Discursos Bento XVI 803

AO SENHOR SANTE CANDUCCI

NOVO EMBAIXADOR DA REPÚBLICA DE SÃO MARINO JUNTO DA SANTA SÉ Quarta-feira, 13 de Novembro de 2008

Senhor Embaixador

804 Estou feliz por lhe transmitir as minhas cordais saudações de boas-vindas, no momento em que recebo das suas mãos as Cartas Credenciais mediante as quais Vossa Excelência é nomeado, junto desta Sé Apostólica, Ministro Extraordinário e Plenipotenciário da antiga e ilustre República de São Marino. O meu primeiro e deferente pensamento dirige-se aos Sereníssimos Capitães-Regentes, de quem o Senhor Embaixador se torna alto Representante, e a toda a população de São Marino, desde sempre querida ao Sucessor de Pedro. Com efeito, desde a sua fundação, a República do Titã estabeleceu com a Sé Apostólica relacionamentos serenos e profícuos, oficialmente formalizados em 1926, com vínculos de recíproca e respeitosa interacção. Por conseguinte, é-me grato renovar a expressão da minha proximidade espiritual ao povo que, a partir de hoje, Vossa Excelência é deputado a representar, um povo pequeno pela extensão do território onde reside, mas digno de toda a atenção e respeito pela sua história, rica de tradições culturais e religiosas.

Ao cumprimentá-lo com profundo prazer, gostaria de recordar com sincera gratidão o seu benemérito predecessor, Prof. Giovanni Galassi, que durante longos anos desempenhou de modo louvável o papel de Representante da República de São Marino e a função de Decano do Corpo Diplomático aqui acreditado. A sensibilidade, o tacto humano e a competência que distinguiram a sua actividade granjearam-lhe a estima dos seus colegas diplomatas e contribuíram principalmente para intensificar as já cordiais relações entre a República de São Marino e a Santa Sé. No mesmo caminho, estou convicto de que Vossa Excelência dará continuidade ao trabalho já começado, para que a consolidação de profícuas relações recíprocas, além de favorecer o diálogo e de facilitar o entendimento entre as autoridades e a comunidade católica de São Marino seja útil também para uma coral acção a favor da solidariedade e da paz na Europa e no mundo.

Hoje cada nação e cada instituição, grande ou pequena que seja, é chamada a trabalhar activamente para construir uma comunidade internacional alicerçada em compartilhados valores humanos e espirituais. A este projecto de alcance mundial, a República de São Marino certamente não deixará faltar a sua contribuição, colocando à disposição de todos a experiência de um passado rico de história e de cultura, em que sobressai a tutela da família, célula fundamental de cada comunidade. Aquela que é conhecida como o Esperão do Titã é uma terra caracterizada por uma identidade particular, que se insere na riqueza cultural e espiritual da Península italiana. Ponto qualificador desta identidade é o antigo património de valores, que haure uma boa parte da sua linfa da fé cristã, que impregnou a vida e a história do povo e das instituições de São Marino. Portanto, Vossa Excelência justamente evocou nas suas palavras estas antigas raízes, fazendo referência também à visita realizada pelo meu venerado predecessor, João Paulo II, no dia 28 de Abril de 1982, no meio do entusiasmo do povo de São Marino. Exprimo de coração os bons votos para que, no sulco destas tradições culturais e espirituais plurisseculares, e dando continuidade ao esforço realizado até hoje por numerosas pessoas de boa vontade, a actual comunidade civil e religiosa de São Marino saiba escrever uma nova página de progresso e de civilização, reconhecendo o papel indispensável que cada família é chamada a desempenhar na formação das novas gerações como lugar de educação para a paz.

Valorizar a herança greco-romana, enriquecida pelo encontro com o Cristianismo, constitui portanto uma oportunidade indubitável, oferecida também à República de São Marino, a fim de contribuir para fazer da Europa uma terra de diálogo e uma "casa comum" de nações com as suas específicas peculiaridades culturais e religiosas. Sem dúvida, mudaram as condições ambientais e sociais em que hoje nós vivemos; porém, permanece inalterada a finalidade última de cada um dos nossos compromissos pessoais e comunitários quotidianos: a busca do bem-estar autêntico da pessoa e a construção de uma sociedade aberta à hospitalidade e atenta às exigências concretas de todos. O conjunto unitário de valores e de leis, o "alfabeto" espiritual comum que, nos séculos passados, deu a possibilidade aos nossos povos de escrever nobres páginas de história civil e religiosa, representa uma preciosa herança que não pode ser desperdiçada, um património que deve ser incrementado com a contribuição das descobertas modernas da ciência, da técnica e da comunicação, postas ao serviço do verdadeiro bem do homem.

Senhor Embaixador, a Santa Sé renova o testemunho da sua plena disponibilidade a colaborar para a realização destes objectivos compartilhados, consciente da necessidade, para um empreendimento tão vasto, da cooperação de todos: a níveis local, nacional e internacional, exige-se a contribuição de cada um, no ambiente que lhe é próprio e com a sua tarefa específica, sempre no respeito recíproco e em diálogo constante. Estas são as condições da laicidade "sã", indispensável para construir uma sociedade onde convivam pacificamente diferentes tradições, culturas e religiões. Com efeito, separar totalmente a vida pública de todos os valores das tradições significaria introduzir-se num beco sem saída. Eis por que motivo é necessário voltar a definir o sentido de uma laicidade que ponha em evidência as verdadeiras diferença e autonomia entre os diversos componentes da sociedade, mas que conserve inclusive as competências específicas num contexto de responsabilidade comum. Sem dúvida, esta "sã" laicidade do Estado comporta que cada realidade temporal seja regida segundo normas próprias, que todavia não devem descuidar as instâncias éticas fundamentais, cujo fundamento se encontra na própria natureza do homem e que, precisamente por este motivo, remetem em última análise para o Criador. Quando a Igreja católica, através dos seus Pastores legítimos, faz apelo ao valor que alguns princípios éticos fundamentais, arraigados na herança cristã da Europa, revestem para a vida privada, e mais ainda para a pública, é impelida unicamente pelo desejo de garantir e promover a dignidade inviolável da pessoa e o bem autêntico da sociedade.

Senhor Embaixador, eis os sentimentos que me vêm espontaneamente à alma neste momento. Enquanto lhe agradeço as amáveis palavras e lhe asseguro a plena disponibilidade dos meus Colaboradores, formulo bons votos a fim de que Vossa Excelência possa cumprir da melhor forma a sua alta missão. Aos Sereníssimos Capitães-Regentes e ao povo da amada República de São Marino, representada pelo Senhor Embaixador, renovo com carinho a minha saudação, corroborada pela oração, a fim de que Deus proteja e abençoe sempre todos e cada um.




AOS PARTICIPANTES NA ASSEMBLEIA PLENÁRIA DO PONTIFÍCIO CONSELHO PARA OS LEIGOS Sábado, 15 de Novembro de 2008

Senhores Cardeais
Venerados Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
Queridos irmãos e irmãs!

805 Sinto-me feliz por receber hoje a todos vós, Membros e Consultores do Pontifício Conselho para os Leigos, reunidos em Assembleia plenária. Saúdo o Senhor Cardeal Stanislaw Rylko e D. Josef Clemens, Presidente e Secretário do Conselho, e juntamente com eles saúdo os outros Prelados presentes. Dou especiais boas-vindas aos fiéis leigos provenientes de diversas experiências apostólicas e de vários contextos sociais e culturais. O tema escolhido para a vossa Assembleia "Vinte anos após a Christifideles laici: memória, desenvolvimento, novos desafios e tarefas" introduz-nos directamente no serviço que o vosso Pontifício Conselho foi chamado a oferecer à Igreja para o bem dos fiéis do mundo inteiro.

A Exortação apostólica Christifideles laici, definida a magna charta do laicado católico no nosso tempo, é o fruto maduro das reflexões e dos intercâmbios de experiências e de propostas da VII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que teve lugar no mês de Outubro de 1987 sobre o tema "Vocação e missão dos leigos na Igreja e no mundo". Trata-se de uma revisitação orgânica dos ensinamentos do Concílio Vaticano II relativos aos leigos, à sua dignidade de baptizados, à vocação para a santidade, à pertença à comunhão eclesial, à participação na edificação das comunidades cristãs e à missão da Igreja, ao testemunho em todos os âmbitos sociais e ao compromisso no serviço da pessoa para o seu crescimento integral e para o bem comum da sociedade temas presentes sobretudo nas Constituições Lumen gentium e Gaudium et spes, como também no Decreto Apostolicam actuositatem.

Enquanto retoma os ensinamentos do Concílio, a Christifideles laici orienta o discernimento, o aprofundamento e a orientação do compromisso laical na Igreja face às numerosas mudanças sociais destes anos. Desenvolveu-se em muitas Igrejas particulares a participação dos leigos graças aos conselhos pastorais, diocesanos e paroquiais, revelando-se muito positiva porque animada de um autêntico sensus Ecclesiae. A profunda consciência da dimensão carismática da Igreja levou a apreciar e a valorizar quer os carismas mais simples que a Providência de Deus dispensa às pessoas, quer os que dão grande fecundidade espiritual, educativa e missionária. Não é ocasional que o Documento reconheça e encoraje a "nova época agregativa dos fiéis leigos", sinal da "riqueza e da versatilidade dos recursos que o Espírito alimenta no tecido eclesial" (n. 29), indicando aqueles "critérios de eclesialidade" que são necessários, por um lado, para o discernimento dos Pastores e, por outro, para o crescimento da vida das associações de fiéis, dos movimentos eclesiais e das novas comunidades. A este propósito desejo agradecer ao Pontifício Conselho para os Leigos, de modo muito especial, pelo trabalho realizado durante os passados decénios no acolhimento, acompanhamento, discernimento, reconhecimento e encorajamento destas realidades eclesiais, favorecendo o aprofundamento da sua identidade católica, ajudando-as a inserir-se mais amplamente na grande tradição e no tecido vivo da Igreja, e favorecendo o seu desenvolvimento missionário.

Falar do laicado católico significa referir-se a numerosas pessoas baptizadas, comprometidas em numerosas e diversas situações para crescer como discípulos e testemunhas do Senhor e redescobrir e experimentar a beleza da verdade e a alegria de ser cristãos. A actual condição cultural e social torna ainda mais urgente esta acção apostólica para partilhar a mãos-cheias o tesouro de graça e de santidade, de caridade, doutrina, cultura e obras, de que se compõe o fluxo da tradição católica. As novas gerações são não só destinatárias preferenciais desta transmissão e partilha, mas também sujeitos que aguardam no próprio coração propostas de verdade e de felicidade para poder dar-lhe testemunho cristão, como já se verifica de modo admirável. Eu mesmo fui testemunha disto de novo em Sidney, na recente Jornada Mundial da Juventude. E por isso encorajo o Pontifício Conselho para os Leigos a prosseguir a obra desta providencial peregrinação global dos jovens no nome de Cristo, e a empenhar-se na promoção, em toda a parte, de uma autêntica educação e pastoral juvenil.

Conheço também o vosso compromisso em relação a questões de especial relevo, como é a da dignidade e participação das mulheres na vida da Igreja e da sociedade. Já tive ocasião de apreciar o Congresso por vós promovido vinte anos após a promulgação da Carta apostólica Mulieris dignitatem, sobre o tema "Mulher e homem, o humanum na sua inteireza". O homem e a mulher, iguais em dignidade, são chamados a enriquecer-se reciprocamente em comunhão e colaboração, não só no matrimónio e na família, mas também na sociedade em todas as suas dimensões. Às mulheres cristãs exigem-se consciência e coragem para enfrentar tarefas exigentes, para as quais contudo não lhes falta o apoio de uma marcada propensão para a santidade, de uma especial perspicácia no discernimento das correntes culturais do nosso tempo, e da particular paixão no cuidado do que é humano que as caracteriza. Nunca se dirá o suficiente de quanto a Igreja reconheça, aprecie e valorize a participação das mulheres na sua missão de serviço para a difusão do Evangelho.

Queridos amigos, permiti que faça uma última reflexão relativa à índole secular que é característica dos fiéis leigos. O mundo, na trama da vida familiar, de trabalho, social, é lugar teológico, âmbito e meio de realização da sua vocação e missão (cf. Christifideles laici
CL 15-17). Cada ambiente, circunstância e actividade na qual se espera que possa resplandecer a unidade entre a fé e a vida é confiado à responsabilidade dos fiéis leigos, movidos pelo desejo de comunicar o dom do encontro com Cristo e a certeza da dignidade da pessoa humana. A eles compete encarregar-se do testemunho da caridade especialmente com os mais pobres, sofredores e necessitados, assim como assumir qualquer compromisso cristão destinado a construir condições de justiça e de paz sempre maiores na convivência humana, de modo a abrir novas fronteiras ao Evangelho! Peço portanto ao Pontifício Conselho para os Leigos que siga com diligente cuidado pastoral a formação, o testemunho e a colaboração dos irmãos leigos nas mais diversas situações nas quais estão em jogo a autêntica qualidade humana da vida na sociedade. De modo particular, insisto na necessidade e na urgência da formação evangélica e do acompanhamento pastoral de uma nova geração de católicos comprometidos na política, que sejam coerentes com a fé professada, que tenham rigor moral, capacidade de juízo cultural, competência profissional e paixão de serviço pelo bem comum.

O trabalho na grande vinha do Senhor precisa de christifideles laici que, como a Santíssima Virgem Maria, digam e vivam o "fiat" ao desígnio de Deus na sua vida. Com esta perspectiva, agradeço-vos portanto o vosso precioso contributo para tão nobre causa e concedo de coração a vós e aos vossos entes queridos a Bênção Apostólica.




AOS PARTICIPANTES NA XXIII CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DO PONTIFÍCIO CONSELHO PARA A PASTORAL NO CAMPO DA SAÚDE Sábado, 15 de Novembro de 2008

Senhor Cardeal
Venerados Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
806 Ilustres Professores
Queridos irmãos e irmãs!

Sinto-me feliz por vos encontrar, por ocasião da Conferência Internacional anual organizada pelo Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde, que chegou à XXIII edição. Saúdo cordialmente o Cardeal Javier Lozano Barragán, Presidente do Conselho, e agradeço-lhe as gentis palavras que me dirigiu em vosso nome. Faço extensivo o meu reconhecimento ao Secretário, aos colaboradores deste Pontifício Conselho, aos relatores, às autoridades académicas, às personalidades, aos responsáveis dos Institutos de cuidados médicos, aos agentes da saúde e a quantos ofereceram a sua colaboração participando de vários modos na realização do Congresso, que este ano tem por tema: "A pastoral na cura das crianças doentes". Tenho a certeza de que estes dias de reflexão e confronto sobre um tema tão actual contribuirão para sensibilizar a opinião pública sobre o dever de reservar às crianças todas as atenções necessárias para o seu harmonioso desenvolvimento físico e espiritual. Se isto é válido para todas as crianças, tem ainda mais valor para aqueles doentes e necessitados de tratamentos médicos especiais.

O tema da vossa Conferência, que hoje se conclui, graças à contribuição de peritos de fama mundial, e de pessoas directamente em contacto com a infância em dificuldade, permitiu-vos evidenciar a situação difícil na qual continua a encontrar-se um número bastante considerável de crianças em vastas regiões da terra, e de perspectivar quais sejam as intervenções necessárias, aliás urgentes, para ir em seu auxílio. Foram notáveis, sem dúvida, os progressos da medicina nos últimos cinquenta anos: eles levaram a uma considerável redução da mortalidade infantil, mesmo se ainda falta fazer muito nesta perspectiva. É suficiente recordar, como fizestes notar, que cada ano morrem 4 milhões de recém-nascidos com menos de 26 dias de vida.

Neste contexto, a cura da criança doente representa um tema que não pode deixar de suscitar o interesse atento de quantos se dedicam à pastoral da saúde. É indispensável uma análise cuidadosa do actual estado da situação para iniciar, ou continuar, uma acção firme destinada a prevenir na medida do possível as doenças e, quando elas já estão a decorrer, para curar os pequenos doentes mediante as descobertas mais modernas da ciência médica, assim como para promover melhores condições no campo da higiene da saúde sobretudo nos países mais desvantajados. O desafio hoje é esconjurar o surgimento de não poucas patologias outrora típicas da infância e, complexivamente, favorecer o crescimento, o desenvolvimento e a manutenção de um conveniente estado de saúde para todas as crianças.

Nesta vasta acção todos estão incluídos: famílias, médicos e agentes sociais e da saúde. A pesquisa médica encontra-se por vezes diante de escolhas difíceis quando se trata, por exemplo, de alcançar um justo equilíbrio entre insistência e desistência terapêutica para garantir aqueles tratamentos adequados às necessidades reais dos pequenos doentes, sem ceder à tentação do experimentalismo. Não é supérfluo recordar que no centro de cada intervenção médica deve estar sempre a consecução do verdadeiro bem da criança, considerada na sua dignidade de sujeito humano com plenos direitos. Portanto, é preciso ocupar-se dela sempre com amor, para a ajudar a enfrentar o sofrimento e a doença, também antes do nascimento, na medida adequada à sua situação.

Depois, tendo em consideração o impacto emotivo, devido à doença e aos tratamentos a que a criança é submetida, que com frequência resultam particularmente invasivos, é importante garantir-lhes uma comunicação constante com os familiares. Se os agentes da saúde, médicos e enfermeiros, sentem o peso do sofrimento dos pequenos doentes que assistem, pode-se imaginar como é forte o sofrimento vivido pelos pais! O aspecto da saúde e o humano nunca devem ser separados, e cada estrutura assistencial e de saúde, sobretudo se for animada por um espírito cristão genuíno, tem o dever de oferecer o melhor da competência e da humanidade. O doente, de modo especial a criança, compreende particularmente a linguagem da ternura e do amor, expressa através de um serviço solícito, paciente e generoso, animado nos crentes pelo desejo de manifestar a mesma predilecção que Jesus sentia pelos pequeninos.

"Maxima debetur puero reverentia" (Juvenal, Satira XVI, v. 479): já os antigos reconheciam a importância de respeitar a criança, dom e bem precioso para a sociedade, à qual deve ser reconhecida aquela dignidade humana, que possui plenamente já desde quando, ainda não nascido, se encontra no seio materno. Cada ser humano tem valor por si mesmo, porque criado à imagem de Deus, a cujos olhos é tanto mais precioso, quanto mais frágil parece ser aos olhos do homem. Então, uma criança nascitura e já afectada por patologias médicas deve ser recebido com grande amor! "Sinite parvulos venire ad me": diz Jesus no Evangelho (cf.
Mc 10,14), mostrando-nos qual deva ser a atitude de respeito e de acolhimento com a qual cuidar todas as crianças, sobretudo quando é débil e está em dificuldade, quando sofre e é indefesa. Penso sobretudo nos pequeninos órfãos ou abandonados por causa da miséria e da desagregação familiar; penso nas crianças vítimas inocentes da Sida ou da guerra e dos numerosos conflitos armados que estão a decorrer em várias partes do mundo; penso na infância que morre por causa da miséria, da seca e da fome. A Igreja não esquece estes seus filhos mais pequenos e se, por um lado, aplaude as iniciativas das Nações mais ricas para melhorar as condições do seu desenvolvimento, por outro, sente com força o dever de convidar para prestar mais atenção a estes nossos irmãos, para que, graças à nossa coral solidariedade possam olhar para a vida com confiança e esperança.

Queridos irmãos e irmãs, enquanto formulo votos por que tantas condições de desequilíbrio, ainda existentes, sejam o mais depressa resolvidas com intervenções resolutivas a favor destes nossos irmãos mais pequenos, expresso vivo apreço por quantos dedicam energias pessoais e recursos materiais ao seu serviço. Com particular reconhecimento penso no nosso Hospital "Bambin Gesù" e noutras numerosas associações e instituições sociais e de saúde católicas, as quais, seguindo o exemplo de Jesus Cristo Bom Samaritano, e animadas pela sua caridade, prestam apoio e alívio humano, moral e espiritual a tantas crianças que sofrem, amadas por Deus com singular predilecção. A Virgem Santa, Mãe de cada homem, vele sobre as crianças doentes e proteja quantos se prodigalizam com solicitude humana e espírito evangélico. Com estes sentimentos, expressando sincero apreço pelo vosso trabalho de sensibilização realizado nesta Conferência internacional, garanto uma constante recordação na oração e concedo a todos a Bênção Apostólica.




AO SENHOR GEORGES CHAKIB EL KHOURY NOVO EMBAIXADOR DO LÍBANO JUNTO DA SANTA SÉ Segunda-feira, 17 de Novembro de 2008

Senhor Embaixador

807 Sinto-me feliz por recebê-lo no momento em que apresenta as Cartas que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República do Líbano junto da Santa Sé. Estou-lhe grato pelas suas amáveis palavras assim como pelas saudações que me transmitiu da parte de Sua Ex. o Sr. Michel Sleiman, Presidente da República, o qual tive a alegria de receber no Vaticano recentemente. Queira transmitir-lhe os sentimentos de afecto e de confiança que sinto por todo o povo libanês, desejando que ele prossiga corajosamente os seus esforços por construir uma sociedade unida e solidária.

Como Vossa Excelência ressaltou, Senhor Embaixador, o Líbano é o berço de uma cultura antiga que reinou sobre todo o mediterrâneo e além dele, e é também o país de numerosas confissões religiosas que souberam mostrar que podem viver juntas em fraternidade e colaboração. Com uma rica diversidade, o povo libanês sente amor profundo pela sua terra, cultura e tradições, permanecendo fiel à sua vocação de abertura universal. Esta história milenária do seu país assim como a sua colocação no centro de um contexto regional complexo, confere-lhe a missão fundamental de contribuir para a paz e a concórdia entre todos.

Pela sua experiência de vida e de colaboração intercomunitária e intercultural, o Líbano é um "tesouro" confiado a todos os libaneses. Compete-lhe portanto preservá-lo e fazê-lo frutificar para o bem de toda a Nação. De igual modo, faço votos por que a Comunidade internacional o proteja e valorize e por que, mediante o seu compromisso efectivo, contribua para evitar que este país se torne um terreno de confronto para conflitos regionais ou internacionais. De igual modo, o Líbano deveria ser como um laboratório para a busca de soluções eficazes para os conflitos que, há muito tempo, angustiam a região do Médio Oriente.

Nesta perspectiva, alegro-me profundamente pelos esforços corajosos que foram realizados durante os últimos meses por todo o país e pelos seus Responsáveis para reconduzir a vida política e o conjunto das instituições nacionais ao seu andamento normal, graças aos esforços pacientes de todos. A eleição do Presidente da República, a formação de um governo de unidade nacional e a aprovação de uma nova lei eleitoral não deixarão de favorecer a unidade nacional e de contribuir para uma autêntica coexistência entre os diferentes componentes da nação. De igual modo, o "diálogo nacional", que está a decorrer desde há algumas semanas, será certamente a ocasião para esclarecer os desafios que o país deve enfrentar hoje e procurar os compromissos necessários para lhes fazer face. Por conseguinte, faço votos por que, pondo de lado os interesses particulares e curando as feridas do passado, todos se comprometam efectivamente num caminho de diálogo e de reconciliação, a fim de permitir que o país progrida na estabilidade.

Contudo, as tensões que, infelizmente, ainda perduram, demonstram que é necessário avançar com decisão pelo caminho aberto há alguns meses, com os Acordos de Doha, a fim de construir juntos as instituições libanesas. A atitude fundamental que deve guiar cada um neste compromisso ao serviço do bem comum deve permanecer invariável: cada componente do povo libanês sinta verdadeiramente que o Líbano é a sua casa e veja que as suas preocupações e expectativas legítimas são efectivamente tomadas em consideração, no respeito recíproco pelos direitos de todos. Para esta finalidade, uma verdadeira educação das consciências na paz, na reconciliação e no diálogo deve ser promovida e desenvolvida, sobretudo entre as jovens gerações. Como escreveu o meu venerado predecessor o Papa João Paulo ii: "Nunca se deve esquecer que um gesto de paz pode desarmar o adversário e com frequência convida-o a responder positivamente à mão estendida, porque a paz, que é um bem por excelência, tende a comunicar-se" (Exortação apostólica, Une espérence nouvelle pour le Liban, n. 98). Esta paz duradoura, que é uma aspiração profunda de todos os libaneses, é possível na medida em que prevalecer em todos uma vontade autêntica de viver juntos na mesma terra, e de considerar a justiça, a reconciliação e o diálogo como o quadro propício para a resolução dos problemas das pessoas e dos grupos. Para edificar uma sociedade que garanta a todos os seus membros uma existência digna e livre, uma cooperação cada vez mais profunda entre todos os componentes da nação deve ser desenvolvida e fundada em relações de confiança entre as pessoas e entre as comunidades.

Senhor Embaixador, nesta etapa importante que o seu país está a viver, a Santa Sé continua a seguir com grande atenção os progressos da situação e sente um interesse particular pelos esforços feitos para um regulamento definitivo das questões que o Líbano deve enfrentar. Particularmente sensível aos sofrimentos que as populações do Médio Oriente suportam há muito tempo, a Santa Sé prossegue com determinação o seu compromisso em favor da paz e da reconciliação no Líbano e em toda esta região tão querida a todos os crentes.

No final deste encontro, permita-me Senhor Embaixador, que saúde calorosamente por seu intermédio os Bispos e as comunidades católicas do Líbano. No prolongamento da recente beatificação em Beirute do Pe. Jacques Haddad, Abouna Yaacoub, apóstolo da misericórdia e fervoroso pregador da Palavra de Deus, convido os católicos a serem entre os seus compatriotas, em profunda comunhão com os Pastores, fervorosos artífices de unidade e fraternidade. Que este momento intenso que uniu os Libaneses de todas as origens e sensibilidades religiosas, no reconhecimento da personalidade cheia de sabedoria e da obra admirável de um dos seus cidadãos, se prolongue num compromisso comum ao serviço da paz e da unidade da nação!

Vossa Excelência inicia hoje a nobre missão de representar o Líbano junto da Santa Sé e de manter as excelentes relações que unem o seu país à Sé Apostólica. Queira aceitar os votos cordiais que formulo pelo seu bom êxito e tenha a certeza de que encontrará sempre junto dos meus colaboradores a compreensão e o apoio necessários!

Sobre Vossa Excelência, a sua família, colaboradores e os dirigentes do seu país, invoco de todo o coração a abundância das Bênçãos divinas.




AOS PARTICIPANTES NA SESSÃO PLENÁRIA DA CONGREGAÇÃO PARA OS INSTITUTOS DE VIDA CONSAGRADA E AS SOCIEDADES DE VIDA APOSTÓLICA Sala Clementina

Quinta-feira, 20 de Novembro de 2008


Senhores Cardeais
Venerados Irmãos
808 no Episcopado e no Sacerdócio
Queridos irmãos e irmãs

É com alegria que me encontro convosco, por ocasião da Sessão Plenária da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, que celebra os seus cem anos de vida e de actividade. Com efeito, passou um século desde que o meu venerado predecessor São Pio X, com a Constituição Apostólica Sapienti consilio, de 29 de Junho de 1908, tornou autónomo o vosso Dicastério como Congregatio negotiis religiosorum sodalium praeposita, denominação sucessivamente várias vezes modificada. Para recordar este acontecimento programastes, no dia 22 do próximo mês de Novembro, um Congresso com o significativo título: "Cem anos ao serviço da vida consagrada"; por isso, desejo o pleno bom êxito a esta oportuna iniciativa.

O encontro hodierno é para mim ocasião mais propícia do que nunca para saudar e agradecer a todos aqueles que trabalham no vosso Dicastério. Saúdo em primeiro lugar o Prefeito, Cardeal Franc Rodé, a quem estou agradecido também por se ter feito intérprete dos sentimentos comuns. Juntamente com ele, saúdo os Membros da Congregação, o Secretário, os Subsecretários e os demais Oficiais que, com diversas funções, prestam o seu serviço quotidiano com competência e sabedoria, para "promover e regular" a prática dos conselhos evangélicos nas várias formas de vida consagrada, assim como a actividade das Sociedades de vida apostólica (cf. Constituição Apostólica Pastor bonus ). Os consagrados constituem uma porção eleita do Povo de Deus: caríssimos irmãos e irmãs, sustentar e conservar a fidelidade à sua chamada divina constitui o compromisso fundamental que vós assumis, segundo modalidades já bem consolidadas, graças à experiência acumulada nestes cem anos de actividade. Este serviço da Congregação foi ainda mais assíduo nas décadas seguintes ao Concílio Vaticano II, que viram o esforço de renovação, tanto na vida como na legislação, de todos os Institutos religiosos e seculares e das Sociedades de vida apostólica. Portanto, enquanto me uno a vós ao agradecer a Deus, dador de todo o bem, pelos bons frutos produzidos nestes anos do vosso Dicastério, recordo com pensamento reconhecido todos aqueles que durante este século de actividade despenderam as suas energias em benefício dos consagrados e das consagradas.

Este ano a Plenária da vossa Congregação focalizou a sua atenção sobre um tema que aprecio de maneira particular: o monaquismo, forma vitae que se inspirou sempre na Igreja nascente, gerada pelo Pentecostes (cf.
Ac 2,42-47 Ac 4,32-35). Das conclusões dos vossos trabalhos, centrados especialmente na vida monástica feminina, poderão desabrochar indicações úteis para quantos, monges e monjas, "buscam Deus", realizando esta sua vocação para o bem de toda a Igreja. Também recentemente (cf. Discurso ao mundo da cultura, Paris, 12 de Setembro de 2008), desejei evidenciar a exemplaridade da vida monástica na história, sublinhando o modo como a sua finalidade é simples e ao mesmo tempo essencial: quaerere Deum, buscar Deus e procurá-lo através de Jesus Cristo, que O revelou (cf. Jn 1,18), procurá-lo fixando o olhar nas realidades invisíveis, que são eternas (cf. 2Co 4,18), na expectativa da manifestação gloriosa do Salvador (cf. Tt Tt 2,13).

Christo omnino nihil praeponere (cf. RB 72, 11; Santo Agostinho Enarr. in Ps 29,9 Cipriano, Ad Fort Ps 4). Esta expressão, que a Regra de São Bento retoma da tradição precedente, exprime oportunamente o tesouro precioso da vida monástica praticada até hoje, tanto no Ocidente como no Oriente cristão. Trata-se de um convite urgente a plasmar a vida monástica, a ponto de fazer dela a memória evangélica da Igreja e, quando é autenticamente vivida, "exemplaridade de vida baptismal" (cf. João Paulo II, Orientale lumen, 9). Em virtude do primado absoluto reservado a Cristo, os mosteiros são chamados a torna-se lugares onde se cria espaço para a celebração da glória de Deus, se adora e se canta a misteriosa mas real presença divina no mundo, onde se procura viver o mandamento novo do amor e do serviço recíproco, preparando deste modo a final "manifestação dos filhos de Deus" (Rm 8,19). Quando os monges vivem o Evangelho de modo radical, quando aqueles que se dedicam a uma vida integralmente contemplativa cultivam em profundidade a união esponsal com Cristo, sobre a qual reflectiu amplamente a Instrução desta Congregação Verbi Sponsa (13 de Maio de 1999), o monaquismo pode constituir para todas as formas de vida religiosa e de consagração uma memória daquilo que é essencial e tem o primado em cada vida baptismal: buscar Deus e nada antepor ao seu amor.

A vida indicada por Deus para esta busca e para este amor é a sua própria Palavra, que nos livros das Sagradas Escrituras se oferece generosamente à reflexão dos homens. Portanto, o desejo de Deus e o amor pela sua Palavra alimentam-se reciprocamente e geram na vida monástica a exigência insuprimível do opus Dei, do studium orationis e da lectio divina, que é escuta da Palavra de Deus, acompanhada pelas grandes vozes da tradição dos Padres e dos Santos, e depois oração orientada e sustentada por esta Palavra. A recente Assembleia geral do Sínodo dos Bispos, celebrada em Roma no mês passado sobre o tema: A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja, renovando o apelo a todos os cristãos, a arraigarem a sua existência na escuta da Palavra de Deus contida nas Sagradas Escrituras, convidou especialmente as comunidades religiosas, assim como cada homem e cada mulher consagrados, a fazer da Palavra de Deus o alimento quotidiano, de modo particular através da prática da lectio divina (cf. Elenchus praepositionum, n. 4).

Prezados irmãos e irmãs, quem entra no mosteiro procura aí um oásis espiritual onde aprender a viver como verdadeiro discípulo de Jesus em serena e perseverante comunhão fraterna, acolhendo também eventuais hóspedes como o próprio Cristo (cf. RB 53, 1). Este é o testemunho que a Igreja pede ao monaquismo também nesta nossa época. Invoquemos Maria, a Mãe do Senhor, a "mulher da escuta", que nada antepôs ao amor pelo Filho de Deus que dela nascera, a fim de que ajude as comunidades de vida consagrada, e especialmente as monásticas, a serem fiéis à sua vocação e missão. Possam os mosteiros ser cada vez mais oásis de vida ascética, onde se sente a fascinação da união esponsal com Cristo e onde a opção do Absoluto de Deus é envolvida por um constante clima de silêncio e de contemplação. Enquanto por isso asseguro a minha prece, concedo de coração a Bênção Apostólica a todos vós que participais na Plenária, a quantos trabalham na vossa Congregação e aos membros dos vários Institutos de vida consagrada, de forma especial aos de vida integralmente contemplativa. Que o Senhor derrame sobre cada um a abundância das suas consolações.




Discursos Bento XVI 803