Discursos Bento XVI 314

AOS PARTICIPANTES NA ASSEMBLEIA PLENÁRIA DA PONTIFÍCIA ACADEMIA DAS CIÊNCIAS Segunda-feira, 6 de Novembro de 2006


Excelências
Ilustres Senhoras e Senhores

315 É-me grato saudar os membros da Pontifícia Academia das Ciências, por ocasião desta Assembleia Plenária, e agradeço ao Prof. Nicola Cabibbo as suas amáveis palavras de saudação em nome de todos. O tema da vossa assembleia "A previsibilidade na ciência: exactidão e limitações" discorre sobre um atributo distintivo da ciência moderna. Com efeito, a previsibilidade é um dos motivos-chave do prestígio da ciência na sociedade contemporânea. O estabelecimento do método científico proporcionou às ciências a capacidade de prever os fenómenos, de estudar o seu desenvolvimento e assim de administrar o meio ambiente em que o homem vive.

Este crescente "progresso" da ciência, e especialmente a sua capacidade de dominar a natureza através da tecnologia, está por vezes vinculado a uma correspondente "retirada" da filosofia, da religião e até da fé cristã. Com efeito, algumas pessoas vêem no progresso da ciência e da tecnologia modernas, uma das principais causas da secularização e do materialismo: por que invocar o controle de Deus sobre estes fenómenos, quando a ciência já se mostrou capaz de fazer a mesma coisa? Sem dúvida, a Igreja reconhece que "graças sobretudo à ciência e à técnica, [o homem] estendeu e continuamente estende o seu domínio sobre quase toda a natureza", e assim "o homem procura agora pela própria indústria numerosos bens que outrora esperava de forças superiores" (Gaudium et spes
GS 33). Ao mesmo tempo, a cristandade não pressupõe um conflito inevitável entre a fé sobrenatural e o progresso científico. O próprio ponto de partida da revelação bíblica é a afirmação de que Deus criou o ser humano, conferindo-lhe uma razão e colocando-o acima de todas as criaturas da terra. Deste modo, o homem tornou-se o administrador da criação e "cooperador" de Deus. Se pensamos, por exemplo, no modo como a ciência moderna, ao prever os fenómenos naturais, tem contribuído para a salvaguarda do meio ambiente, para o progresso dos países menos desenvolvidos, para a luta contra as epidemias e para o aumento da expectativa de vida, torna-se evidente que não há conflito entre a providência de Deus e o empreendimento humano. Efectivamente, podíamos dizer que o trabalho de previsão, de controle e de governo da natureza, que actualmente a ciência torna mais praticável do que no passado, é ele mesmo uma parte do plano do Criador.

Todavia, embora dê com generosidade, a ciência só oferece aquilo que deve dar. O homem não pode depositar na ciência e na tecnologia uma confiança tão radical e incondicional, a ponto de acreditar que o progresso científico e tecnológico consegue explicar tudo e suprir completamente todas as suas necessidades existenciais e espirituais. A ciência não pode substituir a filosofia e a revelação, oferecendo uma resposta exaustiva às interrogações mais radicais do homem: perguntas a respeito do significado da vida e da morte, dos valores últimos e da natureza do próprio progresso. Por este motivo, depois de ter reconhecido os benefícios adquiridos pelos progressos científicos, o Concílio Vaticano II recordou que "os métodos de investigação próprios destas ciências são erroneamente assumidos como regra suprema da investigação de toda a verdade", e acrescentou que "pode temer-se que o homem, demasiado orgulhoso das descobertas actuais, venha a pensar que se basta a si mesmo e que não precisa de procurar valores mais altos" (Ibid., n. 57).

Cientificamente, a previsibilidade levanta também a interrogação acerca das responsabilidades éticas do cientista. As suas conclusões devem ser orientadas segundo o respeito pela verdade e um honesto reconhecimento tanto da exactidão como das inevitáveis limitações do método científico. Sem dúvida, isto significa evitar inúteis previsões alarmistas, quando as mesmas não são corroboradas por dados suficientes ou quando excedem a real capacidade de previsão da ciência.

Contudo, significa também evitar o oposto, nomeadamente, o silêncio causado pelo medo, diante dos problemas autênticos. A influência dos cientistas na formação da opinião pública com base no seu conhecimento é demasiado importante para ser debilitada por uma pressa inoportuna ou pela publicidade superficial. Como o meu predecessor, o Papa João Paulo II, uma vez observou: "Precisamente porque "sabem mais", os cientistas são chamados a "servir mais". Dado que a liberdade de que gozam na investigação lhes dá o acesso ao conhecimento especializado, eles têm a responsabilidade de utilizar sabiamente tal conhecimento, para o benefício de toda a família humana" (Discurso à Pontifícia Academia das Ciências, 11 de Novembro de 2002).

Estimados Académicos, o nosso mundo continua a buscar em vós e nos vossos colegas uma clara compreensão das possíveis consequências de muitos dos importantes fenómenos naturais. Penso, por exemplo, nas contínuas ameaças ao meio ambiente, que estão a atingir populações inteiras, e na urgente necessidade de descobrir fontes de energia alternativas que sejam seguras e disponíveis para todos. Os cientistas hão-de receber o apoio da Igreja nos seus esforços em vista de enfrentar estas problemáticas, dado que a Igreja recebeu do seu divino Fundador a missão de orientar as consciências das pessoas para a bondade, a solidariedade e a paz. Precisamente por este motivo, ela sente-se no dever de insistir para que a capacidade de previsão e de controle da ciência jamais possa ser utilizada contra a vida humana e a sua dignidade, mas seja sempre colocada ao serviço da mesma, para o bem da geração actual e das gerações futuras.

Hoje há uma reflexão final que o tema da vossa Assembleia pode sugerir-nos. Como alguns dos relatórios apresentados ao longo destes últimos dias salientaram, o próprio método científico, na reunião dos seus dados e no processo e na utilização de tais informações para as suas projecções, tem limites inerentes que necessariamente restringem a previsibilidade científica de contextos e abordagens específicos. Por conseguinte, a ciência não pode ter a presunção de uma representação determinista completa do nosso futuro e do desenvolvimento de todos os fenómenos que ela estuda. A filosofia e a teologia podem oferecer uma importante contribuição para esta questão fundamentalmente epistemológica, ajudando, por exemplo, as ciências empíricas a reconhecerem uma diferença entre a incapacidade matemática de prever determinados acontecimentos e a validade do princípio de causalidade, ou entre o indeterminismo ou contingência científica (fortuitidade) e a causalidade a nível filosófico ou, mais radicalmente, entre a evolução como origem de uma sucessão no espaço e no tempo, e a criação como a origem última de um ser participado no Ser essencial.

Ao mesmo tempo, existe um nível mais elevado que necessariamente transcende todas as previsões científicas, nomeadamente, o mundo humano da liberdade e da história. Enquanto o cosmos físico pode ter o seu próprio desenvolvimento espaço-temporal, somente a humanidade estritamente falando tem uma história, a história da sua liberdade. Como a razão, a liberdade é uma parte preciosa da imagem de Deus dentro de nós, e jamais pode ser reduzida a uma análise determinista.

A sua transcendência em relação ao mundo material deve ser reconhecida e respeitada, dado que constitui um sinal da nossa dignidade humana. A negação desta transcendência, em nome de uma presumível capacidade absoluta do método científico de prever e condicionar o mundo humano, acarretaria a perda daquilo que é humano no homem, enquanto a incapacidade de reconhecer a sua singularidade e transcendência poderia perigosamente abrir a porta para a sua exploração.

Queridos amigos, ao concluir estas reflexões, asseguro-vos mais uma vez o meu profundo interesse pelas actividades desta Pontifícia Academia, assim como as minhas preces por vós e pelas vossas famílias. Sobre todos vós, invoco as bênçãos da sabedoria, da alegria e da paz de Deus Todo-Poderoso.




NO ENCONTRO COM OS BISPOS DA SUÍÇA Terça-feira, 7 de Novembro de 2006

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Eminências, Excelências
Queridos Irmãos!

Gostaria em primeiro lugar de vos saudar de coração e expressar a minha alegria, porque temos a ocasião de completar agora a visita pastoral, interrompida em 2005, tendo assim a possibilidade de trabalhar mais uma vez juntos sobre todo o panorama de questões que nos preocupam. Tenho ainda uma viva recordação da visita "ad Limina" de 2005, quando na Congregação para a Doutrina da Fé falámos juntos dos problemas que serão novamente debatidos também nestes dias. Tenho ainda muito presente a atmosfera de compromisso interior de então, para fazer com que a Palavra do Senhor seja viva e alcance os corações dos homens deste tempo, para que a Igreja seja plena de vida. Na nossa comum situação difícil devido a uma cultura secularizada, procuramos compreender a missão que o Senhor nos confiou e realizá-la do melhor modo possível.

Não pude preparar um verdadeiro discurso; mas gostaria, em vista de cada um dos grandes e complexos problemas que trataremos, de fazer apenas algumas "primeiras tentativas", que não pretendem representar afirmações definitivas, mas desejam iniciar o diálogo. Este é um encontro entre os Bispos suíços e os vários Organismos da Cúria, nos quais se tornam visíveis e estão representados cada um dos sectores da nossa tarefa pastoral. Sobre alguns deles gostaria de oferecer alguns comentários. Em sintonia com o meu passado, começo com a Congregação para a Doutrina da Fé, ou melhor: com o tema da fé. Já na homilia procurei dizer que, em todas as labutas do nosso tempo, a fé deve ter deveras a prioridade. Há duas gerações, talvez ela ainda pudesse ser pressuposta como uma coisa natural: crescia-se na fé; ela, de certa forma, estava simplesmente presente como uma parte da vida e não tinha que ser procurada de modo particular.

Precisava de ser plasmada e aprofundada, mas era vista como uma coisa óbvia. Hoje parece ser natural o contrário, isto é, que no fundo não é possível crer, que de facto Deus está ausente. Contudo, a fé da Igreja parece ser uma coisa do passado longínquo. Assim, até cristãos activos têm a ideia que convém escolher para si, do conjunto da fé da Igreja, as coisas que ainda se consideram possíveis hoje. E principalmente activamo-nos para cumprir através do compromisso pelos homens, por assim dizer, contemporaneamente também o próprio dever em relação a Deus.

Mas isto é o início de uma espécie de "justificação mediante as obras": o homem justifica-se a si mesmo e ao mundo em que desempenha aquilo que parece claramente necessário, mas falta a luz interior e a alma de tudo. Por isso, penso que seja importante consciencializar-se de novo do facto que a fé é o centro de tudo "Fides tua te salvum fecit", diz o Senhor repetidas vezes àqueles que curou. Não é o contacto físico, não é o gesto exterior que decide, mas o facto que aqueles doentes acreditaram. E nós podemos ainda servir o Senhor de modo vivaz unicamente se a fé se torna forte e se faz presente na sua abundância.

Gostaria de ressaltar neste contexto dois aspectos fundamentais. Primeiro: a fé é sobretudo fé em Deus. No cristianismo não se trata de um peso enorme de coisas diferentes, mas tudo o que o Credo diz e que o desenvolvimento da fé realizou, existe unicamente para tornar mais claro à nossa vista o rosto de Deus. Ele existe e vive; n'Ele cremos; diante d'Ele, e na sua perspectiva, no ser-com-Ele e por Ele é que vivemos. E em Jesus Cristo, Ele está, de certa forma, corporalmente connosco. Esta centralidade de Deus deve, na minha opinião, sobressair de maneira completamente nova em todo o nosso pensar e agir. É isto que anima também as actividades que, caso contrário, facilmente podem declinar em activismo e tornar-se vazias. É este o primeiro aspecto que pretendo evidenciar: que, na realidade, a fé olha decisivamente para Deus, e assim estimula-nos também a nós a olhar para Deus e a pôr-nos em movimento em direcção a Ele.

O outro aspecto é que não podemos inventar nós próprios a fé compondo-a de pedaços "sustentáveis", mas que cremos juntamente com a Igreja. Não podemos compreender tudo o que a Igreja ensina, nem tudo pode ser apresentado em cada vida. Mas é importante que sejamos não-crentes no grande Eu da Igreja, no seu Nós vivente, encontrando-nos assim na grande comunidade da fé, naquele grande sujeito, no qual o Tu de Deus e o Eu do homem verdadeiramente se encontram; no qual o passado das palavras da Escritura se torna presente, os tempos se compenetram reciprocamente, o passado é presente e, abrindo-se para o futuro, deixa entrar no tempo o esplendor da eternidade, do Eterno. Esta forma completa da fé, expressa no Credo, de uma fé em e com a Igreja como sujeito vivente, no qual o senhor age esta é a forma de fé que deveríamos procurar pôr deveras no centro das nossas actividades. Vemo-lo também hoje de maneira muito clara: o desenvolvimento, onde foi promovido de maneira exclusiva sem alimentar a alma, causa danos.

Então as capacidades técnicas crescem, sem dúvida, mas elas originam sobretudo novas possibilidades de destruição. Se juntamente com a ajuda em favor dos Países em vias de desenvolvimento, juntamente com a aprendizagem de tudo o que o homem é capaz de fazer, de tudo o que a sua inteligência inventou e que a sua vontade torna possível, não for contemporaneamente também iluminada a sua alma e se não chegar a força de Deus, aprende-se sobretudo a destruir. E por isso, penso que se deva de novo tornar forte em nós a responsabilidade missionária: se sentimos alegria pela nossa fé, sentimo-nos obrigados a falar dela aos outros. Depois está nas mãos de Deus a medida em que os homens a poderão aceitar.

Deste assunto, gostaria agora de passar à "Educação Católica", tratando dois sectores. Uma coisa que, penso, a todos nós causa uma "preocupação" no sentido positivo da palavra, é o facto de que a formação teológica dos futuros sacerdotes e dos outros professores e anunciadores da fé deva ser boa; portanto, temos necessidade de boas Faculdades teológicas, de bons seminários maiores e de adequados professores de teologia que comuniquem não só conhecimentos, mas formem para uma fé inteligente, de modo que fé se torne inteligência e inteligência se torne fé. Em relação a isto tenho um desejo muito específico. A nossa exegese fez grandes progressos; sabemos deveras muito sobre o desenvolvimento dos textos, sobre a subdivisão das fontes, etc., sabemos qual o significado que pode ter tido a palavra naquela época...

Mas vemos também cada vez mais que a exegese histórico-crítica, se permanecer apenas histórico-crítica, remete a palavra para o passado, torna-a uma palavra daquele tempo, uma palavra que, no fundo, não nos diz nada; e vemos que a palavra se reduz a fragmentos porque, precisamente, se desfaz em tantas fontes diversas. O Concílio, a Dei Verbum, disse-nos que o método histórico-crítico é uma dimensão essencial da exegese, porque pertence à natureza da fé a partir do momento que ela é factum historicum. Não cremos simplesmente numa ideia; o cristianismo não é uma filosofia, mas um acontecimento que Deus colocou neste mundo, é uma história que Ele formou de modo real e forma como história juntamente connosco. Por isso, na nossa leitura da Bíblia o aspecto histórico deve verdadeiramente estar presente na sua seriedade e exigência: devemos efectivamente reconhecer o acontecimento e, precisamente, "fazer história" por Deus no seu agir. Mas a Dei Verbum acrescenta que a Escritura que, por conseguinte, deve ser lida segundo os métodos históricos, deve ser lida também como unidade e deve ser lida na comunidade vivente da Igreja. Faltam estas duas dimensões em grandes sectores da exegese.

317 A unidade da Escritura não é um facto meramente histórico-crítico, mesmo se o conjunto, também sob o ponto de vista histórico, é um processo interior da Palavra que, lida e compreendida sempre de novo durante sucessivas releituras, continua a maturar. Mas esta unidade é, em definitiva, precisamente, um facto teológico: estes escritos são uma única Escritura, só compreensíveis profundamente se forem lidos na analogia fidei como unidade na qual há um progresso para Cristo e, inversamente, Cristo atrai para si toda a história; e se, por outro lado, isto tiver a sua vitalidade na fé da Igreja. Por outras palavras, é meu grande desejo que os teólogos aprendam a ler e a amar a Escritura do modo como, segundo a Dei Verbum, o Concílio quis: que vejam a unidade interior da Escritura uma coisa hoje ajudada pela "exegese canónica" (que sem dúvida ainda se encontra num tímido estádio inicial) e que depois façamos dela uma leitura espiritual, que não é algo exterior, de carácter edificante, mas ao contrário, um imerger-se interiormente na presença da Palavra.

Parece-me uma tarefa muito importante fazer algo neste sentido, contribuir para que, paralelamente à exegese histórico-científica seja feita deveras uma introdução à Escritura viva, como Palavra de Deus actual. Não sei como concretizar isto, mas penso que, quer no âmbito académico, quer no seminário, quer num curso de introdução, se possam encontrar professores adequados, para que aconteça este encontro actual com a Escritura na fé da Igreja um encontro com base no qual depois se torna possível o anúncio.

Outro aspecto é a catequese que, precisamente, nos últimos cinquenta anos, por um lado fez grandes progressos metodológicos, mas por outro, perdeu-se muito na antropologia e na busca de pontos de referência, de modo que com frequência nem sequer se alcançam os conteúdos da fé. Posso compreender isto: inclusivamente na época em que eu era vice-pároco portanto há 56 anos já era muito difícil anunciar a fé na escola pluralista, com muitos pais e crianças não crentes, porque ela era vista como um mundo totalmente afastado e irreal. Hoje, naturalmente, a situação piorou.

Contudo, é importante que na catequese, que inclui os ambientes da escola, da paróquia, da comunidade, etc, a fé continue a ser plenamente valorizada, isto é, que as crianças aprendam verdadeiramente o que é "criação", o que é "história da salvação" realizada por Deus, o que é, quem é Jesus Cristo, o que são os Sacramentos, qual é o objecto da nossa esperança... Penso que todos nós devemos, como sempre, comprometer-nos ao máximo por uma renovação da catequese, na qual seja fundamental a coragem de testemunhar a palavra fé e encontrar modos para que ela seja compreendida e aceite. Hoje a ignorância religiosa alcançou um nível assustador.

E contudo, na Alemanha, as crianças têm pelo menos dez anos de catequese, portanto no fundo deveriam saber muitas coisas. Por isso devemos sem dúvida reflectir seriamente sobre as nossas possibilidades de encontrar caminhos para comunicar, mesmo se de forma simples, os conhecimentos, para que a cultura da fé esteja presente.

E agora, algumas observações sobre o "Culto divino". O Ano Eucarístico, em relação a isto, deu-nos muito. Posso dizer que a exortação pós-sinodal chegou a bom ponto. Será certamente um enriquecimento. Além disso, temos o documento da Congregação para o Culto Divino sobre a justa celebração da Eucaristia, o que é muito importante. Penso que depois de tudo isto, a pouco e pouco se torne claro que a Liturgia não é uma "automanifestação" da comunidade que, como se diz, nela entra em cena, mas é ao contrário o sair da comunidade do simples "ser espontâneos" e aceder ao grande banquete dos pobres, entrar na grande comunidade vivente, na qual o próprio Deus nos alimenta. Este carácter universal da Liturgia deve entrar de novo na consciência de todos.

Na Eucaristia recebemos uma coisa que nós não podemos fazer, mas entramos ao contrário em algo de maior que se torna nosso, precisamente quando nos entregamos a esta coisa maior procurando celebrar a Liturgia verdadeiramente como Liturgia da Igreja. Depois, com isto, está relacionado também o famoso problema da homilia. Sob o ponto de vista meramente funcional posso compreendê-lo muito bem: pode acontecer que o pároco esteja cansado ou pregou já repetidas vezes ou é idoso e os seus cargos superam as suas forças. Então, se existe um assistente para a pastoral que é muito capaz na interpretação da Palavra de Deus de modo convincente, é espontâneo dizer: por que não deveria falar o assistente para a pastoral; ele fala melhor e assim o povo tira maior vantagem.

Mas isto, precisamente é a visão meramente funcional. É preciso, ao contrário ter em consideração o facto de que a homilia não é uma interrupção da Liturgia para uma parte discursiva, mas que ela pertence ao acontecimento sacramental, levando a Palavra de Deus ao presente da comunidade. É o momento, no qual verdadeiramente esta comunidade como sujeito quer ser chamada em causa para ser levada à escuta e ao acolhimento da Palavra. Isto significa que a própria homilia faz parte do mistério, da celebração do mistério, e por conseguinte, não pode simplesmente ser separada dele.

Mas, sobretudo, considero também importante que o sacerdote não seja limitado ao Sacramento e à jurisdição na convicção de que todas as outras tarefas poderiam ser assumidas também por outros mas conserve-se a integridade do seu cargo. O sacerdócio também é belo quando se deve cumprir uma missão que é um todo, do qual não se pode cortar algo aqui e ali. E desde sempre pertence a esta missão também no culto veterotestamentário o dever do sacerdote de relacionar a Palavra, que é parte integrante do conjunto, com o sacrifício. Sob o ponto de vista meramente prático, devemos activar-vos para fornecer aos sacerdotes as ajudas necessárias para que possam desempenhar de maneira justa também o ministério da Palavra. Em linha de máxima, esta unidade interior quer da essência da Celebração eucarística, quer da essência do ministério sacerdotal, é muito importante.

O segundo tema, que gostaria de tratar neste contexto, refere-se ao sacramento da Penitência, cuja prática nestes últimos cinquenta anos diminuiu progressivamente. Graças a Deus existem claustros, abadias e santuários, aos quais as pessoas vão em peregrinação e onde os seus corações se abrem e estão também prontos para a confissão. Verdadeiramente, devemos aprender de novo este Sacramento. Já sob um ponto de vista meramente antropológico é importante, por um lado, reconhecer a culpa e, por outro, exercer o perdão. A difundida falta de uma consciência da culpa é um fenómeno preocupante do nosso tempo.

O dom do sacramento da Penitência consiste portanto não só no facto de que recebemos o perdão, mas também que nos apercebemos, antes de tudo, da nossa necessidade de perdão; já com isto somos purificados, transformamo-nos interiormente e depois podemos compreender melhor os outros e perdoá-los. O reconhecimento da culpa é uma coisa elementar para o homem está doente se deixa de sentir isto e é de igual modo importante para ele a experiência libertadora de receber o perdão. Para as duas coisas o sacramento da Reconciliação é o lugar decisivo de prática. Além disso a fé torna-se uma coisa totalmente pessoal, já não se esconde na colectividade. Se o homem enfrenta o desafio e, na sua situação de necessidade de perdão, se apresenta, por assim dizer, indefeso diante de Deus, então faz a experiência comovedora de um encontro totalmente pessoal com o amor de Jesus Cristo.

318 Por fim, gostaria ainda de falar sobre o ministério episcopal. No fundo, já falámos implicitamente dele até agora. Parece-me importante que os Bispos, como sucessores dos Apóstolos, por um lado, assumam verdadeiramente a responsabilidade das Igrejas locais que o Senhor lhes confiou, fazendo com que nelas a Igreja como Igreja de Jesus Cristo cresça e viva. Por outro lado, eles devem abrir as Igrejas locais ao universal. Considerando as dificuldades que os Ortodoxos têm com as Igrejas autocéfalas, como também os problemas dos nossos amigos protestantes face à desagregação das Igrejas regionais, apercebemo-nos do grande significado que a universalidade assume, como é importante que a Igreja se abra à totalidade, tornando-se na universalidade verdadeiramente uma única Igreja. Por outro lado, é capaz disto apenas se for viva no seu próprio território. Esta comunhão deve ser alimentada pelos Bispos juntamente com o Sucessor de Pedro no espírito de uma consciente sucessão no Colégio dos Apóstolos. Todos nós nos devemos esforçar continuamente por encontrar nesta relação recíproca o equilíbrio justo, para que a Igreja local viva a sua autenticidade e, contemporaneamente, a Igreja universal receba disto um enriquecimento, para que as duas dêem e recebam e, desta forma, a Igreja do Senhor cresça.

O Bispo Grab já falou das fadigas do ecumenismo; é um campo que devo unicamente confiar ao coração de todos vós. Na Suíça confrontais-vos com esta tarefa que é difícil, mas também causa alegria. Penso que sejam importantes, por um lado, os relacionamentos pessoais, nos quais nos reconhecemos e nos estimamos uns aos outros de maneira imediata e nos ajudamos também reciprocamente. Por outro lado, trata-se como já disse o Bispo Grab de se fazer garantes dos valores da nossa sociedade essenciais, portantes, provenientes de Deus. Neste âmbito, todos juntos protestantes, católicos e ortodoxos temos uma grande tarefa. E sinto-me feliz por que a consciência disto esteja a aumentar. No ocidente é a Igreja na Grécia que diz cada vez mais claramente: na Europa só podemos desempenhar a nossa tarefa se nos comprometermos juntos pela grande herança cristã. Também a Igreja na Rússia vê cada vez mais este aspecto e de igual modo os nossos amigos protestantes estão conscientes dele. Penso que, se aprendermos a agir juntos neste campo, podemos realizar uma boa parte de unidade onde a plena unidade teológica e sacramental ainda não é possível.

Para concluir, gostaria de vos expressar mais uma vez a minha alegria pela vossa visita, desejando-vos muitos colóquios frutuosos durante estes dias.




À ASSEMBLEIA PLENÁRIA EM VISTA DO 49º CONGRESSO EUCARÍSTICO INTERNACIONAL (QUEBEQUE, JUNHO DE 2008) Quinta-feira, 9 de Novembro de 2006

Senhores Cardeais
Venerados irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
Queridos irmãos e irmãs

É com muito prazer que recebo a vossa visita e saúdo todos vós com afecto. Em primeiro lugar, saúdo o Cardeal Jozef Tomko, a quem estou grato por se ter feito intérprete dos sentimentos de todos e por me ter informado acerca da realização da vossa Assembleia Plenária destes dias. Uma cordial saudação aos membros da Pontifícia Comissão para os Congressos Eucarísticos Internacionais e aos Delegados Nacionais, que participaram neste encontro para preparar em conjunto o 49º Congresso Eucarístico Internacional, programado para se realizar em Quebeque em Junho de 2008. Além disso, saúdo os representantes da Comissão preparatória local deste grandioso acontecimento eclesial, assim como o pequeno mas significativo grupo dos Adoradores da Eucaristia.

Vós vindes de diversas regiões do mundo, e a finalidade da vossa reunião consiste em preparar uma celebração importante como nunca para a Igreja inteira, que é exactamente o Congresso Eucarístico Internacional. Como o Cardeal Jozef Tomko acabou de recordar, ele constitui uma resposta unânime do Povo de Deus ao amor do Senhor, sumamente manifestado no Mistério eucarístico. É verdade! Os Congressos Eucarísticos, que se realizam cada vez em diferentes lugares e continentes, são sempre um manancial de renovação espiritual, ocasião para fazer conhecer melhor a Santíssima Eucaristia, o tesouro mais precioso que nos foi legado por Jesus; eles constituem também um encorajamento para a Igreja a difundir em todos os âmbitos da sociedade e testemunhar o amor de Cristo, sem hesitação. De resto, desde que foi instituída, esta é a finalidade que a vossa benemérita Pontifícia Comissão se propõe: "Fazer conhecer, amar e servir sempre nosso Senhor Jesus Cristo no seu Mistério eucarístico, centro da vida da Igreja e da sua missão para a salvação do mundo".

Por conseguinte, cada um destes Congressos Eucarísticos representa uma providencial oportunidade para mostrar à humanidade, de maneira solene, "a Eucaristia, dom de Deus para a vida do mundo", como afirma o texto-base do próximo Congresso. Este documento foi apresentado durante os vossos trabalhos pelo Cardeal Marc Ouellet, Arcebispo de Quebeque, a quem dirijo uma especial saudação. Não só quantos têm a possibilidade de participar pessoalmente, mas também as várias comunidades cristãs que são convidadas a unir-se idealmente, poderão beneficiar das graças especiais que o Senhor dispensará no Congresso Eucarístico Internacional. Naqueles dias, o mundo católico terá os olhos fixos no sumo mistério da Eucaristia para dele receber renovado impulso apostólico e missionário.

319 Eis por que motivo é importante preparar-se bem, e eu agradeço-vos queridos irmãos e irmãs, o trabalho que estais a levar a cabo para ajudar os fiéis de todos os continentes a compreenderem cada vez mais o valor e a importância da Eucaristia da nossa vida. Além disso, a presença entre vós de alguns representantes dos Adoradores da Eucaristia e a alusão que Vossa Eminência, Senhor Cardeal Tomko, fez à "Federación Mundial de la Adoración Nocturna", permitem-me recordar como é profícua a redescoberta da adoração eucarística por parte de numerosos cristãos.

A este propósito, apraz-me voltar com a memória à experiência vivida no ano passado com os jovens em Colónia, por ocasião da Jornada Mundial da Juventude, e na Praça de São Pedro com as crianças da primeira Comunhão, acompanhados pelas famílias e pelos catequistas. Quanta necessidade tem a humanidade contemporânea de voltar a descobrir no Sacramento eucarístico a fonte da própria esperança! Dou graças ao Senhor porque muitas paróquias, juntamente com a devota celebração da Santa Missa, continuam a educar os fiéis para a adoração eucarística, e formulo votos a fim de que, também em vista do próximo Congresso Eucarístico Internacional, esta prática se difunda cada vez mais.

Estimados irmãos e irmãs, como se sabe, a próxima Exortação pós-sinodal será dedicada à Eucaristia. Ela reunirá as indicações evidenciadas pelo último Sínodo dos Bispos, dedicado precisamente ao Mistério eucarístico, e estou persuadido de que também este documento ajudará a Igreja a preparar e a celebrar com participação interior o Congresso Eucarístico, que se realizará no mês de Junho de 2008. Confio-o desde agora à Virgem Maria, primeira e incomparável adoradora de Cristo eucarístico. Nossa Senhora proteja e acompanhe cada um de vós e as vossas comunidades, tornando fecundo o trabalho que estais a realizar em vista deste importante acontecimento eclesial de Quebeque. Quanto a mim, asseguro-vos a minha lembrança na oração e abençoo-vos todos de coração.



NA CONCLUSÃO DO ENCONTRO

COM OS BISPOS DA SUÍÇA Quinta-feira, 9 de Novembro de 2006


Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a todos este encontro, que me parece muito importante como exercício do afecto colegial, como manifestação da nossa comum responsabilidade pela Igreja e pelo Evangelho neste momento do mundo. Obrigado por tudo! Lamento que, por causa de outros compromissos, sobretudo das visitas ad Limina (nestes dias é a vez dos Bispos alemães) não pude estar convosco. Teria realmente o desejo de ouvir a voz dos Bispos suíços, mas talvez se apresentem outras ocasiões e, naturalmente, de ouvir também o diálogo entre a Cúria Romana e os Bispos suíços: na Cúria Romana fala também sempre o Santo Padre, na sua responsabilidade para com a Igreja inteira. Portanto, obrigado por este encontro que parece-me é para todos uma experiência da unidade da Igreja, e é também uma experiência da esperança que nos acompanha em todas as dificuldades que nos circundam.

Gostaria de pedir desculpa também pelo facto de me ter apresentado já no primeiro dia sem um texto escrito; naturalmente, eu já tinha pensado um pouco, mas não tive tempo para o escrever. E assim, também neste momento, apresento-me com esta pobreza; mas talvez ser pobre, em todos os sentidos, convém inclusive para um Papa nesta fase da história da Igreja. De qualquer maneira, agora não posso oferecer um grande discurso, como seria justo depois de um encontro com estes frutos. Com efeito, devo dizer que já li a síntese dos vossos debates e agora ouvi-a com grande atenção: parece-me um texto muito bem ponderado e rico; corresponde realmente às interrogações essenciais que nos comprometem tanto pela unidade da Igreja no seu conjunto, como pelas questões específicas da Igreja que está na Suíça. Parece-me que realmente traça o caminho para os próximos anos e demonstra a nossa vontade comum de servir o Senhor. Um texto muito rico. Quando o li, pensei: seria um pouco absurdo se agora começasse a falar de novo sobre estes temas, acerca dos quais houve um debate profundo e intenso que durou três dias. Vejo aqui o resultado resumido e rico do trabalho realizado; acrescentar ainda algo sobre cada um dos pontos parece-me muito difícil, também porque conheço o êxito do trabalho, mas não a viva voz de quantos intervieram em tais debates. Por isso, pensei que talvez fosse justo reflectir, nesta tarde conclusiva, mais uma vez sobre os grandes temas que nos preocupam e que, em última análise, constituem o fundamento de todos os pormenores embora todos os detalhes, obviamente, sejam importantes.

Na Igreja, a instituição não é apenas uma estrutura exterior, enquanto o Evangelho seria puramente espiritual. Na realidade, Evangelho e Instituição são inseparáveis, porque o Evangelho tem um corpo, o Senhor tem um corpo nesta nossa época. Portanto, as questões que à primeira vista parecem quase exclusivamente institucionais, na realidade são problemas teológicos e questões centrais, porque discorrem sobre a realização e a concretização do Evangelho no nosso tempo. Por conseguinte, é justo agora reiterar uma vez mais as grandes perspectivas em cujo contexto se desenvolve toda a nossa reflexão. Permiti-me, com a indulgência e a generosidade dos membros da Cúria Romana, voltar à língua alemã, porque dispomos de intérpretes excelentes, que de outra forma permaneceriam desempregados. Pensei em dois temas específicos, dos quais já falei, e que agora gostaria de aprofundar ulteriormente.

Agora, portanto, o tema "Deus". Veio-me à mente a palavra de Santo Inácio: "O cristianismo não é uma obra de persuasão, mas de grandeza" (Carta aos Rm 3,3). Não deveríamos permitir que a nossa fé seja vanificada pelos demasiados debates sobre múltiplos pormenores menos importantes mas, ao contrário, ter sempre à vista em primeiro lugar a sua grandeza. Recordo-me quando, nos anos 80-90, eu ia à Alemanha e me pediam que concedesse entrevistas: eu conhecia sempre antecipadamente as perguntas. Tratava-se da ordenação das mulheres, da contracepção, do aborto e de outros problemas como estes que voltam a apresentar-se continuamente. Se nos deixarmos absorver por estes debates, então a Igreja identifica-se com alguns mandamentos ou proibições, e nós passamos por moralistas com algumas convicções um pouco fora de moda, enquanto não sobressai minimamente a verdadeira grandeza da fé. Por este motivo, considero fundamental que volte a pôr sempre em evidência a grandeza da nossa fé um compromisso do qual não podemos permitir que semelhantes situações nos distraiam.

Sob este aspecto, agora gostaria de continuar, completando as nossas reflexões de terça-feira passada, e insistir mais uma vez: é importante, sobretudo, cuidar da relação pessoal com Deus, com aquele Deus que se nos manifestou em Cristo. Agostinho salientou reiteradamente os dois aspectos do conceito cristão de Deus: Deus é Logos, e Deus é Amor a ponto de se fazer totalmente pequeno, de assumir um corpo humano e, no final, de se entregar como pão nas nossas mãos. Deveríamos ter sempre presentes e tornar presentes estes dois aspectos do conceito cristão de Deus. Deus é Spiritus creator, é Logos, é razão. E por isso a nossa fé é algo que tem a ver com a razão, pode ser transmitida mediante a razão e não deve esconder-se diante da mesma, nem da razão da nossa época. Todavia, esta razão eterna e incomensurável, precisamente, não é apenas uma matemática do universo e, ainda menos, uma prima causa que, depois de ter provocado o Big Bang, se retirou. Ao contrário, esta razão tem um coração, a ponto de poder renunciar à própria imensidade e fazer-se carne. E na minha opinião, é somente nisto que está a última e verdadeira grandeza da nossa concepção de Deus. Nós sabemos: Deus não é uma hipótese filosófica, não é algo que talvez exista, mas nós conhecemo-lo e Ele conhece-nos. E podemos conhecê-lo cada vez melhor, se permanecermos em diálogo com Ele.

Por isso, uma tarefa fundamental da pastoral consiste em ensinar a rezar e em aprendê-lo pessoalmente cada vez mais. Hoje existem escolas de oração, grupos de oração; vê-se que as pessoas o querem. Muitos procuram a meditação noutras partes, porque pensam que não podem encontrar no cristianismo a dimensão espiritual. Nós temos o dever de lhes mostrar de novo que esta dimensão espiritual não só existe, mas é a fonte de tudo. Com esta finalidade, devemos multiplicar estas escolas de oração, da oração conjunta, onde se pode aprender a prece pessoal em todas as suas dimensões: como escuta silenciosa de Deus, como escuta que penetra na sua Palavra e no seu silêncio, perscruta a sua obra na história e na minha pessoa; compreender também a sua linguagem na minha vida e depois aprender a responder na oração com as grandes preces dos Salmos do Antigo e do Novo Testamento. Por nós mesmos, não temos as palavras para Deus, mas foram-nos doadas algumas palavras: o próprio Espírito Santo já formulou palavras de oração para nós; podemos entrar nelas, rezar com as mesmas e depois aprender também a oração pessoal, "aprender" Deus cada vez mais e assim tornar-nos convictos dele não obstante Ele se cale tornar-nos felizes em Deus. Este íntimo estar com Deus e, portanto, a experiência da presença de Deus é aquilo que sempre de novo nos faz, por assim dizer, experimentar a grandeza do cristianismo e nos ajuda depois também a superar todas as insignificâncias entre as quais, sem dúvida, ele dever ser vivido e dia após dia, sofrendo e amando, na alegria e na tristeza ser realizado.

E a partir desta perspectiva vê-se, na minha opinião, o significado da Liturgia também como escola, precisamente, de oração, em que o próprio Senhor nos ensina a rezar, em que rezamos juntamente com a Igreja, tanto na celebração simples e humilde apenas com poucos fiéis, como também na festa da fé. Compreendi de novo, precisamente agora nos vários diálogos, como é importante para os fiéis, por um lado, o silêncio no contacto com Deus e, por outro, a festa da fé, e como é importante poder viver esta festa. Também o mundo tem as suas festas. Nietzsche chegou mesmo a dizer: "Somente se Deus não existe podemos festejar". Mas isto é um absurdo: só se Deus existe e nos toca pode haver uma festa autêntica. E sabemos como estas festas da fé abrem totalmente os corações das pessoas e produzem impressões que ajudam em relação ao futuro. Nas minhas visitas pastorais à Alemanha, à Polónia e à Espanha, vi novamente que ali a fé é vivida como festa e que ela depois acompanha as pessoas, orientando-as.


Discursos Bento XVI 314