Discursos Bento XVI 384

AO SENHOR JUAN GÓMEZ MARTÍNEZ NOVO EMBAIXADOR DA COLÔMBIA JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS

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Sexta-feira, 9 de Fevereiro de 2007


Senhor Embaixador

1. Apraz-me receber das suas mãos as Cartas que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República da Colômbia junto da Santa Sé. Dou-lhe as minhas cordiais boas-vindas a este encontro com o qual inicia a sua missão e agradeço-lhe as amáveis palavras que me dirigiu, assim como a deferente saudação que o Senhor Presidente, Dr. Álvaro Uribe Vélez, me enviou por seu intermédio, como expressão da proximidade espiritual do povo colombiano ao Papa.

Vossa Excelência vem representar junto da Santa Sé uma Nação que, ao longo da sua história, se distinguiu pela sua identidade católica. As suas palavras recordaram-me, e permitiram-me comprovar mais uma vez, o profundo afecto e a filial devoção dos colombianos ao Sucessor de Pedro, como fruto de uma arraigada vivência da fé cristã, e que se manifesta também, no apreço dos fiéis para com os Bispos e seus colaboradores, procurando manter as tradições e as virtudes herdadas dos antepassados.

2. Não passam despercebidos no mundo os esforços importantes que o seu país fez para procurar a paz e a reconciliação, juntamente com o compromisso por fomentar o progresso e instituições democráticas mais sólidas. São dignos de louvor os objectivos alcançados para uma maior segurança e estabilidade social, assim como a luta contra a pobreza. É preciso ressaltar também a constante preocupação em matéria de educação, favorecendo o acesso de todos os cidadãos aos programas escolares e universitários, porque a educação é a base de uma sociedade mais humana e solidária.

Não obstante, como Vossa Excelência mencionou, no seu país continuam a verificar-se situações complexas no campo político e social. Conheço os desafios que impedem de prosseguir um diálogo de paz, necessário não obstante os múltiplos obstáculos que se apresentam no caminho. Além disso, persistem outros problemas na sociedade que atentam contra a dignidade das pessoas, a unidade das famílias, um justo progresso económico e uma conveniente qualidade de vida. Tendo em consideração tanto os benefícios como as dificuldades, estimulo todos os colombianos a continuar os seus esforços para conseguir a concórdia e o crescimento harmonioso da nação. Estas aspirações só alcançam a sua plena realização quando Deus é considerado como o centro da vida e da história humana.

3. Por isso aprecio que Vossa Excelência tenha ressaltado o trabalho importante da Igreja Católica para a reconciliação nacional. De facto, além da participação directa de alguns Bispos, sacerdotes e religiosos nas acções encaminhadas para construir a paz, a sua voz ressoou também nos momentos decisivos da vida colombiana, recordando quais são as bases insubstituíveis do verdadeiro progresso humano e da convivência pacífica, exortando os católicos e os homens de boa vontade a seguir o caminho do perdão e da responsabilidade comum para instaurar a justiça.

4. Como Pastor da Igreja Universal, não posso deixar de expressar a Sua Excelência a minha preocupação pelas leis relativas a questões muito delicadas como a transmissão e a defesa da vida, a enfermidade, a identidade da família e o respeito do matrimónio. Sobre estes temas, e à luz da razão natural e dos princípios morais e espirituais que provêm do Evangelho, a Igreja Católica continuará a proclamar incessantemente a inalienável grandeza dos leigos presentes nos órgãos legislativos, no Governo e na administração da justiça, para que as leis expressem sempre os princípios e os valores que estejam em conformidade com o direito natural e que promovam o autêntico bem comum.

5. O início da sua missão junto da Santa Sé oferece-me também a oportunidade de recordar o que já disse no mês passado no meu discurso ao Corpo Diplomático acreditado junto da Santa Sé. Ao falar sobre vários países, referi-me "sobretudo à Colômbia, onde o prolongado conflito interno provocou uma crise humanitária, sobretudo no que se refere aos prófugos. Devem ser feitos todos os esforços para pacificar o país, para que às famílias sejam restituídos os seus parentes dos quais foram privadas, para dar de novo segurança e vida normal a milhões de pessoas. Estes sinais darão confiança a todos, inclusive a quantos foram envolvidos na luta armada" (8 de Janeiro de 2007).

É meu desejo fervoroso que no seu país se ponha fim a este cruel flagelo dos sequestros, que atentam de modo tão grave contra a dignidade e os direitos das pessoas. Acompanho com a minha oração quantos se encontram injustamente privados da liberdade e expresso a minha proximidade às suas famílias, confiando na sua imediata libertação.

A este respeito, as numerosas instituições dedicadas à caridade, seguindo os projectos pastorais da Conferência Episcopal e das dioceses, estão chamadas a prestar assistência humanitária aos mais necessitados, especialmente aos deslocados, tão numerosos na Colômbia, assim como às vítimas da violência. Deste modo dão também testemunho do esforço da Igreja que, sempre como sinal da sua própria missão e nas circunstâncias que a nação vive, é artífice de comunhão e de esperança.

6. Ao terminar este encontro, desejo manifestar-lhe os meus anseios de que na sua Pátria se consolide a paz tão desejada, assim como a reconciliação. Peço a Deus Pai que faça frutificar todos os esforços realizados com esta finalidade. Invoco também a intercessão de Nossa Senhora do Rosário de Chiquinquirá sobre o querido povo colombiano, sobre o Senhor Presidente e demais governantes, e de modo especial sobre Vossa Excelência e sua distinta família, desejando-lhe bom êxito no cumprimento da alta missão que lhe foi confiada.




A UM GRUPO DE MINISTROS DAS FINANÇAS DE VÁRIOS PAÍSES Sexta-feira, 9 de Fevereiro de 2007

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Senhoras e Senhores

É com prazer que vos dou as boas-vindas, a vós Ministros das Finanças da Itália, do Reino Unido, do Canadá e da Rússia, assim como aos demais Ministros, aos ilustres líderes internacionais e às importantes personalidades mundiais, inclusive à Rainha da Jordânia e ao Presidente do Banco Mundial. Estou grato ao Senhor Ministro Tommaso Padoa Schioppa, pelas suas amáveis palavras de saudação, proferidas em nome de todos vós. O nosso encontro hodierno é profundamente apreciado, uma vez que se realiza como parte do lançamento de um programa-guia destinado ao desenvolvimento e à produção de vacinas contra enfermidades pandémicas, bem como à sua distribuição aos países mais pobres. Esta digna iniciativa, denominada "Advance Market Commitment", tem em vista contribuir para a resolução de um dos desafios mais urgentes no campo dos cuidados preventivos da saúde, que diz respeito de maneira particular às nações que já sofrem por causa da pobreza e de graves necessidades. Além disso, ela tem inclusive o mérito de unir as instituições públicas e o sector privado, num esforço para encontrar formas mais eficazes de intervir neste campo.

Este nosso encontro tem lugar imediatamente antes do Dia Mundial do Doente, celebrado todos os anos em 11 de Fevereiro, festa de Nossa Senhora de Lourdes. Trata-se de uma ocasião que a a Igreja tem de chamar publicamente a atenção para o flagelo do sofrimento, e no corrente ano ela está focalizada sobre as pessoas que sofrem de doenças incuráveis, muitas das quais se encontram numa fase terminal. Em tal contexto, encorajo de todo o coração os esforços que envidais em vista deste novo programa e da sua finalidade de fazer progredir a investigação científica destinada à descoberta de novas vacinas. Estas vacinas são urgentemente necessárias para prevenir que milhões de seres humanos inclusive inúmeras crianças venham a morrer todos os anos por causa de enfermidades infecciosas, de maneira especial nas regiões do nosso mundo que se encontram expostas a maiores perigos. Nesta era do mercado globalizado, todos nós estamos preocupados com o crescente fosso existente entre o padrão de vida dos países que gozam de enormes riquezas e de um elevado nível de desenvolvimento tecnológico, e o das nações que são insuficientemente desenvolvidas, onde a pobreza persiste e chega mesmo a aumentar.

A iniciativa criativa e promissora lançada no dia de hoje deseja opor-se a esta tendência, uma vez que visa criar um "futuro" mercado em favor das vacinas, prioritariamente das que são capazes de prevenir a mortalidade infantil. Asseguro-vos o apoio integral da Santa Sé em benefício deste programa humanitário, que se inspira no espírito de solidariedade humana de que o nosso mundo tem necessidade para ultrapassar todas as formas de egoísmo e para promover a coexistência pacífica dos povos. Como mencionei na minha Mensagem para o Dia Mundial da Paz do corrente ano, qualquer serviço prestado para o bem dos pobres constitui um serviço que se realiza em prol da paz, porque "na raiz de não poucas tensões que ameaçam a paz, estão certamente as inúmeras desigualdades injustas, ainda tragicamente presentes no nosso mundo" (n. 6).

Ilustres Senhoras e Senhores, rezarei por cada um de vós, a fim de que Deus Todo-Poderoso vos assista nos vossos esforços, envidados para levar a cabo esta importante obra. Sobre vós e os vossos entes queridos, invoco cordialmente as suas Bênçãos de sabedoria, de fortaleza e de paz.




À DELEGAÇÃO DA ACADEMIA DAS CIÊNCIAS MORAIS E POLÍTICAS DE PARIS Sábado, 10 de Fevereiro de 2007

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Senhor Secretário perpétuo
Senhor Cardeal
Queridos amigos Académicos
Minhas Senhoras e meus Senhores!

É com prazer que hoje vos recebo, membros da Academia das Ciências Morais e Políticas. Em primeiro lugar, agradeço ao Senhor Michel Albert, Secretário perpétuo, as palavras com que se fez intérprete da vossa delegação, e a medalha que recorda a minha entrada como membro associado estrangeiro da vossa nobre Instituição.

A Academia das Ciências Morais e Políticas é um lugar de confrontos e de debates, propondo a todos os cidadãos e ao legislador reflexões para ajudar a "encontrar formas de organização políticas mais favoráveis ao bem público e ao desenvolvimento do indivíduo". De facto, a reflexão e a acção das Autoridades e dos cidadãos devem centrar-se sobre dois elementos: o respeito de todo o ser humano e a busca do bem comum. No mundo actual, é extremamente urgente convidar os nossos contemporâneos a dedicar uma atenção renovada a estes dois elementos. De facto, o desenvolvimento do subjectivismo, que faz com que cada um tenda a considerar-se como única referência e a convencer-se de que o que pensa tem o carácter da verdade, estimula-nos a formar as consciências sobre os valores fundamentais, que não podem ser ridicularizados sem pôr em perigo o homem e a própria sociedade, e sobre os critérios objectivos de uma decisão, que pressupõem um acto da razão.

Como ressaltei por ocasião da minha conferência sobre a nova Aliança, feita na vossa Academia em 1995, a pessoa humana é "um ser constitutivamente em relação", chamada a sentir-se cada vez mais responsável pelos seus irmãos e irmãs em humanidade. A questão apresentada por Deus, a partir do primeiro texto da Escritura, deve ressoar incessantemente no coração de cada um: "Que fizeste ao teu irmão?". O sentido da fraternidade e da solidariedade, e o sentido do bem comum baseiam-se numa vigilância em relação aos irmãos e à organização da sociedade, dando a cada um o seu lugar, para que possa viver em dignidade, ter abrigo e o necessário para a sua existência e da sua família, pela qual é responsável. Neste espírito, é preciso compreender a moção que votastes, no passado mês de Outubro, relativa aos direitos do homem e da liberdade de expressão, que faz parte dos direitos fundamentais, tendo sempre a preocupação de não subjugar a dignidade fundamental das pessoas e dos grupos humanos, e de respeitar as crenças religiosas.

Seja-me permitido recordar também nesta ocasião a figura de Andreï Dimitrijevitch Sakharov, ao qual eu sucedi na Academia. Esta grande personalidade recorda-nos que é necessário, na vida pessoal e na pública, ter a coragem de dizer a verdade e segui-la, ser livre em relação ao mundo circunstante que com frequência tende a impor os seus modos de ver e os comportamentos a adoptar. A verdadeira liberdade consiste em caminhar pela via da verdade, segundo a própria vocação, consciente de que cada um deve prestar contas da sua vida ao seu Criador e Salvador. É importante que saibamos propor aos jovens este caminho, recordando-lhes que o verdadeiro desenvolvimento não se realiza a qualquer preço e convidando-os a não se contentarem de seguir todas as modas que surgem. Desta forma, eles saberão discernir com coragem e tenacidade o caminho da liberdade e do bem-estar, que exige que se viva um certo número de exigências e que se façam esforços, sacrifícios e renúncias necessárias para agir bem.

Um dos desafios para os nossos contemporâneos, e sobretudo para a juventude, consiste em procurar viver não simplesmente a exterioridade, a aparência, mas desenvolver uma vida interior, lugar unificador do ser e do agir, lugar do reconhecimento da nossa dignidade de filhos de Deus chamados à liberdade, sem se separar da fonte da vida, mas permanecendo-lhes ligados.

Reconhecer-se filhos e filhas de Deus, uma vida bela e boa sob o olhar de Deus e as vitórias realizadas sobre o mal e contra a mentira fazem rejubilar o coração do homem. Permitindo que todos descubram que a sua vida tem um sentido e que dele somos responsáveis, abrimos o caminho para uma maturação das pessoas e para uma humanidade reconciliada, solícita com o bem comum.

O estudioso russo Sakharov é um exemplo disto; quando, sob o regime comunista, foi privado da sua liberdade exterior, a sua liberdade interior, da qual ninguém o podia privar, autorizava-o a tomar a palavra para defender com determinação os seus compatriotas, em nome do bem comum.

Ainda hoje, é fundamental que o homem não se deixe limitar por correntes exteriores, como o relativismo, a busca do poder e do lucro a qualquer preço, a droga, as relações afectivas desregradas, a confusão em campo matrimonial, o não reconhecimento do ser humano em todas as etapas da sua existência, desde a concepção até ao seu fim natural, deixando pensar que existem períodos nos quais o ser humano realmente não existe. Devemos ter a coragem de recordar aos nossos contemporâneos o que é o homem e o que é a humanidade. Convido as Autoridades civis e as pessoas que desempenham uma função na transmissão dos valores a terem sempre a coragem da verdade sobre o homem.

Ao terminar o nosso encontro, consenti que eu faça votos por que, mediante os seus trabalhos, a Academia das Ciências Morais e Políticas, com outras instituições, possa ajudar sempre os homens a construir uma vida melhor e a edificar uma sociedade onde é belo viver como irmãos.

Acompanho estes votos com a oração que elevo ao Senhor por vós, pelas vossas famílias e por todos os membros da Academia das Ciências Morais e Políticas.



À CONFEDERAÇÃO NACIONAL DAS MISERICÓRDIAS DA ITÁLIA E AOS DOADORES DE SANGUE Sábado, 10 de Fevereiro de 2007

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Amados amigos
das Misericórdias da Itália

Estou contente por vos receber e dirijo as minhas cordiais boas-vindas a todos vós aqui presentes, agradecido por esta visita, que me oferece a ocasião para vos conhecer melhor. Saúdo o Presidente da vossa Confederação e agradeço ao prezado Cardeal Antonelli as amáveis palavras que me dirigiu em nome de todos vós. As Misericórdias é necessário ressaltá-lo constituem a mais antiga forma de voluntariado organizado, que surgiu no mundo. Efectivamente, elas remontam à iniciativa tomada por São Pedro, Mártir de Verona que, em 1244 em Florença, reuniu um grupo de cidadãos de todas as idades e classes sociais, desejosos de "honrar a Deus mediante obras de misericórdia para o bem do próximo", no anonimato mais absoluto e na gratuidade total.

Hoje, a Confederação das Misericórdias da Itália reúne mais de setecentas "confrarias" como vós as definis eloquentemente concentradas de maneira especial na Toscana, mas presentes em todo o território nacional, de forma particular nas regiões centrais e meridionais. A elas, é necessário acrescentar os numerosos grupos de doadores de sangue, denominados "Fratres". Por conseguinte, os voluntários congregados pela vossa organização benéfica são mais de cem mil; eles estão comprometidos de modo permanente nos âmbitos social e de assistência à saúde. A variedade das vossas intervenções, além de ser uma resposta às necessidades emergentes na sociedade, constitui o sinal de um zelo, de uma "fantasia" na caridade, que deriva de um coração palpitante, cujo "motor" é o amor pelo homem que se encontra em dificuldade.

É precisamente por este motivo que mereceis apreço: com a vossa presença e a vossa acção, contribuís para difundir o Evangelho do amor de Deus por todos os homens. Com efeito, como deixar de recordar a impressionante página evangélica, em que São Mateus nos apresenta o encontro definitivo com o Senhor?

Então, como o próprio Jesus nos disse, seremos interrogados pelo Juiz do mundo se, ao longo da nossa existência, demos de comer aos famintos e de beber aos sedentos; se recebemos o forasteiro e se abrimos as portas do nosso coração aos mais necessitados. Em síntese, no juízo final Deus perguntar-nos-á se não amamos de maneira abstracta, mas concretamente, com as obras (cf.
Mt 25,31-46). E sensibiliza-me sempre verdadeiramente, ao ler de novo estas linhas, o facto de que Jesus, o Filho do homem e Juiz derradeiro, nos precede mediante esta acção, tornando-se Ele mesmo homem, fazendo-se pobre e sequioso e, no final, nos abraça estreitando-nos ao coração. É assim que Deus realiza aquilo que deseja que nós mesmos façamos: permanecer abertos aos outros e viver o amor não tanto com as palavras, mas com as obras.

No final da nossa vida seremos julgados sobre o amor, gostava de repetir São João da Cruz. Como é necessário que também hoje, aliás, especialmente nesta nossa época caracterizada por numerosos desafios humanos e espirituais, os cristãos proclamem com as obras o amor misericordioso de Deus! Cada baptizado deveria ser um "Evangelho vivo". Com efeito, muitas pessoas que não recebem facilmente Cristo e os seus ensinamentos exigentes, são contudo sensíveis ao testemunho daqueles que transmitem a sua mensagem mediante o exemplo concreto da caridade. O amor é uma linguagem que chega directamente ao coração, abrindo-o à confiança. Então exorto-vos, como fazia São Pedro com os primeiros cristãos, a estardes sempre prontos "a responder a quem quer que vos pergunte a razão da vossa esperança" (1P 3,15).

Além disso, gostaria de acrescentar mais uma reflexão: a vossa realidade associativa constitui um típico exemplo da importância que contém a conservação das próprias "raízes cristãs" na Itália e na Europa. As vossas confrarias, as Misericórdias, são uma presença viva e alegre, muito realista, destas raízes cristãs. Nos dias de hoje, as Misericórdias não constituem uma agregação eclesial, mas as suas raízes históricas sem dúvida permanecem cristãs. Exprime-o o seu próprio nome: "Misericórdias", manifestando inclusive o facto, precedentemente recordado, de que nas vossas origens existe a iniciativa de um Santo. Pois bem, para que continuem a dar frutos, as raízes devem conservar-se vivas e sólidas. É por isso que, oportunamente, propondes que os vossos sócios dediquem momentos periódicos de qualificação e de formação, em vista de aprofundar cada vez mais as motivações humanas e cristãs das vossas actividades. Com efeito, corre-se o risco de que o voluntariado venha a reduzir-se a um simples activismo. Contudo, se permanecer vital, o seu vigor espiritual poderá comunicar aos outros muito mais do que as coisas materialmente necessárias: pode oferecer ao próximo que está em dificuldade, o olhar de amor de que ele tem necessidade (cf. Carta Encíclica Deus caritas est ).

Enfim, desejo manifestar-vos um terceiro motivo de apreço: juntamente com outras associações de voluntariado, vós desempenhais uma importante função educativa. Ou seja, contribuís para manter viva a sensibilidade aos valores mais nobres, como a fraternidade e a ajuda abnegada àqueles que se encontram em dificuldade. Da experiência do voluntariado, particularmente os jovens poderão haurir benefício porque, se for bem delineado, o mesmo torna-se para eles uma "escola de vida", que os ajuda a dar um sentido e um valor mais excelsos e fecundos à sua própria existência. Possam as Misericórdias encorajá-los a crescer na dimensão do serviço ao próximo e a descobrir uma grande verdade evangélica: ou seja, que "há mais alegria em dar do que em receber" (Ac 20,35 cf. Deus caritas est ).

Dilectos amigos, amanhã 11 de Fevereiro, festa de Nossa Senhora de Lourdes, celebra-se o Dia Mundial do Doente, que já chegou à sua XV edição. No corrente ano, a atenção dirige-se de maneira especial às pessoas que sofrem de doenças incuráveis. Queridos amigos, a muitos deles também vós dedicais os vossos serviços. A Virgem Imaculada, Mãe da Misericórdia, vele sobre todas as vossas confrarias, aliás, sobre cada um dos membros das Misericórdias da Itália. Que Ela vos ajude a cumprir com amor autêntico a vossa missão, contribuindo desta forma para difundir no mundo o amor de Deus, manancial de vida para cada ser humano. A vós aqui presentes, a todas as Misericórdias da Itália e aos doadores de sangue "Fratres", concedo do íntimo do coração a minha Bênção.



AO SENHOR LUIS PARÍS CHAVERRI NOVO EMBAIXADOR DA COSTA RICA JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS

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Sábado, 10 de Fevereiro de 2007


Senhor Embaixador!

1. É-me grato recebê-lo nesta audiência durante a qual me apresenta as Cartas Credenciais que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da Costa Rica junto da Santa Sé, e agradeço-lhe sinceramente as amáveis palavras que me dirigiu neste solene acto com o qual inicia a missão que o seu Governo lhe confiou. Peço-lhe que faça chegar a minha deferente saudação ao Senhor Presidente da República, Dr. Óscar Arias, correspondendo ao que Vossa Excelência me transmitiu, e com o qual expressa a proximidade e o afecto do povo costa-riquenho ao Sucessor de Pedro.

2. A Costa Rica tem uma forte marca religiosa, que reflecte a fé do seu povo depois de mais de cinco séculos do início da evangelização. Neste sentido, a Igreja Católica, fiel à sua missão de levar a mensagem de salvação a todos os povos, e de acordo com a sua doutrina social, procura favorecer o progresso integral do ser humano e a defesa da sua dignidade, contribuindo para a consolidação dos valores fundamentais para que a sociedade possa gozar de estabilidade e harmonia, de acordo com a sua grande aspiração a viver em paz, liberdade e democracia.

As diversas comunidades eclesiais, movidas pelo desejo de manter viva a mensagem evangélica, cooperam em campos muito importantes, como o ensino, a assistência aos mais desfavorecidos, os serviços no campo da saúde, e a promoção da pessoa na sua condição de cidadão e filho de Deus. Por isso, os Bispos da Costa Rica olham com atenção e preocupação para as circunstâncias sociais que o País vive, como o crescente nível de pobreza, a insegurança pública e a violência familiar, juntamente com uma forte imigração de países vizinhos. Perante situações por vezes conflituosas e para defender o bem comum, oferecem a sua colaboração com iniciativas que favorecem o entendimento e a conciliação, e levam à promoção da justiça e à solidariedade, fomentando quando é necessário o diálogo nacional entre os responsáveis da vida pública.

Por outro lado, e como Sua Excelência ressaltou, este diálogo deve excluir qualquer forma de violência nas suas diversas expressões e ajudar a construir um futuro mais humano com a colaboração de todos. A este respeito, é oportuno recordar que as mensagens sociais não se alcançam aplicando unicamente medidas técnicas necessárias, mas promovendo também reformas que tenham presente uma consideração ética da pessoa, da família e da sociedade. Por isso, devem cultivar-se os valores morais como a honestidade, a austeridade e a responsabilidade pelo bem comum. Deste modo poder-se-á evitar o egoísmo pessoal e colectivo, assim como a corrupção em todos os ambientes, que impedem qualquer progresso.

3. Sabemos bem que o futuro de uma Nação se deve basear na paz, fruto da justiça (cf. St 3, 18), construindo um tipo de sociedade que, começando pelos responsáveis da vida política, parlamentar, administrativa e judicial, favoreça a concórdia, a harmonia e o respeito da pessoa, assim como a defesa dos seus direitos fundamentais. Neste sentido, são dignas de louvor as iniciativas que o Governo da Costa Rica realizou no âmbito internacional para promover no mundo a paz e os direitos humanos, assim como a tradicional proximidade com as posições mantidas pela Santa Sé em diversos foros internacionais sobre questões tão importantes como a defesa da vida humana e a promoção do matrimónio e da família.

Todos os costa-riquenhos, com as qualidades que os distinguem, devem ser protagonistas e artífices do progresso do País, cooperando para a estabilidade política que permita a todos participar na vida pública. Cada um, segundo a sua capacidade e possibilidades pessoais, é chamado a dar a própria contribuição para o bem da Pátria, baseado numa ordem social mais justa e participativa. Para esta finalidade, os ensinamentos morais da Igreja oferecem valores e orientações que, se forem tomados em consideração especialmente por quantos trabalham ao serviço da Nação, são de grande ajuda para enfrentar de modo adequado as necessidades e aspirações dos cidadãos.

O doloroso e vasto problema da pobreza, com graves consequências no campo da educação, da saúde e da habitação, é um desafio urgente para os governantes e responsáveis da administração pública em relação ao futuro da Nação. É necessária uma retomada de consciência mais profunda que permita enfrentar decididamente a actual situação em todas as suas dimensões, cooperando assim para um verdadeiro compromisso pelo bem de todos. Assim como noutras partes, os pobres carecem dos bens primários e não encontram os meios indispensáveis que permitem a sua promoção e progresso integral. Isto prejudica, sobretudo, os imigrados em busca de melhor nível de vida. Perante esta situação, a Igreja, à luz da sua doutrina social, procura estimular e favorecer iniciativas orientadas para superar situações de marginalização em que se encontram tantos irmãos necessitados, pois a preocupação pelo social também faz parte da sua acção evangelizadora (cf. Sollicitudo rei socialis
SRS 41).

4. Senhor Embaixador, antes de concluir este encontro desejo expressar-lhe os meus melhores votos para que a missão que hoje inicia seja fecunda em frutos e êxitos. Peço-lhe, de novo, que se faça intérprete dos meus sentimentos e esperanças junto do Senhor Presidente da República e demais Autoridades do seu País, enquanto invoco a bênção de Deus e a protecção da sua Padroeira, Nossa Senhora dos Anjos, para Vossa Excelência, a distinta família e colaboradores, e para todos os amadíssimos filhos e filhas da Costa Rica.




DURANTE O ENCONTRO COM OS ENFERMOS NO XV DIA MUNDIAL DO DOENTE Domingo, 11 de Fevereiro de 2007

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Amados irmãos e irmãs

É com imensa alegria que me encontro convosco aqui, na Basílica Vaticana, por ocasião da festa de Nossa Senhora de Lourdes e do anual Dia Mundial do Doente, no final da Celebração Eucarística presidida pelo Cardeal Camillo Ruini. Dirijo-lhe, em primeiro lugar, a minha cordial saudação, que faço extensiva a todos vós aqui presentes: ao Arcipreste da Basílica, D. Angelo Comastri, aos demais Bispos, aos sacerdotes, aos religiosos e às religiosas. Saúdo os responsáveis e os membros da UNITALSI, que se ocupam do transporte e do cuidado pelos enfermos nas peregrinações e noutros momentos significativos. Cumprimento os responsáveis e os peregrinos da Obra Romana de Peregrinações e quantos participarem no XV Congresso Nacional Teológico-Pastoral, que contará com a adesão de muitos da Itália e do estrangeiro.

Além disso, saúdo a delegação dos representantes dos "Caminhos da Europa". Todavia, a saudação mais cordial quero dirigi-la a vós, queridos enfermos, aos vossos familiares e aos voluntários que, com amor, vos seguem e vos acompanham também no dia de hoje. Juntamente com todos vós, desejo unir-me àqueles que, neste mesmo dia, participam nos vários momentos do Dia Mundial do Doente, que se realiza na cidade de Seul, na Coreia. Ali, em meu nome, preside às celebrações o Cardeal Javier Lozano Barragán, Presidente do Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde.

Portanto, hoje é a festa da Bem-Aventurada Virgem Maria de Lourdes, que há pouco menos de cento e cinquenta anos apareceu a uma jovem simples, Santa Bernadete Soubirous, manifestando-se como Imaculada Conceição. Também naquela aparição, Nossa Senhora mostrou-se como Mãe terna aos seus filhos, recordando que os mais pequeninos, os pobres, são os predilectos de Deus, e que a eles é revelado o mistério do Reino dos céus. Queridos amigos, Maria, que com a sua fé acompanhou o Filho até aos pés da cruz e que, por um desígnio misterioso, foi associada aos sofrimentos de Cristo, seu Filho, nunca se cansa de nos exortar a viver e a compartilhar com confiança segura a experiência da dor e da enfermidade, oferecendo-a com fé ao Pai, completando assim na nossa carne aquilo que falta às tribulações de Cristo (cf.
Col 1,24).

A este propósito, voltam-me ao pensamento as palavras com que o meu venerado Predecessor Paulo VI concluía a Exortação Apostólica Marialis cultus: "Para o homem contemporâneo não raro atormentado entre a angústia e a esperança, prostrado mesmo pela sensação das próprias limitações e assaltado por aspirações sem limites, perturbado na mente e dividido no seu coração, com o espírito suspenso perante o enigma da morte, oprimido pela solidão e, simultaneamente, a tender para a comunhão, presa da náusea e do tédio a Bem-Aventurada Virgem Maria, contemplada no enquadramento das vicissitudes evangélicas em que interveio e na realidade que já alcançou na Cidade de Deus, proporciona-lhe uma visão serenadora e uma palavra tranquilizante: a da vitória da esperança sobre a angústia, da comunhão sobre a solidão, da paz sobre a perturbação, da alegria e da beleza sobre o tédio e a náusea, das perspectivas eternas sobre as temporais e, enfim, da vida sobre a morte" (n. 57). Trata-se de palavras que iluminam o nosso caminho, mesmo quando o sentido da esperança e a certeza da cura parecem definhar; trata-se de palavras que eu gostaria que pudessem servir de conforto, especialmente para aqueles que são atingidos por enfermidades graves e dolorosas.

E é precisamente a estes nossos irmãos provados de maneira particular, que o hodierno Dia Mundial do Doente dedica a sua atenção. Gostaríamos de fazer com que eles sentissem a proximidade material e espiritual de toda a comunidade cristã. É importante não os deixar no abandono e na solidão, enquanto estão a enfrentar um momento tão delicado da sua vida. Por este motivo, dignos de mérito são aqueles que, com paciência e amor, colocam ao serviço destas pessoas as suas próprias competências profissionais e o seu calor humano.

Penso nos médicos, nos enfermeiros, nos agentes que trabalham no campo da saúde, nos voluntários, nos religiosos, nas religiosas e nos sacerdotes que, sem pouparem esforços, se inclinam sobre os doentes, como o bom Samaritano, sem ter em consideração a sua condição social, a cor da sua pele ou a sua pertença religiosa, mas somente aquilo de que eles têm necessidade. No rosto de cada ser humano, ainda mais se é provado e desfigurado pela doença, brilha o rosto de Cristo, que disse: "Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes" (Mt 25,40).

Estimados irmãos e irmãs, daqui a pouco uma sugestiva procissão de velas fará reviver o clima que se cria entre os peregrinos e os devotos em Lourdes, ao anoitecer. O nosso pensamento dirige-se à Gruta de Massabielle, onde se entrelaçam o sofrimento humano e a esperança, o medo e a confiança. Quantos peregrinos, confortados pelo olhar da Mãe, encontram em Lourdes a força para cumprir mais facilmente a vontade de Deus, mesmo quando isto exige renúncia e dor, conscientes de que, como afirma o Apóstolo Paulo, tudo concorre para o bem daqueles que amam o Senhor (cf. Rm 8,28)!

A vela, que vós tendes acesa nas vossas mãos, constitua também para vós, prezados irmãos e irmãs, o sinal de um desejo sincero de caminhar com Jesus, esplendor de paz que resplandece as trevas e nos impele, por nossa vez, a ser luz e apoio para aqueles que vivem ao nosso lado.

Ninguém, especialmente aquele que se encontra em condições de árduo sofrimento, nunca se sinta sozinho e abandonado. Esta tarde, confio todos vós à Virgem Maria. Depois de ter conhecido sofrimentos indizíveis, Ela foi assunta ao Céu, onde nos espera e aonde também nós esperamos um dia poder compartilhar a glória do seu Filho divino, o júbilo sem fim. Com estes sentimentos, concedo a minha Bênção a todos vós aqui presentes e a quantos vos são queridos.





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