Discursos Bento XVI 24208


AOS PARTICIPANTES NA XIV ASSEMBLEIA DA PONT. ACAD. PARA A VIDA: "AO LADO DO DOENTE INCURÁVEL E DO MORIBUNDO: ORIENTAÇÕES ÉTICAS E PRATICÁVEIS" Segunda-feira, 25 de Fevereiro de 2008

Queridos irmãos e irmãs!

Com profunda alegria saúdo todos vós que participais no Congresso convocado pela Pontifícia Academia para a Vida sobre o tema "Ao lado do doente incurável e do moribundo: orientações éticas e praticáveis". O Congresso realiza-se em ligação com a XIV Assembleia geral da Academia, cujos membros estão também presentes nesta Audiência. Agradeço antes de tudo ao Presidente D. Elio Sgreccia as gentis palavras de saudação; com ele agradeço a toda a Presidência, ao Conselho Directivo da Pontifícia Academia, a todos os colaboradores e membros ordinários, honorários e correspondentes. Desejo depois dirigir uma saudação cordial e reconhecida aos relatores deste importante Congresso, assim como a todos os participantes provenientes de diversos Países do mundo. Caríssimos, o vosso empenho generoso e o vosso testemunho são verdadeiramente merecedores de louvor.

Já considerando simplesmente os títulos das relações congressuais, pode-se entrever o amplo panorama das vossas reflexões e o interesse que elas revestem para o tempo actual, de modo especial para o mundo secularizado de hoje. Vós procurais dar respostas aos numerosos problemas apresentados todos os dias pelo constante progresso das ciências médicas, cujas actividades resultam cada vez mais apoiadas por instrumentos tecnológicos de elevado nível. Face a tudo isto, sobressai o urgente desafio para todos, e de modo especial para a Igreja, vivificada pelo Senhor ressuscitado, de levar ao vasto horizonte da vida humana o esplendor da verdade revelada e o apoio da esperança.

Quando uma vida se apaga em idade avançada, ou ao contrário no alvorecer da existência terrena, ou no pleno florescer da idade por causas imprevistas, não se deve ver nisto apenas um facto biológico que chega ao seu termo, ou uma biografia que se encerra, mas um nascimento novo e uma existência renovada, oferecida pelo Ressuscitado a quem não se opôs propositadamente ao seu Amor. Com a morte conclui-se a experiência terrena, mas através da morte abre-se também, para cada um de nós, além do tempo, a vida plena e definitiva. O Senhor da vida está presente ao lado do doente como Aquele que vive e oferece a vida, Aquele que disse: "Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância" (Jn 10,10), "Eu sou a Ressurreição e a Vida: quem crê em mim, mesmo se morrer viverá (cf. Jn 10,25) e "Eu ressuscitá-lo-ei no último dia" (Jn 6,54).

Naquele momento solene e sagrado, todos os esforços realizados na esperança cristã para melhorar a nós próprios e ao mundo que nos está confiado, purificados pela graça, encontram o seu sentido e enriquecem-se graças ao amor de Deus Criador e Pai. Quando, no momento da morte, a relação com Deus se realiza plenamente no encontro com "Aquele que não morre, que é a própria Vida e o próprio Amor, então estamos na vida; então "vivemos"" (Bento XVI, Spe salvi ). Para a comunidade dos crentes, este encontro do moribundo com a Fonte da Vida e do Amor representa um dom que tem valor para todos, que enriquece a comunhão de todos os fiéis. Como tal, ele deve conter a atenção e a participação da comunidade, não só do núcleo dos familiares mais chegados mas, nos limites e nas formas possíveis, de toda a comunidade que esteve relacionada com a pessoa que morre. Nenhum crente deveria morrer na solidão e no abandono. Madre Teresa de Calcutá tinha uma particular solicitude por reunir os pobres e os desamparados, para que pelo menos no momento da morte pudessem experimentar, no abraço das irmãs e dos irmãos, o calor do Pai.

624 Mas não é apenas a comunidade cristã que, pelos seus vínculos particulares de comunhão sobrenatural, está comprometida a acompanhar e celebrar nos seus membros o mistério da dor e da morte e o alvorecer da nova vida. Na realidade, toda a sociedade mediante as suas instituições de saúde e civis está chamada a respeitar a vida e a dignidade do doente grave e do moribundo. Mesmo na consciência do facto que "não é a ciência que redime o homen" (Bento XVI, Spe salvi ), a sociedade inteira e em particular os sectores ligados à ciência médica devem manifestar a solidariedade do amor, a salvaguarda e o respeito da vida humana em cada momento do seu desenvolvimento terreno, sobretudo quando ela sofre uma condição de doença ou está na fase terminal. Trata-se, mais em concreto, de garantir a cada pessoa que dele tenha necessidade, o apoio necessário através de terapias e intervenções médicas adequadas, individuais e geridas segundo critérios da proporcionalidade médica, tendo sempre em consideração o dever moral de administrar (por parte do médico) e de receber (por parte do doente) aqueles meios de preservação da vida que, na situação concreta, resultarem "ordinários". No que diz respeito, ao contrário, às terapias significativamente arriscadas ou que devem ser prudentemente julgadas "extraordinárias", o recurso a elas deve ser considerado moralmente lícito mas facultativo. Além disso, será necessário garantir sempre a cada pessoa os cuidados necessários e devidos, além do apoio às famílias mais provadas pela doença de um dos seus membros, sobretudo se é grave e prolongada. Também no sector da regulamentação do trabalho, normalmente reconhecem-se direitos específicos aos familiares no momento de um nascimento; de modo análogo, e especialmente em certas circunstâncias, deveriam ser reconhecidos direitos semelhantes aos parentes próximos no momento da doença terminal de um seu ente querido. Uma sociedade solidária e humanitária não pode ter em consideração as condições difíceis das famílias que, às vezes por longos períodos, devem carregar o peso da gestão domiciliar de doentes graves não auto-suficientes. O maior respeito pela vida humana individual passa inevitavelmente através da solidariedade concreta de todos e de cada um, constituindo um dos desafios mais urgentes do nosso tempo.

Como recordei na Encíclica Spe salvi, "a grandeza da humanidade determina-se essencialmente na relação com o sofrimento e com quem sofre. Isto vale tanto para o indivíduo como para a sociedade. Uma sociedade que não consegue aceitar os que sofrem e não é capaz de contribuir, mediante a compaixão, para fazer com que o sofrimento seja compartilhado e assumido mesmo interiormente é uma sociedade cruel e desumana" (n. 38). Numa sociedade complexa, muito influenciada pelas dinâmicas da produtividade e pelas exigências da economia, as pessoas frágeis e as famílias mais pobres correm o risco, nos momentos de dificuldade económica e/ou de doença, de serem arrasadas. Encontram-se cada vez mais nas grandes cidades pessoas idosas e sós, também nos momentos de doença grave e em proximidade da morte. Nestas situações, os estímulos eutanásicos tornam-se insistentes, sobretudo quando se insinua uma visão utilitarista em relação à pessoa. A este propósito, aproveito a ocasião para reafirmar, mais uma vez, a firme e constante condenação ética de qualquer forma de eutanásia directa, segundo o plurissecular ensinamento da Igreja.

O esforço sinérgico da sociedade civil e da comunidade dos crentes deve ter por finalidade fazer com que todos possam não só viver digna e responsavelmente, mas também atravessar o momento da prova e da morte na melhor condição de fraternidade e de solidariedade, também quando a morte acontece numa família pobre ou na cama de um hospital. A Igreja, com as suas instituições já activas e com novas iniciativas, está chamada a oferecer o testemunho da caridade concreta, sobretudo nas situações críticas de pessoas não auto-suficientes e privadas de apoios familiares, e para com os doentes graves necessitados de terapias paliativas, além da apropriada assistência religiosa. Por um lado, a mobilização espiritual da comunidade paroquial e diocesana e, por outro, a criação ou qualificação das estruturas dependentes da Igreja, poderão animar e sensibilizar todo o ambiente social, para que a todos os que sofrem e em particular a quem se aproxima do momento da morte, sejam oferecidas e testemunhadas a solidariedade e a caridade. A sociedade, por seu lado, não pode deixar de garantir o apoio devido às famílias que desejam empenhar-se em cuidar na própria casa, por períodos por vezes longos, doentes atingidos por patologias degenerativas (tumorais, neurodegenerativas, etc.) ou necessitados de uma assistência particularmente empenhativa. De modo especial, é exigido o concurso de todas as forças vivas e responsáveis da sociedade para aquelas instituições de assistência específica que absorvem pessoal numeroso e especializado e aparelhos de custo elevado. É sobretudo nestes campos que a sinergia entre a Igreja e as Instituições se pode revelar singularmente preciosa para garantir a ajuda necessária à vida humana no momento da fragilidade.

Ao desejar que neste Congresso Internacional, celebrado em concomitância com o Jubileu das aparições de Lourdes, se possam encontrar novas propostas para aliviar a situação de quantos se deparam com as formas terminais da doença, exorto-vos a prosseguir o vosso benemérito compromisso de serviço à vida em cada uma das suas fases. Com estes sentimentos, garanto-vos a minha oração em apoio do vosso trabalho e acompanho-vos com uma especial Bênção Apostólica.


AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL DE EL SALVADOR POR OCASIÃO DA VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM» Quinta-feira, 28 de Fevereiro de 2008

Queridos Irmãos no Episcopado

1. É com grande alegria que vos recebo neste dia em que, por ocasião da vossa visita ad Limina, viestes até aos túmulos dos Apóstolos para fortalecer os vínculos de comunhão das vossas respectivas Igrejas particulares com a Sé Apostólica. A minha alegria é ainda maior porque esta é a primeira vez que tenho a oportunidade de me encontrar convosco como Sucessor de Pedro. Agradeço a D. Fernando Sáenz Lacalle, Arcebispo de São Salvador e Presidente da Conferência Episcopal, as palavras atenciosas que me dirigiu em vosso nome. Através de vós, envio uma saudação especial aos vossos sacerdotes, religiosos e fiéis leigos que, com generosidade e esforço incansável vivem e anunciam a Boa Nova da Redenção que Cristo nos trouxe, verdadeira e única para todos os povos.

Na sua maioria, o povo salvadorenho caracteriza-se por uma fé viva e um profundo sentimento religioso. O Evangelho, levado ali pelos primeiros missionários e anunciado também com fervor por pastores cheios de amor a Deus, como D. Óscar Arnulfo Romero, arraigou-se amplamente nesta maravilhosa terra, dando abundantes frutos de vida cristã e de santidade. Mais uma vez, queridos Irmãos Bispos, fez-se realidade a capacidade transformadora da mensagem de salvação, que a Igreja está chamada a anunciar, porque certamente "a Palavra de Deus não está em cadeias" (cf. 2Tm 2,9) e é viva e eficaz (cf. Hb He 4,12).

2. Como Pastores da Igreja, os vossos corações comovem-se ao contemplar as graves necessidades do povo que vos foi confiado e ao qual quereis servir com amor e dedicação. Devido à situação de pobreza muitos se vêem obrigados a emigrar em busca de melhores condições de vida, o que causa com frequência consequências negativas para a estabilidade do matrimónio e da família. Conheço também os esforços que estais a fazer para promover a reconciliação e a paz no vosso País, e para superar assim dolorosos acontecimentos do passado.

Ao mesmo tempo, dedicastes uma carta pastoral em 2005 ao problema da violência, considerado como o mais grave na vossa Nação. Ao analisar as suas causas, reconheceis que o aumento da violência é a consequência imediata de outras chagas sociais mais profundas, como a pobreza, a falta de educação, a progressiva perda daqueles valores que forjaram desde sempre a alma salvadorenha, e a desagragação familiar. De facto, a família é um bem, indispensável para a Igreja e para a sociedade, assim como um factor básico para construir a paz (cf. Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2008, n. 3). Por isso, sentis a necessidade de revitalizar e fortalecer em todas as Dioceses uma adequada e eficaz pastoral familiar, que ofereça aos jovens uma sólida formação espiritual e afectiva, que os ajude a descobrir a beleza do plano de Deus sobre o amor humano, e lhes permita viver com coerência os valores autênticos do matrimónio e da família, como a ternura e o respeito mútuo, o domínio de si, a entrega total e a fidelidade constante.

3. Face à pobreza de tantas pessoas, sente-se como uma necessidade iniludível a melhoria das estruturas e condições económicas que permitam a todos levar uma vida digna. Mas não se deve esquecer que o homem não é um simples produto das condições materiais ou sociais em que vive. Necessita de mais, aspira a mais do que a ciência ou qualquer iniciativa humana pode dar. Existe nele uma imensa sede de Deus. Sim, queridos Irmãos Bispos, os homens anseiam por Deus no íntimo do seu coração, e Ele é o único que pode satisfazer a sua sede de plenitude e de vida, porque só Ele nos pode dar a certeza de um amor incondicionado, de um amor mais forte que a morte (cf. Spe salvi ). "O homem tem necessidade de Deus; de contrário, fica privado de esperança" (ibid., 23).

625 Por isso é preciso estimular um ambicioso e audaz esforço de evangelização nas vossas comunidades diocesanas, orientado a facilitar em todos os fiéis esse encontro íntimo com Cristo vivo que está na base e na origem do ser cristão (cf. Deus caritas est ). Uma pastoral, portanto, que esteja centrada "no próprio Cristo, que temos de conhecer, amar, imitar, para n'Ele viver a vida trinitária e com Ele transformar a história até à sua plenitude na Jerusalém celeste" (Novo millennio ineunte NM 29). É preciso ajudar os fiéis leigos para que descubram cada vez mais a riqueza espiritual do seu baptismo, pelo qual estão "chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição do amor" (Lumen gentium LG 40), e que iluminará o seu compromisso de dar testemunho de Cristo no meio da sociedade humana (cf. Gaudium et spes GS 43). Para cumprir esta nobre vocação, necessitam de estar bem enraizados numa vida intensa de oração, de escutar assídua e humildemente a Palavra de Deus e participar com frequência nos sacramentos, assim como de adquirir um forte sentido de pertença eclesial e uma sólida formação doutrinal, especialmente no que se refere à doutrina social da Igreja, na qual encontrarão critérios e orientações claras para poder iluminar cristãmente a sociedade na qual vivem.

4. Na vossa solicitude pastoral, os sacerdotes devem ocupar um lugar muito especial. A eles unem-vos vínculos muito estreitos em virtude do Sacramento da Ordem que receberam e da participação na mesma missão evangelizadora. Eles merecem as vossas melhores atenções e a vossa proximidade em todas as suas necessidades espirituais e materiais e animai-os a prosseguir com alegria o seu caminho de santidade sacerdotal. Nisto imitai o exemplo de Jesus, que considerava amigos quantos estavam com Ele (cf. Jn 15,15).

Como fundamento e princípio visível de unidade nas vossas Igrejas particulares (cf. Lumen gentium LG 23) estimulo-vos a ser promotores e modelos de comunhão no próprio presbitério, recomendando que vivais a concórdia e a união de todos os sacerdotes entre si e em redor do seu Bispo, como manifestação do vosso afecto de pai e irmão, sem deixar de corrigir as situações irregulares, quando for necessário.

O amor e a fidelidade do sacerdote à sua vocação será a melhor e mais eficaz pastoral vocacional, assim como um exemplo e estímulo para os vossos seminaristas, que são o coração das vossas Dioceses, e nos quais deveis dedicar os vossos melhores recursos e energias (cf. Optatam totius OT 5), porque são a esperança das vossas Igrejas.

Segui também com atenção a vida e as obras dos Institutos religiosos, valorizando e promovendo nas vossas comunidades diocesanas a vocação e a missão específicas da vida consagrada (cf. Lumen gentium LG 44), e estimulando-os a colaborar na actividade pastoral diocesana para enriquecer, "com a presença e com o seu ministério, a comunhão eclesial" (Exort. apost. Pastores gregis ).

5. Mesmo se os desafios que se vos apresentam são enormes e parecem superiores às vossas forças e capacidades, sabeis que podeis recorrer com confiança ao Senhor, para quem nada é impossível (cf. Lc 1,37), e abrir o vosso coração ao impulso da graça divina. Neste contacto constante com Jesus, o Bom Pastor, com a oração, amadurecerão os melhores projectos pastorais para as vossas comunidades e sereis verdadeiramente ministros de esperança para todos os vossos irmãos (cf. Pastores gregis ), pois é Ele quem torna fecundo o vosso ministério episcopal que, por sua vez, deve ser um reflexo autêntico da vossa caridade pastoral, à imagem d'Aquele que veio "não para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos" (Mc 10,45).

6. Queridos Irmãos, no final do nosso encontro agradeço-vos de novo a vossa dedicação generosa à Igreja e acompanho-vos com a minha oração, para que em todos os vossos desafios pastorais vos encham de esperança e de ânimo as palavras do Senhor Jesus: "E Eu estarei sempre convosco, até ao fim do mundo" (Mt 28,20).Estreito-vos ao meu coração com um abraço de paz, no qual incluo os sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos das vossas Igrejas locais. Sobre cada um de vós e dos vossos fiéis diocesanos imploro a protecção constante da Virgem Maria Rainha da Paz, Padroeira de El Salvador, e concedo-vos com grande afecto a Bênção Apostólica.




À SENHORA MARY ANN GLENDON NOVA EMBAIXADORA DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA JUNTO DA SANTA SÉ Sexta-feira, 29 de Fevereiro de 2008

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Excelência

É para mim um prazer aceitar as Cartas pelas quais Vossa Excelência é acreditada Embaixadora Extraordinária e Plenipotenciária dos Estados Unidos da América e oferecer as minhas cordiais felicitações no momento em que assume as suas novas responsabilidades ao serviço do seu país. Estou confiante que o conhecimento e a experiência nascidos da sua distinta associação ao trabalho da Santa Sé se revelarão benéficos no desenrolar dos seus deveres e enriquecerão a actividade da comunidade diplomática à qual agora pertence. Gostaria também de lhe agradecer as saudações cordiais que me transmitiu da parte do Presidente George W. Bush em nome do povo americano, enquanto penso na minha Visita Pastoral aos Estados Unidos em Abril.

Desde o despontar da República, a América foi, como Vossa Excelência fez notar, uma nação que valorizou o papel do credo religioso como garante de uma ordem democrática vibrante e eticamente sólida. O exemplo da sua nação em unir pessoas de boa vontade, independentemente da raça, nacionalidade ou religião, numa visão partilhada e numa busca disciplinada do bem comum encorajou outras jovens nações nos seus esforços de criação de uma ordem social harmoniosa, livre e justa. Hoje esta tarefa de conciliar a unidade e a diversidade, de forjar uma visão comum e invocar a energia moral para a cumprir, tornou-se uma urgente prioridade para toda a família humana, que é cada vez mais consciente da sua interdependência e da necessidade de solidariedade efectiva para enfrentar os desafios globais e a construção de um futuro de paz para as próximas gerações.

A experiência do último século, com o seu pesado preço de guerra e violência, culminado no extermínio planeado de povos inteiros, tornou claro que o futuro da humanidade não pode depender de meros compromissos políticos. Aliás, tem de ser o fruto de um consenso mais profundo baseado no reconhecimento de verdades universais fundadas na reflexão sensata dos postulados da nossa humanidade comum (cf. Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2008, 13). A Declaração Universal dos Direitos Humanos, da qual este ano celebramos 60 anos, foi o resultado do reconhecimento mundial de que uma ordem global justa só pode ser baseada no reconhecimento e defesa da dignidade dos direitos invioláveis de cada homem e mulher. Este reconhecimento, por sua vez, tem de ser o motor de todas as decisões que afectam o futuro da família humana e todos os seus membros. Estou confiante que a sua nação, fundada sobre a verdade evidente por si mesma, que o Criador atribuiu a cada ser humano certos direitos inalienáveis, continuará a encontrar nos princípios da lei moral comum, embebida nos seus documentos constituintes, um guia seguro no exercício da sua liderança no seio da comunidade internacional.

A construção de uma cultura jurídica global inspirada pelos mais altos ideais de justiça, solidariedade e paz requer um forte empenho, esperança e generosidade da parte de cada nova geração (cf. Spe salvi ). Agradeço a sua referência aos significantes esforços americanos para descobrir métodos criativos de aliviar os graves problemas que afligem numerosas nações e povos no nosso planeta. A construção de um futuro mais seguro para a família humana significa em primeiro lugar e acima de tudo trabalhar para o desenvolvimento integral dos povos, especialmente através da provisão de cuidados à saúde adequados, da eliminação de pandemias como a sida, de mais amplas oportunidades educativas para os jovens, da promoção das mulheres e da luta contra a corrupção e a militarização que desviam preciosos recursos de muitos dos nossos irmãos e irmãs nos países mais pobres. O progresso da família humana é ameaçado não só pela chaga do terrorismo internacional, mas também por insídias à paz como o acelerar da corrida aos arsenais e o persistir das tensões no Médio Oriente. Aproveito a ocasião para exprimir a minha esperança em que pacientes e transparentes negociações conduzam à redução e eliminação das armas nucleares e que a recente Conferência de Annapolis seja a primeira de uma série de passos na direcção da paz duradoura na região. A resolução destes e outros problemas similares requerem confiança e empenho no trabalho de órgãos internacionais como a organização das Nações Unidas, que por sua própria natureza são capazes de criar diálogo e entendimento genuínos, reconciliar visões divergentes, e desenvolver políticas e estratégias multilaterais capazes de enfrentar os múltiplos desafios do nosso mundo complexo e em rápida mudança.

Não posso deixar de notar com gratidão a importância que os Estados Unidos atribuíram ao diálogo inter-religioso e intercultural como força positiva de paz. A Santa Sé está convencida do enorme potencial espiritual que esse diálogo representa, especialmente no que diz respeito à promoção da não-violência e à rejeição de ideologias que manipulam e desfiguram a religião com objectivos políticos e justificam a violência em nome de Deus. A apreciação histórica do povo americano em relação ao papel da religião na formação do discurso político e na iluminação da inerente dimensão moral das questões sociais um papel às vezes contestado em nome de uma limitada compreensão da vida política e do discurso público reflecte-se nos esforços de tantos dos seus concidadãos e líderes de governo para garantir a protecção legal da vida como dom de Deus, desde a concepção até à morte natural, e a salvaguarda da instituição do matrimónio, reconhecido como união estável entre um homem e uma mulher, e da família.

Senhora Embaixadora, agora que assume as suas altas responsabilidades ao serviço do seu país, renovo os meus votos pelo sucesso do seu trabalho. Asseguro-lhe que poderá sempre contar com o apoio e a assistência da Santa Sé ao desenrolar das suas funções. Sobre si, a sua família, e todo o amado povo americano, invoco cordialmente de Deus bênçãos de sabedoria, força e paz.




AOS PARTICIPANTES NA ASSEMBLEIA PLENÁRIA DO PONTIFÍCIO CONSELHO "COR UNUM" Sexta-feira, 29 de Fevereiro de 2008


Senhor Cardeal
Venerados irmãos no Episcopado
e no Sacerdócio
Queridos irmãos e irmãs!

Sinto-me feliz por me encontrar convosco por ocasião da Assembleia Plenária do Pontifício Conselho Cor Unum.Dirijo a minha cordial saudação a cada um de vós que participais neste Encontro. Saúdo em particular o Cardeal Paul Josef Cordes, ao qual agradeço as gentis palavras, o Rev. Mons. Secretário e todos os Membros e Oficiais do Pontifício Conselho Cor Unum. A temática sobre a qual estais a reflectir nestes dias "As qualidades humanas e espirituais de quem trabalha na actividade caritativa da Igreja" aborda um elemento importante da vida eclesial. De facto, trata-se de quantos desempenham no Povo de Deus um serviço indispensável, a diakonia da caridade. E precisamente ao tema da caridade quis dedicar a minha primeira Encíclica Deus caritas est.

Portanto, aproveito de bom grado esta ocasião para expressar um particular reconhecimento a quantos, de várias formas, trabalham no sector caritativo, manifestando com as suas acções que a Igreja se faz presente, de modo concreto, ao lado de quantos se encontram envolvidos de qualquer forma no mal-estar e no sofrimento. Desta acção eclesial os Pastores têm a responsabilidade global e última, no que diz respeito quer à sensibilização quer à realização de projectos de promoção humana, sobretudo a favor de Comunidades menos abastadas. Demos graças a Deus porque são muitos os cristãos que empregam tempo e energias para fazer chegar não só ajudas materiais, mas também um apoio de conforto e de esperança a quem se encontra em condições difíceis, cultivando uma constante solicitude pelo verdadeiro bem do homem. A actividade caritativa ocupa um lugar central na missão evangelizadora da Igreja. Não devemos esquecer que as obras de caridade constituem um terreno privilegiado de encontro também com pessoas que ainda não conhecem Cristo ou que o conhecem só parcialmente. Justamente, portanto, os Pastores e os responsáveis da pastoral da caridade dedicam uma atenção constante a quem trabalha no âmbito da diakonia, preocupando-se por formá-los sob o ponto de vista quer humano e profissional, quer teológico-espiritual e pastoral.

627 Neste nosso tempo dá-se grande importância à formação contínua quer na sociedade quer na Igreja, como demonstra o florescimento de instituições apropriadas e centros criados com a finalidade de fornecer instrumentos úteis para adquirir competências técnicas específicas. Mas é indispensável para quantos trabalham nos organismos caritativos eclesiais aquela "formação do coração", da qual falei na citada Encíclica Deus caritas est (cf. n. 31): formação íntima e espiritual que, do encontro com Cristo, faz brotar aquela sensibilidade de coração, a única que permite conhecer profundamente as expectativas e as necessidades do homem. É precisamente isto que torna possível a aquisição dos mesmos sentimentos de amor misericordioso que Deus sente por todos os seres humanos. Nos momentos de sofrimento e de dor é este o comportamento necessário. Quem trabalha nas numerosas formas de actividade caritativa da Igreja não pode, portanto, contentar-se apenas com a acção técnica ou com resolver problemas e dificuldades materiais. A ajuda que oferece nunca se deve limitar a gestos filantrópicos, mas há-de ser expressão concreta do amor evangélico. Depois, quem presta a sua obra em favor do homem em organismos paroquiais, diocesanos e internacionais realiza-a em nome da Igreja e está chamado a deixar transparecer na sua actividade uma experiência autêntica de Igreja.

Uma formação válida e eficaz neste sector vital só pode ter por objectivo a melhor qualificação dos agentes das diversas actividades caritativas, para que sejam também e sobretudo testemunhas de amor evangélico. Eles são-no se a sua missão não termina no facto de serem trabalhadores nos serviços sociais, mas anunciadores do Evangelho. Seguindo as pegadas de Cristo, eles estão chamados a ser testemunhas do valor da vida, em todas as suas expressões, defendendo especialmente a vida dos débeis e dos doentes, seguindo o exemplo da Beata Madre Teresa de Calcutá, que amava e se ocupava dos moribundos, porque a vida não se mede a partir da sua eficiência, mas tem sempre valor para todos. Em segundo lugar, estes agentes eclesiais estão chamados a ser testemunhas do amor, isto é, do facto que somos plenamente homens e mulheres quando vivemos propensos para o outro; que ninguém pode morrer e viver para si mesmo; que a felicidade não se encontra na solicitude de uma vida fechada em si mesma, mas na doação de si. Por fim, quem trabalha no âmbito das actividades eclesiais, deve ser testemunha de Deus, que é plenitude de amor e convida a amar. A fonte de cada intervenção do trabalhador eclesial está em Deus, amor criador e redentor. Como escrevi na Deus caritas est, nós podemos praticar o amor porque fomos criados à imagem e semelhança divina para "viver o amor e deste modo fazer entrar a luz de Deus no mundo" (n. 39): eis para o que quis convidar com esta Encíclica.

Quanta plenitude de significado podeis portanto colher na vossa actividade! E quanto ela é preciosa para a Igreja! Alegro-me porque, precisamente para a tornar cada vez mais testemunho do Evangelho, o Pontifício Conselho Cor Unum promoveu para o próximo mês de Junho um curso de Exercícios Espirituais em Guadalajara para Presidentes e Directores de organismos caritativos do Continente americano. Ele servirá para recuperar plenamente a dimensão humana e cristã à qual acabei de me referir, e espero que no futuro a iniciativa se possa ampliar também às outras regiões do mundo. Queridos amigos, ao agradecer-vos quanto fazeis, garanto-vos a minha afectuosa recordação na oração e sobre cada um de vós e sobre o vosso trabalho concedo de coração uma especial Bênção Apostólica.

                                                            Março 2008




DURANTE A VIGÍLIA DE ORAÇÃO COM OS UNIVERSITÁRIOS EUROPEUS E AMERICANOS Sábado, 1 de Março de 2008

Prezados jovens universitários

No final desta vigília mariana, é com grande alegria que dirijo a minha saudação a todos vós, a quantos estais aqui presentes e a todos vós que participais na oração mediante as ligações satelitares. Saúdo com reconhecimento os venerados Cardeais e Bispos, de modo particular aqueles que presidiram à recitação do Rosário nas sedes com as quais estamos ligados: Aparecida no Brasil, Avinhão na França, Bucareste na Roménia, Cidade do México no México, Havana em Cuba, Loja no Equador, Minsk na Bielo-Rússia, Nápoles na Itália, Toledo na Espanha e Washington nos Estados Unidos da América. Cinco sedes na Europa e cinco nas Américas. Com efeito, esta iniciativa tem como tema: "A Europa e as Américas, juntas para construir a civilização do amor". E foi precisamente sobre este tema que se realizou nestes dias na Universidade Gregoriana um congresso, a cujos participantes dirijo uma cordial saudação.

É feliz a opção de evidenciar sempre de novo a relação entre a Europa e outro continente, numa perspectiva de esperança. Há dois anos, Europa e África; no ano passado, Europa e Ásia; no corrente ano, Europa e Américas. O Cristianismo constitui um vínculo forte e profundo entre o chamado velho continente e aquele que se denominava o "novo mundo". É suficiente pensar no lugar fundamental que ocuparam a Sagrada Escritura e a Liturgia cristã na cultura e na arte dos povos europeus e americanos. Porém, infelizmente a chamada "civilização ocidental" também atraiçoou parcialmente a sua inspiração evangélica. Por conseguinte, impõe-se uma reflexão honesta a sincera, um exame de consciência. É necessário discernir entre aquilo que constrói a "civilização do amor", em conformidade com o desígnio de Deus revelado em Jesus Cristo e o que, ao contrário, se lhe opõe.

Agora dirijo-me a vós, queridos jovens. Os jovens foram sempre, na história da Europa e das Américas, portadores de impulsos evangélicos. Pensemos em jovens como São Bento de Núrsia, São Francisco de Assis e o Beato Karl Leisner, na Europa; como São Martinho de Porres, Santa Rosa de Lima e a Beata Kateri Tekakwitha, nas Américas. Jovens construtores da civilização do anmor! Hoje, jovens europeus e americanos, Deus chama-vos a cooperar juntamente com os vossos coetâneos do mundo inteiro, para que a linfa do Evangelho renove a civilização destes dois continentes e de toda a humanidade. As grandes cidades europeias e americanas são cada vez mais cosmopolitas, mas nelas falta frequentemente esta linfa, capaz de fazer com que as diferenças não venham a ser um motivo de divisão ou de conflito, mas sim de enriquecimento recíproco. A civilização do amor é a "convivialidade", ou seja, a convivência respeitosa, pacífica e alegre das diferenças em nome de um projecto conjunto, que o Beato Papa João XXIII fundava sobre os quatro pilares do amor, da verdade, da liberdade e da justiça. Eis, estimados amigos, o mandato que vos confio: sede discípulos e testemunhas do Evangelho, uma vez que o Evangelho é a boa semente do Reino de Deus, ou seja, da civilização do amor! Sede construtores de paz e de unidade! Sinal desta unidade católica, ou seja, universal e íntegra nos conteúdos da fé cristã que a todos nos une, é inclusivamente a iniciativa de entregar a cada um de vós o texto da Encíclica Spe salvi num CD em cinco línguas. A Virgem Maria vele sobre vós, as vossas famílias e todos os vossos entes queridos.

Agora, gostaria de saudar nas várias línguas quantos estão unidos a nós a partir das outras cidades através das ligações radiotelevisivas.

Queridos jovens reunidos nas cidades do México, Havana, Loja e Toledo, sede testemunhas da grande esperança que Cristo trouxe ao mundo. Que o Senhor vos abençoe e acompanhe nos vossos compromissos de estudo.


Discursos Bento XVI 24208