Discursos Bento XVI 122

AOS PARTICIPANTES NO ENCONTRO DE PRESIDENTES DAS COMISSÕES EPISCOPAIS PARA A FAMÍLIA E A VIDA DA AMÉRICA LATINA Sábado, 3 de Dezembro de 2005


Queridos Irmãos no Episcopado!

123 1. Apraz-me receber-vos por ocasião do III Encontro dos Presidentes das Comissões Episcopais para a Família e a Vida da América Latina. Desejo expressar a minha gratidão pelas palavras que me expressou o Senhor Cardeal Alfonso López Trujillo, Presidente do Pontifício Conselho para a Família. Sou testemunha, juntamente com toda a Igreja, da solicitude com que o Papa João Paulo II se dedicou a este tema tão importante. Por meu lado, assumo esta mesma preocupação que afecta em grande medida o futuro da Igreja e dos povos, dado que, como afirmava o meu Predecessor na Exortação Apostólica Familiaris consortio, "o futuro da humanidade passa pela família! É pois indispensável e urgente que cada homem de boa vontade se empenhe em salvar e promover os valores e as exigências da família". E acrescentava: "Compete ainda aos cristãos a tarefa de anunciar com alegria e convicção a "boa nova" acerca da família, que tem necessidade absoluta de ouvir e de compreender sempre mais profundamente as palavras autênticas que lhe revelam a sua identidade, os seus recursos interiores, a importância da sua missão na Cidade dos homens e na de Deus" (n. 86). A mencionada Exortação, juntamente com a Carta às Famílias Gratissimam sane e a Encíclica Evangelium vitae constituem um luminoso tríptico que deve inspirar a vossa tarefa de Pastores.

2. Quero agradecer de modo especial a vossa solicitude pastoral com a intenção de salvaguardar os valores fundamentais do matrimónio e da família, ameaçados pelo fenómeno actual da secularização que impede que a consciência social descubra adequadamente a identidade e missão da instituição familiar, e ultimamente pela pressão de leis injustas que desconhecem os direitos fundamentais da mesma.

Perante esta situação, contemplo com prazer como cresce e se consolida o labor das Igrejas particulares em favor desta instituição humana, que afunda as suas raízes no desígnio amoroso de Deus e representa o modelo insubstituível para o bem comum da humanidade. São muitíssimos os lares que dão uma resposta generosa ao Senhor e, além disso, abundam as experiências pastorais, sinal de uma nova vitalidade, nas quais, através de uma maior preparação para o matrimónio, se fortalece a identidade da família.

3. O vosso dever de Pastores é apresentar em toda a sua riqueza o valor extraordinário do matrimónio que, como instituição natural, é "património da humanidade". Por outro lado, a sua elevação à altíssima dignidade de sacramento deve ser contemplada com gratidão e admiração, como expressei recentemente ao afirmar que "a sacramentalidade que o matrimónio assume em Cristo significa portanto que o dom da criação foi elevado à graça de redenção. A graça de Cristo não se acrescenta de fora à natureza do homem, não lhe faz violência, mas liberta-a e restaura-a, precisamente ao elevá-la acima dos seus próprios limites" (Discurso na Cerimónia de Abertura da Assembleia Eclesial da Diocese de Roma, 6 de Junho de 2005).

4. O amor e a entrega total dos esposos, com as suas notas peculiares de exclusividade, fidelidade, permanência no tempo e a abertura à vida, está na base dessa comunidade de vida e amor que é o matrimónio (cf. GS
GS 48). Hoje é preciso anunciar com renovado entusiasmo que o evangelho da família é um caminho de realização humana e espiritual, com a certeza de que o Senhor está sempre presente com a sua graça. Este anúncio muitas vezes é desfigurado por falsas concepções do matrimónio e da família que não respeitam o projecto originário de Deus. Neste sentido, houve quem chegou a propor novas formas de matrimónio, algumas delas desconhecidas nas culturas dos povos, nas quais se altera a sua natureza específica.

Também no âmbito da vida estão a surgir novas orientações que põem em questão este direito fundamental. Como consequência, facilita-se a eliminação do embrião ou o seu uso arbitrário em nome do progresso da ciência que, não reconhecendo os seus próprios limites e não aceitando os princípios morais que permitem salvaguardar a dignidade da pessoa, se converte numa ameaça para o próprio ser humano, reduzindo-o a um objecto ou a um mero instrumento. Quando se chega a estes níveis a própria sociedade ressente-se e abalam-se os seus fundamentos com todos os tipos de riscos.

5. Na América Latina, como noutras partes, os filhos têm o direito de nascer e crescer no seio de uma família fundada no matrimónio, onde os pais sejam os primeiros educadores da fé dos seus filhos, e estes possam alcançar a sua plena maturidade humana e espiritual. Verdadeiramente, os filhos são a maior riqueza e o bem mais precioso da família. Por isso é necessário ajudar todas as pessoas a tomar consciência do mal intrínseco do crime do aborto que, ao atentar contra a vida humana no seu início, é também uma agressão contra a própria sociedade. Por isso, os políticos e legisladores, enquanto servidores do bem social, têm o dever de defender o direito fundamental à vida, fruto do amor de Deus.

6. Não há dúvida de que para a acção pastoral, numa matéria tão delicada e complexa, na qual intervêm diversas disciplinas e se tratam questões tão fundamentais, requer-se uma cuidadosa preparação dos Agentes pastorais nas Dioceses. Assim, os sacerdotes, como colaboradores imediatos dos Bispos, devem poder receber uma sólida preparação neste campo, que lhes permita enfrentar com competência e convicção a problemática suscitada no seu trabalho pastoral. No que diz respeito aos leigos, sobretudo aos que dedicam as suas energias a este serviço das famílias, eles necessitam também de uma válida e elevada formação que os ajude a testemunhar a grandeza e o valor permanente do matrimónio na sociedade actual.

7. Queridos Irmãos: como bem sabeis, está próximo o V Encontro Mundial das Famílias, em Valência, Espanha, e que terá como tema: A transmissão da fé na família. A este respeito, desejo expressar a minha cordial saudação ao Arcebispo daquela cidade, D. Agustín García-Gasco, o qual participa neste Encontro e que, com o Pontifício Conselho para a Família, está a realizar a difícil tarefa da sua preparação. Estimulo-vos a todos para que numerosas delegações das Conferências Episcopais, Dioceses e Movimentos da América Latina, possam participar num acontecimento importante como esse. Por meu lado, apoio decididamente a celebração deste Encontro e coloco-o sobre a protecção da Sagrada Família.

Concedo de coração a vós, queridos Pastores, e a todas as famílias da América Latina a minha Bênção Apostólica.

SOLENIDADE DA IMACULADA CONCEIÇÃO DA BEM-AVENTURADA VIRGEM MARIA ORAÇÃO 8 de Dezembro de 2005

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Vim neste dia dedicado a Maria, pela primeira vez como Sucessor de Pedro, aos pés da imagem da Imaculada aqui, na Praça de Espanha, percorrendo idealmente a peregrinação tantas vezes feita pelos meus Predecessores. Sinto que me acompanham a devoção e o afecto da Igreja que vive nesta cidade de Roma e no mundo inteiro. Trago comigo as preocupações e as esperanças da humanidade deste nosso tempo, e venho colocá-las aos pés da celeste Mãe do Redentor.

Neste dia singular, que recorda o quadragésimo aniversário do encerramento do Concílio Vaticano II, volto com o pensamento ao dia 8 de Dezembro de 1965 quando, precisamente no final da homilia da Celebração eucarística na Praça de São Pedro, o Servo de Deus Paulo VI dirigiu o seu pensamento a Nossa Senhora "a Mãe de Deus e nossa Mãe espiritual... a criatura na qual a imagem de Deus se reflecte com nitidez absoluta, sem perturbação alguma, como acontece ao contrário com cada criatura humana". O Papa depois perguntava: "Não é, porventura, fixando o nosso olhar nesta Mãe e Rainha, espelho nítido e sagrado da infinita Beleza, que pode... começar o nosso trabalho pós-conciliar? Não se torna para nós esta beleza de Maria Imaculada um modelo inspirador? Uma esperança confortadora?". E concluía: "Nós pensamos isto para nós e para vós; esta é a nossa saudação mais nobre e, queira Deus, a mais válida!" (Insegnamenti di Paolo VI, III 1965, p. 746). Paulo VI proclamou Maria "Mãe da Igreja", e a ela confiou para o futuro a fecunda aplicação das decisões conciliares.

Recordando os numerosos acontecimentos que marcaram os quarenta anos transcorridos, como não reviver hoje os vários momentos que distinguiram o caminho da Igreja neste período? Nossa Senhora amparou durante estes quatro decénios os Pastores e, em primeiro lugar, os Sucessores de Pedro no seu exigente ministério ao serviço do Evangelho; guiou a Igreja para a fiel compreensão e aplicação dos documentos conciliares. Por isso, fazendo-me voz de toda a Comunidade eclesial, gostaria de agradecer à Virgem Santíssima e dirigir-me a ela com os mesmos sentimentos que animaram os Padres conciliares, os quais dedicaram precisamente a Maria o último capítulo da Constituição dogmática Lumen gentium, realçando a indescritível relação que une a Virgem à Igreja.

Sim, desejamos agradecer-te, Virgem Mãe de Deus e nossa Mãe amadíssima, pela tua intercessão em favor da Igreja. Tu, que ao aceitar sem hesitações a vontade divina, te consagraste com todas as tuas forças à pessoa e à obra do teu Filho, ensinando-nos a guardar no coração e a meditar em silêncio, como tufizeste,osmistérios da vida de Cristo.

Tu, que fostes até ao Calvário, sempre profundamente unida ao teu Filho, que na cruz te deu como mãe ao discípulo João, faz com que também nós te sintamos sempre próxima a cada passo da nossa existência, sobretudo nos momentos de sombras e de provações.

Tu, que no Pentecostes, juntamente com os Apóstolos em oração, imploraste o dom do Espírito Santo para a Igreja nascente, ajuda-nos a perseverar no seguimento fiel de Cristo. A ti dirigimos com confiança o olhar, em "sinal de esperança certa e de conforto, enquanto não vier o dia do Senhor" (n. 68).

A ti, Maria, invocam com oração insistente os fiéis de todas as partes do mundo para que, glorificada no céu entre os anjos e os santos, intercedas por nós junto do teu Filho "enquanto todas as famílias dos povos, quer as que se distinguem pelo nome cristão, quer as que ainda ignoram o seu Salvador, em paz e concórdia estejam felizmente reunidas num só povo de Deus, para glória da santíssima e indivisível Trindade" (n. 69).

Amém!


AOS MEMBROS DA DELEGAÇÃO DO CONSELHO METODISTA MUNDIAL Sexta-feira, 9 de Dezembro de 2005


Prezado Bispo Mbang
Queridos irmãos em Cristo

125 É com grande alegria que vos dou as boas-vindas, representantes do Conselho Metodista Mundial, enquanto vos agradeço a vossa visita. Estou profundamente agradecido pela presença e apoio orante dos representantes metodistas no funeral do Papa João Paulo II e na celebração que assinalou a inauguração do meu Pontificado.

Há quarenta anos, nesta semana, o Papa Paulo VI dirigiu-se aos observadores ecuménicos no encerramento do Concílio Vaticano II. Durante este encontro, ele manifestou a esperança de que as diferenças entre os cristãos pudessem ser resolvidas "lenta, gradual, leal e generosamente".

Agora, temos o dever de reflectir sobre as relações amistosas entre católicos e metodistas, e sobre o diálogo paciente e perseverante em que estamos comprometidos. Com efeito, hoje temos muito a agradecer.

Desde 1967, o nosso diálogo abordou temas teológicos prioritários, como: a revelação e a fé, a tradição e a autoridade do ensinamento na Igreja. Nestes esforços, enfrentaram-se com sinceridade as diferentes áreas de diferença. Eles têm demonstrado também um considerável nível de convergência e são dignos de reflexão e de estudo. O nosso diálogo e os numerosos modos de os católicos e metodistas aprenderem a conhecer-se uns aos outros permitiram-nos reconhecer em conjunto alguns daqueles "tesouros cristãos de grande valor". Em várias ocasiões, este reconhecimento tornou-nos capazes de falar em uníssono, ao abordarmos questões sociais e éticas num mundo cada vez mais secularizado.

Senti-me encorajado pela iniciativa que há-de levar as Igrejas-membro do Conselho Metodista Mundial a associarem-se à Declaração Conjunta sobre a Doutrina da Justificação, assinada pela Igreja Católica e pela Federação Luterana Mundial em 1999. Se o Conselho Metodista Mundial viesse a expressar a sua intenção de se associar à mencionada Declaração Conjunta, haveria de contribuir para a purificação e a reconciliação a que aspiramos ardentemente, e constituiria um passo significativo rumo à finalidade estabelecida da plena unidade na fé.

Estimados amigos, sob a guia do Espírito Santo e conscientes da grandiosa e infalível Misericórdia de Deus no mundo inteiro, procuremos fomentar o compromisso recíproco na Palavra de Deus, no testemunho e na oração comum. Enquanto preparamos nos nossos corações e nas nossas mentes para acolher o Senhor neste período de Advento, invoco as abundantes bênçãos de Deus sobre todos vós e sobre os metodistas no mundo inteiro.


AOS RELIGIOSOS, ÀS RELIGIOSAS, AOS MEMBROS DE INSTITUTOS SECULARES E DE SOCIEDADES DE VIDA APOSTÓLICA DA DIOCESE DE ROMA Sábado, 10 de Dezembro de 2005

Senhor Cardeal
Venerados Irmãos
no Episcopado e no Presbiterado
Queridos irmãos e irmãs!

126 É para mim uma grande alegria encontrar-me convosco hoje no clima espiritual do Advento, enquanto nos preparamos para o Santo Natal. Saúdo com afecto cada um de vós, religiosos e religiosas, membros de Institutos seculares e de novas formas de vida consagrada, presentes na Diocese de Roma, onde desempenhais um serviço muito apreciado, inserindo-vos bem nas várias realidades sociais e pastorais. Muito obrigado por este vosso sacrifício. Dirijo um pensamento particular a quantos vivem nos mosteiros de vida contemplativa e que estão unidos a nós espiritualmente, assim como às pessoas de vida consagrada provenientes da África, da América Latina e da Ásia, que estudam em Roma ou transcorrem aqui um período da sua existência, participando bastante activamente na missão da Igreja que está na Cidade.

Dirijo uma saudação fraterna ao Cardeal Camillo Ruini, ao qual agradeço as palavras que me dirigiu em nome de todos vós. Desde sempre os consagrados e as consagradas constituem uma presença preciosa na Igreja de Roma, também porque oferecem um testemunho peculiar da unidade e da universalidade do Povo de Deus. Agradeço-vos pelo trabalho que desempenhais na vinha do Senhor, pelo compromisso que assumis ao enfrentar os desafios que a cultura hodierna apresenta à evangelização numa metrópole, como a nossa, que é cosmopolita.

O complexo contexto social e cultural da nossa Cidade na qual vos encontrais a agir exige de vós, além de uma constante atenção às problemáticas locais, uma fidelidade corajosa ao carisma que vos distingue. De facto, desde as origens, a vida consagrada caracterizou-se pela sua sede de Deus: quaerere Deum. Por conseguinte, o vosso anseio primário e supremo seja testemunhar que Deus deve ser ouvido e amado com todo o coração, com toda a alma, com todas as forças, antes de qualquer outra pessoa e coisa. Esta primazia de Deus, precisamente no nosso tempo no qual há grande ausência de Deus, é muitíssimo importante. Não tenhais medo de vos apresentar também visivelmente, como pessoas consagradas, e procurai manifestar de todas as formas a vossa pertença a Cristo, o tesouro escondido pelo qual deixastes tudo. Fazei vosso o conhecido mote programático de s. Bento: "Nada seja anteposto ao amor de Cristo".

Sem dúvida são numerosos os desafios e as dificuldades que encontrais hoje, estando comprometidos em várias frentes. Nas vossas residências e nas obras apostólicas estais bem inseridos nos programas da Diocese colaborando como disse o Cardeal Ruini nos vários ramos da acção pastoral, graças também à ligação que os órgãos de representação da vida consagrada fazem, como a Conferência Italiana dos Superiores Maiores e a União das Superioras Maiores da Itália, o Grupo Institutos Seculares e o Ordo Virginum. Prossegui por este caminho fortalecendo a vossa fidelidade aos compromissos assumidos, ao carisma de cada um dos vossos Institutos e às orientações da Igreja local. Vós sabeis que esta fidelidade é possível quando somos fiéis às pequenas, mas insubstituíveis, fidelidades quotidianas: antes de tudo, fidelidade à oração e à escuta da Palavra de Deus; fidelidade ao serviço dos homens e das mulheres do nosso tempo, segundo o próprio carisma; fidelidade ao ensinamento da Igreja, a partir do ensinamento sobre a vida consagrada; fidelidade aos sacramentos da Reconciliação e da Eucaristia, que nos amparam nas situações difíceis da vida, dia após dia.

Depois, a vida comunitária é parte constitutiva da vossa missão. Comprometendo-vos a realizar comunidades fraternas, demonstrais que, graças ao Evangelho, também os relacionamentos humanos podem mudar, que o amor não é uma utopia, mas, ao contrário, é o segredo para construir um mundo mais fraterno. O livro dos Actos dos Apóstolos, depois da descrição da fraternidade realizada na comunidade dos cristãos, realça, quase como consequência lógica, que a "a palavra de Deus ia-se espalhando cada vez mais; o número dos discípulos aumentava consideravelmente" (
Ac 6,7). A difusão da Palavra é a bênção que o Dono da messe dá à comunidade que leva a sério o seu compromisso por fazer crescer a caridade na fraternidade.
Queridos irmãos e irmãs, a Igreja tem necessidade do vosso testemunho, precisa de uma vida consagrada que enfrente com coragem e criatividade os desafios do tempo presente. Face ao progredir do hedonismo, é-vos pedido o testemunho corajoso da castidade, como expressão de um coração que conhece a beleza e o preço do amor de Deus. Face à sede de dinheiro, hoje amplamente dominante, a vossa vida sóbria e pronta para o serviço dos mais necessitados recorda que Deus é a riqueza verdadeira que não perece. Face ao individualismo e ao relativismo, que induzem as pessoas a serem a única normativa de si mesmas, a vossa vida fraterna, capaz de se deixar coordenar e, portanto, capaz de obediência, confirma que vós pondes em Deus a vossa realização. Como deixar de desejar que a cultura dos conselhos evangélicos, que é a cultura das Bem-aventuranças, cresça na Igreja, para apoiar a vida e o testemunho do povo cristão?

O Decreto conciliar Perfectae caritatis, do qual este ano comemoramos o quadragésimo aniversário de promulgação, afirma que as pessoas consagradas "dão testemunho diante de todos os cristãos daquele admirável consórcio estabelecido por Deus e que se há-de manifestar plenamente na vida futura, pelo qual a Igreja tem a Cristo por seu único esposo" (n. 12). A pessoa consagrada vive no seu tempo, mas o seu coração está projectado para além do tempo e testemunha ao homem contemporâneo, com frequência absorvido pelas coisas do mundo, que o seu verdadeiro destino é o próprio Deus.

Obrigado, amados irmãos e irmãs, pelo serviço que prestais ao Evangelho, pelo vosso amor aos pobres e aos sofredores, pelo vosso esforço no campo da educação e da cultura, pela incessante oração que se eleva dos mosteiros, pela multiforme actividade que desempenhais. A Virgem Santa, modelo de vida consagrada, vos acompanhe e vos ampare para que possais ser para todos "sinal profético" do reino dos céus. Garanto-vos a minha recordação na oração e abençoo-vos a todos de coração.


À COMISSÃO MISTA INTERNACIONAL PARA O DIÁLOGO TEOLÓGICO ENTRE A IGREJA CATÓLICA E A IGREJA ORTODOXA Quinta-feira, 15 de Dezembro de 2005


Amados Irmãos em Cristo!

Dou-vos as boas-vindas em nome do Senhor, rejubilando pelo nosso encontro fraterno. Neste período litúrgico de alegre expectativa do Nascimento do Salvador, a vossa presença faz crescer a nossa alegria. Reavivais em mim a recordação das Igrejas que representais e de todo o mundo ortodoxo.

127 Alegro-me igualmente pelo encontro do Comité misto de coordenação da Comissão internacional para o diálogo teológico entre a Igreja Católica e a Igreja Ortodoxa no seu conjunto, sinal do desejo de retomar e prosseguir o diálogo, que conheceu ao longo dos anos passados sérias dificuldades internas e externas. Esta retomada do diálogo acontece após um acordo interortodoxo, do qual a Igreja Católica foi informada por Sua Santidade Bartolomeu I. Por conseguinte, ela reveste uma importância particular e constitui uma grande responsabilidade; trata-se de facto de cumprir a vontade do Senhor, que deseja que os seus discípulos formem uma comunidade harmoniosa e que testemunhem juntos o amor fraterno que vem do Senhor. Nesta nova fase do diálogo, devem ser enfrentados juntamente dois aspectos: por um lado eliminar as divergências que persistem, e, por outro, ter como desejo primordial fazer o possível para restabelecer a plena comunhão, extremamente fundamental para a comunidade dos discípulos de Cristo, como realçou o documento preparatório para o vosso trabalho.

A plena comunhão tem por finalidade uma comunhão na verdade e na caridade. Não podemos contentar-nos com permanecer em estádios intermédios, mas devemos incessantemente, com coragem, lucidez e humildade, procurar a vontade de Jesus Cristo, mesmo se isto não corresponde aos nossos projectos humanos. A realização da unidade plena da Igreja e a reconciliação entre os cristãos exigem o preço da submissão das nossas vontades à vontade do Senhor. Esta tarefa deve comprometer os pastores, os teólogos e as nossas comunidades inteiras, cada um segundo o papel que lhe é próprio. Para progredir neste caminho de unidade, as nossas débeis forças não são suficientes. Devemos pedir a ajuda do Senhor, mediante uma oração cada vez mais insistente, porque a unidade é antes de tudo um dom de Deus (cf. Decreto Unitatis redintegratio
UR 24), convidando ao mesmo tempo todos os cristãos à oração comum como "meio certamente eficaz para pedir a graça da unidade". De igual modo, o Decreto Unitatis redintegratio recomendava o conhecimento recíproco (cf. n. 9) e o diálogo, mediante o qual é preciso "prosseguir com amor à verdade, caridade e humildade", para que seja mantida a pureza da doutrina (ibid,n. 11). Os Pastores que têm o mérito de o ter empreendido, Sua Santidade o Papa João Paulo II e Sua Santidade Demétrio I, Patriarca de Constantinopla, na declaração conjunta com a qual o tomaram, abriram um caminho, o qual temos o dever de prosseguir, para o levar ao fim. Ao progredir para a plena comunhão entre católicos e ortodoxos, o diálogo contribuirá também "para os diálogos múltiplos que se desenvolvem no mundo cristão na busca da sua unidade" (Declaração conjunta, 30 de Novembro de 1979).

Ao agradecer o vosso compromisso no estudo de caminhos concretos para o progresso do diálogo entre católicos e ortodoxos, garanto-vos a minha oração fervorosa. Desejo-vos também um feliz e santo Natal. Que a Boa Nova vos cumule de graças divinas e seja um tempo de graça no caminho para a plena unidade.


AOS ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS DE ROMA E DA REGIÃO DO LÁCIO Quinta-feira, 15 de Dezembro de 2005



Venerados Irmãos
Ilustres Autoridades Académicas
Estimados estudantes

É com grande alegria que transmito a todos vós a minha cordial saudação, no final da tradicional Celebração eucarística pré-natalícia para os universitários dos Ateneus romanos, que era tão apreciada pelo meu amado Predecessor João Paulo II. Em primeiro lugar, saúdo o Cardeal Vigário, que presidiu à Santa Missa, e juntamente com ele saúdo os outros eclesiásticos presentes.

Estou grato a cada um de vós, queridos amigos, por terdes acolhido o convite a participar neste encontro e, em particular, expresso o meu reconhecimento ao Ministro da Educação, da Universidade e da Pesquisa, assim como aos Reitores dos Ateneus de Roma e da Itália, aos Directores dos Conservatórios universitários e às delegações de estudantes provenientes de alguns países da Europa e da África. Além disso, é-me grato acolher nesta circunstância também os participantes no Congresso mundial de pastoral para os estudantes estrangeiros, organizado pelo Pontifício Conselho para a Pastoral dos Migrantes e Itinerantes. Dirijo a todos uma afectuosa palavra de boas-vindas.

É de bom grado que aproveito esta ocasião para expressar a minha profunda satisfação pela crescente colaboração que se está a instaurar entre os vários Ateneus romanos. Queridos amigos, continuai a desenvolver em conjunto a reflexão sobre o novo humanismo, tendo em conta os grandes desafios da época contemporânea e procurando unir a fé e a cultura de maneira harmoniosa. Como é necessário, neste momento histórico, cultivar uma atenta investigação cultural e espiritual! Além disso, tomei conhecimento com prazer que as cinco Faculdades de Medicina da Cidade concordaram em comprometer-se nalguns campos de colaboração sobre os temas da vida.

Depois, a nível mais especificamente pastoral, apreciei a opção de aprofundar o tema da fé, com um caminho formativo que empenhe tanto os estudantes como os professores. Dilectos jovens, que aqui vejo em grande número, formulo-vos votos a fim de que realizeis com alegria o vosso itinerário de formação cristã, unindo-o ao esforço quotidiano de aprofundamento do saber, que é próprio dos respectivos percursos académicos. É necessário voltar a descobrir a beleza de ter Cristo como Mestre de vida e assim conseguir renovar a própria profissão de fé de modo livre e consciente.

128 Agora, gostaria de dirigir a minha atenção aos estudantes estrangeiros. A sua presença constitui um fenómeno crescente e representa para a Igreja um importante campo de acção pastoral. Com efeito, os jovens que deixam o seu país por motivos de estudo vão ao encontro de não poucos problemas e sobretudo do risco de uma crise de identidade, de uma perda dos valores espirituais e morais. Por outro lado, a possibilidade de estudar no estrangeiro é para muitos jovens uma oportunidade para se tornarem capazes de contribuir em maior medida para o desenvolvimento dos seus próprios países, e também de participar de maneira concreta na missão da Igreja. É importante continuar pelo caminho empreendido, para ir ao encontro das necessidades destes nossos irmãos e irmãs.

Estimados amigos universitários, estamos próximos da grande e sugestiva celebração do Santo Natal. O clima típico desta festa convida-nos à intimidade e à alegria. Enquanto desejo, a quem tem a possibilidade, que transcorra as festividades de Natal com grande serenidade em família, convido-vos a viver a plenitude da mensagem espiritual, que esta solenidade volta a propor-nos.

Deus fez-se Homem e colocou a sua morada no meio de nós. Preparemos o nosso coração para receber Aquele que vem para nos salvar com a entrega da sua vida, que se faz um de nós e que se torna próximo de nós, fazendo-se nosso irmão. Que nesta expectativa sejais orientados por Maria Santíssima, Sedes Sapientiae. O seu Ícone, que está a visitar várias nações, passa agora da delegação da Polónia para a da Bulgária, em vista de continuar nesse país a sua peregrinatio pelas cidades universitárias. Que Ela, a Virgem fiel, a Mãe de Cristo, obtenha para cada um de vós e para os vossos ambientes académicos, a luz da Sabedoria divina, Cristo Senhor. Feliz Natal a todos!




ÀS FORÇAS ARMADAS ITALIANAS

NO FINAL DA SANTA MISSA CELEBRADA PELO ORDINÁRIO MILITAR Sexta-feira, 16 de Dezembro de 2005

Venerados Irmãos,
Distintas Autoridades civis e militares
Queridos Amigos!

É com verdadeiro prazer que venho encontrar-me convosco, no final da Santa Missa celebrada aqui, nesta Basílica, que conserva as memórias vivas do Apóstolo Pedro. Já estamos próximos da solenidade do Santo Natal e esta é uma ocasião propícia como nunca para formular fervorosos votos a todos vós, que representais as Forças Armadas Italianas. Dirijo a cada um de vós uma saudação afectuosa. Em particular, saúdo o vosso Pastor, o Ordinário Militar, D. Angelo Bagnasco, ao qual agradeço as palavras com que interpretou os sentimentos comuns. Com ele saúdo os Capelães militares, os vossos guias espirituais, que quiseram acompanhar-vos também neste momento de intensa comunhão eclesial. O meu deferente pensamento dirige-se, depois, ao Ministro da Defesa, aos Subsecretários, aos Chefes de Estado Maior e aos Comandantes-Gerais, que com a sua adesão tornaram este encontro também mais significativo.

Aquele que adoramos no Sacramento do Altar é o Emanuel, o Deus connosco, que veio ao mundo para a nossa redenção. Na Novena de Natal, que iniciamos precisamente hoje, à medida que nos aproximamos da Noite Santa, a liturgia com crescente intensidade espiritual faz-nos repetir: "Maranatha! Vinde, Senhor Jesus!". Esta invocação eleva-se do coração dos crentes em todas as partes da terra e ressoa incessante em cada Comunidade eclesial. No Natal virá o Messias esperado, Aquele que na sinagoga de Nazaré aplicará a si as antigas palavras proféticas: "O Senhor enviou-me... a proclamar a libertação aos cativos" (cf. Lc 4,18). O Redentor do homem virá para nos libertar e quebrará os vínculos do erro, do egoísmo, do pecado, que nos fazem prisioneiros. Cristo virá libertar com o seu amor o coração do homem. Como é importante preparar-nos para o acolher com humildade e sinceridade!

No mistério do Natal de Cristo, o Pai celeste manifesta à humanidade a sua misericórdia. Ele não quis abandonar o homem a si mesmo e ao seu pecado, mas veio ao seu encontro, oferecendo-lhe o perdão que liberta da opressão do pecado com o poder da sua graça. Que estes últimos dias do Advento torne mais forte em cada um de vós, queridos militares, o desejo do encontro com Cristo, o Príncipe da paz, fonte da nossa autêntica alegria.

Todos os dias experimentamos como a vida terrena é precária e provisória mas, graças à encarnação do Filho unigénito do Pai, o nosso olhar consegue captar sempre o amor providencial de Deus que dá sentido e valor a toda a nossa existência. A liturgia deste tempo de Advento estimula-nos à confiança, encoraja-nos a confiar-nos Àquele que pode cumprir plenamente as expectativas do nosso coração. Maria, com o seu "sim" ao Anjo Gabriel, aderiu totalmente à vontade de Deus e iniciou o grande mistério da redenção. Que ela nos acompanhe ao encontro com o Emanuel, o Deus connosco. Queridos militares, com estes sentimentos renovo-vos os meus votos mais cordiais para o Santo Natal já próximo, e concedo de coração a todos a minha Bênção, que faço extensiva às vossas comunidades de proveniência e às vossas famílias.




AO TERCEIRO GRUPO DE BISPOS DA POLÓNIA POR OCASIÃO DA VISITA "AD LIMINA APOSTOLORUM"


129
Sábado, 17 de Dezembro de 2005


Estimados Irmãos
no ministério episcopal

É com alegria que dou as minhas boas-vindas a todos vós, que constituís o terceiro grupo de Bispos da Polónia, vindos em visita ad limina Apostolorum.

Nos discursos precedentes, abordei numerosos temas ligados ao compromisso da evangelização no mundo moderno. Anunciei também que na terceira parte da minha mensagem teria centrado a reflexão no papel dos fiéis leigos na Igreja.

1. Portanto, comecemos a partir daquele ambiente que na estrutura da Igreja é o mais fundamental o ambiente da paróquia. No Decreto conciliar sobre o apostolado dos leigos, lemos: "A paróquia dá-nos um exemplo claro de apostolado comunitário, porque congrega numa unidade toda a diversidade humana que aí se encontra e a insere na universalidade da Igreja. Acostumem-se os leigos a trabalhar na paróquia, intimamente unidos aos seus sacerdotes, a trazer para a comunidade eclesial os próprios problemas e os do mundo, e as questões que dizem respeito à salvação dos homens, para que se examinem e resolvam no confronto de vários pareceres. Acostumem-se, por fim, a prestar auxílio a toda a iniciativa apostólica e missionária da sua comunidade eclesial, na medida das próprias forças" (Apostolicam actuositatem
AA 10).

A primeira e mais importante exigência é que a paróquia constitua uma "comunidade eclesial" e uma "família eclesial". Mesmo que se trate de paróquias muito numerosas, é necessário realizar todos os esforços possíveis, a fim de que elas não se reduzam a uma massa de fiéis anónimos. Naturalmente, na realização de tal tarefa é insubstituível o papel dos presbíteros e, de maneira particular, o dos párocos. Eles deveriam ser os primeiros a conhecer as ovelhas do seu rebanho, a manter contactos pastorais com todos os ambientes e a procurar tomar conhecimento das necessidades espirituais e materiais dos paroquianos.

É importante também a participação concreta dos leigos na formação da comunidade. Aqui, penso em primeiro lugar nos Conselhos pastorais e nos Conselhos para os assuntos económicos (cf. Código de Direito Canónico, CIC 537). Embora eles tenham uma índole exclusivamente consultiva e não decisória, todavia podem ajudar eficazmente os Pastores no discernimento das necessidades da comunidade e na descoberta das modalidades para ir ao encontro de tais necessidades. A colaboração dos Conselhos com os Pastores deve realizar-se sempre no espírito de comum solicitude pelo bem dos fiéis.

É necessário também um contacto vivo dos Pastores com as diversas comunidades de apostolado, que trabalham no âmbito da paróquia. Também não podemos esquecer a necessidade da colaboração entre as próprias comunidades. Jamais deveria existir rivalidades entre as mesmas; pelo contrário, seria necessário que entre elas houvesse uma complementação recíproca e cordial, em vista da assunção das tarefas apostólicas. Especialmente os líderes de tais grupos não deveriam esquecer que, quando trabalham no território e no seio de uma comunidade paroquial, são chamados a realizar um único programa de pastoral, sob a direcção de Pastores responsáveis.

No que se refere à evangelização, já falei sobre a necessidade da catequese dos adultos. Não obstante esteja fundamentada na Sagrada Escritura e no Magistério da Igreja, ela deve contudo concentrar-se na experiência sacramental, e particularmente no compromisso a viver o mistério da Eucaristia. Os Padres conciliares não hesitaram em reconhecer que a Eucaristia é "fonte e ápice de toda a evangelização" (cf. Presbyterorum ordinis PO 5 cf. também Sacrosanctum concilium SC 10).

Como escrevia o meu amado Predecessor João Paulo II, "a Igreja recebeu a Eucaristia de Cristo seu Senhor, não como um dom, embora precioso, entre muitos outros, mas como o dom por excelência, porque dom d'Ele mesmo, da sua Pessoa na humanidade sagrada, e também da sua obra de salvação" (Ecclesia de Eucharistia EE 11). Por isso, os Pastores da Igreja devem realizar todos os esforços para que o povo a eles confiado esteja consciente da grandeza de tal dom e se aproxime com a maior frequência possível deste Sacramento do amor, tanto na Celebração eucarística e na Comunhão, como na adoração.

130 Na Carta Apostólica Novo millennio ineunte, João Paulo II recordava que a Eucaristia dominical é "o lugar privilegiado, onde a comunhão é constantemente anunciada e fomentada" (n. 36). Sei que na Igreja presente na Polónia a participação dos fiéis na Santa Missa dominical é numerosa. Mas os Pastores, encorajados pelos seus Bispos, façam o possível a fim de que o número dos participantes na Liturgia dominical não diminua, mas aumente.

Irmãos, peço-vos cordialmente que encorajeis os sacerdotes a cuidarem das crianças e dos jovens, que se aproximam do altar do Senhor como coroinhas e leitores. Manifestem a sua solicitude pastoral também para com as jovens que, na Liturgia, desempenham activamente o papel que lhes compete. Este serviço pastoral pode produzir muitos frutos para as vocações sacerdotais e religiosas.

2. No século passado, especialmente depois do Concílio, na Igreja desenvolveram-se vários movimentos que têm como finalidade a evangelização. Tais movimentos não podem existir, por assim dizer, "ao lado" da comunidade universal da Igreja. Por isso, faz parte das tarefas do Bispo diocesano manter um contacto vivo com eles, animando-os a trabalhar em conformidade com o carisma reconhecido pela Igreja e, ao mesmo tempo, a evitar de se fechar à realidade que os circunda.

Muitos destes movimentos estabeleceram um profundo contacto com as Igrejas não católicas. Eles podem oferecer uma importante contribuição no trabalho de construção dos vínculos ecuménicos: a oração em comum e as obras empreendidas em conjunto alimentam a esperança de que se possa apressar a aproximação, também nos sectores da doutrina e da vida da Igreja. Todavia, é necessário que também aqui os Bispos tenham o cuidado de fazer com que se interprete correctamente o ecumenismo. Ele deve consistir sempre na busca da verdade e não dos compromissos fáceis, que podem levar os movimentos católicos a perder a sua própria identidade.

Ao lado dos movimentos eclesiais, existem numerosos ambientes de leigos que se associam num determinado sector, ou então com base na profissão que desempenham, e acorrem aos Bispos para lhes pedir a introdução de uma pastoral específica, correspondente à realidade que lhes é própria. Prezados Irmãos, encorajo-vos a apoiar tais iniciativas, oferecendo assim a cada um a possibilidade de desenvolver a sua espiritualidade pessoal, tendo como base os desafios de cada dia.

Entre estes ambientes, João Paulo II dedicou uma atenção particular àqueles que "ocupam lugares de primeiro plano na sociedade" (Levantai-vos, vamos!, n. 91), mas que ao mesmo tempo desejam levar uma vida de fé e oferecer um testemunho cristão. O Concílio exortava-os: "Os que são ou podem tornar-se aptos para exercer a difícil, e muito nobre arte da política, preparem-se para ela; e procurem exercê-la sem pensar no próprio interesse ou em vantagens materiais.

Procedam com inteireza e prudência contra a injustiça e a opressão, contra o domínio arbitrário de uma pessoa ou de um partido [político] e contra a intolerância. E dediquem-se com sinceridade e equidade, mais ainda, com caridade e fortaleza política, ao bem de todos" (Gaudium et spes
GS 75).

No cumprimento desta tarefa, os políticos cristãos não podem permanecer desprovidos da ajuda por parte da Igreja. Aqui, trata-se de maneira particular da ajuda a tomarem consciência da sua identidade cristã e dos valores morais universais, que se fundamentam na natureza do homem, de forma a comprometer-se, com base numa consciência recta, a incuti-los nas disposições civis, em vista de uma convivência respeitosa do homem em todas as suas dimensões. No entanto, nunca podemos esquecer que é uma questão "de grande importância, sobretudo onde existe uma sociedade pluralista, que se tenha uma concepção exacta das relações entre a comunidade política e a Igreja, e ainda que se distingam de modo clarividente as actividades que os fiéis, isoladamente ou em grupo, desempenham no seu próprio nome, como cidadãos guiados pela sua consciência de cristãos, e aquelas que eles exercem em nome da Igreja e em união com os seus pastores" (Ibid., n. 76).

3. Para concluir, gostaria de chamar a atenção sobre outra dimensão do compromisso dos leigos na Igreja. No mundo de hoje, juntamente com a globalização e com a rápida passagem das informações, observamos em muitos ambientes uma maior sensibilidade às necessidades do próximo e a disponibilidade a prestar ajuda onde quer que se verifique uma desgraça.

Ao lado das iniciativas internacionais e nacionais, estão a desenvolver-se também várias formas de voluntariado, que se propõem como finalidade a ajuda aos necessitados presentes no próprio ambiente. Nos asilos, nos dormitórios para os desabrigados, para as pessoas não auto-suficientes e para as mães solteiras e vítimas da violência trabalham indivíduos dispostos a dedicar o próprio tempo ao serviço do próximo. Eles oferecem a sua ajuda também aos doentes, às pessoas abandonadas, às famílias numerosas, que vivem na indigência, e aos portadores de deficiência física ou mental. Organizam-se centros de intervenção em caso de crise, unidades operativas ao serviço das pessoas que experimentam alguma forma de dificuldade que a vida pode reservar. Não se pode deixar de valorizar o trabalho de quantos se inspiram no exemplo do bom samaritano evangélico. Ele deve ser sustentado e animado.

Bem sei que na Polónia está a desenvolver-se também o voluntariado que se propõe como finalidade a defesa da vida humana. Há que agradecer a quantos empreendem uma obra de educação e de preparação para a vida matrimonial e familiar, e defendem o direito à vida de cada ser humano, desde a concepção até à morte natural. Muitos empenham em tal actividade os próprios meios materiais, outros dedicam o seu tempo e outros ainda oferecem o dom da oração. Todas estas pessoas contam com o encorajamento e o apoio moral da parte dos Bispos, dos sacerdotes e de toda a comunidade dos fiéis. Que isto não lhes venha a faltar!

131 As missões são outro campo da vida da Igreja, em que os voluntários se comprometem. Um número cada vez maior de leigos parte para os países de missão, a fim de ali trabalhar segundo a sua preparação profissional e em conformidade com os talentos que lhes são próprios e, ao mesmo tempo, para oferecer o seu testemunho de amor cristão aos habitantes das regiões mais pobres do mundo. Trata-se de uma actividade digna de admiração e de reconhecimento. Queridos Irmãos, exorto-vos a aceitar com abertura e benevolência, mas sempre com a devida prudência, os leigos que estão dispostos a trabalhar no campo das missões. A grande obra missionária de toda a Igreja seja sustentada espiritual e materialmente por todos, em conformidade com a vocação cristã de cada um, na consciência do compromisso que brota do Baptismo, a anunciar a todos os povos a mensagem do amor de Cristo.

Estimados Irmãos, nos documentos do Concílio e dos meus Predecessores nesta Sé Apostólica encontrareis muitos outros pensamentos preciosos sobre o tema da actividade dos leigos na Igreja e no mundo. Vale a pena voltar a reflectir sobre este magistério. Vós, dilectos Irmãos, sabeis discernir as necessidades das comunidades confiadas ao vosso cuidado pastoral e criar as melhores condições para uma boa colaboração do laicado com o clero na mesma obra de evangelização, de santificação e de edificação do Reino de Deus. Que Maria, Mãe da Igreja, vos sustente neste trabalho. O bom Deus vos abençoe!



Discursos Bento XVI 122