Discursos Bento XVI 267


BENTO XVI:

268 Antes de tudo, gostaria de realçar o que o senhor disse. Por ocasião das Jornadas Mundiais da Juventude, e também noutras circunstâncias como recentemente na Vigília de Pentecostes sobressai que há um desejo na juventude, uma busca também de Deus. Os jovens querem ver se Deus existe e o que nos diz. Portanto, verifica-se uma certa disponibilidade, com todas as dificuldades de hoje.

Existe também um entusiasmo. Portanto, devemos fazer o possível para manter viva esta chama que se mostra em ocasiões como as Jornadas Mundiais da Juventude.

Como fazer? É uma pergunta comum. Penso que precisamente aqui, se deveria realizar uma "pastoral integrada", porque na realidade nem todos os párocos têm a possibilidade de se ocuparem o suficiente da juventude. Portanto, há necessidade de uma pastoral que transcenda os limites da paróquia e também os limites do trabalho do sacerdote. Uma pastoral que inclua também muitos agentes. Parece-me que, sob a coordenação do Bispo, se deve encontrar o modo, por um lado, de integrar os jovens na paróquia, para que sejam fermento da vida paroquial; e, por outro, encontrar para estes jovens também a ajuda de agentes extraparoquiais. As duas coisas devem caminhar em paralelo. É preciso sugerir aos jovens que, não só na paróquia mas em diversos contextos, se integrem na vida da Diocese, para depois se reencontrarem também na paróquia. Por isso, é necessário privilegiar todas as iniciativas que favoreçam este aspecto.

Penso que é muito importante agora a experiência do voluntariado. É fundamental que os jovens não sejam deixados às discotecas, mas tenham compromissos nos quais se sintam necessários, se aperçebam que podem fazer algo de positivo. Sentindo este impulso de fazer algo de bom pela humanidade, por alguém, por um grupo, os jovens sentem este estímulo a comprometer-se e encontram também a "pista" positiva para um compromisso, para uma ética cristã. Parece-me ser muito importante que os jovens tenham realmente compromissos que mostrem a sua necessidade, que os guiem pelo caminho de um serviço positivo na ajuda inspirada pelo amor de Cristo pelos homens, de forma que eles mesmos procurem as fontes das quais haurir para encontrar a força e o compromisso.

Outra experiência são os grupos de oração, onde eles aprendem a ouvir a Palavra de Deus, a compreender a Palavra de Deus precisamente no seu contexto juvenil, a entrar em contacto com Deus. Isto significa também aprender a forma comum da oração, a Liturgia, que talvez num primeiro momento pareça bastante inacessível para eles. Aprendem que a Palavra de Deus nos procura, apesar da distância dos tempos, que hoje nos fala. Nós levamos o fruto da terra e do nosso trabalho ao Senhor e encontramo-lo transformado em dom de Deus. Como filhos, falámos com o Pai e depois recebemos o dom da sua Presença.

Também seriam úteis as escolas de Liturgia, às quais os jovens possam ter acesso. Por outro lado, são necessárias ocasiões nas quais a juventude possa mostrar-se e apresentar-se. Ouvi dizer que aqui, em Albano, foi feita uma representação da vida de São Francisco. Comprometer-se neste sentido significa entrar na personalidade de São Francisco, no seu tempo, e assim alargar a própria personalidade, entrar num contexto de tradição cristã, despertar a sede de conhecer melhor onde se inspirou este santo. Não era só um ambientalista ou um pacifista. Era sobretudo um homem convertido. Li com muito prazer que o Bispo de Assis, D. Sorrentino, precisamente para remediar este "abuso" da figura de São Francisco, por ocasião do VIII centenário da sua conversão quer proclamar um "Ano de conversão", para ver qual é o verdadeiro "desafio". Talvez todos nós possamos animar um pouco a juventude para fazer compreender o que é a conversão, relacionando-nos também com a figura de São Francisco, para procurar um caminho que alargue a vida. Inicialmente, Francisco era quase uma espécie de "play-boy". Depois, sentiu que isso não lhe bastava. Ouviu a voz do Senhor: "Constrói a minha casa". Pouco a pouco compreendeu o que significava "construir a Casa do Senhor".

Portanto, não tenho respostas muito concretas, porque me encontro perante uma missão onde os jovens já estão reunidos, graças a Deus. Mas parece-me que se devem usar todas as possibilidades que se oferecem hoje nos Movimentos, nas Associações, no Voluntariado, noutras actividades juvenis. É preciso apresentar também a juventude à paróquia, de forma que ela veja quem são os jovens. É necessária uma pastoral vocacional. Tudo deve ser coordenado pelo Bispo.

Parece-me que se encontram agentes pastorais através da mesma cooperação autêntica dos jovens que se formam. E assim, pode abrir-se o caminho da conversão, a alegria que Deus existe e se preocupa por nós, que nós temos acesso a Deus e podemos ajudar outros a "reconstruir a sua Casa". Parece-me que esta é enfim a nossa missão, por vezes difícil, mas no final muito bela: a de "construir a Casa de Deus" no mundo de hoje.

Agradeço-vos a vossa atenção e peço desculpa pela fragmentariedade das minhas respostas. Colaboremos juntos para que cresça a "Casa de Deus" no nosso tempo, para que muitos jovens encontrem o caminho do serviço ao Senhor.

                                                 

                                                          Setembro 2006





VISITA AO SANTUÁRIO DA SANTA FACE DE MANOPELLO NOS ABRUZOS, ITÁLIA DISCURSO


269
Sexta-feira, 1 de Setembro de 2006


Antes de entrar no Santuário, o Santo Padre saudou os milhares de fiéis ali reunidos com as seguintes palavras:

Queridos irmãos e irmãs!

Obrigado pelas boas-vindas tão cordiais. Vejo que a Igreja é uma grande família. Onde está o Papa a família reúne-se em grande alegria. Para mim é um sinal da fé viva, da alegria que a fé nos dá, da comunhão, da paz que cria a fé. Estou-vos muito grato pelas boas-vindas. Assim vejo toda a beleza desta Região da Itália aqui, nos vossos rostos. Dirijo uma saudação particular aos doentes. Sabemos que o Senhor está particularmente próximo de vós, vos ajuda, vos acompanha nos vossos sofrimentos. Estais nas nossas orações. E rezai também por nós.

Dirijo uma saudação especial aos jovens e às crianças da Primeira Comunhão. Obrigado pelo vosso entusiasmo, pela vossa fé. Todos nós, como dizem os Salmos, "procuramos a Face do Senhor". Este é também o sentido desta minha visita. Juntos procuremos conhecer sempre melhor a face do Senhor e da face do Senhor haurimos esta força de amor e de paz que nos mostra também o caminho da nossa vida.

Obrigado e felicidades a todos vós!

Excelência
Venerados Irmãos no Episcopado
Queridos irmãos e irmãs!

Antes de tudo, desejo mais uma vez agradecer profundamente este acolhimento, as suas palavras, Excelência, tão profundas, tão cordiais, a expressão da sua amizade, da vossa amizade, e os dons de grandíssimo significado: a Face de Cristo que aqui se venera, para mim, para a minha casa, e depois estes dons da vossa terra, que expressam a beleza e a bondade da terra, dos homens que vivem e trabalham aqui, e a beleza e bondade do próprio Criador.

Desejo simplesmente agradecer ao Senhor o encontro de hoje, simples e familiar, num lugar onde podemos meditar sobre o mistério do amor divino, contemplando o ícone da Santa Face. A todos vós aqui presentes dirijo o meu agradecimento mais sentido pelo vosso cordial acolhimento e pelo empenho e discrição com que favorecestes esta peregrinação particular, que contudo, como peregrinação eclesial não pode ser totalmente particular. Saúdo e agradeço, repito, em particular ao vosso Arcebispo, amigo desde há muitos anos. Colaborámos na Comissão Teológica. E em tantos diálogos aprendi sempre da sua sabedoria, e também dos seus livros. Obrigado pelos dons que me oferecestes e que aprecio muito precisamente na sua qualidade de "sinais", como os chamou D. Forte.

270 De facto, eles são sinais da comunhão afectiva e efectiva que liga o povo desta querida terra dos Abruzos ao Sucessor de Pedro. Dirijo uma saudação especial a vós, sacerdotes, religiosos, religiosas e seminaristas aqui reunidos. Sinto-me particularmente feliz por ver um grande número de seminaristas, por conseguinte o futuro da Igreja presente entre nós. Não sendo possível encontrar toda a Comunidade diocesana talvez seja na próxima sinto-me feliz que vós a representeis aqui, vós, que sois pessoas já dedicadas ao ministério presbiteral e à vida consagrada ou encaminhadas para o sacerdócio.

Pessoas que me apraz considerar apaixonadas por Cristo, atraídas por Ele e comprometidas a fazer da própria existência uma busca contínua da Santa Face. Por fim, dirijo uma grata saudação à comunidade dos Padres Capuchinhos, que nos hospeda, e que há séculos se ocupa deste santuário, meta de tantos peregrinos.

Há pouco, quando estava em oração, pensei nos dois primeiros Apóstolos que, solicitados por João Baptista, seguiram Jesus nas proximidades do rio Jordão como lemos no início do Evangelho de João (cf.
Jn 1,35-37). O evangelista narra que Jesus se voltou e lhes perguntou: "Quem procurais?". Eles responderam: "Rabbi, onde moras?". Respondeu: "Vinde ver" (cf. Jn 1,38-39). Naquele mesmo dia os dois que O seguiram fizeram uma experiência inesquecível, que os fez dizer: "Encontramos o Messias" (Jn 1,41). Aquele que pouco tempo antes consideravam um simples "rabbi", tinha adquirido uma identidade bem definida, a de Cristo esperado há séculos.

Mas na realidade, quanto caminho tinham ainda diante de si aqueles discípulos! Nem sequer podiam imaginar quão profundo seria o mistério de Jesus de Nazaré; quanto se poderia revelar imperscrutável o seu "rosto". A ponto que, depois de ter vivido junto com ele três anos, Filipe, um deles, ouvirá na Última Ceia: "Estou convosco há tanto tempo e tu ainda não me conheces, Filipe?". E depois aquelas palavras que expressam toda a novidade da revelação de Jesus: "Quem me vê, vê o Pai" (Jn 14,9).

Só depois da sua paixão, quando o encontrarem ressuscitado, quando o Espírito iluminar as suas mentes e os seus corações, os Apóstolos compreenderão o significado das palavras que Jesus tinha dito, e reconhecê-lo-ão como o Filho de Deus, o Messias prometido para a redenção do mundo. Então tornar-se-ão seus mensageiros infatigáveis, testemunhas corajosas até ao martírio.

"Quem me vê, vê o Pai". Sim, queridos irmãos e irmãs, para "ver Deus" é preciso conhecer Cristo e deixar-se plasmar pelo seu Espírito que guia os crentes "para a verdade completa" (cf. Jn 16,13).

Quem encontra Jesus, quem se deixa atrair por Ele e está disposto a segui-lo até ao sacrifício da vida, experimenta pessoalmente, como Ele fez na cruz, que só o "grão de trigo" que é lançado à terra e morre, dá "muito fruto" (cf. Jn 12,24). Este é o caminho de Cristo, o caminho do amor total que vence a morte: quem o percorrer e desprezar "a si mesmo, neste mundo, assegura para si a vida eterna" (Jn 12,25). Isto é, vive em Deus já nesta terra, atraído e transformado pelo esplendor do seu rosto. Esta é a experiência dos verdadeiros amigos de Deus, os santos, que reconheceram e amaram nos irmãos, especialmente os mais pobres e necessitados, o rosto daquele Deus longamente contemplado com amor na oração.

Eles são para nós exemplos encorajadores a ser imitados; garantem-nos que se percorrermos com fidelidade este caminho, o caminho do amor, também nós como canta o Salmista nos saciaremos da presença de Deus (cf. Sl Ps 16 [17], 15).

"Jesu... quam bonus te quaerentibus! Quanto és bom, Jesus, para quem te procura!": assim cantámos há pouco executando o antigo hino "Jesu, dulcis memoria", que alguns atribuem a São Bernardo. É um hino que adquire eloquência particular neste santuário dedicado à Santa Face e que recorda o Salmo 23 [24]: "Esta é a geração dos que o procuram, dos que buscam a face de Deus de Jacob" (v. 6). Mas qual é "a geração" que procura o rosto de Deus, qual geração é digna de "subir ao monte do Senhor", de "estar no seu lugar santo"? O salmista explica: são aqueles que têm "mãos inocentes e coração puro", que não dizem mentiras, que não juram falso contra o próximo (cf. v. 3-4).

Portanto, para entrar em comunhão com Cristo e contemplar o seu rosto, para reconhecer o rosto do Senhor no dos irmãos e nas vicissitudes de todos os dias, são necessárias "mãos inocentes e corações puros". Mãos inocentes, isto é, existências iluminadas pela verdade do amor que vence a indiferença, a dúvida, a mentira e o egoísmo; e além disso, são necessários corações puros, corações arrebatados pela beleza divina, como diz a pequena Teresa de Lisieux na sua oração à Santa Face, corações que têm impresso o rosto de Cristo.

Queridos sacerdotes, se permanecer impressa em vós, pastores do rebanho de Cristo, a santidade da sua face, não tenhais receio, também os fiéis confiados aos vossos cuidados serão por ele contagiados e transformados. E vós, seminaristas, que vos preparais para ser guias responsáveis do povo cristão, não vos deixeis atrair por mais nada a não ser por Jesus e pelo desejo de servir a sua Igreja.

271 Também a vós, religiosos e religiosas, gostaria de dizer o mesmo, para que cada uma das vossas actividades seja um reflexo visível da bondade e da misericórdia divina. "A tua face, ó Senhor, eu procuro": procurar a face de Jesus deve ser o anseio de todos nós, cristãos; de facto, nós somos "a geração" que neste tempo procura a sua face, o rosto do "Deus de Jacob". Se perseverarmos na busca da face do Senhor, no final da nossa peregrinação terrena será Ele, Jesus, o nosso gozo eterno, a nossa recompensa e glória para sempre: "Sis Jesu nostrum,/qui es futurus praemium:/sit nostra in te gloria,/per cuncta semper saecula".

Foi esta certeza que animou os santos da vossa região, entre os quais me apraz citar particularmente Gabriel de Nossa Senhora das Dores e Camillo de Lellis; a eles dirigimos a nossa recordação reverente e a nossa oração. Mas dirigimos agora um pensamento de especial devoção à "Rainha de todos os santos", a Virgem Maria, que vós venerais em diversos santuários e capelas espalhados nos vales e montes dos Abruzos. Nossa Senhora, em cujo rosto mais do que em qualquer outra criatura se vêem os traços do Verbo encarnado, vigie sobre as famílias e paróquias, sobre as cidades e nações de todo o mundo.

Ajude-nos a Mãe do Criador a respeitar também a natureza, grande dom de Deus que podemos admirar olhando para as maravilhosas montanhas que nos circundam. Mas este dom está sempre exposto a sérios riscos de degradação ambiental e por isso deve ser defendido e tutelado. Trata-se de uma urgência que, como observou D. Forte, é oportunamente realçada pelo Dia de reflexão e oração pela protecção da natureza, que é celebrado precisamente hoje pela Igreja italiana.

Queridos irmãos e irmãs, ao agradecer mais uma vez a vossa presença e os vossos dons, invoco sobre todos vós e vossos familiares a bênção de Deus com a antiga fórmula bíblica: "O Senhor te abençoe e te guarde! O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face e te favoreça. O Senhor volte para ti a sua face e te dê paz!" (cf. Nm
Nb 6,24-26). Amém!




AO SENHOR PEDRO PABLO CABRERA GAETE NOVO EMBAIXADOR DO CHILE JUNTO À SANTA SÉ Sexta-feira, 8 de Setembro de 2006



Senhor Embaixador

1. Apraz-me recebê-lo nesta Audiência na qual me apresenta as Cartas Credenciais que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República do Chile junto da Santa Sé. Dou-lhe as boas-vindas ao assumir a nobre responsabilidade que o seu Governo lhe confiou, e expresso-lhe os melhores votos por que a sua missão seja frutuosa para continuar a fortalecer as boas relações diplomáticas existentes entre o seu País e a Sé Apostólica.

Agradeço-lhe as amáveis palavras que me dirigiu, assim como a deferente saudação que a Presidente da República, Srª Michelle Bachelet, me quis fazer chegar por seu intermédio, expressão da proximidade espiritual do povo chileno ao Sucessor de Pedro, cinzelada ao longo da história em concomitância com o trabalho da Igreja através dos seus membros e instituições.

2. O Chile aproxima-se do seu bicentenário como República com as esperanças que nascem de um período particularmente significativo, no qual se conquistaram metas de desenvolvimento notáveis, se foram consolidando as Instituições e parece prosperar o clima de uma convivência pacífica. O percurso económico favorável propiciou também progressos no campo da educação e da saúde, assim como iniciativas sociais orientadas para que todos os cidadãos possam viver plenamente em sintonia com a sua dignidade.

Estes factores, assim como a abertura a horizontes que vão mais além dos próprios confins, são sem dúvida motivo de satisfação, e também uma nova chamada ao sentido de responsabilidade, para manter vigorosos os mais nobres ideiais que dão vida a qualquer progresso verdadeiro e, a longo prazo, o tornam possível. Como Vossa Excelência recordou com as suas palavras, o progresso perene dos valores, que devem inspirar as realizações técnicas, é uma dimensão na qual deve crescer quer a comunidade nacional quer a internacional para promover o bem comum.

3. Em relação a isto, a Igreja cumpre a sua missão anunciando o Evangelho de Cristo, projectando a sua luz sobre as realidades do mundo e do ser humano, proclamando através dele a sua dignidade mais alta. De facto, "a fé ilumina todas as coisas com uma luz nova e faz-nos conhecer a vontade divina sobre a vocação integral do homem, orientando assim o espírito para soluções plenamente humanas" (Lumen gentium LG 11). Neste sentido, partilha os anseios de uma justiça que não se vê subjugada pela falta de respeito pela dignidade do homem e pelos direitos inalienáveis a que ela dá origem.

272 Estes direitos são inalienáveis precisamente porque o homem os possui por sua própria natureza e, portanto, não estão ao serviço de outros interesses. Entre eles deve mencionar-se, em primeiro lugar, o direito à vida em todas as fases do seu desenvolvimento ou em qualquer situação em que se encontre. Também o direito a formar uma família, baseada nos vínculos do amor e da fidelidade, estabelecidos no matrimónio entre um homem e uma mulher, e que deve ser protegida e ajudada para que cumpra a sua missão incomparável de ser fonte de convivência e célula básica de toda a sociedade. Nela, como instituição natural, reside além disso o direito primário de educar os filhos segundo os ideais com que os pais desejam enriquecê-los depois de os terem acolhido com amor nas suas vidas.

4. Vossa Excelência sabe bem que a querida Pátria chilena conta com abundantes recursos históricos e espirituais para enfrentar o futuro com esperanças fundadas de alcançar novas metas de humanidade, contribuindo assim para favorecer também no concerto das nações vínculos de cooperação e convivência pacífica. Disto dão testemunho os Santos, que tanta fama adquiriram em toda a parte, como Teresa dos Andes ou o Padre Alberto Hurtado. Os numerosos dons que o Criador conferiu na natureza aos filhos e filhas chilenos devem continuar a dar frutos que abram um futuro mais próspero às novas gerações, sejam amantes da paz e tenham um sentido transcendente da vida, em sintonia com as raízes cristãs seculares do País.

Ao terminar este encontro, renovo-lhe a minha saudação de boas-vindas. Desejo-lhe uma feliz permanência em Roma, não só rica de experiências profissionais, mas também pessoais. Esta é uma cidade que oferece em si mesma muitas possibilidades e, de certa forma, um ponto privilegiado para compreender as problemáticas do mundo.

Com estes sentimentos, invoco a protecção materna da Santíssima Virgem Maria que, sob o título do Carmelo, é Padroeira dos chilenos, e concedo de coração a Vossa Excelência, à sua família e demais entes queridos, assim como aos seus colaboradores na Embaixada, a Bênção Apostólica.




AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL DO CANADÁ (ONTÁRIO) POR OCASIÃO DA VISITA "AD LIMINA APOSTOLORUM" Sexta-feira, 8 de Setembro de 2006


Eminência
Queridos Irmãos Bispos

1. "Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus, e Deus nele" (1Jn 4,16). É com carinho fraterno que vos dou as boas-vindas, Bispos de Ontário, enquanto agradeço ao Bispo D. Smith os amáveis sentimentos que expressou no vosso nome. Retribuo com afecto e asseguro-vos, bem como às pessoas confiadas aos vossos cuidados pastorais, as minhas orações e a minha solicitude. A vossa visita ad limina Apostolorum e ao Sucessor de Pedro constitui uma oportunidade para confirmar o vosso compromisso em tornar Deus cada vez mais visível na Igreja e na sociedade, através do testemunho jubiloso do Evangelho, que é o próprio Jesus Cristo.

As numerosas exortações do Evangelista João, a permanecer no amor e na verdade de Cristo evoca a sugestiva imagem de uma morada certa e segura. É Deus que nos ama primeiro (cf. 1Jn 4,10) enquanto nós, atraídos por esta dádiva, encontramos a nossa morada lá onde podemos "beber incessantemente da fonte primeira e originária, que é Jesus Cristo, de cujo coração trespassado brota o amor de Deus" (Deus caritas est ). São João sentia-se também impelido a exortar as suas comunidades a perseverarem em tal amor, dado que certas pessoas já tinham sido debilitadas pelas controvérsias e pelas distracções que eventualmente podiam levar à divisão.

2. Estimados Irmãos, as vossas próprias comunidades diocesanas são desafiadas a fazer ressoar esta profunda profissão de fé: "Nós conhecemos o amor que Deus nos tem, pois cremos nele" (1Jn 4,16). Estas palavras, que revelam eloquentemente a fé como uma adesão pessoal a Deus e o consequente consenso a toda a verdade revelada por Deus (cf. Dominus Iesus, 7), só podem ser credivelmente proclamadas em vista de um encontro com Cristo. Atraído pelo seu amor, o fiel confia-se inteiramente a Deus e, desta forma, torna-se um só com o Senhor (cf. 1Co 6,17). Na Eucaristia, esta união é fortalecida e renovada quando o homem entra na própria dinâmica da abnegação de Cristo, a fim de a participar na vida divina: "Quem realmente come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e Eu nele" (Jn 6,56 cf. Deus caritas est ).

Todavia, a admoestação de São João permanece sempre actual. Nas sociedades cada vez mais secularizadas vós mesmos fazeis esta experiência o amor que brota do Coração de Deus em benefício da humanidade pode passar inobservado ou até chegar a ser rejeitado. Quando acredita que o facto de se subtrair a este relacionamento constitui, de uma maneira ou de outra, uma solução para a sua própria libertação, o homem torna-se efectivamente alheio a si mesmo porque "na realidade, o mistério do homem só se esclarece verdadeiramente no mistério do Verbo encarnado" (Gaudium et spes GS 22). Em virtude do escasso interesse que têm por aquele amor que revela a plenitude da verdade do ser humano, numerosos homens e mulheres continuam a afastar-se da morada de Deus, preferindo viver no deserto do isolamento individual, da ruptura social e da perda da sua própria identidade cultural.

273 3. Nesta perspectiva, compreende-se que a tarefa fundamental da evangelização da cultura consiste no desafio de tornar Deus visível no rosto humano de Jesus. Ajudando os indivíduos a reconhecerem e experimentarem o amor de Cristo, haveis de despertar neles o desejo de permanecer na casa do Senhor, abraçando a vida da Igreja. Esta é a nossa missão. Ela expressa a nossa natureza eclesial e assegura que, consequentemente, todas as iniciativas de evangelização fortalecem a identidade cristã. A este propósito, temos o dever de reconhecer que qualquer diminuição da mensagem fulcral de Jesus, ou seja, do "Reino de Deus", quando se fala de modo indefinido dos "valores do Reino", debilita a identidade cristã e enfraquece a contribuição da Igreja em vista da regeneração da sociedade. Quando o crer é substituído pelo "fazer" e o testemunho pelo diálogo sobre "questões", há urgente necessidade de recuperar a profunda alegria e admiração dos primeiros discípulos cujos corações, na presença do Senhor, "ardiam dentro deles", impelindo-os assim a "narrar o que tinha acontecido" (cf. Lc 24,32 Lc 24,35).

Hoje, os obstáculos levantados contra a propagação do Reino de Cristo são experimentados de modo mais dramático na separação entre o Evangelho e a cultura, com a exclusão de Deus do sector público. O Canadá goza de uma merecida reputação de compromisso generoso e concreto nos campos da justiça e da paz, e nas vossas cidades multiculturais existe um entusiasmante sentido de fascinação e de oportunidades. Ao mesmo tempo, contudo, determinados valores separados das suas raízes morais e do seu significado integral, que se encontra em Cristo, começaram a desenvolver-se de maneira extremamente preocupante. Em nome da "tolerância", o vosso país está a enfrentrar a loucura da redefinição da palavra esposo, e em nome da "liberdade de escolha" está a confrontar-se com a aniquilação quotidiana dos nascituros. Quando se ignora o plano divino do Criador, perde-se a verdade da natureza humana.

Falsas dicotomias não são desconhecidas no seio da própria comunidade cristã. Elas são particularmente prejudiciais, quando os líderes civis cristãos sacrificam a unidade da fé e sancionam a desintegração da razão e dos princípios da ética natural, submetendo-se às tendências sociais efémeras e às exigências falazes das sondagens da opinião pública. A democracia só terá bom êxito na medida em que estiver alicerçada na verdade e na correcta compreensão da pessoa humana. O empenhamento dos católicos na vida política não pode comprometer este princípio, caso contrário o testemunho do esplendor da verdade por parte dos cristãos no sector público seria silenciado com a proclamação da sua autonomia da moralidade (cf. Nota doutrinal A participação dos católicos na vida política, 2-3; 6). Nos vossos debates com os líderes políticos e civis, encorajo-vos a demonstrar que, longe de ser um impedimento para o diálogo, a nossa fé cristã constitui uma ponte precisamente porque chega a unir a razão e a cultura.

4. No contexto da evangelização da cultura, desejo fazer menção da excelente rede de escolas católicas no núcleo da vida eclesial da vossa Província. A catequese e a educação religiosa constituem um apostolado exigente. Agradeço e encorajo os numerosos leigos, homens e mulheres que, juntamente com os religiosos e as religiosas, se esforçam por assegurar que os vossos jovens sejam cada vez mais reconhecidos pelo dom da fé que receberam. Mais do que nunca, isto exige que o testemunho, alimentado pela oração, seja o ambiente abrangente de cada uma das escolas católicas. Como testemunhas, cada um dos professores deve dar a razão da sua esperança (cf. 1P 3,15), vivendo a verdade que eles mesmos propõem aos seus estudantes, sempre com referência Àquele que encontraram e cuja bondade confiante eles experimentaram com alegria (cf. Discurso no Encontro eclesial diocesano de Roma sobre "Viver a verdade segundo a qual Deus ama o seu povo", 6 de Junho de 2005). Assim, juntamente com Santo Agostinho, eles dizem: "Nós que falamos e vós que ouvis reconhecemo-nos como co-discípulos de um único Mestre" (Santo Agostinho, Sermões, 23,2).

Um obstáculo particularmente insidioso para a educação nos dias de hoje, como confirmam os vossos próprios relatórios, é a acentuada presença na sociedade contemporânea daquele relativismo que, nada reconhecendo como definitivo, considera como critério último somente o próprio eu com os respectivos desejos. Num horizonte tão relativista verifica-se um eclipse das finalidades sublimes, com a diminuição dos padrões de excelência, a insegurança diante das categorias do bem e a busca intransigente e insensata de novidades, exibidas como a realização da liberdade. Estas tendências prejudiciais estão a indicar uma particular exigência do apostolado da "caridade intelectual", que promove a unidade essencial do saber, orienta os jovens rumo à sublime satisfação do exercício da sua liberdade em relação à verdade e articula o relacionamento entre a fé e todos os aspectos da vida familiar e cívica. Se forem introduzidos no amor pela verdade, estou persuadido de que os jovens do Canadá sentirão o prazer de descobrir a casa do Senhor, que "a todo o homem ilumina" (Jn 1,9) e satisfaz todas as aspirações da humanidade.

5. Prezados Irmãos, é com carinho e gratidão fraternal que partilho estas reflexões convosco, enquanto vos animo na vossa proclamação da Boa Nova de Jesus Cristo. Experimentai este amor e, desta forma, fazei com que a luz de Deus resplandeça no mundo (cf. Deus caritas est )! Invoco sobre todos vós a intercessão de Maria, Sede da Sabedoria, e concedo do íntimo do coração a minha Bênção Apostólica a cada um de vós, aos presbíteros, aos religiosos, às religiosas e aos fiéis leigos das vossas Dioceses.



VIAGEM APOSTÓLICA A MÜNCHEN, ALTÖTTING E REGENSBURG (9-14 DE SETEMBRO DE 2006)


NA CERIMÓNIA DE BOAS-VINDAS Aeroporto "Franz Joseph Strauß" de München Sábado, 9 de Setembro de 2006

9906
Senhor Presidente da República
Senhora Chanceler
Senhor Ministro-Presidente
Senhores Cardeais
Venerados Irmãos no Episcopado
Ilustres Senhores, gentis Senhoras
Queridos Concidadãos

É com profunda emoção que piso, pela primeira vez depois da minha elevação à Cátedra de Pedro, a terra alemã bávara. Volto à minha Pátria, ao meio do meu povo, com o programa de visitar alguns lugares que tiveram uma importância fundamental na minha vida. Agradeço-lhe, Senhor Presidente da República, as expressões de cordiais boas-vindas que me dirigiu. Nestas palavras ouvi o eco fiel dos sentimentos de todo o nosso povo. Agradeço à Senhora Chanceler, Dra. Angela Merkel, e ao Senhor Ministro-Presidente, Dr. Edmund Stoiber, a amabilidade com que quiseram honrar a minha chegada à terra alemã e bávara. Além disso, estendo a minha saudação reconhecida aos membros do Governo, às Personalidades eclesiásticas, civis e militares aqui reunidas, assim como a todos aqueles que desejaram estar aqui presentes para me receber nesta visita tão importante para mim.

Neste momento vêm-me muitas recordações dos anos passados em München e Regensburg: trata-se de lembranças de pessoas e de acontecimentos que deixaram em mim uma marca profunda. Consciente daquilo que recebi, estou aqui em primeiro lugar para expressar o profundo sentido de reconhecimento que sinto por todos os que contribuíram para formar a minha personalidade nas décadas da minha vida. Mas estou aqui também como Sucessor do Apóstolo Pedro, para reafirmar e para confirmar os profundos vínculos que existem entre a Sé de Roma e a Igreja na nossa Pátria.

Trata-se de laços que têm uma história secular, alimentada pela adesão firme aos valores da fé cristã, uma adesão da qual podem orgulhar-se de modo particular precisamente as regiões bávaras. Dão testemunho disto monumentos famosos, catedrais majestosas, estátuas e pinturas de grande valor artístico, obras literárias, iniciativas culturais e sobretudo muitas vicissitudes de indivíduos e de comunidades em que se reflectem as convicções cristãs das gerações que se sucederam nesta terra que me é tão querida. As relações da Baviera com a Santa Sé, apesar de alguns momentos de tensão, foram sempre caracterizados pela cordialidade respeitosa. Além disso, nos momentos decisivos da sua história o povo bávaro confirmou sempre a sua profunda devoção à Cátedra de Pedro e a firme adesão à fé católica. A Mariensäule, que se eleva na praça central da nossa capital München, é um testemunho eloquente disto.

O contexto social contemporâneo é, sob muitos aspectos, diferente em relação ao do passado. Todavia, penso que estamos todos unidos na esperança de que as novas gerações permaneçam fiéis ao património espiritual, que resistiu através de todas as crises da história. A minha visita à terra onde nasci quer ser também um encorajamento neste sentido: a Baviera é uma parte da Alemanha, pois pertence à história da Alemanha nos seus altos e baixos e pode, justamente, sentir-se orgulhosa das tradições que herdou do passado. Faço votos por que todos os meus compatriotas na Baviera e em toda a Alemanha se tornem uma parte activa na transmissão aos cidadãos de amanhã dos valores fundamentais da fé cristã, que nos sustém a todos e não divide, mas abre e aproxima as pessoas pertencentes aos diferentes povos, culturas e religiões. É de bom grado que teria ampliado a minha visita também a outras regiões da Alemanha, para alcançar as várias Igrejas locais, de modo particular as quais estou vinculado por lembranças pessoais. Recebi muitos sinais de carinho de todas as partes e especialmente das Dioceses bávaras, tanto neste início de Pontificado como durante todos estes anos. Isto anima-me cada vez mais. Por isso, desejo aproveitar esta ocasião para expressar-vos a minha profunda gratidão. Pude também ver e acompanhar quanto foi realizado durante estas semanas e nestes meses, quantas pessoas contribuíram com todas as suas forças, a fim de que esta visita fosse bonita. E agora damos graças ao Senhor que nos concede também o céu bávaro, porque isto nós não podíamos pedir. Obrigado!

Que Deus vos recompense por tudo o que foi feito pelas mais diversas partes terei outras ocasiões de voltar a falar sobre isto para garantir a realização tranquila desta visita nestes dias.

Dirijo também esta saudação a vós, amados concidadãos vejo aqui diante de mim as etapas do meu caminho, de Marktl e Tittmoning ad Aschau, Traunstein, Regensburg e München e natualmente desejo dirigir a minha saudação com grande afecto a todos os habitantes da Baviera e de toda a Alemanha: não penso unicamente nos fiéis católicos, aos quais esta minha visita é dirigida de modo particular, mas também aos seguidores das outras Igrejas e Comunidades eclesiais, de maneira especial aos cristãos evangélicos e ortodoxos. Vossa Excelência, prezado Senhor Presidente da República, com as suas palavras interpretou os pensamentos do meu coração: embora quinhentos anos não possam simplesmente ser eliminados de maneira burocrática, nem através de discursos inteligentes, empenhar-nos-emos com todo o coração e com a mente para convergir uns aos outros.

Enfim, saúdo os seguidores das demais religiões e todas as pessoas de boa vontade, que estimam a paz e a serenidade do país e do mundo. Queira o Senhor abençoar os esforços de todos em vista da edificação de um futuro de autêntico bem-estar, fundamentado sobre aquela justiça que cria a paz. Confio estes bons votos à Virgem Maria, venerada nesta nossa terra com o título de Patrona Bavariae. Faço-o com as palavras clássicas de Jakob Balde, inscritas aos pés da Mariensäule: Rem regem regimen regionem religionem conserva Bavaris, Virgo Patrona, tuis! Conserva aos teus Bávaros, ó Virgem Padroeira, os bens, ou como se diz em dialecto, "as coisas", a autoridade política, o país e a religião!

A todos aqui presentes, um cordial "Grüß Gott!".




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