Discursos Bento XVI 90

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Sábado, 22 de Outubro de 2005



Caros Irmãos no Episcopado
e no Sacerdócio,
Irmãos e Irmãs

Com este almoço solene chegamos, praticamente, ao ponto do "Ite, Missa est" do nosso Sínodo, embora celebraremos amanhã a conclusão verdadeira com a Sagrada Eucaristia. Num certo sentido, terminamos aqui o nosso estar juntos, o nosso debate, os nossos momentos convivais.

No uso pré-cristão da expressão, "Ite, Missa est" era somente uma fórmula para dizer: "a assembleia chegou ao fim". A Liturgia romana escolheu esta expressão tão sóbria para dizer: "agora esta nossa assembleia acabou". Contudo, pouco a pouco ela encontrou um significado mais profundo. Na Roma Antiga queria dizer: "chegou ao fim". "Missa" significava "demissão". Agora não é mais "demissão" mas "missão", porque esta assembleia não é uma assembleia técnica, burocrática, mas um encontro com o Senhor que toca os nossos corações e nos dá uma vida nova.

Assim também nós, após este Sínodo, regressamos a casa não somente com muito papel impresso não obstante precioso mas sobretudo com um amor renovado e mais profundo pelo Senhor, pela sua Igreja, e neste sentido também com um novo compromisso a assumir, a fim de que a missão do Senhor seja realizada e o Evangelho chegue a todos.

Mas, neste momento convém não só falar destas coisas elevadas, que são o coração do nosso estar juntos, mas também exprimir alegria e gratidão pelas coisas deste mundo, por assim dizer. O Senhor não teria escolhido a imagem do banquete para prefigurar o Céu, se não tivesse aprovado também a beleza de um almoço, estar juntos, comer em companhia, a alegria também das coisas deste mundo, que foram criadas por Ele. Dessa maneira, agradeço a todos os que organizaram este almoço, aos que o serviram, prepararam. Parece-me que, em nome de todos, posso afirmar que era um almoço realmente digno deste Sínodo!

Renovo o meu agradecimento a todos, começando pelos Presidentes Delegados, Relatores, Secretário-Geral, todos os Padres que contribuíram com o Sínodo, até àqueles que trabalharam nos bastidores. Um grande obrigado a todos! Levamos connosco, no nosso coração, esta gratidão, também por esta experiência de fraternidade.

Volto mais uma vez ao "Ite, Missa est". Muitas traduções modernas acrescentaram a esta sóbria expressão do rito romano a palavra de conclusão do rito bizantino: "Ide em paz". Faço minhas estas palavras neste momento. Caros Irmãos e Irmãs, ide em paz! Estamos cientes de que esta paz de Cristo não é uma paz estática, somente uma espécie de repouso, mas é uma paz dinâmica que quer transformar o mundo para que seja um mundo de paz animado pela presença do Criador e Redentor. Neste sentido, com um grande obrigado, digo: vamos em paz!




NO FINAL DO CONCERTO REALIZADO PELOS "REGENSBURGER DOMSPATZEN" NA CAPELA SISTINA Sábado, 22 de Outubro de 2005

Queridos amigos

91 No final desta bonita execução musical, tenho a certeza de interpretar o pensamento de todos os presentes expressando profunda gratidão aos Regensburger Domspatzen, magistralmente guidos pelo Director Roland Büchner e acompanhados pela Orquestra Franz Josef Stoiber. Pudemos apreciar alguns maravilhosos trechos musicais, enquanto o olhar vagueava pelas obras-primas de Michelangelo e de outros pintores conhecidos, cujas criações artísticas estão aqui conservadas.

Escutando, vinha espontâneo à mente o Salmo 84: "Como são amáveis as tuas moradas, / ó Senhor do universo! [...] Até os pássaros encontram abrigo a palavra alemã para "pássaros" é "Spatzen" e as andorinhas um ninho, para os seus filhos, / junto dos teus altares, Senhor do universo / meu rei e meu Deus. / Felizes os que habitam na tua casa / e te louvam sem cessar!" (vv. 2. 4-5). Felizes os jovens deste coro famoso, que puderam cantar o louvor de Deus no maravilhoso cenário da Capela Sistina. E felizes de nós que, ouvindo o seu canto, nos sintonizamos com o seu louvor.

Confrontando-nos nesta noite sobretudo com maestros do Século XIX com grandes nomes, mas também com compositores pouco conhecidos fora do ambiente eclesiástico deste-nos uma grande alegria precisamente com a variedade do programa. Todos os cantos por vós executados pertencem a uma espécie de música que, tendo nascido da inspiração da fé, conduz de novo à fé e à oração é música que desperta em nós a alegria em Deus. Ouvindo, senti-me transportado aos meus anos de Ratisbona tempos belos quando através do meu irmão também eu me pude integrar um pouco na família dos Domspatzen. No final dos trinta anos de trabalho com o vosso Coro, ele disse: "O bom Deus não me podia ter confiado uma tarefa mais bela". Este não foi apenas um agradecimento pessoal por uma chamada maravilhosa; foi ao mesmo tempo um desejo: que os Domspatzen continuem a ser mensageiros do belo, mensageiros da fé, mensageiros de Deus neste mundo, e encontrem sempre segundo a sua chamada principal o centro das suas actividades no serviço litúrgico para glória de Deus.

O orante do Salmo 84 vê-se a si próprio como um pássaro que encontrou junto do altar de Deus o lugar da sua colocação preferida, o lugar onde pode habitar e ser "bem-aventurado". A imagem do pássaro é uma imagem jubilosa, mediante a qual o salmista quer dizer que toda a sua vida se tornou um canto. Ele pode cantar e voar. O próprio cantar é quase voar, elevar-se para Deus, antecipar de certa forma a eternidade, quando poderemos "cantar continuamente os louvores de Deus". É nesta perspectiva que dirijo a todos os presentes os meus votos mais cordiais, invocando sobre cada um a bênçao de Deus.




AOS PEREGRINOS QUE VIERAM A ROMA PARA AS CANONIZAÇÕES Segunda-feira, 24 de Outubro de 2005


Amados irmãos e irmãs!

Depois da solene celebração de ontem, sinto-me feliz por me encontrar de novo convosco. Viestes para prestar homenagem aos cinco novos Santos: José Bilczewski, Sigismundo Gorazdowski, Alberto Hurtado Cruchaga, Caetano Catanoso e Félix de Nicósia. Saúdo-vos a todos cordialmente e agradeço-vos o afecto que me manifestastes. Saúdo os Cardeais presentes, os Bispos, os Sacerdotes, assim como as distintas Autoridades civis; saúdo as Religiosas e os Religiosos e todos os fiéis leigos.

Dou as boas-vindas aos Pastores e aos fiéis da Ucrânia. Saúdo os representantes das Autoridades estatais. Hoje agradecemos a canonização dos dois grandes santos: o Bispo José Bilczewski e o sacerdote Sigismundo Gorazdowski. Os dois realizaram o seu sacerdócio unidos a Cristo e totalmente dedicados aos homens. A oração, o amor à Eucaristia e a prática da caridade eis o caminho da sua santidade. À protecção destes santos Padroeiros confio a Igreja na Ucrânia e todo o Povo ucraniano. Queira Deus, pela sua intercessão, abençoar todos abundantemente.

Saúdo cordialmente os polacos aqui presentes. Sinto-me feliz por podermos juntos prestar glória aos novos Santos. Podemos descrever a santidade de José Bilczewski com três palavras: oração, trabalho, abnegação. "Ser tudo para todos a fim de salvar pelo menos um" este era o desejo de São Sigismundo Gorazdowski. Os dois, haurindo força da oração e da Eucaristia, doaram-se totalmente a Deus e levaram de modo eficaz uma ajuda material e espiritual aos mais necessitados. Confio todos os fiéis da Igreja que está na Polónia à sua protecção e, de modo particular, os Bispos e os sacerdotes. Deus vos abençoe.

Uma figura insigne da Nação chilena é o Padre Alberto Hurtado Cruchaga, sacerdote da Companhia de Jesus, que ontem tive a alegria de canonizar. Ao encontrar-me aqui convosco, queridos irmãos e irmãs, sinto-me muito próximo de todo o povo do Chile. Desejo que a minha saudação chegue também a quantos estão espiritualmente unidos a esta grande festa de acção da graças e de louvor ao Senhor pela proclamação do novo Santo. O objectivo da sua vida foi ser outro Cristo. Assim, compreende-se melhor a sua consciência filial diante do Pai, o seu espírito de oração, o seu grande amor a Maria, a sua generosidade em doar-se totalmente, a sua entrega e serviço aos pobres. À luz da verdade do Corpo Místico, fez seus os sofrimentos do próximo, o que o levou a uma maior dedicação aos pobres, fundando para eles o "Lar de Cristo". É grandioso que hoje esteja aqui presente um grupo representativo desse centro, dando testemunho do ambiente familiar que o nosso Santo lhe conferiu e que continua a contar com a colaboração de muitas pessoas de boa vontade. A vida do Padre Hurtado convida todos à responsabilidade, mas especialmente à santidade. Que santo Alberto Hurtado interceda por todos, para que leveis aos vossos lares, comunidades eclesiais e âmbitos sociais, a luz que deu esplendor à sua vida e alegria ao seu coração.

A minha saudação dirige-se agora para vós, queridos amigos devotos de São Caetano Catanoso. Penso de modo especial nos fiéis da Arquidiocese de Régio Calábria-Bova, à qual ele pertencia, assim como às Irmãs Verónicas da Sagrada Face. O Padre Caetano viveu em plenitude o ministério presbiteral desde o dia da sua Ordenação, em 1902, até à morte ocorrida em 1963, foi autêntico servo do Povo de Deus a ele confiado, primeiro num pequeno centro "aspromontano", depois numa grande paróquia de cidade. Anunciou o Reino de Deus com fervor apostólico e com a convicção da testemunha; administrou os Sacramentos, e sobretudo a divina Eucaristia, imergindo-se todos os dias no mistério do amor oblativo de Cristo. Pôs-se ao serviço dos últimos, dos mais distantes, aos quais abriu o coração e deu esperança; dedicou-se às crianças pobres e abandonadas, com uma intensa obra de evangelização e de promoção humana. Para ir ao encontro das pessoas necessitadas, fundou uma congregação inspirada na figura da "Verónica", isto é, com o dom de reconhecer a Sagrada Face na dos irmãos, para os amar e servir.

92 Agora saúdo-vos a vós, que viestes para participar na Canonização de Félix de Nicósia e, em particular, os Frades Menores Capuchinhos e o numeroso grupo de peregrinos provenientes da Sicília. Queridos irmãos e irmãs, o novo Santo não só representa as características mais fortes e radicadas da vossa Terra, mas com a sua existência totalmente permeada pelo Evangelho enriquece a longa tradição de santidade e de cultura cristã que floresceu desde a antiguidade na Ilha. Num mundo fortemente tentado pela busca da aparência e do bem-estar egoísta, são Félix recorda a todos que a alegria verdadeira muitas vezes está escondida atrás de pequenas coisas e se alcança fazendo o próprio dever quotidiano com espírito de serviço. Desejo de coração que, com a sua ajuda e a sua intercessão, possais fazer vossa a grande mensagem de fé e de espiritualidade que ainda hoje o Santo de Nicósia continua a enviar aos seus irmãos de hábito e a todos os fiéis: aderir cada mais profundamente à vontade de Deus, para encontrar nela a paz verdadeira, realização plena de si mesmo e júbilo perfeito.

Queridos irmãos e irmãs, todos juntos damos graças a Deus, que não cessa de suscitar na Igreja sempre novos exemplos resplandecentes de santidade. Invocamos os Santos e Beatos como protectores e contamos com a sua ajuda celeste. Ao mesmo tempo, contudo, somos estimulados pelo seu testemunho a imitá-los para crescer na fé, na esperança e na caridade. Confio todos vós à intercessão destes novos Santos, para que cada um de vós possa levar no coração um raio da santidade de Deus e reflecti-lo em todas as circunstâncias da vida. Vele sobre vós sobretudo Maria Santíssima, a Rainha dos Santos, e vos acompanhe a minha Bênção, que de coração faço extensiva às vossas famílias e a todos os vossos entes queridos.



SAUDAÇÃO NO FINAL DA CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA DE BEATIFICAÇÃO DOS MÁRTIRES JOSEP TÁPIES E SEIS COMPANHEIROS SACERDOTES E DE MARIA DE LOS ÁNGELES GINARD MARTÍ 29 de Outubro de 2005


Queridos irmãos e irmãs!

No final desta celebração eucarística, durante a qual foram beatificados os mártires Josep Tápies e seis companheiros sacerdotes, e a mártir Maria de los Ángeles Ginard Martí, sinto-me feliz por me unir a vós que viestes de diversas partes para lhes prestar homenagem. Saúdo com afecto os meus Irmãos Bispos, as distintas Autoridades e também os sacerdotes, os religiosos e os fiéis aqui presentes.

Os sacerdotes exemplares da Diocese de Urgell imolaram a sua vida durante a perseguição religiosa na Espanha por fidelidade ao ministério sacerdotal, que exerceram com grande dedicação nas comunidades paroquiais que lhes tinham sido confiadas. Dando testemunho da sua condição sacerdotal e perdoando os seus perseguidores, deram a vida invocando o Rei do Universo.

Que eles intercedam pela Diocese de Urgell e pelas outras Dioceses espanholas, pelas vocações sacerdotais e religiosas, e pelo crescimento de todos os fiéis nas virtudes cristãs!

A nova beata, que nasceu na Diocese de Maiorca e pertencia às Irmãs Zeladoras do Culto Eucarístico, sofreu o martírio em Madrid durante a mesma perseguição. Totalmente dedicada ao Senhor na vida religiosa, transcorria longas horas em adoração ao Santíssimo Sacramento, sem descuidar o seu serviço à comunidade. Preparou-se assim para oferecer a própria vida como expressão suprema de amor a Cristo.

Estes novos beatos são para todos nós um exemplo vivo da identidade sacerdotal e de consagração religiosa. Demos graças a Deus pelo grande dom destas testemunhas heróicas da fé.

Beatos Josep Tápies e companheiros, e beata Maria de los Ángeles, rezai pelas comunidades eclesiais de Urgell, de Maiorca e de toda a Espanha! Amém.



AO CARDEAL ARINZE ACOMPANHADO

DE UM GRUPO DE PEREGRINOS DA NIGÉRIA NA CELEBRAÇÃO DO 40º ANIVERSÁRIO DA SUA ORDENAÇÃO EPISCOPAL Segunda-feira, 31 de Outubro de 2005



Eminência

93 É-me grato recebê-lo, juntamente com os seus amigos da comunidade nigeriana de Roma e com os demais visitantes do seu país, que vieram para se unir a Vossa Eminência na celebração do 40º aniversário da sua Ordenação episcopal. É de bom grado que lhe transmito as minhas sinceras felicitações e os meus pessoais bons votos por esta circunstância.

Ontem, na igreja de santa Maria "in Traspontina", Vossa Eminência celebrou a Santa Missa de acção de graças ao Deus Todo-Poderoso, pelo dom de quarenta anos de ministério episcopal.

Hoje, sinto-me feliz por unir as minhas preces às suas intenções e pedir ao Senhor que seja o seu guia e a sua fortaleza no serviço contínuo à Igreja, com amor e zelo. Enquanto invoco sobre Vossa Eminência, através da intercessão de Maria, Mãe de Deus, as dádivas divinas da alegria e da paz, concedo-lhe cordialmente a minha Bênção Apostólica, assim como a todos aqueles que participam nesta festiva celebração.


                                                   Novembro de 2005




AOS PRELADOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL DA ÁUSTRIA POR OCASIÃO DA VISITA "AD LIMINA APOSTOLORUM " Sábado, 5 de Novembro de 2005


Estimado Senhor Cardeal
Queridos Irmãos no Episcopado!

A visita dos Pastores da Igreja na Áustria aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo é um encontro fixo num momento de confirmação no exercício deste cargo de grande responsabilidade. Portanto, queridos Irmãos, apresento-vos com grande alegria as boas-vindas aqui ao Palácio Apostólico, por ocasião da vossa visita ad Limina. Esta peregrinação consolida os vossos vínculos com o Sucessor de Pedro e ao mesmo tempo permite viver a comunhão da Igreja universal no seu centro.

Precisamente durante os acontecimentos dos meses passados pudemos viver a vitalidade da Igreja em todo seu vigor e na sua energia missionária mundial, em particular durante a XX Jornada Mundial da Juventude em Agosto deste ano em Colónia. Mesmo se na Igreja nem sempre é visível o estímulo espiritual, que Deus nos faz viver em tais momentos particulares de graça, conhecemos a promessa do nosso Senhor divino e Mestre de todos os tempos e lugares. "E sabei que Eu estarei sempre convosco até ao fim do mundo" (Mt 28,20). Por conseguinte, sabemos que este presente vital do Senhor ressuscitado na sua Igreja é realizado e ao mesmo tempo actualizado através da celebração sacramental do seu Sacrifício, através da Comunhão, na qual recebemos o seu Corpo e o seu Sangue, e mediante a experiência que nos é oferecida na adoração da sua presença real sob as espécies das partículas sagradas: "O Ano Eucarístico" há pouco concluído com o Sínodo dos Bispos, quis chamar a atenção dos fiéis para a fonte da vida e da missão da Igreja e sobre o verdadeiro ápice para o qual se voltam todos os nossos esforços para conduzir os homens ao seu Salvador e para os reconciliar n'Ele com Deus Uno e Trino.

Com base nestas experiências agora é necessário analisar com confiança e tranquilidade a situação das Dioceses austríacas para revelar os pontos nevrálgicos nos quais o nosso compromisso é exigido de modo particular, para a salvação e o bem do rebanho "de que o Espírito Santo vos constituiu administradores para apascentardes a Igreja de Deus, adquirida por Ele com o seu próprio sangue" (Ac 20,28). Na certeza da presença do Senhor olhamos com coragem para os olhos da realidade sem que o optimismo, pelo qual sempre somos treinados, possa representar um obstáculo para chamar as coisas com o seu nome em total objectividade e sem embelezamentos.

Hoje verificam-se acontecimentos dolorosos: o processo de secularização actualmente cada vez mais significativo para a Europa não se deteve nem sequer diante das portas da Áustria católica. A identificação com o ensinamento da Igreja diminuiu em muitos fiéis e com isto perde-se a certeza da fé e vem a faltar o temor reverencial à lei de Deus. Com estas poucas observações não devo aqui, amados Irmãos no Episcopado, recordar pormenorizadamente os numerosos sectores críticos da vida social em geral e da situação eclesial em particular porque sei que são sempre preocupações vivas para vós. Partilho as vossas ansiedades pela Igreja no vosso País. Portanto, que podemos fazer? Existe um instrumento santo que Deus preparou para a Igreja do nosso tempo, para que possais enfrentar com coragem os desafios com os quais vos deparais ao longo do vosso caminho no terceiro milénio cristão. Sem dúvida, por um lado é necessária a confissão clara, corajosa e entusiasta da fé em Jesus Cristo que vive também aqui e hoje na sua Igreja e no qual, segundo a sua essência, a alma humana orientada para Deus pode encontrar a sua felicidade. Por outro lado, são necessárias numerosas medidas missionárias, pequenas e grandes, que devemos tomar para fazer uma "mudança de rota".

94 Como bem sabeis a confissão da fé faz parte dos primeiros deveres do Bispo. "Não me subtraí diz São Paulo em Mileto aos Pastores da Igreja de Éfeso à tarefa de vos anunciar toda a vontade de Deus" (Ac 20,27). É verdade que nós, Bispos, devemos agir com ponderação. Contudo, esta prudência não nos deve impedir de apresentar a Palavra de Deus em toda a clareza, também as coisas que não se escutam de boa vontade ou que suscitam certamente reacções de protesto e escárnio. Vós, queridos Irmãos no Episcopado, sabei-lo bem: existem temas, relativos à verdade de fé e sobretudo à doutrina moral, que nas vossas Dioceses não estão presentes de modo suficiente na catequese e no anúncio e que, por vezes, por exemplo na pastoral juvenil das paróquias ou das uniões, não são enfrentados minimamente, ou não o são no sentido claro da Igreja. Dando graças a Deus nem sempre é assim em toda a parte. Contudo, talvez os responsáveis do anúncio temam aqui e ali que as pessoas se possam afastar se se fala demasiado claramente.

Mas, em geral a experiência demonstra que acontece precisamente o oposto. Não vos iludis! Um ensinamento católico que seja oferecido de maneira incompleta, é uma contradição em si e não pode ser fecundo por um longo período. O anúncio do Reino de Deus caminha ao passo com a exigência de conversão e com o amor que encoraja, que conhece o caminho, que ensina a compreender que com a graça de Deus até o que parece impossível se torna possível. Pensai como, pouco a pouco, o ensinamento da religião, a catequese nos vários níveis e a pregação podem ser melhoradas, aprofundadas e, por assim dizer, completadas! Utilizai, por favor, com zelo o Compêndio e o Catecismo da Igreja Católica! Fazei com que os sacerdotes e os catequistas adoptem estes instrumentos, que sejam explicados nas paróquias, nas uniões e nos movimentos e que sejam utilizados nas famílias como importantes leituras! Na incerteza deste período histórico e desta sociedade, oferecei aos homens a certeza da fé completa da Igreja! A clareza e a beleza da fé católica são aquilo que tornam luminosa a vida do homem também hoje! Isto em particular se for apresentada por testemunhas entusiastas e entusiasmantes.

O testemunho claro, público e resoluto dos Bispos, pelo qual se podem orientar e haurir coragem para fortalecer a fé mediante a própria atitude todos os fiéis e sobretudo os sacerdotes, em relação aos quais tendes uma particular solicitude, deve ser acompanhado por muitas medidas, por vezes aparentemente insignificantes e desnecessárias, que agem publicamente. Foi feito algo para despertar a sensibilidade missionária dos cristãos nas vossas Dioceses. A este propósito penso, por exemplo, na extraordinária missão da cidade em Viena e naturalmente no Mitteleuropäischen Katholikentag, que é um testemunho excepcional da fé católica ligada ao povo face à opinião pública europeia. É preciso fazer ainda muito para que a Igreja na Áustria desenvolva melhor o seu mandato missionário. Na realidade muitas vezes são as medidas de ordinária administração, como por exemplo decisões sábias e correctas relativas às pessoas, que melhoram a situação de modo permanente. Quer se trate da frequência da Missa dominical ou da recepção do Sacramento da Penitência, como são importantes muitas vezes o exemplo e a palavra encorajadora! É o preceito do amor que nos estimula não só a fornecer ao próximo este ou aquele serviço social, mas também a ajudá-lo a obter o máximo bem, dirigir-se constantemente ao Deus vivo, a comunhão com Jesus Cristo, a descoberta da própria vocação à santidade, a abertura à vontade de Deus, a alegria de uma vida que num certo sentido já antecipa a felicidade da eternidade.

Queridos Irmãos no Episcopado! Numerosas situações positivas da vida eclesial, como por exemplo a prática e a redescoberta da adoração eucarística nas paróquias e a fidelidade de muitos indivíduos e de comunidades à recitação do Rosário, e a constante boa colaboração entre Estado e Igreja para o bem do homem delineado à imagem da Igreja na Áustria assim como a grande riqueza cultural do vosso Pais tão abençoado pelo Senhor ao longo da história de Cristo. A centelha do zelo cristão pode reacender-se. Usai todos estes dons onde puderdes, mas não vos contenteis com uma religiosidade exterior. Deus não se contenta do facto que o seu povo o venera com os lábios. Ele quer o coração e dá-nos a sua graça se não nos afastarmos ou se não nos separamos dele. Conheço muito bem os vossos esforços de grande dedicação e os de muitos sacerdotes, diáconos, religiosos e leigos. Estou certo de que o Senhor acompanhará e recompensará com a sua bênção divina a vossa fidelidade e a vossa diligência. A Magna Mater Austriae, a boa Mãe de graça de Marienzell e a altíssima Virgem da Áustria, cujo santuário se tornou para mim tão querido, possa dar a vós e aos fiéis do vosso País a força e a perseverança para prosseguir com coragem e com confiança a grande obra de renovação autentica da vida de fé na vossa pátria em fidelidade às directrizes da Igreja Universal! Com a sua intercessão concedo a todos vós pelas tarefas do vosso serviço pastoral assim como a todos os fiéis na Áustria a minha Bênção Apostólica.


AO PRESIDENTE DA FEDERAÇÃO LUTERANA MUNDIAL Segunda-feira, 7 de Novembro de 2005


Prezado Bispo Hanson
Queridos amigos luteranos

É com grande alegria que dou as boas-vindas aos representantes da Federação Luterana Mundial, por ocasião da vossa visita oficial a Roma. Recordo com gratidão a presença da vossa Delegação, tanto no funeral do saudoso Papa João Paulo II como na solene inauguração do meu próprio ministério como Bispo de Roma.

Desde há muitos anos, a Igreja Católica e a Federação Luterana Mundial mantêm contactos estreitos e participam num intenso diálogo ecuménico. Este intercâmbio de ideias tem sido muito frutuoso e promissor. Com efeito, um dos resultados deste diálogo fecundo é a Declaração Conjunta sobre a Justificação, que constitui um significativo marco miliário ao longo do nosso caminho para a unidade visível. Trata-se de uma importante realização. A fim de construirmos a partir desta realização, temos que reconhecer o facto de que ainda existem diferenças relativas à questão fulcral da justificação; elas devem ser abordadas, juntamente com os modos de a graça de Deus ser comunicada na Igreja e através da Igreja.

Como mencionei durante a minha recente visita a Colónia, faço votos por que o progresso futuro do nosso diálogo sobre estas problemáticas não só seja inserido num contexto de questões "institucionais", mas tenha em consideração também a verdadeira fonte de todo o ministério na Igreja. Com efeito, a missão da Igreja consiste em dar testemunho da verdade de Jesus Cristo, o Verbo que se fez carne. O Verbo e o testemunho caminham juntos: a Palavra interpela o testemunho e dá-lhe forma; o testemunho haure a sua autenticidade da fidelidade total à Palavra, como é expresso e vivido na comunidade apostólica de fé, sob a orientação do Espírito Santo.

A Comissão Internacional Luterano-Católica Romana, sobre a Unidade, em breve completará a sua quarta fase de diálogo e publicará as suas conclusões num documento sobre a Apostolicidade da Igreja. Todos nós estamos conscientes de que o nosso diálogo fraterno é desafiado não apenas pela necessidade de verificar a recepção destas formulações doutrinais conjuntas nas nossas respectivas comunhões, mas sobretudo nos dias de hoje, em virtude de um clima geral de incerteza acerca das verdades cristãs e dos princípios éticos que precedentemente não eram questionados. Em certos casos, este património comum está a ser debilitado pelas transformadas abordagens hermenêuticas.

95 O nosso caminho ecuménico conjunto continuará a encontrar dificuldades e exigirá um diálogo paciente. Contudo, recebo um grande encorajamento da tradição sólida dos estudos e intercâmbios sérios que têm caracterizado as relações católico-luteranas ao longo dos anos. Conforta-nos o facto de que a nossa busca da unidade é orientada pela presença do Senhor ressuscitado e pelo poder inextinguível do seu Espírito, "que sopra onde quer" (Jn 3,8). Enquanto nos preparamos para celebrar o quinto centenário dos acontecimentos de 1517, deveríamos intensificar os nossos esforços em ordem a compreender mais profundamente aquilo que temos em comum e o que nos divide, assim como os dons de que dispomos para oferecermos uns aos outros. Perseverando neste caminho, rezemos para que o rosto de Cristo resplandeça cada vez mais nos seus discípulos, a fim de que todos possam ser um só, para que o mundo creia (cf. Jn 17,21).

Demos graças a Deus por tudo aquilo que já se alcançou até agora nas relações católico-luteranas, e rezemos a fim de podermos continuar a caminhar juntos rumo à unidade que o Senhor deseja.



AO SENHOR FRANCIS ROONEY NOVO EMBAIXADOR

DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA JUNTO DA SANTA SÉ Sábado, 12 de Novembro de 2005


Senhor Embaixador

É-me grato dar-lhe as boas-vindas ao Vaticano e aceitar as Cartas Credenciais mediante as quais Vossa Excelência é designado Embaixador e Ministro Plenipotenciário dos Estados Unidos da América junto da Santa Sé. Agradeço a mensagem de saudação que Vossa Excelência me transmitiu da parte do Presidente Bush; gostaria de lhe pedir a amabilidade de lhe assegurar de maneira particular a minha sincera solidariedade para com todas as pessoas atingidas pelas recentes tempestades na região sul do seu país, assim como a ajuda das minhas preces por aqueles que estão comprometidos no imenso trabalho de socorro e reconstrução.

Na sua Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2005, o meu predecessor, o Papa João Paulo II, chamou a atenção para a intrínseca dimensão ética de cada decisão política e observou que, em última análise, a preocupante difusão da desordem social, da guerra, da injustiça e da violência no nosso mundo só pode ser contrastada com um renovado apreço e respeito pela lei moral universal, cujos princípios derivam do próprio Criador (cf. nn. 2-3). O reconhecimento do rico património de valores e de princípios contido nesta lei é essencial para a construção de um mundo que reconheça e promova a dignidade, a vida e a liberdade de cada pessoa humana e, ao mesmo tempo, crie as condições de justiça e de paz em que os indivíduos e as comunidades possam florescer de forma autêntica. É precisamente a promoção e a defesa destes valores, que devem governar as relações entre as nações e os povos na busca do bem comum da família humana, que inspira a presença e a actividade da Santa Sé no contexto da comunidade internacional. Como afirmava o Concílio Vaticano II, a missão religiosa universal da Igreja não permite que a mesma seja identificada com qualquer sistema político, económico ou social específico mas, ao mesmo tempo, esta missão serve como fonte de compromisso, de orientação e de fortaleza, que pode contribuir para estabelecer e consolidar a comunidade humana, segundo a lei de Deus (cf. Gaudium et spes GS 42).

Por este motivo, estimo a sua amável referência aos esforços que a Santa Sé está a realizar, a fim de contribuir para encontrar soluções eficazes para alguns dos problemas mais significativos que se têm apresentado à comunidade internacional nos últimos anos, como o escândalo da fome, das enfermidades graves e da pobreza, cada vez mais difundidas em vastas regiões do nosso mundo.

Uma abordagem adequada destas problemáticas não se pode limitar a simples considerações económicas ou técnicas, mas exige uma visão alargada, uma solidariedade concreta e decisões corajosas a longo prazo, a propósito das complexas questões éticas; entre elas, penso de maneira especial nos efeitos da dívida esmagadora, que alimenta a espiral da pobreza em numerosas nações menos desenvolvidas. O povo americano tem-se distinguido desde há muito tempo pela sua generosa assistência caritativa aos desvantajados e aos necessitados em todos os continentes. Num mundo de crescente globalização, estou convicto de que a sua nação continuará a demonstrar uma liderança, fundamentada num compromisso inabalável em favor dos valores da liberdade, da integridade e da autodeterminação e, ao mesmo tempo, a cooperar com as várias entidades internacionais que trabalham para construir um consenso genuíno e para desenvolver um curso unificado de acção, em vista de confrontar questões críticas para o futuro de toda a família humana.
Senhor Embaixador, aproveito esta oportunidade para recordar que, há pouco mais de duas décadas, foram estabelecidas as plenas relações diplomáticas entre os Estados Unidos e a Santa Sé, graças aos esforços do ex-Presidente Ronald Reagan e do saudoso Papa João Paulo II.

Aprecio o diálogo e a fecunda cooperação que estas relações tornaram possíveis, enquanto manifesto a minha esperança por que nos anos vindouros elas sejam aprofundadas e consolidadas.

No momento em que Vossa Excelência começa a sua missão, formulo-lhe os meus bons votos pelo trabalho que assumirá ao serviço da sua nação, e asseguro-lhe a disponibilidade constante dos departamentos da Santa Sé para o assistir no cumprimento das suas responsabilidades. Sobre Vossa Excelência e a sua família, e sobre todo o querido povo americano, invoco cordialmente as bênçãos divinas de prosperidade, alegria e paz.



AOS BISPOS DA BULGÁRIA EM VISITA « AD LIMINA APOSTOLORUM »

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Sábado, 12 de Novembro de 2005


Venerados Irmãos no Episcopado!

O primeiro sentimento espontâneo que brota na minha alma ao receber a vossa saudação é uma cordial gratidão pelo afecto que as vossas Comunidades, por meio de vós, manifestam ao Sucessor de Pedro, renovando a confirmação de adesão fiel ao depositum recebido dos Padres. Foram para mim de conforto as expressões de comunhão que, nestes dias, cada um de vós me renovou em nome do clero, dos religiosos e dos fiéis confiados à responsabilidade deles. Consciente como estou do ministério que fui chamado a desempenhar ao serviço da comunhão eclesial, peço-vos que vos façais intérpretes da minha constante solicitude em relação a todos os crentes em Cristo.

Dos colóquios que tive com cada um de vós, cheguei à conclusão de que a Igreja Católica na Bulgária é viva e desejosa de oferecer com entusiasmo o próprio testemunho de Cristo no meio da sociedade na qual vive. Encorajo-vos a prosseguir por este caminho, esforçando-vos por difundir, embora na limitação das forças à vossa disposição, o Evangelho da esperança e do amor: o Senhor sabe sempre colmar as nossas eventuais lacunas e a pobreza dos meios à nossa disposição.

O que conta não é tanto a eficiência da organização, quanto a confiança inabalável em Cristo, porque é precisamente Ele quem guia, rege e santifica a sua Igreja, também através do vosso ministério indispensável.

Nos seus desígnios imperscrutáveis, Deus colocou-vos para exercer o vosso serviço eclesial ao lado dos nossos irmãos da Igreja ortodoxa búlgara. Faço votos por que os bons relacionamentos existentes se desenvolvam ainda mais em benefício do anúncio do Evangelho do Filho de Deus, princípio e fim de todas as acções realizadas pelo cristão. Em relação a isto, peço-vos, venerados Irmãos, que leveis a minha saudação cordial ao Patriarca Maxim, primeiro Hierarca da Igreja Ortodoxa da Bulgária. Dignai-vos fazer-vos intermediários dos meus votos pela sua saúde e pela feliz retomada do seu ministério. Ainda permanece viva em mim a recordação do respeitoso e fraterno acolhimento que ele dedicou ao meu venerado Predecessor, o Papa João Paulo II, durante a visita pastoral que realizou ao vosso País. É necessário prosseguir o caminho empreendido, intensificando a oração para que se apresse a hora na qual poderemos sentar-nos à única Mesa, para comer o único Pão da salvação.

Sei que subsiste um intenso diálogo com as Autoridades civis sobre temas de interesse comum. Sinto-me feliz por isso, porque, através do compromisso de todos, podem ser localizados os problemas a enfrentar juntos e os percursos a seguir segundo as oportunidades concretas para o bem supremo de todo o Povo búlgaro, o qual se sente justamente parte da grande família do Continente europeu. Formada por diversas componentes culturais e religiosas, a Bulgária pode tornar-se um exemplo de sábia integração, de colaboração e de convivência pacífica. E a Comunidade católica, mesmo sendo uma minoria no contexto do País, pode desempenhar uma tarefa de testemunho generoso da caridade universal de Cristo.

Depois do triste período da opressão comunista, os católicos que perseveraram com fidelidade activa na sua adesão a Cristo sentem agora a urgência de fortalecer a sua fé e de difundir o Evangelho em todos os âmbitos sociais, especialmente onde é mais evidente a necessidade do anúncio cristão. Penso, por exemplo, na grande diminuição da natalidade, na elevada percentagem de abortos, na fragilidade de tantas famílias, no problema da emigração. Sinto-me feliz por saber que a Igreja Católica na Bulgária está muito empenhada no âmbito social, para socorrer as necessidades de tantos pobres. Venerados Irmãos, encorajo-vos a prosseguir por este caminho ao serviço do Povo búlgaro, que me é tão querido. Não tenhais receio de propor às jovens gerações também o ideal da consagração total a Cristo, a fim de contribuir para dilatar cada vez mais o Reino de Deus. De igual modo, prossegui o esforço em dotar, com a ajuda também de outras Igrejas e organizações católicas, as vossas Comunidades das estruturas que sejam úteis para as actividades pastorais e para a prática do culto cristão. Em relação a isto, foi com particular satisfação que tomei conhecimento que está a ser completada a Igreja-Catedral latina de Sófia, dedicada a São José.

Venerados Irmãos, confiando na vossa orante recordação ao Senhor, por minha vez garanto-vos uma especial oração Àquele que é o verdadeiro Esposo da Igreja, por Ele amada, protegida e alimentada: Jesus nosso Senhor, único Filho do Deus Vivo. Com estes sentimentos concedo de todo o coração a minha Bênção a vós, aos vossos presbíteros, aos religiosos e às religiosas, e a todo o povo que Deus vos confiou.




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