Discursos Bento XVI 855

À COMISSÃO MISTA INTERNACIONAL PARA O DIÁLOGO TEOLÓGICO ENTRE AS IGREJAS CATÓLICA E AS ORTODOXAS ORIENTAIS


855
Sala do Consistório

Sexta-feira, 30 de Janeiro de 2009


Queridos irmãos em Cristo

Dou as boas-vindas a vós e aos membros da Comissão internacional para o diálogo teológico entre a Igreja católica e as Igrejas ortodoxas orientais. No final desta semana de trabalho intenso, juntos podemos dar graças ao Senhor pelo vosso firme compromisso na busca da reconciliação e comunhão no Corpo de Cristo, que é a Igreja.

De facto, cada um de vós contribuis para esta tarefa não só com a riqueza da vossa tradição, mas também com o empenho das Igrejas participantes neste diálogo para superar as divisões do passado e fortalecer o testemunho comum dos cristãos perante os enormes desafios que os fiéis enfrentam actualmente.

O mundo precisa de sinais visíveis do mistério da unidade que une as três Pessoas divinas e que nos foi revelado, há dois mil anos, com a Encarnação do Filho de Deus. A tangibilidade da mensagem evangélica é perfeitamente transmitida por João, quando ele declara a sua intenção de anunciar o que ouviu, o que os seus olhos viram e as suas mãos tocaram, a fim de que todos possam estar em comunhão com o Pai e com o seu Filho Jesus Cristo (cf.
1Jn 1,1-4). A nossa comunhão através da graça do Espírito Santo na vida que une o Pai e o Filho tem uma dimensão perceptível na Igreja, o Corpo de Cristo, "que é o Seu corpo e o complemento d'Aquele que preenche tudo em todos" (Ep 1,23), e todos nós temos o dever de trabalhar para a manifestação ao mundo desta dimensão essencial da Igreja.

No vosso 6º encontro foram dados passos importantes relativamente ao estudo da Igreja como comunhão. O próprio facto de que o diálogo continue ao longo do tempo e que cada ano seja hospedado por uma das diversas Igrejas que representais é em si mesmo um sinal de esperança e encorajamento. Nós só precisamos de dirigir a nossa mente para o Médio Oriente de onde muitos de vós vindes para ver que sementes de esperança autênticas são urgentemente necessárias num mundo ferido pela tragédia da divisão, conflitos e imenso sofrimento humano.

A semana de oração pela unidade dos cristãos concluiu-se com a cerimónia na Basílica dedicada ao grande Apóstolo Paulo, na qual muitos de vós estavam presentes. Paulo foi o grande defensor e teólogo da unidade da Igreja. Os seus esforços e as suas lutas foram inspirados pela aspiração contínua a manter a comunhão visível, não só exterior, mas real e plena entre os discípulos do Senhor. Portanto, através da intercessão de Paulo, peço a bênção de Deus por todos vós e pelas Igrejas e povos que representais.



AOS DIRIGENTES DA CONFEDERAÇÃO ITALIANA

SINDICAL DOS TRABALHADORES (CISL) Sala Clementina

Sábado, 31 de Janeiro de 2009




Ilustres Senhores
Gentis Senhoras

856 É com profundo apreço que recebo em vós, e saúdo cordialmente, os membros do grupo de dirigentes da Confederação Italiana Sindical dos Trabalhadores: saúdo de modo particular o Secretário-Geral, e agradeço-lhe as palavras que me dirigiu em nome de todos. Ele recordou que precisamente há 60 anos, a CISL dava os primeiros passos, participando activamente na fundação do sindicato livre internacional, oferecendo à nascente entidade a contribuição da ancoragem nos princípios da doutrina social da Igreja e a prática de um sindicalismo livre e autónomo das linhas políticas e dos partidos. Hoje vós tencionais reconfirmar estas mesmas orientações, desejando continuar a haurir do magistério social da Igreja a inspiração na vossa acção, destinada a tutelar os interesses dos trabalhadores e das trabalhadoras e dos aposentados da Itália. Como o Secretário-Geral recordou oportunamente, o grande desafio e oportunidade que a preocupante crise económica deste momento convida a saber enfrentar, é encontrar uma nova síntese entre bem comum e mercado, entre capital e trabalho. E neste âmbito, é significativa a contribuição que podem oferecer as organizações sindicais.

No pleno respeito pela autonomia legítima de todas as instituições a Igreja, perita em humanidade, não se cansa de oferecer a contribuição do seu ensinamento e da sua experiência para aqueles que têm a intenção de servir a causa do homem, do trabalho e do progresso, da justiça social e da paz. A sua atenção às problemáticas sociais aumentou ao longo do século passado. Precisamente por isso, os meus venerados Predecessores, atentos aos sinais dos tempos, não deixaram de oferecer indicações oportunas aos fiéis e aos homens de boa vontade, iluminando-os no seu compromisso pela salvaguarda da dignidade do homem e pelas reais exigências da sociedade.

No alvorecer do século XX, com a Encíclica Rerum novarum, o Papa Leão XIII fez uma defesa premente da dignidade inalienável da dignidade dos trabalhadores. As orientações ideais, contidas neste documento, contribuem para revigorar a animação cristã da vida social; e isto traduziu-se, entre outras coisas, no nascimento e na consolidação de muitas iniciativas de interesse civil, como os centros de estudos sociais, as sociedades de trabalhadores, as cooperativas e os sindicatos. Verificou-se inclusive um impulso notável para uma legislação do trabalho, respeitosa das legítimas expectativas dos operários, especialmente das mulheres e dos menores, e houve também um sensível aumento dos salários e das próprias condições de trabalho. Desta Encíclica, que teve "o privilégio" de ser comemorada por vários documentos pontifícios sucessivos, João Paulo II quis tornar solene o centésimo aniversário, publicando a Encíclica Centesimus annus, na qual observa que a doutrina social da Igreja, especialmente neste nosso período histórico, considera o homem inserido na complexa rede de relações, que é típica das sociedades modernas. Por sua vez, as ciências humanas contribuem para o tornar capaz de se compreender cada vez melhor a si mesmo, enquanto ser social. "Todavia, somente a fé observa o meu venerado Predecessor lhe revela plenamente a sua verdadeira identidade, e é precisamente dela que parte a doutrina social da Igreja que, recolhendo todos os contributos das ciências e da filosofia, se propõe assistir o homem no caminho da salvação" (n. 54).

Na sua precedente Encíclica social Laborem exercens, de 1981, dedicada ao tema do trabalho, o Papa João Paulo II tinha sublinhado o facto de que a Igreja nunca cessou de considerar os problemas do trabalho no âmbito de uma questão social que, progressivamente, foi assumindo dimensões mundiais. Aliás, o trabalho ele insiste deve ser visto como a "chave essencial" de toda a problemática social, porque condiciona o desenvolvimento não apenas económico, mas também cultural e moral, das pessoas, das famílias, das comunidades e de toda a humanidade (cf. n. 1). Ainda neste importante documento são frisados o papel e a importância estratégica dos sindicatos, definidos como "um elemento indispensável da vida social, especialmente nas modernas sociedades industrializadas" (cf. n. 20).

Há outro elemento que volta frequentemente no magistério dos Papas do século XX, e trata-se do apelo à solidariedade e à responsabilidade. Para superar a crise económica e social que estamos a viver, sabemos que é necessário um esforço livre e responsável da parte de todos; ou seja, é necessário ultrapassar os interesses particularistas e sectorais, de maneira a enfrentar em conjunto e unidos as dificuldades que investem todos os âmbitos da sociedade, de modo especial o mundo do trabalho. Nunca se sentiu tal urgência como hoje; as dificuldades que angustiam o mundo do trabalho impelem a uma concertação efectiva e mais estreita entre os múltiplos e diversos componentes da sociedade. O apelo à colaboração encontra referências significativas também na Bíblia. Por exemplo, no livro do Qohelet lemos: "É melhor serem dois do que um só, porque obterão mais rendimento no seu trabalho. Se um cair, o outro levanta-o. Mas ai do homem que está só: se cair, não há ninguém para o levantar!" (4, 9-10). Portanto, formulo bons votos a fim de que na actual crise mundial nasça a vontade comum de dar vida a uma nova cultura da solidariedade e da participação responsável, condições indispensáveis para construir em conjunto o porvir do nosso planeta.

Queridos amigos, a celebração do 60º aniversário de fundação da vossa organização sindical seja motivo para renovar o entusiasmo dos primórdios e para redescobrir ainda mais o vosso carisma originário. O mundo tem necessidade de pessoas que se dediquem com abnegação à causa do trabalho, no pleno respeito pela dignidade humana e do bem comum. A Igreja, que aprecia o papel fundamental dos sindicatos, está próxima de vós tanto hoje como ontem, e está pronta para vos ajudar, a fim de que possais cumprir da melhor forma o vosso papel na sociedade. Na hodierna festa de São João Bosco, desejo enfim confiar a actividade e os programas do vosso sindicato a este Apóstolo dos jovens, que com grande sensibilidade social fez do trabalho um precioso instrumento de formação e de educação das novas gerações. Além disso, invoco sobre vós e as vossas famílias a salvaguarda de Nossa Senhora e de São José, pai bom e trabalhador perito, que cuidava quotidianamente da família de Nazaré. Quanto a mim, asseguro-vos uma lembrança na oração, enquanto com afecto vos abençoo, a vós aqui presentes, e todos os que estão inscritos na vossa Confederação.


Fevereiro de 2009



AO SENHOR JÁNOS BALASSA NOVO EMBAIXADOR

DA HUNGRIA JUNTO DA SANTA SÉ Segunda-feira, 2 de Fevereiro de 2009



Excelência

É-me grato dar-lhe as boas-vindas no início da sua missão e aceitar as Cartas que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República da Hungria junto da Santa Sé. Agradeço-lhe as suas amáveis palavras e as saudações que me transmite da parte do Presidente, Senhor László Sólyom. Peço-lhe que tenha a amabilidade de lhe comunicar os meus respeitosos bons votos e a certeza das minhas preces por todo o povo da sua nação.

O restabelecimento da parte da Santa Sé das plenas relações diplomáticas com os países do ex-bloco oriental, depois dos acontecimentos fundamentais de 1989, abriu novos horizontes de esperança para o futuro. Ao longo dos vinte anos que transcorreram desde então, a Hungria alcançou grandes progressos na fundação das estruturas de uma sociedade livre e democrática, capaz e desejosa de desempenhar o papel que lhe cabe numa comunidade mundial cada vez mais globalizada. Como Vossa Excelência observou, as forças que governam os assuntos económicos e políticos no mundo moderno têm necessidade de ser adequadamente orientadas por outras palavras, precisam de ser edificadas sobre um fundamento ético, dando sempre prioridade à dignidade e aos direitos da pessoa humana e ao bem comum da humanidade. Em função da sua forte herança cristã, que remonta a mais de mil anos, a Hungria encontra-se numa posição oportuna para participar na promoção destes ideais humanos no seio da comunidade europeia e na mais vasta comunidade mundial, e faço votos por que as nossas relações diplomáticas ajudem a revigorar esta dimensão vital da contribuição do seu país para as questões internacionais.

857 Por vezes, a experiência de uma liberdade recém-conquistada acarretou consigo o risco de que aqueles mesmos valores cristãos e humanos, tão profundamente arraigados na história e na cultura dos povos individualmente, e na realidade de todo o continente europeu, pudessem ser suplantados por outros, alicerçados sobre visões volúveis do homem e da sua dignidade, e prejudiciais para o desenvolvimento de uma sociedade autenticamente próspera. Na minha Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2008, ressaltei a importância primordial da família para a edificação de relações comunitárias pacíficas a todos os níveis. Numa boa parte da Europa moderna, o papel coesivo vital que a família tem a desempenhar nas questões humanas está a ser posto em dúvida e mesmo em perigo, como resultado de formas erróneas de pensar que às vezes encontram uma sua expressão em políticas sociais e políticas agressivas. Faço os votos mais ardentes por que se encontrem maneiras de salvaguardar este elemento essencial da nossa sociedade, que constitui o âmago de cada cultura e de cada nação. Um dos modos específicos como o governo pode ajudar a família é assegurar que aos pais seja permitido exercer o seu direito fundamental como educadores primordiais dos próprios filhos, o que incluiria a opção de os fazer frequentar escolas religiosas, se assim o quiserem.

A Igreja católica na Hungria viveu com particular intensidade a transição entre o período do governo totalitário e a liberdade, da qual agora o seu país goza. Depois de décadas de opressão, enfrentadas com o testemunho heróico de um número tão elevado de cristãos, ela renasceu para assumir o lugar que lhe é próprio numa sociedade transformada, mais uma vez capaz de proclamar livremente o Evangelho. Ela não busca privilégios para si mesma, mas deseja ardentemente desempenhar o seu papel na vida da nação, em fidelidade à sua natureza e missão. Na medida em que continua o processo de implementação dos acordos entre a Hungria e a Santa Sé penso no memorandum, recentemente assinado, sobre a assistência religiosa às forças armadas e à polícia aduaneira estou persuadido de que qualquer questão fundamental relativa à Igreja no seu país será resolvida no espírito da boa vontade e do diálogo fecundo que tem caracterizado as nossas relações diplomáticas, desde que foram restabelecidas de maneira tão feliz.

Excelência, rezo para que a missão diplomática que hoje começa fortaleça ulteriormente os vínculos de amizade existentes entre a Santa Sé e a República da Hungria. Asseguro-lhe que os vários departamentos da Cúria Romana estão sempre prontos para o ajudar e assistir no cumprimento dos seus deveres. Com os meus sinceros bons votos, invoco sobre Vossa Excelência, a sua família e todos os seus compatriotas, abundantes bênçãos de paz e de prosperidade.

Deus abençoe a Hungria!




AOS BISPOS DA TURQUIA POR OCASIÃO DA VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM» Segunda-feira, 2 de Fevereiro de 2009

Queridos Irmãos no Episcopado
e no Sacerdócio!

Sinto-me feliz por vos receber esta manhã, no momento em que fazeis a vossa peregrinação aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo, sinal eloquente da vossa comunhão com o Sucessor de Pedro. Agradeço ao Presidente da vossa Conferência episcopal, D. Luigi Padovese, Vigário Apostólico na Anatólia, as amáveis palavras que me dirigiu em vosso nome. Através da vossa presença, são as vossas comunidades com numerosos aspectos que vêm também ao encontro da Igreja de Roma, manifestando assim a unidade profunda que as reúne. Ao regressardes às vossas casas saudai afectuosamente em meu nome os sacerdotes, os religiosos e as religiosas e todos os fiéis das vossas dioceses. Dizei-lhes que o Papa, na recordação sempre presente no seu coração da peregrinação na Turquia, permanece próximo de cada um deles, das suas preocupações e esperanças.

A vossa visita, que se realiza providencialmente neste ano consagrado a São Paulo, assume uma importância particular para vós que sois os Pastores da Igreja católica na Turquia, esta terra na qual nasceu o Apóstolo das Nações e na qual ele fundou várias comunidades. Como declarei na Basílica onde se encontra o seu túmulo, quis promulgar este ano paulino "para escutar e aprender agora dele, que é o nosso mestre, "a fé e a verdade", nas quais estão enraizadas as razões da unidade entre os discípulos de Cristo" (Basílica de São Paulo fora dos Muros, 28 de Junho de 2008). Sei que no vosso país, quisestes dar um realce particular a este ano jubilar e que numerosos peregrinos visitam os lugares queridos à tradição cristã. Faço votos por que o acesso a estes lugares significativos para a fé cristã, assim como a celebração do culto, sejam cada vez mais facilitados aos peregrinos. Por outro lado, alegro-me profundamente pela dimensão ecuménica que foi conferida a este ano paulino, manifestando deste modo a importância desta iniciativa para as outras Igrejas e comunidades cristãs. Que este ano permita novos progressos no caminho rumo à unidade de todos os crentes!

A existência das vossas Igrejas locais, em toda a sua diversidade, situa-se no prolongamento de uma rica história marcada pelo desenvolvimento das primeiras comunidades cristãs. Muitos nomes, tão queridos aos discípulos de Cristo, permanecem ligados à vossa terra, desde São João, Santo Inácio de Antioquia, São Policarpo de Esmirna e muitos outros ilustres Padres da Igreja, sem esquecer o concílio de Éfeso no qual a Virgem Maria foi proclamada "Theotokos". Mais recentemente, o Papa Bento XV e o bem-aventurado João XXIII marcaram por sua vez a vida da nação e da Igreja na Turquia. E desejo ainda recordar todos os cristãos, sacerdotes e leigos, que testemunharam a caridade de Cristo, por vezes até ao dom supremo da sua vida, como o Padre Andrea Santoro. Que esta história prestigiosa seja para todas as vossas comunidades, das quais conheço o vigor da fé e a abnegação nas provas, não só a recordação de um passado glorioso, mas um encorajamento a prosseguir generosamente pelo caminho traçado, testemunhando entre os seus irmãos o amor de Deus por todos os homens.

Queridos Irmãos, os Concílios de Niceia e de Constantinopla deram ao Credo a sua expressão definitiva. Que isto seja para vós e para os vossos fiéis, um estímulo premente a aprofundar a fé da Igreja e a viver sempre com maior fervor a esperança que disto deriva. O povo de Deus encontrará um apoio eficaz para a sua esperança numa autêntica comunhão eclesial. De facto, "a Igreja é uma comunhão estruturada, que se realiza na coordenação dos diversos carismas, ministérios e serviços, e está ordenada para a obtenção da finalidade comum que é a salvação" (Pastores gregis ), e os bispos são os primeiros responsáveis da realização concreta desta unidade. A comunhão profunda que deve reinar entre eles, na diversidade dos ritos, expressa-se sobretudo mediante uma real fraternidade e uma colaboração recíproca que lhes permite cumprir o seu ministério num espírito colegial e fortalecer a unidade do Corpo de Cristo.

858 Esta unidade encontra uma fonte vital na Palavra de Deus, da qual o recente Sínodo dos Bispos voltou a realçar a importância na vida e na missão da Igreja. Convido-vos portanto a formar os fiéis das vossas dioceses, a fim de que a Sagrada Escritura não seja só uma Palavra do passado, mas esclareça a sua existência e lhes abra um autêntico caminho para Deus. Neste contexto, é-me agradável recordar que a meditação da Palavra de Deus pelo Patriarca ecuménico de Constantinopla, Bartolomeu I, foi um momento importante desta Assembleia sinodal.

Permiti que saúde os sacerdotes e os religiosos que colaboram convosco no anúncio do Evangelho. Sendo em grande número provenientes de outros países, a sua tarefa é por vezes fadigosa. Encorajo-os a inserir-se cada vez mais nas realidades das vossas Igrejas locais, a fim de poderem dar a todos os membros da comunidade católica a atenção pastoral necessária, sem esquecer as pessoas mais débeis e mais isoladas. O pequeno número de sacerdotes, muitas vezes insuficiente para a vastidão do trabalho, não pode deixar de vos estimular a desenvolver uma pastoral vigorosa das vocações.

A pastoral dos jovens é uma das vossas maiores preocupações. De facto é importante que eles possam adquirir uma formação cristã que os ajude a consolidar a sua fé e a vivê-la num contexto muitas vezes difícil. Na mesma perspectiva, a formação dos leigos também lhes deve permitir que assumam com competência e eficácia as responsabilidades que lhes são exigidas no seio da Igreja.

A comunidade cristã do vosso país vive numa nação regida por uma Constituição que afirma a laicidade do Estado, mas cuja grande parte dos habitantes é muçulmana. É por conseguinte muito importante que cristãos e muçulmanos possam comprometer-se juntos pelo homem, pela vida, pela paz e pela justiça. Por outro lado, a distinção entre esfera civil e religiosa é certamente um valor que deve ser protegido. Contudo, neste quadro, compete ao Estado garantir de maneira efectiva aos cidadãos e às comunidades religiosas a liberdade de culto e a liberdade religiosa, tornando inaceitável qualquer forma de violência em relação aos crentes, seja qual for a sua religião. Neste contexto, conheço o vosso desejo e disponibilidade para um diálogo sincero com as Autoridades, a fim de encontrar uma solução para os diferentes problemas que se apresentam às vossas comunidades, sendo um deles o reconhecimento jurídico da Igreja católica e dos seus bens. Um tal reconhecimento teria consequências positivas para todos. É desejável que os contactos permanentes possam ser estabelecidos, por exemplo por intermédio de uma Comissão bilateral, a fim de estudar as questões que ainda não estão resolvidas.

Queridos Irmãos, no final do nosso encontro, gostaria de vos dizer estas palavras de esperança dirigidas às Igrejas de Éfeso e de Esmirna no livro do Apocalipse: "És perseverante, pois sofreste por causa do meu nome, mas não esmoreceste... Não tenhas medo do que irás sofrer... Mostra-te fiel até à morte e eu te darei a coroa da vida" (
Ap 2,3 Ap 2,10). Que a intercessão de São Paulo e da Theotokos, vos conceda viver nesta esperança que nos vem de Cristo Ressuscitado e vivo entre nós. De coração, dirijo-vos uma afectuosa Bênção Apostólica, assim como aos sacerdotes, aos religiosos e às religiosas, e a todos os fiéis das vossas dioceses.



AO SENHOR LUIS FELIPE SEIXAS CORRÊA NOVO EMBAIXADOR DO BRASIL JUNTO DA SANTA SÉ Segunda-feira, 9 de Fevereiro de 2009

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Excelência

1. É com grata satisfação que dou-lhe as boas-vindas ao acolhê-lo aqui no Vaticano, no ato da apresentação das Cartas Credenciais, como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República Federativa do Brasil junto à Santa Sé.

Esta feliz circunstância proporciona-me a oportunidade de verificar uma vez mais os sentimentos de proximidade espiritual que o povo brasileiro nutre para com o Sucessor de Pedro; ao mesmo tempo dá-me o ensejo de reiterar a expressão de meu sincero afeto e a ampla estima pela sua nobre Nação.

Agradeço vivamente as amáveis palavras que Me dirigiu. Em especial, agradeço os pensamentos deferentes e a saudação que o Presidente da República, senhor Luiz Inácio Lula da Silva, quis enviar-Me. Peço a Vossa Excelência a fineza de retribuir de minha parte a saudação, com os melhores votos de felicidades e que lhe transmita a certeza das minhas preces pelo seu País e povo.

É-me grato aproveitar a ocasião para recordar com apreço a Visita Pastoral que a Providência permitiu-me realizar no Brasil em 2007, a fim de presidir a V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe, bem como os encontros havidos com o mais Alto Mandatário da Nação, tanto em São Paulo, como mais recentemente aqui em Roma. Possam essas circunstâncias testemunhar, uma vez mais, os estreitos laços de amizade e de frutífera colaboração entre o vosso País e a Santa Sé.

859 2. Os objetivos, o da Igreja, na sua missão de natureza religiosa e espiritual, e o do Estado, apesar de distintos, confluem num ponto de convergência: o bem da pessoa humana e o bem comum da Nação. Mas, como o meu Venerável Predecessor, o Papa João Paulo II, quis referir em certa ocasião "o entendimento respeitoso, a preocupação de independência mútua e o princípio de servir melhor o homem, dentro de uma concepção cristã, serão fatores de concórdia cujo beneficiário será o próprio povo" (Discurso ao Presidente do Brasil, 14 de outubro de 1991, 2). O Brasil é um país que conserva na sua grande maioria a fé cristã legada, desde as origens do seu povo, pela evangelização plantada há mais de 5 séculos.

Desta forma, apraz-me considerar a convergência de princípios, tanto da Sé Apostólica quanto do seu Governo, no que diz respeito às ameaças à Paz mundial, quando esta se vê afetada pela ausência da visão de respeito ao próximo em sua dignidade humana. O recente conflito no Oriente-Médio prova a necessidade de apoiar todas as iniciativas destinadas a resolver pacificamente as divergências havidas, e faço votos por que o vosso Governo prossiga nesta direção. Por outro lado, desejo reiterar aqui a esperança de que, de conformidade com os princípios que zelam pela dignidade humana, dos quais o Brasil sempre se fez paladino, se continuem a fomentar e divulgar os valores humanos fundamentais, sobretudo quando se trata de reconhecer de maneira explícita a santidade da vida familiar e a salvaguarda do nascituro, desde o momento da sua concepção até o seu termo natural. Pari passu, no que diz respeito às experiências biológicas, a Santa Sé vem promovendo incontinenti a defesa de uma ética que não deturpe e proteja a existência do embrião e o seu direito de nascer.

3. Vejo com satisfação que a Nação brasileira vem-se tornando, num clima de acentuada prosperidade, um fator de estímulo ao desenvolvimento em áreas limítrofes e em vários países do Continente africano. Em clima de solidariedade e de mútuo entendimento, o Governo procura apoiar iniciativas destinadas a favorecer a luta contra a pobreza e o despreparo tecnológico, tanto a nível nacional como internacional.

Por outro lado, a política de redistribuição da renda interna tem facilitado um maior bem-estar entre a população; neste sentido, faço votos por que se prossiga estimulando uma melhor distribuição da renda, e se fortaleça uma maior justiça social para o bem da população. Cabe ressaltar, porém, que, para além da pobreza material, incide de maneira relevante a pobreza moral que grassa pelo mundo afora, inclusive ali onde não se carece de bens materiais. De fato, o perigo do consumismo e do hedonismo, aliado à falta de sólidos princípios morais que norteiem a vida do simples cidadão, torna vulnerável a estrutura da sociedade e da família brasileira. Por isso, nunca é demais insistir na urgência de uma sólida formação moral a todos os níveis, inclusive no âmbito político, face às constantes ameaças geradas pelas ideologias materialistas ainda reinantes e, particularmente, à tentação da corrupção na gestão do dinheiro público e privado. A esta finalidade, o cristianismo pode proporcionar uma válida contribuição - como eu quis afirmar recentemente - por ser “uma religião de liberdade e de paz e está ao serviço do verdadeiro bem da humanidade” (Audiência ao Corpo Diplomático, 8 de Janeiro de 2009). É na esteira destes valores que a Igreja continua oferecendo este serviço de profundo valor evangélico que favoreça a consecução da paz e da justiça entre todos os povos.

4. O recente Acordo no qual se define o estatuto jurídico civil da Igreja Católica no Brasil e se regulam as matérias de mútuo interesse entre ambas as Partes são sinais significativos desta sincera colaboração que a Igreja deseja manter, dentro da sua missão própria, com o vosso Governo. Exprimo neste sentido a esperança por que esse Acordo, como já tive ocasião de assinalar “facilite o livre exercício da missão evangelizadora da Igreja e fortaleça ainda mais a sua colaboração com as instituições civis para o desenvolvimento integral da pessoa” (Audiência cit.). A fé e a adesão a Jesus Cristo impõem aos fiéis católicos, também no Brasil, tornarem-se instrumentos de reconciliação e de fraternidade, na verdade, na justiça e no amor. Faço votos, assim sendo, de ver ratificado este Documento solene a fim de que a organização eclesiástica da vida entre os católicos veja-se agilizada e alcance alto grau de eficiência.

Senhor Embaixador,

antes de concluir este encontro, reitero o pedido de transmitir ao Senhor Presidente da República os meus melhores votos de felicidades e de paz. E quero dizer a Vossa Excelência que pode contar com a estima, a boa acolhida e o apoio desta Sé Apostólica no desempenho da sua missão, que lhe desejo feliz e fecunda de frutos e de alegrias. O meu pensamento vai, nesta hora, para todos os brasileiros e para quantos conduzem os seus destinos. A todos desejo felicidades, em crescente progresso e harmonia. Estou certo de que o Senhor se fará intérprete destes meus sentimentos e esperanças junto ao mais Alto Mandatário da Nação. Por intercessão de Nossa Senhora Aparecida, imploro para a sua pessoa, para seu mandato e para seus familiares, assim como para todos os amados brasileiros, copiosas bênçãos de Deus Todo Poderoso.



MEMÓRIA LITÚRGICA DA BEM-AVENTURADA

VIRGEM MARIA DE LOURDES

XVII DIA MUNDIAL DO DOENTE

PALAVRAS

DURANTE O ENCONTRO COM OS DOENTES

Basílica de São Pedro

Quarta-feira, 11 de Fevereiro de 2009




Queridos doentes
Amados irmãos e irmãs!

860 Este nosso encontro assume um singular valor e significado: ele tem lugar por ocasião do Dia Mundial do Doente, que se celebra hoje, memória da Bem-Aventurada Virgem de Lourdes. O meu pensamento dirige-se para aquele Santuário onde também eu fui, por ocasião do 150º aniversário das aparições a Santa Bernadete; e conservo uma viva recordação daquela peregrinação, que se focaliza em particular sobre o contacto que pude ter com os doentes reunidos junto da Gruta de Massabielle. Vim de bom grado saudar-vos na conclusão da Celebração eucarística, presidida pelo Cardeal Javier Lozano Barragán, Presidente do Pontifício Conselho para a Pastoral da Saúde, ao qual dirijo o meu cordial pensamento. Juntamente com ele saúdo os Prelados, os sacerdotes, os religiosos e as religiosas, os voluntários, os peregrinos, sobretudo os queridos doentes e quantos deles se ocupam quotidianamente. É sempre emocionante reviver nesta circunstância aqui, na Basílica de São Pedro, aquele clima típico de oração e de espiritualidade mariana que caracteriza o Santuário de Lourdes. Portanto, obrigado por esta vossa manifestação de fé e de amor a Maria; obrigado a quantos a promoveram e organizaram, em particular a UNITALSI e a "Obra Romana de Peregrinações".

Este dia convida a fazer ouvir com maior intensidade aos doentes a proximidade espiritual da Igreja, a qual, como escrevi na Encíclica Deus caritas est, é a família de Deus no mundo, no âmbito da qual ninguém deve sofrer por falta do necessário (cf. n. 25 b). Ao mesmo tempo, é-nos dada hoje a ocasião de reflectir sobre a experiência da doença, do sofrimento, e mais em geral sobre o sentido da vida a realizar plenamente também quando é sofredora. Na mensagem para a hodierna celebração quis colocar em primeiro plano as crianças doentes, que são as criaturas mais frágeis e indefesas. É verdade! Se já permanecemos sem palavras diante de um adulto que sofre, o que dizer quando o mal atinge um pequenino inocente? Como sentir também em situações tão difíceis o amor misericordioso de Deus, que nunca abandona os seus filhos na provação?

São frequentes e por vezes preocupantes estas interrogações, que na verdade a nível simplesmente humano não encontram respostas adequadas, porque o sofrimento, a doença e a morte permanecem, no seu significado, insondáveis para a nossa mente. Mas vem-nos em ajuda a luz da fé. A Palavra de Deus revela-nos que também estes doentes são misteriosamente "abraçados" pelo desígnio divino de salvação; a fé ajuda-nos a considerar a vida humana bela e digna de ser vivida em plenitude mesmo quando é debilitada pelo mal. Deus criou o homem para a felicidade e para a vida, enquanto a doença e a morte entraram no mundo como consequência do pecado. Mas o Senhor não nos abandonou a nós mesmos; Ele, o Pai da vida, é o médico por excelência do homem e não deixa de inclinar-se amorosamente sobre a humanidade sofredora. O Evangelho mostra Jesus que "afasta os espíritos e cura quantos estão doentes" (
Mt 8,16), indicando o caminho da conversão e da fé como condições para obter a cura do corpo e do espírito. Com a sua paixão e morte Ele assumiu e transformou profundamente a nossa debilidade. Eis por que segundo quanto escreveu o Servo de Deus João Paulo II na Carta apostólica Salvifici doloris "sofrer significa tornar-se particularmente susceptíveis, particularmente abertos à obra das forças salvíficas de Deus, oferecidas à humanidade em Cristo" (n. 23).

Queridos irmãos e irmãs, cada vez mais damo-nos conta de que a vida do homem não é um bem disponível, desde o momento do seu início até ao seu fim último e natural. A vida é mistério que em si mesma exige responsabilidade, amor, paciência, caridade, da parte de todos e de cada um. É necessário ainda mais circundar de cuidados e respeito quem é doente e sofredor. Isto nem sempre é fácil; mas sabemos onde ir buscar a coragem e a plenitude para enfrentar as vicissitudes da existência terrena, em particular as doenças e todos os tipos de sofrimento. Para nós, cristãos, é em Cristo que se encontra a resposta para o enigma do sofrimento e da morte. A participação na Santa Missa, como vós acabastes de fazer, imerge-nos no mistério da sua morte e ressurreição. Cada celebração eucarística é o memorial perene de Cristo crucificado e ressuscitado, que derrotou o poder do mal com a omnipotência do seu amor. É portanto na "escola" do Cristo eucarístico que nos é concedido aprender a amar sempre a vida e a aceitar a nossa aparente incapacidade perante a doença e a morte.

O meu venerado predecessor João Paulo II quis que o Dia Mundial do Doente coincidisse com a festa da Virgem Imaculada de Lourdes. Naquele lugar sagrado, a nossa Mãe celeste veio recordar-nos que estamos nesta terra só de passagem e que a habitação verdadeira e definitiva do homem é o Céu. Devemos tender todos para essa meta. A luz do "Alto" nos ajude a compreender e a dar sentido e valor também à experiência do sofrer e do morrer. Pedimos a Nossa Senhora que volte o seu olhar materno sobre cada doente e sobre a família, a fim de os ajudar a carregar com Cristo o peso da cruz. Confiemos a ela, Mãe da humanidade, os pobres, os sofredores, os doentes do mundo inteiro, com um pensamento especial para as crianças que sofrem. Com estes sentimentos encorajo-vos a confiar sempre no Senhor e de coração vos abençoo a todos.






Discursos Bento XVI 855