Discursos Bento XVI 619

619 Não menos importante entre as várias divisões dos povos europeus, são aquelas resultantes da trágica perda da unidade cristã nos últimos mil anos. Regozijo-me com o progresso que foi feito nas relações entre os cristãos ortodoxos e católicos, e agradeço especialmente à Igreja Ortodoxa da Sérvia ter hospedado, gentilmente, o encontro da comissão mista para o diálogo teológico entre católicos e ortodoxos de 2006, com o apoio activo de membros ilustres do seu Governo. Houve na verdade bastantes desenvolvimentos esperançosos nesta área, encorajados pelo Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, incluindo as iniciativas conjuntas entre a Pontifícia Universidade Lateranense e Faculdade de Teologia Ortodoxa do Patriarcado da Sérvia em Belgrado, às quais Vossa Excelência fez referência. Espero sinceramente que estes eventos positivos continuem a dar frutos, em particular através da análise conjunta da doutrina social crista, e a este propósito recordo com gratidão o acolhimento reservado ao Cardeal Renato Martino, Presidente do Pontifício Conselho "Justiça e Paz", na sua recente visita à Faculdade de Teologia Ortodoxa.

A localização geográfica da Sérvia, na fronteira entre a Cristandade do Oriente e do Ocidente confere-lhe uma oportunidade única para promover o diálogo ecuménico, enquanto a sua familiaridade com o Islão, quer através do seu encontro com o Império Otomano quer através da presença de numerosos muçulmanos hoje na região, abre muitas boas possibilidades ao progresso do diálogo inter-religioso. Estes dois processos são de suma importância para estabelecer um maior entendimento e respeito mútuos entre os povos e as nações no mundo moderno. Fique assegurado que a Igreja católica na Sérvia está ansiosa por fomentar ulteriormente as boas relações com o Santo Sínodo e assumir o seu papel nas iniciativas conjuntas que promovem a unidade crista e um genuíno rapprochement entre os aderentes a religiões diferentes, contribuindo desta maneira para a construção da paz e harmonia entre as nações.

A liberdade de religião é um elemento indispensável na construção do tipo de sociedade em que a harmonia pode crescer, e nos últimos anos os passos dados pela Sérvia no sentido de garantir este fundamental direito do homem, são de louvar grandemente. O plano de restituição às Igrejas e comunidades religiosas das propriedades que foram nacionalizadas pela Federação Jugoslava e a introdução do ensino religioso nas escolas contribuíram para o renovamento espiritual do seu país, e neste aspecto foi dado um exemplo importante, do qual outros governos podem aprender. Rezo para que esta abertura aos valores religiosos na sociedade continue a crescer, para que o debate público possa ser verdadeiramente nutrido pelos princípios derivantes da fé. Como indiquei no discurso que preparei recentemente para a Universidade de Roma "La Sapienza" (17 de Janeiro de 2008), se a razão "se torna surda à grande mensagem que lhe chega da fé crista e da sua sabedoria, seca como uma árvore cujas raízes já não chegam às águas que lhes dão vida". Sem o nutrimento que advém da fé viva, a cultura é profundamente empobrecida e a esperança por uma civilização verdadeiramente humana recede rapidamente.

Excelência, rezo para que a missão diplomática que o senhor começa hoje, fortaleça ainda mais as boas relações que existem entre a Santa Sé e o seu país. Asseguro-lhe que a Cúria Romana e os seus vários departamentos estão sempre prontos para oferecer ajuda e apoio no cumprimento dos seus deveres. Com os meus bons votos, invoco sobre Vossa Excelência, a sua família e todo o povo da Sérvia, as abundantes bênçãos de Deus.


AOS PARTICIPANTES NA CONGREGAÇÃO GERAL DA COMPANHIA DE JESUS (JESUÍTAS) Quinta-feira, 21 de Fevereiro de 2008



Prezados Sacerdotes da Congregação Geral
da Companhia de Jesus

Estou feliz por vos receber no dia de hoje, no momento em que os vossos trabalhos empenhativos estão a entrar nas fases conclusivas. Estou grato ao novo Prepósito-Geral, Pe. Adolfo Nicolás, por se ter feito intérprete dos vossos sentimentos e do vosso compromisso para responder às expectativas que a Igreja deposita em vós. Falei-vos acerca disto na mensagem que dirigi ao Rev. Pe. Kolvenbach e através dele a toda a vossa Congregação no início dos vossos trabalhos. Agradeço mais uma vezao Pe. Peter-Hans Kolvenbach o precioso serviço de governo que prestou à vossa Ordem durante quase um quarto de século. Saúdo também os membros do novo Conselho Geral e os Assistentes que hão-de ajudar o Prepósito na sua missão extremamente delicada de guia religioso e apostólico de toda a vossa Companhia.

A vossa Congregação realiza-se num período de grandes mudanças sociais, económicas e políticas; de acentuados problemas éticos, culturais e ambientais, de conflitos de todos os tipos; mas também de comunicações mais intensas entre os povos, de novas possibilidades de conhecimento e de diálogo, de profundas aspirações pela paz. São situações que interpelam em grande medida a Igreja católica e a sua capacidade de anunciar aos nossos contemporâneos a Palavra de esperança e de salvação. Por isso, formulo votos sinceros para que toda a Companhia de Jesus, graças aos resultados da vossa Congregação, possa viver com renovado impulso e fervor a missão para a qual o Espírito a suscitou na Igreja e, desde há mais de quatro séculos e meio, a conservou com extraordinária fecundidade de frutos apostólicos. Hoje, quero encorajar-vos, bem como aos vossos coirmãos, a continuardes ao longo do caminho desta missão, no consenso eclesial e social que caracteriza este início de milénio. Como várias vezes vos disseram os meus Predecessores, a Igreja tem necessidade de vós, conta convosco e continua a dirigir-se a vós com confiança, de modo particular para chegar àqueles lugares físicos e espirituais aonde os outros não chegam ou têm dificuldade de chegar. Permaneceram gravadas no vosso coração estas palavras de Paulo VI: "Onde quer que, na Igreja, também nos campos mais difíceis e de vanguarda, nas encruzilhadas das ideologias e nas trincheiras sociais, tenha havido e haja o confronto entre as exigências ardentes do homem e a mensagem perene do Evangelho, lá estiveram e estão presentes os Jesuítas" (Discurso por ocasião da XXXII Congregação Geral, 3 de Dezembro de 1974).

Como reza a Fórmula do vosso Instituto, a Companhia de Jesus foi instituída em primeiro lugar "para a defesa e a propagação da fé". Numa época em que se abriam novos horizontes geográficos, os primeiros companheiros de Inácio puseram-se à disposição do Papa, precisamente para que "os empregasse onde quer que julgasse que era para a maior glória de Deus e utilidade das almas" (Autobiografia, n. 85). Assim, eles foram enviados para anunciar o Senhor a povos e culturas que ainda não O conheciam. Fizeram-no com uma coragem e um zelo que permanecem um exemplo e uma inspiração até aos nossos dias: o nome de São Francisco Xavier é o mais famoso de todos, mas quantos outros podiam ser citados! Hoje, os novos povos que não conhecem o Senhor, ou que mal O conhecem, a ponto de não O saberem reconhecer como o Salvador, encontram-se distantes não tanto do ponto de vista geográfico, como sobretudo do ponto de vista cultural. Os obstáculos que desafiam os anunciadores do Evangelho não são os mares ou as grandes distâncias, mas acima de tudo as fronteiras que, a seguir a uma visão errónea ou superficial de Deus e do homem, se interpõem entre a fé e o saber humano, entre a fé e a ciência moderna, entre a fé e o compromisso pela justiça.

Por isso, a Igreja tem a urgente necessidade de pessoas de fé sólida e profunda, de cultura séria e de sensibilidade humana e social genuína, de religiosos e sacerdotes que dediquem a sua vida à permanência nestas fronteiras para testemunhar e ajudar a compreender que existe, ao contrário, uma profunda harmonia entre fé e razão, entre espírito evangélico, sede de justiça e diligência em prol da fé. Somente assim será possível fazer conhecer o verdadeiro rosto do Senhor a muitas pessoas para as quais Ele ainda está escondido ou é irreconhecível. Portanto, é a isto que a Companhia de Jesus deve dedicar-se de maneira preferencial. Fiel à sua melhor tradição, ela deve continuar a formar com grande cuidado os seus membros na ciência e na virtude, sem contentar-se com a mediocridade, porque a tarefa do confronto e do diálogo com os contextos sociais e culturais muito diversos e as diferentes mentalidades do mundo de hoje é uma das mais difíceis e extenuantes. E esta busca da qualidade e da solidez humana, espiritual e cultural, deve caracterizar também toda a múltipla actividade formativa e educativa dos Jesuítas, em relação aos mais diversos tipos de indivíduos, onde quer que eles se encontrem.

620 Na sua história, a Companhia de Jesus viveu experiências extraordinárias de anúncio e de encontro entre o Evangelho e as culturas do mundo é suficiente pensar em Mateus Ricci na China e em Roberto De Nobili na Índia, ou nas "Missões" da América Latina. E sois justamente orgulhosos disto. Hoje, sinto o dever de vos exortar a seguir novamente os passos dos vossos predecessores, com igual coragem e inteligência, mas também com profunda motivação de fé e paixão ao serviço do Senhor e da sua Igreja. Todavia, enquanto procurais reconhecer os sinais da presença e da obra de Deus em todos os lugares do mundo, mesmo para além dos confins da Igreja visível, e enquanto vos esforçais por construir pontes de compreensão e de diálogo com aqueles que não pertecem à Igreja ou com aqueles que têm dificuldade de aceitar as suas posições e as suas mensagens, deveis ao mesmo tempo assumir lealmente o dever fundamental da Igreja, de se manter fiel ao seu mandato de aderir totalmente à Palavra de Deus, e da tarefa do Magistério de conservar a verdade e a unidade da doutrina católica na sua integridade. Isto é válido não apenas para o compromisso pessoal de cada um dos Jesuítas: uma vez que trabalhais como membros de um corpo apostólico, deveis também prestar atenção a fim de que as vossas obras e instituições conservem sempre uma identidade clara e explícita, para que a finalidade da vossa actividade apostólica não seja ambígua nem obscura, e para que muitas outras pessoas possam compartilhar os vossos ideais e unir-se a vós de maneira eficaz e com entusiasmo, colaborando para o vosso compromisso de serviço a Deus e ao homem.

Como vós bem sabeis, por terdes realizado muitas vezes sob a guia de Santo Inácio nos Exercícios Espirituais a meditação "das duas bandeiras", o nosso mundo é teatro de uma batalha entre o bem e o mal, e estão em acção poderosas forças negativas, que causam aquelas dramáticas situações de subjugação espiritual e material dos nossos contemporâneos, contra os quais muitas vezes declarastes que desejais combater, comprometendo-vos ao serviço da fé e da promoção da justiça. Estas forças manifestam-se hoje de muitas formas, mas com particular evidência através de tendências culturais que se tornam com frequência predominantes, como o subjectivismo, o relativismo, o hedonismo e o materialismo prático. Foi por este motivo que vos pedi um vosso renovado compromisso na promoção e na defesa da doutrina católica, "de modo particular no que diz respeito aos pontos nevrálgicos, hoje fortemente atacados pela cultura secular", alguns dos quais pude exemplificar na minha Carta.Os temas hoje continuamente debatidos e questionados, da salvação de todos os homens em Cristo da moral sexual, do matrimónio e da família, devem ser aprofundados e iluminados no contexto da realidade contemporânea, mas conservando aquela sintonia com o Magistério que evita provocar confusão e desconcerto no Povo de Deus.

Sei e compreendo bem que este é um ponto particularmente sensível e exigente para vós e para vários dos vossos irmãos de hábito, sobretudo para aqueles que estão comprometidos na investigação teológica, no diálogo inter-religioso e no diálogo com as culturas contemporâneas. Foi precisamente por isso que vos convidei e vos convido também hoje a reflectir para voltardes a encontrar o sentido mais completo daquele vosso característico "quarto voto" de obediência ao Sucessor de Pedro, que não comporta unicamente a prontidão a serdes enviados em missão para terras distantes, mas também no mais genuíno espírito inaciano do "sentir com a Igreja e na Igreja" a "amardes e servirdes" o Vigário de Cristo na terra, com aquela devoção "efectiva e afectiva", que deve fazer de vós preciosos e insubstituíveis colaboradores no seu serviço em benefício da Igreja universal.

Ao mesmo tempo, animo-vos a continuar e a renovar a vossa missão no meio dos pobres e com os pobres. Infelizmente, não faltam causas de pobreza e de marginalização, num mundo assinalado por graves desequilíbrios económicos e ambientais; por processos de globalização orientados mais pelo egoísmo do que pela solidariedade; e por conflitos armados devastantes e absurdos. Como tive a oportunidade de reiterar aos Bispos latino-americanos, congregados no Santuário de Aparecida, "a opção preferencial pelos pobres está implícita na fé cristológica naquele Deus que por nós se fez pobre, para nos enriquecer mediante a sua pobreza (cf.
2Co 8,9)". Por conseguinte, é natural que quem deseja ser verdadeiramente companheiro de Jesus, compartilhe de maneira real o amor pelos pobres. Para nós, a opção pelos pobres não é ideológica, mas nasce do Evangelho. São inúmeras e dramáticas as situações de injustiça e de pobreza no mundo de hoje, e enquanto é necessário empenhar-se para compreender e para combater as suas causas estruturais, é preciso também saber combater até no próprio coração do homem, as profundas raízes do mal, o pecado que o separa de Deus, sem esquecer de ir ao encontro das necessidades mais urgentes no espírito da caridade de Cristo. Recolhendo e desenvolvimento uma das últimas, clarividentes intuições do Padre Arrupe, a vossa Companhia continua a comprometer-se de modo meritório no serviço em prol dos refugiados, que muitas vezes são os mais pobres entre os pobres, e que têm necessidade não somente do socorro material, mas inclusive daquela proximidade espiritual, humana e psicológica mais profunda, que é mais própria do vosso serviço.

Enfim, convido-vos a reservar uma atenção específica àquele ministério dos Exercícios Espirituais, que desde as origens foi característico da vossa Companhia. Os Exercícios constituem a fonte da vossa espiritualidade e a matriz das vossas Constituições, mas são também um dom que o Espírito do Senhor concedeu à Igreja inteira: compete a vós continuar a fazer deles um instrumento precioso e eficaz para o crescimento espiritual das almas, para a sua iniciação na oração, na meditação, neste mundo secularizado em que Deus parece estar ausente. Precisamente na semana passada, também eu aproveitei dos Exercícios Espirituais, juntamente com os meus mais estreitos colaboradores da Cúria Romana, sob a orientação de um dos vossos exímios irmãos de hábito, o Cardeal Albert Vanhoye. Numa época como a hodierna, em que a confusão e a multiplicidade das mensagens, a rapidez das mudanças e das situações, torna particularmente difícil aos nossos contemporâneos pôr ordem na sua vida e responder com decisão e com alegria ao chamamento que o Senhor dirige a cada um de nós, os Exercícios Espirituais representam um caminho e um método particularmente precioso para procurar e encontrar Deus, em nós, ao nosso redor e em todas as coisas, para conhecer a sua vontade e para a pôr em prática.

Neste espírito de obediência à vontade de Deus, a Jesus Cristo, que se torna também humilde obediência à Igreja, convido-vos a continuar e a completar os trabalhos da vossa Congregação, enquanto me uno a vós na oração que nos foi ensinada por Santo Inácio no final dos Exercícios, oração esta que sempre me parece demasiado excelsa, a tal ponto que quase não ouso recitá-la e que, todavia, deveríamos voltar a propor-nos: "Tomai, Senhor, e recebei toda a minha liberdade, a minha memória, a minha inteligência e toda a minha vontade, tudo aquilo que eu tenho e possuo; fostes Vós que mo destes, Senhor, e a Vós o restituo; tudo é vosso, de tudo dispondes segundo toda a vossa vontade; dai-me somente o vosso amor e a vossa graça; isto é-me suficiente" (ES 234).






AOS SÓCIOS DO CÍRCULO DE SÃO PEDRO PARA A ENTREGA DO ÓBOLO Sexta-feira, 22 de Fevereiro de 2008

Prezados Sócios
do Círculo de São Pedro

Também no corrente ano, por ocasião da festa da Cátedra de São Pedro, tenho o prazer de me encontrar convosco: obrigado por esta vossa visita. Saúdo cordialmente todos vós e estendo a minha saudação aos vossos familiares, às pessoas que vos são queridas e a quantos cooperam convosco nas várias actividades que desempenhais. Saúdo o vosso Assistente espiritual, Mons. Franco Camaldo, vosso Presidente-Geral, o Duque Leopoldo Torlonia, a quem agradeço as palavras com as quais interpretou os sentimentos de todos vós aqui presentes. Ele explicou-me também brevemente aquilo que a vossa conhecida e benemérita associação realiza.

Quem é que não conhece o Círculo de São Pedro? A vossa agremiação tem origens antigas e sempre se distinguiu pela fidelidade incondicionada à Igreja e ao seu Pastor universal, o Pontífice Romano. O serviço prestado pelo Círculo constitui, nas suas várias articulações, um apostolado muito apreciado, enquanto oferece um testemunho constante do amor que vós nutris pela Igreja e, de modo particular, pela Santa Sé. Penso na vossa presença na Basílica do Vaticano e no serviço de ordem que levais a cabo durante as celebrações por mim presididas; penso nos vossos encontros formativos e espirituais, que tendem a suscitar em vós uma tensão constante para a santidade; e penso nas actividades de assistência e de caridade que desempenhais com generosidade.

621 Obrigado por esta vossa colaboração e pelas numerosas iniciativas que promoveis com espírito evangélico e com sentido eclesial. Poderíamos quase dizer que aquilo que realizais, num certo sentido, é em nome do próprio Papa que o fazeis: por exemplo, é em seu nome que vos preocupais em ir ao encontro, na medida do que vos é possível, das necessidades de muitas pessoas pobres que vivem na cidade de Roma, cujo Bispo é o Sucessor de Pedro. Assim, desejais ser os seus braços e o seu coração que alcançam, também através de vós, aqueles que se encontram em condições de precariedade. E sei que, ao longo destes últimos anos, multiplicastes os vossos esforços para responder, com iniciativas generosas e comprometedoras, às exigências destas pessoas que estão em dificuldade.

Estou-vos grato por esta vossa colaboração: agindo com zelo apostólico admirável, dais um testemunho evangélico silencioso e, ao mesmo tempo, eloquente. Respondendo ao mandato de Cristo, esforçais-vos por reconhecer e servir em cada pessoa o próprio Jesus, que no Evangelho nos assegura: "Sempre que fizestes isto a um só destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes" (
Mt 25,40). A fé e o amor que nutrimos por Ele, o Senhor exorta-nos a traduzi-los em gestos quotidianos de atenção às pessoas com as quais nos encontramos, de forma especial com aquelas que estão a atravessar momentos de provação, uma vez que no rosto de cada pessoa, ainda mais se vive em necessidade, resplandece o rosto de Cristo. Na Carta Encíclica Spe salvi, escrevi que "aceitar o outro que sofre significa, de facto, assumir de alguma forma o seu sofrimento, de tal modo que este se torna também meu. Mas, precisamente porque agora se tornou sofrimento compartilhado, no qual há a presença do outro, este sofrimento é penetrado pela luz do amor" (n. 38). É desta forma que nos tornamos mensageiros e testemunhas do Evangelho da caridade, realizando uma obra de evangelização autêntica e profunda.

Queridos amigos, há outro motivo pelo qual vos queria manifestar a minha gratidão. Com efeito, também hoje viestes entregar-me o óbolo de São Pedro, que vós mesmos vos preocupastes em angariar aqui em Roma. Ele representa uma ajuda concreta oferecida ao Papa, para que assim ele possa corresponder aos inúmeros pedidos de ajuda que lhe são dirigidos de todas as regiões do mundo, especialmente pelos países mais pobres. Por conseguinte, digo-vos obrigado por este vosso serviço que desempenhais com tanta generosidade e espírito de sacrifício. A Virgem Maria, que neste tempo quaresmal nós contemplamos associada à Paixão de Cristo, suscite e sustente em vós todos os propósitos e projectos de bem. Quanto a mim, asseguro-vos uma especial lembrança na oração enquanto, com carinho, vos concedo a Bênção apostólica, que de bom grado faço extensiva às vossas famílias e a quantos vos são queridos.




POR OCASIÃO DA ATRIBUIÇÃO DO PÁTIO NORTE DA BASÍLICA DO VATICANO A SÃO GREGÓRIO, O ILUMINADOR Sexta-feira, 22 de Fevereiro de 2008

Estimados irmãos e irmãs

Dirijo a minha cordial saudação a todos os presentes. Em primeiro lugar, saúdo o Cardeal Angelo Comastri, Arcipreste da Basílica de São Pedro, e o Cardeal Giovanni Lajolo, Presidente do Governatorato. Além disso, saúdo o Patriarca Nersés Bédros XIX, a quem agradeço as amáveis palavras com as quais interpretou os sentimentos corais. Estendo o meu pensamento aos Arcebispos, Bispos e Personalidades religiosas de toda a Igreja católica arménia. Depois, saúdo as personalidades políticas, as delegações e quantos quiseram participar nesta significativa cerimónia, em que benzerei a placa toponomástica deste pátio. É de bom grado que aproveito o ensejo hodierno para abraçar com amor fraternal a Igreja apostólica arménia, assim como a Nação arménia e todos os Arménios espalhados pelo mundo inteiro.

Sem dúvida, esta é uma circunstância providencial, que nos oferece a oportunidade de nos encontramos aqui, ao lado do túmulo do Apóstolo Pedro, para recordar outro grande Santo ao qual, neste momento, se intitula o chamado "cortilone". Apraz-me recordar que o meu venerado Predecessor João Paulo II benzeu a imagem de São Gregório, o Iluminador, colocada precisamente aqui, poucos meses antes da sua morte. Há mais de 17 séculos, este grande Santo fez dos Arménios um povo cristão, aliás, o primeiro povo que se tornou oficialmente cristão. A conversão dos Arménios é um acontecimento que assinalou de modo profundo a identidade arménia, não apenas a nível pessoal, mas de toda a Nação. O termo "Iluminador", com o qual é denominado este Santo que vos é muito querido, põe em evidência a dúplice função que São Gregório teve na história da conversão arménia. Efectivamente, a "iluminação" é um conceito que se utiliza na linguagem cristã para indicar a passagem das trevas para a luz de Cristo. E na verdade exactamente Cristo é o grande Iluminador que irradia a sua luz sobre toda a existência de quem o acolhe e segue fielmente. Pois bem, São Gregório chamava-se o Iluminador precisamente porque nele se reflectia de modo extraordinário o rosto do Salvador. Na acepção arménia, o vocábulo "iluminação" reveste também um ulterior significado; indica a luz que deriva da difusão da cultura através do ensinamento. E isto faz pensar imediatamente naqueles monges-mestres que, seguindo os passos de São Gregório, deram continuidade à sua pregação, propagando desta forma a luz da verdade evangélica, que revela ao homem a verdade do seu próprio ser e desenvolve as suas ricas potencialidades culturais e espirituais.

Amados irmãos e irmãs, agradeço-vos mais uma vez o facto de terdes participado neste nosso encontro. Inaugurando o "Pátio São Gregório, o Iluminador", oremos a fim de que o povo arménio, por intercessão deste seu ilustre e benemérito filho, continue a percorrer o caminho da fé deixando-se orientar como fez ao longo dos séculos por Cristo e pelo seu Evangelho, que assinalaram a sua cultura de maneira indelével. Com estes bons votos, que confio à intercessão da Virgem Maria, concedo a todos vós a minha Bênção.


AUDIÊNCIA PARA A APRESENTAÇÃO E ENTREGA À DIOCESE DE ROMA DA "CARTA SOBRE A TAREFA URGENTE DA EDUCAÇÃO"

Praça de São Pedro

Sábado, 23 de Fevereiro de 2008


Queridos irmãos e irmãs!

622 Agradeço-vos por terdes aceite, em tão grande número, o convite para esta Audiência especial, durante a qual recebereis das minhas mãos a Carta que dirigi à Diocese e à Cidade de Roma sobre a tarefa urgente da educação. Saúdo com afecto cada um de vós: sacerdotes, religiosos e religiosas, pais, professores, catequistas e outros educadores, crianças, adolescentes e jovens, incluindo quantos seguem a Audiência através da televisão. Saúdo e agradeço, em particular, o Cardeal Vigário e todos os que tomaram a palavra em representação das várias categorias de pessoas que participam do grande desafio educativo.

De facto, estamos aqui reunidos porque nos impele uma solicitude comum pelo bem das novas gerações, pelo crescimento e pelo futuro dos filhos que o Senhor deu a esta cidade. Impele-nos também uma preocupação, isto é, a percepção da que chamámos "uma grande emergência educativa". Educar nunca foi fácil e hoje parece tornar-se cada vez mais difícil: por isso não poucos pais e professores sentem-se tentados a renunciar à sua tarefa, e até já não conseguem compreender qual é, verdadeiramente, a missão que lhe é confiada. De facto, demasiadas incertezas e dúvidas circulam na nossa sociedade e na nossa cultura, demasiadas imagens deformadas são veiculadas pelos meios de comunicação social. Assim, torna-se difícil propor às novas gerações algo válido e certo, regras comportamentais e objectivos pelos quais mereça despender a própria vida. Mas estamos aqui hoje também e sobretudo porque nos sentimos amparados por uma grande esperança e por uma forte confiança: ou seja, pela certeza de que aquele "sim" claro e definitivo, que Deus disse à família humana em Jesus Cristo (cf.
2Co 1,19-20), é válido também para os nossos adolescentes e jovens, para as crianças que hoje se apresentam à vida. Por isso também no nosso tempo educar para o bem é possível, é uma paixão que devemos trazer no coração, é um empreendimento comum ao qual todos são chamados a dar a sua contribuição.

Estamos aqui, em concreto, porque pretendemos responder àquela pergunta educativa que hoje os pais sentem dentro de si, preocupados com o futuro dos próprios filhos, os professores, que vivem a partir de dentro a crise da escola, os sacerdotes e os catequistas que sabem por experiência como é difícil educar para a fé, as próprias crianças, adolescentes e jovens, que não querem ser deixados sozinhos face aos desafios da vida. É esta a razão pela qual vos escrevi, queridos irmãos e irmãs, a carta que estou para vos entregar. Nela podeis encontrar algumas indicações, simples e concretas, sobre os aspectos fundamentais e comuns da obra educativa. Hoje dirijo-me a cada um de vós para vos oferecer o meu afectuoso encorajamento a fim de que assumais com alegria as responsabilidades que o Senhor vos confia, para que a grande herança de fé e de cultura, que é a riqueza mais verdadeira desta nossa amada cidade, nunca se perca na passagem de uma geração à outra, mas ao contrário se renove, enrobusteça, sirva de guia e de estímulo no nosso caminho rumo ao futuro.

Neste espírito dirijo-me a vós, queridos pais, para vos pedir antes de tudo que permaneçais firmes, para sempre, no vosso amor recíproco: este é o primeiro e grande dom do qual os vossos filhos têm necessidade, para crescer serenos, adquirir confiança em si mesmos e confiança na vida e assim aprender a ser, por sua vez, capazes de amor autêntico e generoso. O bem que sentis pelos filhos deve dar-vos depois o estilo e a coragem do verdadeiro educador, com um testemunho coerente de vida e também com a firmeza necessária para modelar o carácter das novas gerações, ajudando-as a distinguir com clareza o bem do mal e a construir por sua vez regras sólidas de vida, que as amparem nas provas futuras. Assim fareis ricos os vossos filhos com a herança mais preciosa e duradoura, que consiste no exemplo de uma fé quotidianamente vivida.

Com o mesmo espírito peço a vós, professores dos diversos tipos de escolas, que tenhais um conceito nobre e grandioso do vosso trabalho empenhativo, apesar das dificuldades, das incompreensões, das desilusões que com muita frequência conhecem. De facto, ensinar significa ir ao encontro daquele desejo de conhecer e compreender o que está ínsito no homem e que na criança, no adolescente, no jovem se manifesta com toda a sua força e espontaneidade. Mas a vossa tarefa não se pode limitar a fornecer noções e informações, deixando de lado a grande pergunta sobre a verdade, sobretudo acerca daquela verdade que pode servir de guia na vida. Sois de facto, a pleno título, educadores: a vós, em estreita sintonia com os pais, está confiada a nobre arte da formação da pessoa. Em particular, quantos ensinam nas escolas católicas tenham dentro de si e traduzam em acção quotidiana aquele projecto educativo que tem no seu centro o Senhor Jesus e o seu Evangelho.

E vós, queridos sacerdotes, religiosos e religiosas, catequistas, animadores e formadores das paróquias, dos grupos juvenis, das associações e movimentos eclesiais, dos oratórios, das actividades desportivas e recreativas, procurai ter sempre, para com as crianças e os jovens, os mesmos sentimentos que foram de Jesus Cristo (cf. Ph 2,5). Portanto, sede aqueles amigos de confiança nos quais eles possam sentir a amizade de Jesus por eles, e ao mesmo tempo sede as testemunhas sinceras e corajosas daquela verdade que torna livre (cf. Jn 8,32) e que indica às novas gerações o caminho que leva à vida.

Mas a educação não é só obra dos educadores: é uma relação entre pessoas na qual, com o passar dos anos, entram cada vez mais em jogo a liberdade e a responsabilidade de quantos são educados. Por isso, com grande afecto, dirijo-me a vós, crianças, adolescentes e jovens, para vos recordar que vós mesmos estais chamados a ser os artífices do vosso crescimento moral, cultural e espiritual. Compete a vós, portanto, acolher livremente no coração, na inteligência e na vida o património de verdade, de bondade e de beleza que se formou através dos séculos e que tem em Jesus Cristo a sua pedra angular. Compete a vós renovar e desenvolver ulteriormente este património, libertando-o das tantas mentiras e manchas que muitas vezes o tornam irreconhecível e provocam em vós desconfiança e desilusão. Sabei contudo que neste caminho não fácil não estais sozinhos: estão-vos próximos não só os vossos pais, professores, sacerdotes, amigos e formadores, mas sobretudo aquele Deus que nos criou e que é hóspede secreto dos nossos corações. Ele ilumina a partir de dentro a nossa inteligência, Ele orienta para o bem a nossa liberdade, que muitas vezes sentimos frágil e inconstante, Ele é a verdadeira esperança e o fundamento sólido da nossa vida. N'Ele, antes de tudo, podemos confiar.

Queridos irmãos e irmãs, no momento no qual vos entrego simbolicamente a Carta sobre a tarefa urgente da educação, confiemo-nos portanto, todos juntos, Àquele que é o nosso verdadeiro e único Mestre (cf. Mt 23,8), para nos comprometermos juntamente com Ele, com confiança e alegria, naquele maravilhoso empreendimento que é a formação e o crescimento autêntico das pessoas. Com estes sentimentos e votos, concedo a todos a minha Bênção.


VISITA PASTORAL À PARÓQUIA ROMANA DE SANTA MARIA LIBERTADORA NO BAIRRO "TESTACCIO"


SAUDAÇÃO DURANTE O ENCONTRO COM OS GRUPOS PAROQUIAIS Domingo, 24 de Fevereiro de 2008

24208
Sinto-me muito feliz por estar aqui entre vós. Infelizmente não falo dialecto romano, mas como católicos somos todos um pouco romanos e levamos Roma no nosso coração, portanto compreendemos um pouco do dialecto romano. Apreciei muito ser saudado com este vosso dialecto, porque se compreende que se trata de palavras que vêm do coração. É belo e encorajador ver também aqui representadas em vós as numerosas actividades que se realizam nesta paróquia, as muitas realidades que aqui existem: sacerdotes, irmãs de diversas Congregações, catequistas, leigos que colaboram de vários modos com a paróquia. E vejo também São João Bosco vivo entre vós que continua a sua obra, e vejo também como Nossa Senhora Libertadora, aquela que torna livre, convida a abrir as portas a Cristo e a dar a verdadeira liberdade também aos outros. Isto significa criar a Igreja, criar também a presença do Reino de Cristo entre nós. Obrigado por tudo isto.

Hoje lemos um trecho do Evangelho muito actual. A mulher samaritana da qual se fala, pode parecer uma representante do homem moderno, da vida moderna. Teve cinco maridos e convive com outro homem. Usava amplamente a sua liberdade e contudo nunca se tornava livre, aliás, tornava-se mais vazia. Mas vemos também que nesta mulher havia um grande desejo de encontrar a verdadeira felicidade, a verdadeira alegria. Por isso estava sempre inquieta e afastava-se cada vez mais da verdadeira felicidade.

Contudo, também esta mulher, que levava uma vida aparentemente tão superficial, também afastada de Deus, no momento em que Cristo lhe fala mostra que no fundo do coração conservava esta pergunta sobre Deus: quem é Deus? Onde podemos encontrá-lo? Como podemos adorá-lo? Podemos ver reflectida nesta mulher toda a nossa vida de hoje, com todos os problemas que nos envolvem; mas vemos também como na profundeza do coração está sempre a questão de Deus, a expectativa que Ele se mostre noutro mundo.

A nossa actividade é realmente a expectativa; respondamos à expectativa de quantos esperam a luz do Senhor, e ao responder-lhe a esta pergunta também nós crescemos na fé e podemos compreender que esta fé é aquela água da qual temos sede.

Neste sentido desejo encorajar-vos a prosseguir com o vosso empenho pastoral e missionário, com o vosso dinamismo para ajudar as pessoas de hoje a encontrar a verdadeira liberdade e a verdadeira alegria. Todos, como esta mulher do Evangelho, estão a caminho para ser totalmente livres, para encontrar a liberdade total e para encontrar nela a alegria plena; mas muitas vezes encontram-se no caminho errado. Que eles possam, através da luz do Senhor e da nossa cooperação com o Senhor, descobrir que a verdadeira liberdade provém do encontro com a Verdade que é o amor e a alegria.

Hoje comoveram-me em particular duas frases. A primeira é a do pároco: "Temos mais futuro do que passado". Esta é a verdade da nossa Igreja, tem sempre mais futuro do que passado. E por isso prossigamos com coragem.

A outra frase que me comoveu faz parte do discurso do representante do Conselho pastoral: "A verdadeira santidade é ser alegre". A santidade mostra-se com a alegria. Do encontro com Cristo nasce a alegria. E são estes os meus votos para todos vós, que nasça sempre de novo esta alegria ao conhecer Cristo e com ela um renovado dinamismo ao anunciá-lo aos vossos irmãos. Obrigado por quanto fazeis. Boa Páscoa!



Discursos Bento XVI 619