deste nosso encontro, da Jornada Mundial da Juventude.

Enquanto renovo a todos vós aqui presentes o meu caloroso agradecimento pela amável hospitalidade, rezo ao Senhor pelo caminho futuro da Igreja e de toda a sociedade nesta República Federal da Alemanha, que me é tão querida. A sua longa história e as suas grandes metas sociais, económicas e culturais alcançadas, sirvam de estímulo a prosseguir com renovado compromisso o vosso caminho, num momento de renovados problemas e questões, também para as demais populações do continente. A Virgem Maria, que apresentou o Menino Jesus aos Magos vindos a Belém para adorar o Salvador, continue a interceder por nós, assim como há séculos vela sobre o povo da Alemanha nos numerosos Santuários espalhados pelos Estados alemães. Que o Senhor vos abençoe, a vós aqui presentes, assim como todos os peregrinos e os habitantes do País. Deus proteja a República Federal da Alemanha!




NA FESTA DE ACOLHIMENTO DOS JOVENS Colónia, 18 de Agosto de 2005

Caríssimos jovens!

Sinto-me feliz por me encontrar convosco aqui em Colónia nas margens do Reno! Viestes de várias partes da Alemanha, da Europa, do mundo, fazendo-vos peregrinos pelo caminho dos Magos.

Seguindo as suas pegadas quereis descobrir Jesus. Aceitastes pôr-vos a caminho para contemplar vós também de modo pessoal e ao mesmo tempo comunitário, o rosto de Deus revelado no menino do Presépio. Como vós, também eu me pus a caminho para vir juntamente convosco ajoelhar-me diante da branca Hóstia consagrada na qual os olhos da fé reconhecem a presença real do Salvador do mundo. Juntamente continuaremos a meditar sobre o tema desta Jornada Mundial da Juventude: "Viemos adorá-lo" (Mt 2,2).

Caríssimos jovens, é com grande alegria que vos saúdo e vos acolho, a vós que viestes aqui de perto e de longe, caminhando pelas estradas do mundo e pelas veredas da vossa vida. Dirijo uma saudação particular a quantos vieram do "Oriente" como os Magos. Vós sois os representantes das numerosas multidões de irmãos e irmãs nossos em humanidade, que aguardam sem o saber o aparecimento da estrela nos respectivos céus para serem guiados até Cristo, Luz dos Povos, e para encontrar n'Ele a resposta que sacia a sede dos seus corações. Saúdo com afecto também todos os que, entre vós, não são baptizados, quantos ainda não conhecem Cristo ou não se reconhecem na Igreja. Precisamente a vós o Papa João Paulo II dirigiu um convite particular para este encontro; agradeço-vos terdes decidido vir a Colónia. Alguns de vós poderiam talvez fazer a descrição que Edith Stein fez da sua adolescência, ela, que viveu sucessivamente no Carmelo de Colónia: "Tinha consciente e propositadamente perdido o costume de rezar". Durante estes dias, podereis fazer de novo a experiência comovedora da oração como diálogo com Deus, pelo qual sabemos que somos amados e o qual, por nossa vez, desejamos amar. Gostaria de dizer a todos com insistência: abri o vosso coração a Deus, deixai-vos surpreender por Cristo! Concedei-lhe o "direito de vos falar" durante estes dias! Abri as portas da vossa liberdade ao seu amor misericordioso! Exponde as vossas alegrias e as vossas tristezas a Cristo, deixando que Ele ilumine com a sua luz a vossa mente e alcance com a sua graça o vosso coração. Nestes dias abençoados de partilha e de alegria, fazei a experiência libertadora da Igreja como lugar da misericórida e da ternura de Deus para com os homens. Na Igreja e mediante a Igreja alcançareis Cristo que vos aguarda.

Hoje, ao chegar a Colónia para participar convosco na XX Jornada Mundial da Juventude, torna-se espontâneo recordar com emoção e reconhecimento o Servo de Deus tão amado por todos nós, João Paulo II, que teve a ideia luminosa de convocar os jovens do mundo inteiro para celebrar juntos Cristo, único Redentor do género humano. Graças ao diálogo profundo que se desenvolveu durante mais de vinte anos entre o Papa e os jovens, muitos deles puderam aprofundar a fé, estabelecer vínculos de comunhão, apaixonar-se pela Boa Nova da salvação em Cristo e proclamá-la em tantas partes da terra. Este grande Papa soube compreender os desafios que se apresentam aos jovens de hoje e, confirmando a sua confiança neles, não hesitou desafiá-los para que fossem corajosos anunciadores do Evangelho e construtores audazes da civilização da verdade, do amor e da paz.

Hoje compete a mim receber esta extraordinária herança espiritual que o Papa João Paulo II nos deixou. Ele amou-vos, vós o compreendestes e retribuístes com a espontaneidade da vossa idade. Agora, todos juntos, temos a tarefa de pôr em prática os seus ensinamentos. Estamos aqui em Colónia, peregrinos no seguimento dos Magos, com este compromisso. Segundo a tradição, os seus nomes em língua grega eram Melchior, Gaspar e Baltasar. No seu Evangelho, Mateus transcreve a pergunta que ardia no coração dos Magos: "Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer" (Mt 2,2). Procurar Jesus era o motivo pelo qual tinham enfrentado a longa viagem até Jerusalém. Por isso tinham suportado fadigas e privações sem ceder ao desencorajamento e à tentação de retroceder nos seus passos. Agora, que estavam próximos da meta, não tinham outra pergunta a fazer a não ser esta. Também nós viemos a Colónia porque sentíamos no coração a insistência, mesmo se de outra forma, da mesma pergunta que estimulava os homens do Oriente a pôr-se a caminho. É verdade que nós hoje já não procuramos um rei; mas estamos preocupados pela condição do mundo e perguntamos: onde encontro os critérios para a minha vida, os critérios para colaborar de modo responsável na edificação do presente e do futuro do nosso mundo? Em quem posso confiar de quem posso confiar? Onde está Aquele que me pode oferecer a resposta satisfatória para as expectativas do coração? Fazer estas perguntas significa antes de tudo reconhecer que o caminho não termina enquanto não se encontra Aquele que tem o poder de instaurar o Reino universal de justiça e de paz pelo qual os homens aspiram, mas que não sabem construir sozinhos. Fazer tais perguntas significa procurar Alguém que não se engana e não pode enganar e por isso é capaz de oferecer uma certeza tão firme que permite viver por ela e, nesse caso, também morrer por ela.

59 Queridos amigos, quando se apresenta no horizonte da existência esta resposta é preciso saber fazer as opções necessárias. É como quando nos encontramos numa encruzilhada: que caminho empreender? O que é sugerido pelas paixões ou o que é indicado pela estrela que brilha na consciência? Os Magos, ao ouvir a resposta: "Em Belém da Judeia, pois assim foi escrito pelo profeta" (Mt 2,5), escolheram prosseguir o caminho e ir até ao fundo, iluminados por esta palavra. De Jerusalém foram a Belém, isto é, da palavra que lhes indicava onde estava o Rei dos Judeus que procuravam até ao encontro com aquele Rei que era ao mesmo tempo o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo. Aquela palavra também nos é dita a nós. Também nós devemos fazer a nossa opção. Na realidade, considerando bem, é precisamente esta experiência que fazemos na participação em cada Eucaristia. De facto, em cada Missa, o encontro com a Palavra de Deus introduz-nos na participação no mistério da cruz e ressurreição de Cristo e assim introduz-nos na Mesa eucarística, na união com Cristo. Sobre o altar está presente Aquele que os Magos viram deitado na manjedoura: Cristo, o Pão vivo que desceu do céu para dar a vida ao mundo, o verdadeiro Cordeiro que dá a própria vida pela salvação da humanidade. Iluminados pela Palavra, é sempre em Belém na "Casa do pão" que podemos fazer o encontro arrebatador com a grandeza inconcebível de um Deus que se humilhou a ponto de se mostrar na manjedoura, de se oferecer como alimento no altar.

Podemos imaginar a admiração dos Magos diante do Menino envolvido em panos! Só a fé lhes permitiu reconhecer nas feições daquele menino o Rei que procuravam, o Deus para o qual a estrela os tinha orientado. N'Ele, preenchendo o abismo entre o finito e o infinito, entre o visível e o invisível, o Eterno entrou no tempo, o Mistério revelou-se entregando-se a nós nos membros frágeis de um pequeno menino. "Os Magos estão admirados diante do que vêem; o céu sobre a terra e a terra no céu; o homem em Deus e Deus no homem; vêem contido num corpo pequenino quem não pode ser contido por todo o mundo" (São Pedro Crisólogo, Sermão 160, n. 2). Durante estes dias, neste "Ano da Eucaristia", dirigir-nos-emos com a mesma admiração para Cristo presente no Tabernáculo da misericórdia, no Sacramento do Altar.

Queridos jovens, a felicidade que procurais, a felicidade que tendes o direito de saborear tem um nome, um rosto: o de Jesus de Nazaré, oculto na Eucaristia. Só ele dá plenitude de vida à humanidade! Com Maria, dizei o vosso "sim" àquele Deus que deseja oferecer-se a vós. Repito-vos hoje o que disse no início do meu pontificado: "Quem faz entrar Cristo [na própria vida] nada perde, nada absolutamente nada do que torna a vida livre, bela e grande. Não, só nesta amizade se abrem de par em par as portas da vida. Só nesta amizade desabrocham realmente as grandes potencialidades da condição humana. Só nesta amizade nós experimentamos o que é belo e o que liberta" (Homilia para o início do ministério de Supremo Pastor, 24 de Abril de 2005). Disto estai plenamente convictos: Cristo de nada vos priva do que tendes em vós de belo e de grande, mas tudo leva à perfeição para glória de Deus, a felicidade dos homens e a salvação do mundo.

Nestes dias convido-vos a comprometer-vos sem reservas a servir Cristo, custe o que custar. O encontro com Jesus Cristo permitir-vos-á saborear interiormente a alegria da sua presença viva e vivificante para depois a testemunhar à nossa volta. Que a vossa presença nesta cidade já seja o primeiro sinal de anúncio do Evangelho mediante o testemunho do vosso comportamento e da vossa alegria de viver. Façamos com que do nosso coração se eleve um hino de louvor e de acção de graças ao Pai pelos numerosos benefícios que nos concedeu e pelo dom da fé que celebraremos juntos, manifestando-o ao mundo daqui, desta terra colocada no centro da Europa, de uma Europa que muito deve ao Evangelho e aos seus testemunhos ao longo dos séculos.

Far-me-ei agora peregrino à catedral de Colónia para ali venerar as relíquias dos santos Magos, que aceitaram abandonar tudo para seguir a estrela que os guiava para o Salvador do género humano. Também vós, queridos jovens, já tivestes, ou tereis, a ocasião para fazer a mesma peregrinação. Estas relíquias mais não são do que o sinal frágil e pobre do que eles foram e do que viveram há tantos séculos. As relíquias orientam-nos para o próprio Deus; de facto, é Ele que, com a força da sua graça, concede aos seres frágeis a coragem de o testemunhar diante do mundo.

Convidando-nos a venerar os restos mortais dos mártires e dos santos, a Igreja não se esquece que, em última análise, se trata realmente de pobres ossos humanos, mas de ossos que pertenciam a pessoas visitadas pelo poder vivo de Deus. As relíquias dos santos são vestígios daquela presença invisível mas real que ilumina as trevas do mundo, manifestando o Reino dos céus que está dentro de nós. Elas bradam connosco e por nós: "Maranatha!" "Vem, Senhor Jesus!".

Caríssimos, despeço-me de vós com estas palavras e marco encontro convosco para a vigília de sábado à noite. A todos vós, até à próxima!





POR OCASIÃO DA VISITA À CATEDRAL DE COLÓNIA 18 de Agosto de 2005

Caros irmãos e irmãs!

Alegro-me por estar aqui convosco esta tarde, nesta cidade de Colónia, à qual me ligam tantas bonitas recordações. Passei os primeiros anos da minha carreira académica em Bonn, anos inesquecíveis de despertar da juventude, de esperança antes do Concílio, anos em que vinha frequentemente a Colónia e aprendi a amar esta Roma do Norte. Aqui respira-se a grande história e a corrente do rio doa abertura ao mundo. É um lugar de encontro, de cultura. Sempre amei o estado de espírito, o bom humor, a alegria e a inteligência dos seus habitantes. Além disso, devo dizer, a catolicidade que os habitantes de Colónia têm no sangue, porque os cristãos estão aqui há mais de dois mil anos e assim a catolicidade penetrou no carácter do seu povo, no sentido de uma religiosidade alegre. Por isso hoje nos alegramos. Colónia pode doar aos jovens algo desta sua alegre catolicidade que é antiga e ao mesmo tempo jovem.

Foi muito bom para mim o facto de que o então Arcebispo, Cardeal Frings, desde o início me deu a sua total confiança, instaurando comigo uma amizade autenticamente paterna. Depois fez-me um grande dom, embora eu fosse jovem e inexperiente, de me chamar como seu teólogo, de me levar a Roma para que pudesse participar ao seu lado no Concílio Vaticano II e viver de perto esse extraordinário, grande evento histórico, contribuindo um pouco para ele.

60 Conheci também o Cardeal Höffner, então Bispo de Monastério, com o qual igualmente me ligou uma profunda e viva amizade. Graças a Deus esta corrente das amizades não se rompeu. Também o Cardeal Meisner é meu amigo desde há muito tempo, assim, a partir do Cardeal Frings, e continuando com Höffner e Meisner, pude sentir-me sempre em casa aqui em Colónia.

Agora creio que chegou o momento de agradecer a tantas pessoas com voz forte e do profundo do coração. Antes de tudo, damos graças ao bom Deus que nos concede o bonito céu azul e abençoa sensivelmente estes dias. Agradecemos à Mãe de Deus, que orienta a Jornada Mundial da Juventude. Agradeço ao Cardeal Meisner e a todos os seus colaboradores; ao Cardeal Lehmann, Presidente da Conferência Episcopal Alemã, e com ele a todos os Bispos das dioceses da Alemanha, em especial ao Comité organizador das Jornadas, e também às dioceses e às comunidades locais que nestes últimos dias acolheram os jovens. Posso imaginar o que signifique tudo isto em termos de energias empregadas e de sacrifícios suportados e desejo que se revele fecundo para o êxito espiritual desta Jornada Mundial da Juventude. Por fim, manifesto a minha gratidão às autoridades civis e militares, aos responsáveis municipais e regionais, ao corpo de polícia e aos agentes de segurança da Alemanha e do Land Renânia do Norte-Vestfália. Agradeço na pessoa do Presidente da Câmara desta cidade a toda a população de Colónia pela compreensão demonstrada diante da "invasão" de tantos jovens provenientes de todas as partes do mundo.

A cidade de Colónia não seria o que é sem os Reis Magos, que tanto determinaram a sua história, a sua cultura e a sua fé. Aqui a Igreja celebra, num certo sentido, durante todo o ano a festa da Epifania! Portanto, antes de me dirigir a vós, queridos habitantes de Colónia, de vos saudar, quis recolher-me em oração por alguns instantes diante do relicário dos três Reis Magos, dando graças a Deus pelo seu testemunho de fé, esperança e amor. Sabeis que no ano 1164, as relíquias destes Sábios do Oriente, escoltadas pelo Arcebispo de Colónia Reinald von Dassel, atravessaram os Alpes partindo de Milão, para chegar a Colónia, onde foram acolhidas com grandes manifestações de alegria. Peregrinando pela Europa, tais relíquias deixaram evidentes vestígios que ainda hoje subsistem nos topônimos e na devoção popular. Para os Reis Magos, Colónia mandou confeccionar o relicário mais precioso de todo o mundo cristão e elevou sobre ele um relicário ainda maior: a Catedral de Colónia. Com Jerusalém, a "Cidade Santa", com Roma a "Cidade Eterna", com Santiago de Compostela na Espanha, Colónia, graças aos Magos, tornou-se ao longo dos séculos um dos lugares de peregrinação mais importante do Ocidente cristão.

Não posso continuar a tecer os elogios a Colónia, embora fosse possível e significativo fazê-lo: mas, duraria demasiado tempo, porque sobre Colónia precisaria dizer muitas coisas grandes e bonitas. Contudo, gostaria de lembrar que nós aqui veneramos Santa Úrsula e as suas companheiras; que no ano 745 o Santo Padre nomeou Arcebispo de Colónia São Bonifácio; que aqui trabalhou Alberto Magno, um dos maiores eruditos da Idade Média, cujas relíquias são veneradas na igreja de Santo André; que Tomás de Aquino, o maior teólogo do Ocidente, aqui estudou e ensinou; que no século XIX Adolfo Kolping fundou uma importante obra social; que Edith Stein, judia convertida, viveu aqui em Colónia no Carmelo, antes de ter que fugir para o Carmelo de Echt, na Holanda, e ter sido, depois, deportada para Auschwitz, onde morreu mártir.

Graças a estas e a todas as demais pessoas, famosas e desconhecidas, Colónia possui um grande património de santos. Gostaria pelo menos de dizer ainda que, pelo que sei, aqui em Colónia um dos três Magos foi identificado como um Rei mouro da África, de forma que um representante do Continente africano, foi considerado uma das primeiras testemunhas de Jesus Cristo. Além disso, gostaria de acrescentar que aqui em Colónia surgiram grandes iniciativas exemplares, cuja acção se difundiu em todo o mundo, como "Misereor", "Adveniat" e "Renovabis".

Agora vós estais aqui, jovens do mundo inteiro, representantes daqueles povos longínquos que reconheceram Cristo através dos Magos e que foram reunidos no novo Povo de Deus, a Igreja, que acolhe homens e mulheres de todas as culturas. Vós, queridos jovens, tendes hoje a tarefa de viver o sentido universal da Igreja. Deixai-vos inflamar pelo fogo do Espírito, para que um novo Pentecostes possa realizar-se entre vós e renovar a Igreja. Que através de vós, os vossos coetâneos de todas as partes da terra consigam reconhecer em Cristo a verdadeira resposta das suas expectativas e abrir-se ao acolhimento do Verbo de Deus encarnado, que morreu e ressuscitou para que Deus esteja no meio de nós e nos de a verdade, o amor e a alegria à qual todos nós almejamos. Deus abençoe estas jornadas.




À COMUNIDADE HEBRAICA Sexta-feira, 19 de Agosto de 2005

19805
Ilustres Autoridades hebraicas
Gentis Senhoras
Ilustres Senhores

Saúdo todos aqueles que já foram mencionados. Shalom lêchém! Por ocasião da minha primeira visita à Alemanha depois da eleição como Sucessor do Apóstolo Pedro, manifestei o profundo desejo de me encontrar com a comunidade judaica de Colónia e com os representantes do judaísmo alemão. Com esta visita, gostaria de me referir ao acontecimento de 17 de Novembro de 1980, quando o meu venerado Predecessor, o Papa João Paulo II, na sua primeira viagem à Alemanha, se encontrou em Mogúncia com a Comissão Central Judaica Alemã e com a Conferência Rabínica. Quero confirmar, também nesta circunstância, que tenho a intenção de dar continuidade, com grande vigor, ao caminho rumo ao melhoramento das relações e da amizade com o povo hebraico, ao longo do qual o Papa João Paulo II deu passos decisivos (cf. Discurso à Delegação da Comissão Judaica Internacional para as Consultas Inter-Religiosas).

A comunidade hebraica de Colónia pode sentir-se verdadeiramente "em casa". Com efeito, esta é a sede mais antiga de uma comunidade hebraica no território alemão, pois soubemos com exactidão que ela remonta à Colónia da época romana. A história dos relacionamentos entre a comunidade judaica e a comunidade cristã tem sido complexa e muitas vezes dolorosa. Houve abençoados períodos de boa convivência, mas verificou-se também a expulsão dos hebreus de Colónia no ano de 1424. Depois, no século XX, no período mais obscuro da história alemã e europeia, uma insensata ideologia racista de matriz neopagã deu origem à tentativa, projectada e sistematicamente actuada pelo regime, de exterminar o hebraísmo europeu: então, teve lugar aquilo que passou para a história como o Shoah. Somente em Colónia, contam-se onze mil vítimas deste crime inaudito, e até àquele momento também inimaginável, que são conhecidas pelo seu próprio nome; na realidade, sem dúvida, elas foram muito mais numerosas. Nessa época, deixou-se de reconhecer a santidade de Deus e, por este motivo, espezinhou-se também a sacralidade da vida humana.

Neste ano de 2005, celebra-se o 60º aniversário da libertação dos campos de concentração nazistas, em que milhões de hebreus homens, mulheres e crianças foram mortos nas câmaras de gás e queimados nos fornos crematórios. Faço minhas as palavras escritas pelo meu venerado Predecessor, por ocasião do 60º aniversário da libertação de Auschwitz, e também eu digo: "Inclino a cabeça diante de todos os que experimentaram aquelas manifestações do mysterium iniquitatis" (Mensagem por ocasião do 60º aniversário da libertação dos presos do campo de concentração de Auschwitz-Birkenau, 15 de Janeiro de 2005). Os acontecimentos terríveis dessa época devem "despertar incessantemente as consciências, extinguir os conflitos e exortar à paz" (Ibidem). Todos juntos, devemos recordar-nos de Deus e do seu desígnio sábio para o mundo, por Ele criado: como nos recorda o Livro da Sabedoria, Ele "ama a vida" (11, 26).

No corrente ano comemora-se também o 40º aniversário da promulgação da Declaração Nostra aetate, do Concílio Ecuménico Vaticano II, que abriu novas perspectivas nas relações judaico-cristãs, sob o sinal do diálogo e da solidariedade. No número 4 desta Declaração recordam-se as nossas raízes comuns e o preciosíssimo património espiritual que os judeus e os cristãos compartilham uns com os outros. Tanto os judeus como os cristãos reconhecem em Abraão o seu Pai na fé (cf.
Ga 3,7 Rm 4,11s.), e têm como ponto de referência os ensinamentos de Moisés e dos profetas. Tanto a espiritualidade dos judeus como a dos cristãos recebem o alimento dos Salmos. Juntamente com o Apóstolo Paulo, os cristãos estão convencidos de que "os dons e o chamamento de Deus são irrevogáveis" (Rm 11,29 cf. Rm 9,6 Rm 9,11 Rm 11,1s.). Em consideração da raiz judaica do cristianismo (cf. Rm 11,16-24), o meu venerado Predecessor, confirmando um juízo dos Bispos alemães, asseverou: "Quem se encontra com Jesus Cristo, descobre o judaísmo" (Insegnamenti, vol. III/2, 1980, pág. 1272).

Por conseguinte, a Declaração conciliar Nostra aetate "deplora todos os ódios, perseguições e manifestações de anti-semitismo, efectuadas em qualquer tempo e por quaisquer pessoas, contra os judeus" (NAE 4). Deus criou todos nós "à sua imagem" (cf. Gn 1,27), honrando-nos assim com uma dignidade transcendente. Diante de Deus, todos os homens têm a mesma dignidade, independentemente do povo, da cultura ou da religião a que pertencem. Por este motivo, a Declaração Nostra aetate fala com grande estima também dos muçulmanos (cf. NAE 3) e dos fiéis pertencentes às outras religiões (cf. NAE 2). Tendo como base a dignidade humana comum de todos, a Igreja Católica "reprova como contrária ao espírito de Cristo qualquer discriminação entre os homens, ou qualquer perseguição feita por questões de raça ou de cor, de condição social ou de religião" (Ibid., NAE 5). A Igreja está consciente do seu dever de transmitir, tanto mediante a catequese destinada aos jovens como em todos os aspectos da sua vida, esta doutrina às novas gerações que não foram testemunhas dos terríveis acontecimentos ocorridos antes e durante a segunda guerra mundial. Trata-se de uma tarefa de especial importância, dado que nos dias de hoje, infelizmente, voltam a surgir sinais de anti-semitismo e manifestações de várias formas de hostilidade generalizada em relação aos estrangeiros. Como deixar de ver nisto um motivo de preocupação e de vigilância? A Igreja Católica compromete-se reitero-o inclusive nesta circunstância em prol da tolerância, do respeito, da amizade e da paz entre todos os povos, as culturas e as religiões.

Durante os quarenta anos que transcorreram desde a publicação da Declaração conciliar Nostra aetate, na Alemanha e a nível internacional muito já se fez pelo melhoramento e o aprofundamento dos relacionamentos entre os judeus e os cristãos. Além das relações oficiais, graças sobretudo à colaboração entre os especialistas em ciências bíblicas, nasceram também muitas amizades. A este propósito, recordo as várias declarações da Conferência Episcopal da Alemanha e a actividade benéfica da "Sociedade para a Colaboração Cristão-Judaica de Colónia", que contribuíram para fazer com que a comunidade hebraica, a partir de 1945, pudesse sentir-se verdadeiramente "em casa" aqui em Colónia e instaurasse uma boa convivência com as comunidades cristãs. Porém, ainda há muito a fazer. Temos o dever de nos conhecermos muito mais e melhor uns aos outros.

Por isso, encorajo um diálogo sincero e confiante entre os judeus e os cristãos: somente assim será possível chegar a uma interpretação conjunta acerca de questões históricas ainda abertas e, sobretudo, dar passos em frente na avaliação sob o ponto de vista teológico da relação entre o judaísmo e o cristianismo. Se quiser ser sincero, este diálogo não deverá esquecer nem subestimar as diferenças existentes: mesmo nos aspectos que, em virtude da nossa íntima convicção de fé, nos distinguem uns dos outros aliás, de forma específica em tais aspectos devemos respeitar-nos e amar-nos reciprocamente.

Enfim, o nosso olhar não deveria voltar-se unicamente para trás, para o passado, mas dirigir-se também para a frente, rumo às tarefas de hoje e de amanhã. O nosso precioso património comum e o nosso relacionamento fraterno, inspirado na confiança crescente, obrigam-nos a dar um testemunho conjunto ainda mais concorde, colaborando no plano prático para a defesa e a promoção dos direitos do homem e da sacralidade da vida humana, para os valores da família, da justiça social e da paz no mundo. O Decálogo (cf. Ex 20 Dt 5) é para nós um património e um compromisso conjuntos. Os dez mandamentos não são um peso, mas a indicação do caminho em vista de uma vida bem sucedida. São-no particularmente para os jovens, com quem me encontro nestes dias e por quem nutro um grande afecto. Formulo bons votos a fim de que eles saibam reconhecer no Decálogo este nosso fundamento comum a lâmpada para os seus passos, a luz para o seu caminho (cf. Sl Ps 119,105). Aos jovens, os adultos têm a responsabilidade de transmitir a chama da esperança, que por Deus foi concedida tanto aos judeus como aos cristãos, a fim de que "nunca mais" as forças do mal cheguem ao domínio, e para que as gerações vindouras, com o auxílio de Deus, possam construir um mundo mais justo e pacífico, em que todos os homens tenham o mesmo direito de cidadania.

Concluo com as palavras do Salmo 29 [28], que são os meus bons votos e também uma prece: "O Senhor dá força ao seu povo; o Senhor abençoa o seu povo com a paz" (v. 11).
Que Ele nos ouça!





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