Discursos Bento XVI 21127

À CÚRIA ROMANA NO TRADICIONAL ENCONTRO PARA OS BONS VOTOS DE NATAL Sexta-feira, 21 de Dezembro de 2008

21127
Sala Clementina


Senhores Cardeais
Venerados Irmãos
no Episcopado e no Presbiterado
Queridos irmãos e irmãs!

Já respiramos, neste encontro, a alegria do próximo Natal. Estou-vos profundamente grato pela vossa participação neste tradicional encontro, cujo particular clima espiritual o Cardeal Decano Angelo Sodano evocou bem, recordando o tema central da recente Carta Encíclica sobre a esperança cristã. Agradeço-lhe de coração as calorosas expressões com que se fez intérprete dos sentimentos de bons votos do Colégio cardinalício, dos Membros da Cúria Romana e do Governatorato, assim como dos Representantes Pontifícios espalhados pelo mundo. A nossa é verdadeiramente como Vossa Eminência ressaltou, Senhor Cardeal uma "comunidade de trabalho" que está junto pelos vínculos de amor fraterno, que as festas de Natal fortalecem. Neste espírito, oportunamente Vossa Eminência não deixou de recordar quantos, já pertencentes à nossa família da Cúria, nos meses passados cruzaram o limiar do tempo e entraram na paz de Deus: numa circunstância como esta é bom para o coração sentir próximos quantos partilharam connosco o serviço à Igreja e agora, junto do trono de Deus, intercedem por nós. Obrigado portanto, Senhor Cardeal Decano, pelas suas palavras e obrigado a todos os presentes pela contribuição que cada um dá para o cumprimento do ministério que o Senhor me confiou.

Outro ano está prestes a findar. Como primeiro acontecimento saliente deste período, transcorrido tão rapidamente, gostaria de mencionar a viagem ao Brasil. A sua finalidade era o encontro com a V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe e por conseguinte, mais em geral, um encontro com a Igreja no vasto Continente latino-americano. Antes de me deter sobre a Conferência de Aparecida, gostaria de falar de alguns momentos culminantes daquela viagem. Em primeiro lugar permanece na minha memória a solene vigília com os jovens no estádio de São Paulo: nela, apesar das temperaturas rígidas, sentimo-nos todos unidos por uma grande alegria interior, por uma experiência viva de comunhão e pela vontade clara de ser, no Espírito de Jesus Cristo, servos da reconciliação, amigos dos pobres e dos sofredores e mensageiros daquele bem cujo esplendor encontrámos no Evangelho. Existem manifestações de massa que têm apenas o efeito de uma auto-afirmação; nelas deixamo-nos arrebatar pela enebriação do ritmo e dos sons, acabando por sentir alegria só de nós mesmos. Lá, ao contrário, abriu-se precisamente o coração: a comunhão profunda que naquela tarde se instaurou espontaneamente entre nós, no ser uns com os outros, originou o ser uns para os outros. Não foi uma fuga face à vida quotidiana, mas transformou-se na força de aceitar a vida de modo novo. Portanto, gostaria de agradecer de coração aos jovens que animaram aquela tarde pelo seu ser-com, pelo seu cantar, falar, rezar, que nos purificou e melhorou interiormente melhorados também para os outros.

Permanece inesquecível também o dia em que, juntamente com um grande número de Bispos, sacerdotes, religiosas, religiosos e fiéis leigos pude canonizar Frei Galvão, um filho do Brasil, proclamando-o santo para a Igreja universal. Em toda a parte as suas imagens nos saudavam, das quais emanava o esplendor da bondade de coração que ele tinha adquirido no encontro com Cristo e na relação com a sua comunidade religiosa. Sobre a vinda definitiva de Cristo, na parusia, foi-nos dito que Ele não virá sozinho, mas juntamente com todos os seus santos. Assim, cada santo que entra na história constitui já uma pequena porção da vinda de Cristo, uma sua nova entrada no tempo, que nos mostra a sua imagem de modo novo e nos torna seguros da sua presença. Jesus Cristo não pertence ao passado e não está desterrado num futuro distante, cujo advento nem sequer temos a coragem de pedir. Ele vem com uma grande procissão de santos. Juntamente com os seus santos já está sempre a caminho ao nosso encontro, rumo ao nosso presente.

Recordo com particular vivacidade o dia na Fazenda da Esperança, na qual pessoas, que caíram na escravidão da droga, reencontram liberdade e esperança. Ao chegar lá, como primeiro acto, senti de maneira renovada a força restabelecedora da criação de Deus. Montanhas verdes circundam o amplo vale; dirigem o olhar para o alto e, ao mesmo tempo, dão um sentido de protecção. Do tabernáculo da pequena igreja das Carmelitas brota uma fonte de água límpida que recorda a profecia de Ezequiel sobre a água que, brotando do Templo, desintoxica a terra salgada e faz crescer árvores que proporcionam a vida. Devemos defender a criação não só em vista das nossas utilidades, mas por si mesma como mensagem do Criador, como dom de beleza, que é promessa e esperança. Sim, o homem tem necessidade da transcendência. Só Deus basta, disse Teresa de Ávila. Se Ele faltar, então o homem deve procurar superar por si os confins do mundo, deve abrir diante de si o espaço infinito para o qual foi criado. Então, a droga torna-se para ele quase uma necessidade. Mas muito depressa descobre que esta é uma infinidade ilusória poder-se-ia dizer, um engano que o diabo faz ao homem. Lá, na Fazenda da Esperança, os confins do mundo são verdadeiramente superados, abre-se o olhar para Deus, para a amplitude da nossa vida, e assim realiza-se um restabelecimento. Dirijo a quantos ali trabalham o meu agradecimento sincero, e a todos os que lá procuram restabelecimento, os meus cordiais votos de bênção.

Gostaria depois de recordar o encontro com os Bispos brasileiros na catedral de São Paulo. A música solene que nos acompanhou permanece inesquecível. O que a tornou particularmente bela foi o facto de ter sido executada por um coro e uma orquestra formados por jovens pobres daquela cidade. Aquelas pessoas ofereceram-nos assim a experiência da beleza que faz parte daqueles dons por meio dos quais são superados os limites da quotidianidade do mundo e nós podemos compreender realidades maiores que nos tornam certos da beleza de Deus. Depois, a experiência da "colegialidade efectiva", da comunhão fraterna no ministério comum fez-nos sentir a alegria da catolicidade: além de todos os confins geográficos e culturais nós somos irmãos, juntamente com Cristo ressuscitado que nos chamou ao seu serviço.

E por fim, Aparecida. De modo totalmente particular comoveu-me a pequena imagem de Nossa Senhora. Alguns pobres pescadores que tinham lançado vezes sem conta as redes em vão, pescaram a imagenzinha das águas do rio, e depois disto, finalmente realizou-se uma pesca abundante. É a Nossa Senhora dos pobres, tornando-se ela mesma pobre e pequena. Assim, precisamente mediante a fé e o amor dos pobres, formou-se em volta desta imagem o grande Santuário que, recordando contudo sempre a pobreza de Deus, a humildade da Mãe, constitui dia após dia uma casa e um refúgio para as pessoas que rezam e esperam. Foi bom que nos reuníssemos ali e ali elaborássemos o documento sobre o tema "Discípulos e missionários de Jesus Cristo, para que n'Ele tenham vida". Certamente, poderia haver quem fizesse imediatamente a pergunta: Mas era este o tema justo neste momento da história que estamos a viver? Não era porventura uma viragem excessiva para a interioridade, num momento em que os grandes desafios da história, as questões urgentes sobre a justiça, a paz e a liberdade exigem o compromisso total de todos os homens de boa vontade, e de modo particular da cristandade e da Igreja? Não se deveriam ter enfrentado antes estes problemas, em vez de se retirar no mundo interior da fé?

Adiemos, por um momento, para mais tarde esta objecção. De facto, antes de lhe dar uma resposta é necessário compreender bem o próprio tema no seu verdadeiro significado; quando isto for feito, a resposta à objecção delineia-se por si. A palavra-chave do tema é: encontrar a vida a vida verdadeira. Com isto o tema supõe que este objectivo, sobre o qual talvez todos estejam de acordo, seja alcançado no discipulado de Jesus Cristo como também no compromisso pela sua palavra e pela sua presença. Os cristãos na América Latina, e com eles os de todo o mundo, são portanto convidados antes de tudo a tornarem-se de novo mais "discípulos de Jesus Cristo" o que, no fundo, já somos devido ao Baptismo, sem que isto evite que no-lo devemos tornar sempre de novo na viva apropriação do dom daquele Sacramento. Ser discípulos de Cristo o que significa? Pois bem, significa em primeiro lugar: chegar a conhecê-lo. Como acontece isto? É um convite a ouvi-lo do modo como Ele nos fala no texto da Sagrada Escritura, como se dirige a nós e vem ao nosso encontro na comum oração da Igreja, nos Sacramentos e no testemunho dos santos. Nunca se pode conhecer Cristo apenas teoricamente. Com grande doutrina pode-se conhecer tudo sobre as Sagradas Escrituras, sem nunca O ter encontrado. É parte integrante do facto de O conhecer, caminhar juntamente com Ele, entrar nos seus sentimentos, como diz a Carta aos Filipenses (2, 5). Paulo descreve brevemente estes sentimentos do seguinte modo: ter o mesmo amor, formar juntos uma só alma (sýmpsychoi), estar de acordo, não agir por rivalidade nem vanglória, não tendo cada um por finalidade apenas os próprios interesses, mas também os dos outros (2, 2-4). A catequese nunca pode ser apenas um ensinamento intelectual, deve tornar-se sempre também um exercitar-se na comunhão de vida com Cristo, um exercitar-se na humildade, na justiça e no amor. Só assim caminhamos com Jesus Cristo pelo seu caminho, só assim se abrem os olhos do nosso coração; só assim aprendemos a compreender a Escritura e nos encontramos com Ele. O encontro com Jesus Cristo exige escuta, exige a resposta na oração e em praticar o que Ele nos diz. Com o conhecimento de Cristo chegamos ao conhecimento de Deus, e só a partir de Deus compreendemos o homem e o mundo, um mundo que de outra forma permanece uma pergunta sem sentido.

Tornar-se discípulos de Cristo é portanto um caminho de educação para o nosso verdadeiro ser, para o justo ser homens. No Antigo Testamento, a atitude de fundo do homem que vive a palavra de Deus era resumida com a palavra zadic o justo: quem vive segundo a palavra de Deus torna-se um justo; ele pratica e vive a justiça. No cristianismo, a atitude dos discípulos de Jesus Cristo era expressa também com outra palavra: o fiel. A fé engloba tudo; agora esta palavra indica ao mesmo tempo o ser com Cristo e o ser com a sua justiça. Na fé recebemos a justiça de Cristo, vivemo-la em primeira pessoa e transmitimo-la. O documento de Aparecida concretiza tudo isto falando da Boa Nova sobre a dignidade do homem, sobre a vida, sobre a família, a ciência e a tecnologia, sobre o trabalho humano, sobre o destino universal dos bens da terra e sobre a ecologia: dimensões nas quais se desenrola a nossa justiça, é vivida a fé e são dadas respostas aos desafios dos tempos.

Aquele documento diz-nos que o discípulo de Jesus Cristo deve ser também "missionário", mensageiro do Evangelho. Também aqui se faz uma objecção: ainda é lícito hoje "evangelizar"? Não deveriam antes todas as religiões e concepções do mundo conviver pacificamente e procurar fazer juntas o melhor que podem pela humanidade, cada uma à própria maneira? Pois bem, é indiscutível que todos devemos conviver e cooperar na tolerância e no respeito recíprocos. A Igreja católica compromete-se nisto com grande energia e, com os dois encontros de Assis, deu também indicações evidentes neste sentido, indicações que, no encontro em Nápoles deste ano, retomamos de novo. Em relação a isto, apraz-me aqui recordar a carta que me foi gentilmente enviada a 13 de Outubro passado por 138 Chefes religiosos muçulmanos para testemunhar o seu compromisso comum na promoção da paz no mundo. Respondi com alegria expressando a minha adesão convicta a estes nobres propósitos e ressaltando ao mesmo tempo a urgência de um compromisso concorde pela tutela dos valores do respeito recíproco, do diálogo e da colaboração. O reconhecimento partilhado da existência de um Deus único, próvido Criador e Juiz universal do comportamento de cada um, constitui a premissa de uma acção comum em defesa do respeito efectivo da dignidade de cada pessoa humana para a edificação de uma sociedade mais justa e solidária.

Mas esta vontade de diálogo e de colaboração significa talvez ao mesmo tempo que não podemos transmitir mais a mensagem de Jesus Cristo, não podemos propor mais aos homens e ao mundo esta chamada e a esperança que dela deriva? Quem reconheceu uma grande verdade, quem sentiu uma grande alegria, deve transmiti-la, não pode tê-la para si. Dons tão grandes nunca se destinam a uma só pessoa. Em Jesus Cristo surgiu para nós uma grande luz, a grande Luz: não a podemos colocar debaixo do alqueire, mas devemos pô-la no lucernário, para que ilumine a quantos estão na casa (cf.
Mt 5,15). São Paulo esteve incansavelmente a caminho levando consigo o Evangelho. Sentia-se até sob uma espécie de "constrição" para anunciar o Evangelho (cf. 1Co 9,16) não tanto devido a uma preocupação pela salvação de cada indivíduo não baptizado, que ainda não conhece o Evangelho, mas porque estava consciente de que a história no seu conjunto não podia alcançar o seu cumprimento enquanto a totalidade (pléroma) dos pobres não tivesse sido alcançada pelo Evangelho (cf. Rm 11,25). Para chegar ao seu cumprimento, a história precisa do anúncio da Boa Nova a todos os povos, a todos os homens (cf. Mc 13,10). E de facto: quanto é importante que confluam na humanidade forças de reconciliação, forças de paz, forças de amor e de justiça como é importante que no "balanço" da humanidade, face aos sentimentos e às realidades da violência e da injustiça que a ameaçam, sejam suscitadas e fortalecidas forças antagonistas! É precisamente isto que acontece na missão cristã. Mediante o encontro com Jesus Cristo e com os seus santos, mediante o encontro com Deus, o balanço da humanidade é fornecido de novo com aquelas forças de bem, sem as quais todos os nossos programas de ordem social não se tornam realidade, mas face à pressão extremamente poderosa de outros interesses contrários à paz e à justiça permanecem apenas teorias abstractas.

Assim voltamos às perguntas feitas no início: Fez bem Aparecida, na busca de vida para o mundo em dar a prioridade ao discipulado de Jesus Cristo e à evangelização? Era porventura um fechamento errado na interioridade? Não! Aparecida decidiu de modo justo, porque precisamente através do novo encontro com Jesus Cristo e com o seu Evangelho e só assim são suscitadas as forças que nos tornam capazes de dar a resposta justa aos desafios do tempo.

No final do mês de Junho enviei uma Carta aos Bispos, aos presbíteros, às pessoas consagradas e aos fiéis leigos da Igreja católica na República Popular Chinesa. Com esta Carta quis manifestar quer o meu profundo afecto espiritual por todos os católicos na China, quer uma estima cordial pelo Povo chinês. Nela reafirmei os princípios perenes da tradição católica e do Concílio Vaticano II em campo eclesiológico. À luz do "desígnio originário", que Cristo teve da sua Igreja, indiquei algumas orientações para enfrentar e para resolver, em espírito de comunhão e de verdade, as delicadas e complexas problemáticas da vida da Igreja na China. Indiquei também a disponibilidade da Santa Sé para um diálogo sereno e construtivo com as Autoridades civis a fim de encontrar uma solução para os vários problemas, relativos à comunidade católica. A Carta foi acolhida com alegria e com gratidão pelos católicos na China. Faço votos por que, com a ajuda de Deus, ela possa dar os frutos esperados.

Infelizmente, posso mencionar os outros momentos salientes do ano só brevemente. Eram na realidade acontecimentos que tinham por objectivo as mesmas finalidades, pretendiam evidenciar as mesmas orientações. Foi assim a maravilhosa visita à Áustria. L'Osservatore Romano, com uma bela expressão, caracterizou a chuva, que nos acompanhou, como "chuva da fé": os aguaceiros não só não diminuíram a nossa alegria da fé em Cristo experimentada olhando para a sua Mãe, mas aliás fortaleceram-na. Esta alegria penetrou a barreira das nuvens que nos ameaçavam. Olhando com Maria para Cristo encontramos a Luz que em todas as trevas do mundo nos indica o caminho. Gostaria de agradecer de coração aos Bispos austríacos, aos sacerdotes, às religiosas, aos religiosos e aos numerosos fiéis, que nestes dias se uniram a mim no caminho rumo a Cristo, neste encorajador sinal de fé que deram.

Também o encontro com a juventude na agorá de Loreto foi um grande sinal de alegria e de esperança: se tantos jovens desejam encontrar Maria e com Maria Cristo e se deixam contagiar pela alegria da fé, então podemos tranquilamente ir ao encontro do futuro. Neste sentido dirigi-me em várias ocasiões aos jovens: tanto na visita ao Instituto para menores de Casal del Marmo, como nos discursos pronunciados por ocasião das Audiências ou dos Angelus dominicais. Tomei conhecimento das suas expectativas e dos seus generosos propósitos, relançando a questão educativa e solicitando o compromisso das Igrejas locais na pastoral vocacional. Obviamente não deixei de denunciar as manipulações às quais os jovens hoje estão expostos e os perigos que delas derivam para a sociedade do futuro.

Já mencionei muito brevemente o encontro de Nápoles. Também lá nos encontramos acontecimento totalmente extraordinário para a cidade do sol e da luz circundados pela chuva, mas também lá a humanidade calorosa e a fé viva penetraram as nuvens, fazendo com que experimentássemos a alegria que vem do Evangelho.

Sem dúvida, não nos devemos iludir: os problemas que o secularismo do nosso tempo apresenta e a pressão das presunções ideológicas para as quais tende a consciência secularista com a sua pretensão exclusiva à racionalidade definitiva, não são pequenos. Nós sabemo-lo, e conhecemos a fadiga da luta que neste tempo nos é imposta. Mas sabemos também que o Senhor mantém a sua promessa: "E Eu estarei sempre convosco, até ao fim do mundo" (Mt 28,20). Nesta jubilosa certeza, recebendo o estímulo das reflexões de Aparecida para renovar também nós o nosso ser com Cristo, vamos confiantes ao encontro do novo ano. Vamos sob o olhar materno da Aparecida, d'Aquela que se qualificou como "a serva do Senhor". A sua protecção torna-nos seguros e cheios de esperança. Com estes sentimentos concedo de coração a vós aqui presentes e a quantos fazem parte da grande família da Cúria Romana a Bênção Apostólica.
2008



DURANTE A VISITA À CASA "DOM DE MARIA" DAS MISSIONÁRIAS DA CARIDADE

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Sexta-feira, 4 de Janeiro de 2008


Queridos amigos

Vim visitar-vos no início do novo ano enquanto ainda respiramos o clima familiar do Natal, e aproveito imediatamente a ocasião para formular a todos os meus votos mais cordiais e fervorosos. Saúdo com afecto a vós aqui presentes, juntamente com quantos, graças à ligação televisiva, nos seguem e estão unidos a nós pelos outros ambientes desta casa chamada "Dom de Maria". Durante trinta anos, quando eu era Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, transcorri várias horas do dia ao lado desta vossa benemérita instituição querida pelo meu venerado predecessor, o Servo de Deus João Paulo II, e por ele confiada à Beata Teresa de Calcutá. Pude assim apreciar o generoso serviço de caridade evangélica que as Missionárias da Caridade desempenham há quase vinte anos com a ajuda e a colaboração de muitas pessoas de boa vontade. Eis-me hoje aqui convosco para renovar a minha gratidão às irmãs, aos voluntários e aos vários colaboradores. Eis-me sobretudo para manifestar a minha proximidade espiritual a vós, queridos amigos, que nesta casa encontrais acolhimento solícito, escuta, compreensão e um apoio quotidiano quer material quer espiritual. Vim aqui para vos dizer que o Papa vos quer bem e está próximo de vós. Agradeço à Superiora das Missionárias da Caridade que conclui o seu serviço e se fez intérprete dos vossos sentimentos comuns, dirigindo-me em nome de todos palavras de boas-vindas. Saúdo a nova Superiora que assume a responsabilidade da Casa, com aquele estilo de disponibilidade dócil, típico das filhas espirituais de Madre Teresa de Calcutá.

Quando nasceu esta casa, a Beata Madre Teresa quis chamá-la "Dom de Maria", quase desejando que aqui se possa experimentar sempre o amor da Santa Virgem. Para quem vier bater à porta, é de facto um dom de Maria sentir-se acolhido pelos braços amorosos das Irmãs e dos voluntários. É também um dom de Maria a presença de quem se detém a ouvir as pessoas em dificuldade e a servi-las com a mesma competência que levou imediatamente a Mãe do Senhor a ir ter com Santa Isabel. Que este estilo de amor evangélico sele e distinga sempre a vossa vocação para que, além da ajuda material, possais comunicar a quantos encontrais quotidianamente aquela mesma paixão por Cristo e aquele "sorriso de Deus" luminoso que animaram a existência de Madre Teresa.

Madre Teresa gostava de dizer: é Natal todas as vezes que permitimos que Jesus ame os outros através de nós. O Natal é mistério de amor, o mistério do Amor. O tempo natalício, representando à nossa contemplação o nascimento de Jesus em Belém, mostra-nos a bondade infinita de Deus que, fazendo-se Menino, quis vir ao encontro da pobreza e da solidão dos homens; aceitou habitar entre nós partilhando as nossas dificuldades quotidianas; não hesitou em carregar juntamente connosco o peso da existência, com as suas fadigas e preocupações. Nasceu para nós, para permanecer connosco e oferecer a todo aquele que lhe abre a porta do seu coração o dom da sua alegria, da sua paz, do seu amor. Ao nascer numa gruta, porque não havia lugar para Ele noutra parte, Jesus conheceu as necessidades que muitos de vós conheceis. O Natal ajuda-nos a compreender que Deus nunca nos abandona e vem sempre ao nosso encontro, protege-nos e preocupa-se por todos nós, porque cada pessoa, sobretudo a mais pequena e indefesa, é preciosa aos seus olhos do Pai rico de ternura e misericórdia. Para nós e para a nossa salvação Ele enviou ao mundo o seu Filho, que no mistério do Natal contemplamos como o Emanuel, Deus-connosco. Com estes sentimentos renovo a todos vós os meus votos mais sentidos para o novo ano que acabou de iniciar garantindo-vos a minha recordação quotidiana na oração. E ao invocar a materna protecção de Maria, Mãe de Cristo, a todos concedo com afecto a minha Bênção.



SAUDAÇÃO NO FINAL DA VISITA À CASA "DOM DE MARIA"

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Sexta-feira, 4 de Janeiro de 2008



Queridos irmãos e irmãs!

Saúdo-vos com afecto e agradeço-vos o caloroso acolhimento. Peço-vos que transmitais à Irmã Nìrmala a minha saudação mais cordial, garantindo-lhe a minha oração por ela e pela Congregação. Sinto-me feliz por encontrar ao mesmo tempo os Superiores-Gerais dos dois ramos masculinos da família fundada por Madre Teresa, os Missionários da Caridade e os Irmãos Contemplativos Missionários da Caridade. Saúdo ainda com profunda cordialidade os colaboradores leigos e os convidados aqui presentes, fazendo extensivo o meu apreço a todos os que neste lugar prestam o seu serviço para fazer com que os hóspedes se possam sentir como na própria casa. Todos juntos formais uma cadeia de caridade cristã sem a qual esta Casa, como qualquer obra de voluntariado, não poderia existir e continuar a servir tantas formas de privações e de necessidades. Portanto, manifesto a cada um de vós o meu reconhecimento e o meu encorajamento, porque sei que aquilo que fazeis aqui a cada irmão e irmã, o fazeis como se fosse a Cristo.

A visita que hoje desejei realizar sintoniza-se com as numerosas do meu predecessor, o servo de Deus João Paulo II. Ele quis fortemente esta casa de acolhimento para os mais pobres, precisamente aqui onde está o centro da Igreja, ao lado de Pedro, que serviu, seguiu e amou Jesus, o Senhor. Este nosso encontro realiza-se a quase vinte anos da construção e inauguração desta casa dentro dos Muros Leoninos. Era de facto o dia 21 de Maio de 1988, quando o amado João Paulo II inaugurou a "Dom de Maria". Quantos gestos de partilha, de caridade concreta foram realizados nestes anos dentro destas paredes! Eles são um sinal e um exemplo para as comunidades cristãs, para que se comprometam a ser sempre comunidades acolhedoras e abertas.

O belo nome desta casa, "Dom de Maria", convida-nos, no início do novo ano, a doar incansavelmente a nossa vida. A Virgem Maria, que se entregou totalmente ao Omnipotente e foi cheia de todas as graças e bênçãos com a vinda do Filho de Deus, nos ensine a fazer da nossa existência um dom quotidiano a Deus Pai, no serviço aos irmãos e na escuta da Sua palavra e da Sua vontade. E como os santos Magos vindos de longe para adorar o Rei-Messias, ide também vós, queridos irmãos e irmãs, pelos caminhos do mundo, seguindo o exemplo de Madre Teresa, testemunhando sempre com alegria o amor de Jesus, especialmente para com os últimos e os pobres, e do céu a vossa beata Fundadora vos acompanhe e proteja. A vós aqui presentes, aos hóspedes da casa e a todos os colaboradores renovo de coração a Bênção Apostólica.


AO CORPO DIPLOMÁTICO ACREDITADO JUNTO DA SANTA SÉ PARA A TROCA DE BONS VOTOS DE ANO NOVO Segunda-feira, 7 de Janeiro de 2008

7108 Excelências
Senhoras
Senhores!


1. Saúdo cordialmente o vosso Decano, o Embaixador Giovanni Galassi, e agredeço-lhe as amáveis palavras que me dirigiu em nome do Corpo Diplomático acreditado. Dirijo a cada um uma deferente saudação, em particular a quantos participam pela primeira vez neste encontro. Através de vós, expresso os meus votos fervorosos aos povos e aos governos que representais com dignidade e competência. Um luto atingiu a vossa comunidade, há algumas semanas: o Embaixador da França, Sr. Bernard Kessedjan, terminou a sua peregrinação terrena; que o Senhor o acolha na sua paz! Dirijo igualmente hoje um pensamento especial às nações que ainda não estabeleceram relações diplomáticas com a Santa Sé: elas ocupam também um lugar no coração do Papa. A Igreja está profundamente convencida de que a humanidade constitui uma família, como quis ressaltar na Mensagem para a celebração do Dia Mundial da Paz deste ano.

2. Num espírito de família, foram estabelecidas relações diplomáticas com os Emirados Árabes Unidos e realizadas visitas a países que me são muito queridos. O acolhimento caloroso dos Brasileiros ainda vibra no meu coração! Neste país, tive a alegria de me encontrar com os representantes da grande família da Igreja na América Latina e no Caribe, reunidos em Aparecida para a V Conferência Geral do CELAM. No campo económico e social, pude ver sinais eloquentes de esperança para este continente, assim como motivos de preocupação. Como não desejar uma maior cooperação entre os povos da América Latina e, em cada um dos países que a compõem, o abandono das tensões internas, a fim de que eles possam convergir nos grandes valores inspirados pelo Evangelho? Desejo mencionar Cuba, que se prepara para celebrar o X aniversário da visita do meu venerado Predecessor. O Papa João Paulo II foi recebido com afecto pelas Autoridades e pela população, e encorajou todos os cubanos a colaborar para um futuro melhor. Seja-me permitido retomar aqui esta mensagem de esperança, que conserva toda a sua actualidade.

3. O meu pensamento e a minha oração dirigiram-se sobretudo para as populações atingidas por terríveis catástrofes naturais. Penso nos furacões e nas inundações que devastaram certas regiões do México e da América Central, assim como países da África e da Ásia, sobretudo o Bangladesh, e uma parte da Oceânia; é necessário mencionar também os grandes incêndios. O Cardeal Secretário de Estado, que se deslocou ao Peru nos finais de Agosto, trouxe-me um testemunho directo das destruições e da desolação provocadas pelo terrível terramoto, mas também da coragem e da fé das populações atingidas. Perante acontecimentos trágicos como este, é necessário um compromisso comum e forte. Como escrevi na Encíclica sobre a esperança, "a grandeza da humanidade determina-se essencialmente na relação com o sofrimento e com quem sofre. Isto vale tanto para o indivíduo como para a sociedade" (Encíclica Spesalvi,38).

4. A preocupação da comunidade internacional pelo Médio Oriente continua a ser intensa. Sinto-me feliz por a Conferência de Anápolis ter dado sinais no caminho do abandono do recurso a soluções parciais ou unilaterais, em benefício de uma abordagem global, respeitadora dos direitos e dos interesses dos povos e da região. Faço apelo, mais uma vez, aos Israelianos e aos Palestinos, a fim de que concentrem as suas energias sobre a realização dos compromissos assumidos nesta ocasião e que não interrompam o processo felizmente encaminhado. Convido também a comunidade internacional a apoiar estes dois povos com convicção e compreensão pelos sofrimentos e receios de cada um deles. Como não estar próximo do Líbano, nas provações e violências que continuam a atormentar este querido país? Faço votos por que os Libaneses possam decidir o seu futuro livremente e peço ao Senhor que os ilumine, começando pelos responsáveis da vida pública, a fim de que, pondo de lado os interesses particulares, se disponham a comprometer-se no caminho do diálogo e da reconciliação. Só desta forma o país poderá progredir na estabilidade e ser de novo um exemplo de convivência entre as comunidades. Também no Iraque, a reconciliação é uma urgência! Actualmente, os atentados terroristas, as ameaças e as violências continuam, em particular contra a comunidade cristã, e as notícias que chegaram ontem confirmam a nossa preocupação; é evidente que é preciso resolver certas questões políticas. Neste quadro, uma reforma constitucional apropriada deverá salvaguardar os direitos das minorias. Importantes ajudas humanitárias são necessárias para as populações atingidas pela guerra; penso em particular nos deslocados no interior do país e nos refugiados no estrangeiro, entre os quais se encontram numerosos cristãos. Convido a comunidade internacional a mostrar-se generosa para com os países onde eles se encontram refugiados, cujas capacidades de acolhimento são postas à dura prova. Desejo também manifestar o meu encorajamento para que se continue a prosseguir incessantemente o caminho da diplomacia para resolver a questão do programa nuclear iraniano, negociando em boa fé, adoptando medidas destinadas a incrementar a transparência e a confiança recíprocas, e tendo sempre em consideração as necessidades autênticas dos povos e o bem comum da família humana.

5. Alargando o nosso olhar para todo o continente asiático, gostaria de chamar a vossa atenção para algumas situações de crise. Sobre o Paquistão, em primeiro lugar, que foi duramente provado pela violência durante os últimos meses. Faço votos por que todas as forças políticas e sociais se empenhem na construção de uma sociedade pacífica, que respeite os direitos de todos. No Afeganistão, à violência juntam-se outros graves problemas sociais, como a produção da droga: é necessário oferecer antes de tudo apoio aos esforços de desenvolvimento e trabalhar ainda mais intensamente para construir um futuro sereno. No Sri Lanka não é mais possível adiar os esforços decisivos para remediar os imensos sofrimentos causados pelo conflito em curso. E peço ao Senhor que no Myanmar, com o apoio da comunidade internacional, se abra uma estação de diálogo entre o governo e a oposição, garantia de um verdadeiro respeito de todos os direitos do homem e das liberdades fundamentais.

6. Voltando-me agora para a África, gostaria em primeiro lugar de reafirmar o meu profundo sofrimento, ao verificar como a esperança parece quase vencida pelo sinistro cortejo de fome e de morte que continua no Darfur. Desejo de coração que a acção conjunta das Nações Unidas e da União Africana, cuja missão acaba de iniciar, leve ajuda e conforto às populações provadas. O processo de paz na República Democrática do Congo confronta-se com fortes resistências junto dos Grandes Lagos, sobretudo nas regiões orientais, e a Somália, em particular Mogadíscio, continua a ser afligida por violências e pela pobreza. Faço apelo às partes em conflito para que cessem as acções militares, para que seja facilitada a passagem das ajudas humanitárias e para que os civis sejam respeitados. O Quénia conheceu nestes últimos dias uma brusca erupção de violência. Associando-me ao apelo lançado pelos Bispos a 2 de Janeiro, convido todos os habitantes, em particular os responsáveis políticos, a procurar mediante o diálogo uma solução pacífica, fundada na justiça e na fraternidade. A Igreja católica não permanece indiferente aos gemidos de dor que se elevam nestas regiões. Ela faz seus os pedidos de ajuda dos refugiados e dos deslocados e compromete-se para favorecer a reconciliação, a justiça e a paz. Este ano, a Etiópia festeja a entrada no terceiro milénio cristão, e tenho a certeza de que as celebrações organizadas para esta ocasião hão-de contribuir também para recordar a obra imensa, social e apostólica, realizada pelos cristãos na África.

7. Terminando com a Europa, alegro-me pelos progressos realizados em diferentes países da região dos Balcãs e exprimo mais uma vez votos por que o estatuto definitivo do Kossovo tenha em consideração as reivindicações legítimas das partes em causa e que garanta a segurança e o respeito dos seus direitos a quantos habitam nessa terra, para que se afaste definitivamente o espectro dos confrontos violentos e que seja fortalecida a estabilidade europeia. Gostaria de citar igualmente Chipre, recordando-me com alegria da visita de Sua Beatitude o Arcebispo Chrysostomos II, no passado mês de Junho. Expresso o voto de que, no contexto da União Europeia, não seja poupado esforço algum para encontrar uma solução para uma crise que dura há demasiado tempo. Realizei, no passado mês de Setembro, uma visita à Áustria, que quis ressaltar também a contribuição fundamental que a Igreja católica pode e deseja dar para a unificação da Europa. E, a propósito da Europa, desejo garantir-vos que sigo atentamente o período que inicia com a assinatura do "Tratado de Lisboa". Esta etapa relança o processo de construção da "casa Europa", que "só será um lugar agradável para todos habitarem se for construída sobre uma sólida base cultural e moral de valores comuns que haurimos da nossa história e das nossas tradições" (Encontro com as Autoridades e com o Corpo Diplomático, Viena 7 de Setembro de 2007) e se ela não renegar as suas raízes cristãs.

8. Desta rápida visão de conjunto sobressai claramente que a segurança e a estabilidade do mundo permanecem frágeis. Os factores de preocupação são diversos; contudo todos eles testemunham que a liberdade humana não é absoluta, mas que se trata de um bem partilhado, cuja responsabilidade incumbe sobre todos. Por conseguinte, a ordem e o direito são elementos que a garantem. Mas o direito só pode ser uma força de paz eficaz se os seus fundamentos permanecerem solidamente ancorados no direito natural, doado pelo Criador. Por este motivo também nunca se pode excluir Deus do horizonte do homem e da história. O nome de Deus é um nome de justiça; representa um apelo urgente à paz.

9. Esta tomada de consciência poderá ajudar, entre outros, a orientar as iniciativas de diálogo intercultural e inter-religioso. Estas iniciativas são cada vez mais numerosas e podem estimular a colaboração sobre temas de interesse recíproco, como a dignidade da pessoa humana, a busca do bem comum, a construção da paz e o desenvolvimento. A este propósito, a Santa Sé quis dar um realce particular à sua participação no diálogo de cúpula sobre a compreensão entre as religiões e as culturas e a cooperação pela paz, no âmbito da 62ª Assembleia Geral das Nações Unidas (4-5 de Outubro de 2007). Para ser verdadeiro, este diálogo deve ser claro, evitando relativismo e sincretismo, mas animado por um respeito sincero pelos outros e por um espírito de reconciliação e de fraternidade. A Igreja católica está profundamente comprometida nisto e com prazer evoco de novo a carta que me enviaram, a 13 de Outubro passado, cento e trinta e oito personalidades muçulmanas e renovo a minha gratidão pelos nobres sentimentos que nela são expressos.

10. A nossa sociedade incluiu justamente a grandeza e a dignidade da pessoa humana em diversas declarações dos direitos, que foram formuladas a partir da Declaração Universal dos Direitos do Homem, adoptada precisamente há sessenta anos. Este acto solene foi, segundo a expressão do Papa Paulo VI, um dos maiores títulos de glória das Nações Unidas. Em todos os continentes, a Igreja católica se compromete para que os direitos do homem sejam não só proclamados, mas também aplicados. É desejável que os organismos criados para a defesa e a promoção dos direitos do homem consagrem todas as suas energias para esta tarefa e, em particular, que o Conselho dos direitos do homem saiba responder às expectativas suscitadas pela sua criação.

11. A Santa Sé, por seu lado, nunca se cansará de confirmar estes princípios e estes direitos fundados sobre o que é permanente e essencial para a pessoa humana. É um serviço que a Igreja deseja prestar à verdadeira dignidade do homem, criada à imagem de Deus. E partindo precisamente destas considerações, não posso deixar de deplorar mais uma vez os ataques contínuos perpetrados, em todos os continentes, contra a vida humana. Gostaria de recordar, com muitos pesquisadores e cientistas, que as novas fronteiras da bioética não impõem uma opção entre a ciência e a moral, mas ao contrário exigem um uso moral da ciência. Por outro lado, recordando o apelo do Papa João Paulo II por ocasião do Grande Jubileu do Ano 2000, alegro-me por que, a 18 de Dezembro passado, a Assembleia Geral das Nações Unidas adoptou uma resolução convidando os Estados a instituir uma moratória sobre a aplicação da pena de morte e faço votos por que esta iniciativa estimule o debate público sobre o carácter sagrado da vida humana. Lamento mais uma vez os atentados preocupantes contra a integridade da família, fundada sobre o matrimónio entre um homem e uma mulher. Os responsáveis da política, seja de que parte forem, deveriam defender esta instituição fundamental, célula básica da sociedade. Que mais dizer! Até a liberdade religiosa, "exigência inalienável da dignidade de todos os homens e pedra angular no edifício dos direitos humanos" (Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 1988, Prefácio), com frequência está comprometida. De facto, há ainda muitos lugares onde ela não não pode ser praticada livremente. A Santa Sé defende-a e pede o seu respeito para todos. Ela preocupa-se com as discriminações contra os cristãos e contra os fiéis de outras religiões.

12. A paz não pode ser uma simples palavra ou uma aspiração ilusória. A paz é um compromisso e um modo de vida que exige que se satisfaçam as expectativas legítimas de todos, como o acesso à alimentação, à água e à energia, à medicina e à tecnologia, assim como o controle das mudanças climáticas. Só assim se pode construir o futuro da humanidade; só assim se favorece o desenvolvimento integral hoje e no porvir. Forjando uma expressão particularmente feliz, o Papa Paulo VI ressaltava há quarenta anos, na Encíclica Populorum progressio, que "o progresso é o novo nome da paz". Eis por que, para consolidar a paz, é necessário que os resultados macroeconómicos positivos obtidos por numerosos países em vias de desenvolvimento em 2007 sejam apoiados por políticas sociais eficazes e pela realização dos compromissos de assistência dos países ricos.

13. Por fim, gostaria de exortar a comunidade internacional a um empenho global em favor da segurança. Um esforço comum da parte dos Estados para aplicar todas os compromissos assinados e para impedir o acesso dos terroristas às armas de destruição de massa fortaleceria sem dúvida alguma o regime de não-proliferação nuclear e torná-lo-ia mais eficaz. Congratulo-me pelo acordo concluído para o desmantelamento do programa de armamento nuclear na Coreia do Norte e encorajo a adopção de medidas apropriadas para a redução das armas de tipo clássico e para enfrentar o problema humanitário que as minibombas representam.

Senhoras e Senhores Embaixadores!

14. A diplomacia é, de certo modo, a arte da esperança. Ela vive de esperança e procura discernir até os sinais mais ténues. A diplomacia deve dar esperança. A celebração do Natal recorda-nos todos os anos que, quando Deus se fez uma criança pequena, a Esperança veio habitar no mundo, no coração da família humana. Esta certeza torna-se hoje oração: que Deus abra o coração de quantos governam a família dos povos à Esperança que nunca desilude! Animado por estes sentimentos, dirijo a cada um de vós os meus melhores votos, a fim de que vós próprios, os vossos colaboradores e os povos que representais sejam iluminados pela Graça e pela Paz que o Menino de Belém nos concede.




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