Discursos Bento XVI 860

AO SENHOR TIMOTHY ANDREW FISCHER

NOVO EMBAIXADOR DA AUSTRÁLIA JUNTO DA SANTA SÉ Sexta-feira, 12 de Fevereiro de 2009



Senhor Embaixador

É com particular prazer que o recebo no Vaticano e que aceito as Cartas Credenciais mediante as quais Vossa Excelência é designado Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da Austrália junto da Santa Sé. Pedir-lhe-ia a amabilidade de transmitir à Governadora-Geral, Sr. Quentin Bryce, ao governo e ao povo da sua nação a minha gratidão pelas suas saudações. Com memórias vivas da minha recente visita ao seu maravilhoso país, asseguro-lhe as minhas orações pelo bem-estar da nação e, de modo particular, desejo transmitir as minhas condolências aos indivíduos e famílias enlutados que, em Vitória, perderam os seus entes queridos nos recentes incêndios nos bosques.

A nomeação de Vossa Excelência como primeiro Embaixador residente da Austrália junto da Santa Sé marca uma fase nova e feliz nas nossas relações diplomáticas e oferece uma oportunidade para aprofundar a compreensão recíproca e para aumentar a nossa colaboração, já significativa. O compromisso da Igreja na sociedade civil está alicerçado na sua convicção de que o progresso humano tanto individual como comunitário depende do reconhecimento da vocação sobrenatural que é própria de cada pessoa. É de Deus que os homens e as mulheres recebem a sua dignidade essencial (cf. Gn 1,27) e a capacidade de procurar a verdade e a bondade. Nesta vasta perspectiva, podemos confrontar-nos com tendências para o pragmatismo e o consequencialismo, hoje tão predominantes, que só se preocupam com os sintomas e os efeitos dos conflitos, da fragmentação social e da ambiguidade moral, e não com as suas raízes. Quando se evidencia a dimensão espiritual da humanidade, os corações e as mentes dos indivíduos aproximam-se de Deus e das maravilhas da vida humana: sermos nós mesmos, a verdade, a beleza, os valores morais e as outras pessoas. Deste modo pode-se encontrar um fundamento sólido para unir a sociedade e sustentar uma visão de esperança.

A Jornada Mundial da Juventude, foi um acontecimento de importância singular para a Igreja universal e para a Austrália. Ecos de apreço continuam a ressoar no interior da sua nação e no mundo inteiro. Sobretudo, cada Jornada Mundial da Juventude constitui um acontecimento espiritual: um momento em que os jovens, entre os quais nem todos estão intimamente associados à Igreja, encontram Deus numa intensa experiência de oração, aprendizado e escuta, chegando assim a experimentar a fé em acção. Como Vossa Excelência observou, os próprios residentes de Sidney foram inspirados pela alegria simples dos peregrinos. Rezo a fim de que esta jovem geração de cristãos na Austrália e no mundo inteiro canalize o seu entusiasmo para tudo aquilo que é verdadeiro e bom em vista de forjar amizades para além das divisões e criar lugares de fé viva no e para o nosso mundo, cenários de esperança e de caridade prática.

Senhor Embaixador, a diversidade cultural contribui com muita riqueza para o tecido social da Austrália hoje. Durante décadas, este mosaico foi ofuscado pelas injustiças tão arduamente padecidas pelas populações indígenas. Mediante o pedido de perdão oferecido no ano passado pelo Primeiro-Ministro Rudd, afirmou-se uma profunda transformação do coração. Agora, renovados no espírito de reconciliação, tanto as agências governamentais como os anciãos aborígenes podem enfrentar com resolução e compaixão a vasta gama de desafios que se lhes apresentam. Mais um exemplo do desejo do seu Governo de promover o respeito e a compreensão entre as culturas é o seu esforço louvável para facilitar o diálogo e a cooperação inter-religiosos, tanto no país como na região. Tais iniciativas ajudam a preservar as heranças culturais, alimentam a dimensão pública da religião e fomentam os próprios valores sem os quais o coração da sociedade cívica desvaneceria depressa.

861 A actividade diplomática da Austrália no Pacífico, na Ásia e mais recentemente na África é multifacetada e crescente. O apoio activo da nação aos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, as numerosas parcerias regionais, as iniciativas para fortalecer o Tratado de não-proliferação nuclear e a profunda preocupação pelo justo desenvolvimento económico são bem conhecidos e respeitados.

E enquanto as sombras e as luzes da globalização pairam sobre o nosso mundo de maneiras cada vez mais complexas, a sua nação dá demonstrações de que está pronta para responder à crescente variedade de exigências de forma inovativa, responsável e coerente. Entre estas, não são menos graves as ameaças que incumbem sobre a criação de Deus através da mudança climática. Talvez mais do que nunca na nossa história humana, a relação fundamental entre o Criador, a Criação e a Criatura precisa de ser ponderada e respeitada. Deste reconhecimento podemos descobrir um código ético comum, formado por normas arraigadas na lei natural inscrita pelo Criador no coração de cada ser humano.

Na minha mensagem para o Dia Mundial da Paz do corrente ano chamei a atenção de modo particular para a necessidade de uma abordagem ética da criação de cooperações positivas entre os mercados, a sociedade civil e os Estados (cf. n. 12). A este propósito, observo com interesse a determinação com que o Governo australiano estabelece relações de cooperação alicerçadas nos valores da justiça, do bom governo e do sentido de uma vizinhança regional. Uma instância genuinamente ética encontra-se no cerne de toda a política de desenvolvimento responsável, respeitosa e socialmente abrangente. É a ética que torna imperativa uma resposta compassiva e generosa à pobreza; que torna urgente o sacrifício dos interesses proteccionistas em vista de uma justa acessibilidade dos países mais pobres aos mercados desenvolvidos, assim como torna razoável a insistência das nações doadoras sobre a responsabilidade e a transparência na utilização da ajuda financeira por parte das nações receptoras.

Por sua vez, a Igreja tem uma longa tradição no campo da assistência à saúde, onde salienta uma abordagem ética das necessidades particulares de cada indivíduo. Especialmente nas nações mais pobres, as ordens religiosas e as organizações eclesiais inclusive muitos missionários australianos patrocinam e oferecem funcionários a uma vasta rede de hospitais e clínicas, muitas vezes em áreas remotas onde os Estados foram incapazes de servir o seu próprio povo. Particularmente solícita é a oferta de cuidados médicos às famílias, inclusive a cura obstétrica de alta qualidade às mulheres. No entanto, como é irónico, quando alguns grupos, através de programas de ajuda, promovem o aborto como uma forma de assistência médica "maternal": eliminar uma vida para, por assim dizer, melhorar a qualidade da vida.

Excelência, estou persuadido de que a sua nomeação há-de fortalecer os vínculos de amizade que já existem entre a Austrália e a Santa Sé. Ao exercer as suas novas responsabilidades, Vossa Excelência encontrará a diversificada gama de departamentos da Cúria Romana pronta para o assistir no cumprimento dos seus deveres. Sobre o Senhor Embaixador e a sua família, juntamente com os seus compatriotas, invoco do íntimo do coração as abundantes bênçãos de Deus Todo-Poderoso.




À CONFERÊNCIA DOS PRESIDENTES DAS ORGANIZAÇÕES JUDAICO-AMERICANAS MAIORES Quinta-feira, 12 de Fevereiro de 2009

Queridos amigos

Estou contente por receber hoje todos vós, e agradeço ao Rabino Arthur Schneier e ao Senhor Alan Solow os cumprimentos que me dirigiram em vosso nome. Recordo bem as várias ocasiões, durante a minha visita aos Estados Unidos no ano passado, quando pude encontrar alguns de vós em Washington, D.C. e Nova Iorque. O Rabino Schneier, recebeu-me atenciosamente na sinagoga de Park East algumas horas antes da vossa celebração da Pesah.Agora, estou feliz por ter esta ocasião para vos oferecer a minha hospitalidade aqui na minha casa. Encontros como este dão-nos a possibilidade de demonstrar o nosso respeito uns pelos outros. Gostaria que saibais que sois todos muito bem-vindos aqui hoje na casa de Pedro, a casa do Papa.

Olho para o passado com gratidão pelas várias oportunidades que tive ao longo de muitos anos de passar algum tempo na companhia dos meus amigos judeus. As minhas visitas às vossas comunidades em Washington e Nova Iorque, embora breves, foram experiências de estima fraterna e amizade sincera. Assim foi também a minha visita à sinagoga de Colónia, a primeira visita deste tipo no meu pontificado. Para mim foi muito comovedor passar aqueles momentos com a comunidade judia na cidade que tão bem conheço, que hospedou a primeira colónia judia na Alemanha e cujas origens remontam ao tempo do Império Romano.

Um ano depois, em Maio de 2006, visitei o campo de concentração de Auschwitz-Birkenau. Que palavras podem exprimir de modo adequado aquela experiência profundamente comovedora? Enquanto entrava naquele lugar de horror, cenário de indizível sofrimento, meditei sobre os inúmeros prisioneiros, tantos deles judeus, que percorreram a mesma vereda para o cativeiro em Auschwitz e em todos os outros campos de concentração. Aqueles filhos de Abraão, atingidos pela dor e degradados, tinham pouco onde apoiar-se além da própria fé no Deus dos seus pais, a fé que nós cristãos partilhamos convosco, nossos irmãos e irmãs. Como podemos começar a compreender a crueldade que ocorreu naquelas prisões infames? Toda a raça humana se envergonha profundamente da brutalidade selvagem mostrada para com o vosso povo naquela época. Permiti relembrar o que disse naquela triste ocasião: "Os poderosos do Terceiro Reich queriam esmagar o povo judeu na sua totalidade, eliminá-lo do elenco dos povos da terra. Então as palavras do Salmo: "Estamos todos os dias expostos à morte, tratam-nos como ovelhas para o matadouro", verificaram-se de modo terrível".

O nosso encontro hoje realiza-se no contexto da vossa visita à Itália simultaneamente à vossa Leadership Mission anual a Israel. Também eu me estou a preparar para visitar Israel, a terra que é santa para os cristãos assim como para os judeus, dado que as raízes da nossa fé se encontram ali. De facto, a Igreja extrai o seu sustento da raiz daquela boa oliveira, o povo de Israel, sob o qual foram enxertados os ramos de oliveira selvagem dos gentios (cf. Rm 11,17-24). Desde os primórdios do cristianismo, a nossa identidade e cada aspecto da nossa vida e de culto estão intimamente ligados à antiga religião dos nossos pais na fé.

862 A bimilenária história da relação entre o judaísmo e a Igreja atravessou muitas fases diversas, muitas dolorosas ao serem recordadas. Agora que nos podemos encontrar num espírito de reconciliação, não devemos permitir que as dificuldades do passado nos abstenham de estender recíprocamente a mão da amizade. De facto, que família nunca atravessou tensões de um tipo ou de outro? A Declaração Nostrae aetate do Concílio Vaticano ii foi uma pedra angular no caminho rumo à reconciliação, e claramente delineou os princípios que desde então governam a atitude da Igreja nas relações entre cristãos e judeus. A Igreja está profunda e irrevocavelmente comprometida em rejeitar toda a forma de anti-semitismo e a continuar a construir relações boas e duradouras entre as nossas duas comunidades. Se existe uma imagem em particular que expressa este compromisso, é o momento em que o meu amado predecessor Papa João Paulo II permaneceu junto do Muro Ocidental em Jerusalém, implorando o perdão de Deus depois de toda uma série de injustiças que o povo judeu tinha sofrido. Agora, faço minha a sua oração: "Deus dos nossos pais, Vós escolhestes Abraão e a sua descendência para levarem o vosso Nome aos gentios: sentimo-nos profundamente consternados pelo comportamento de quantos, no decurso da história, fizeram sofrer estes vossos filhos e, pedindo-Vos perdão, queremos empenhar-nos numa fraternidade autêntica com o povo da aliança. Por Cristo nosso Senhor" (26 de Março de 2000).

O ódio e o desprezo pelos homens, mulheres e crianças manifestados no Shoah foram crimes contra Deus e contra a humanidade. Isto deveria ser claro para todos, especialmente para aqueles que pertencem à tradição das Sagradas Escrituras, segundo as quais cada ser humano é criado à imagem e semelhança de Deus (cf.
Gn 1,26-27). É óbvio que qualquer negação ou minimização deste terrível crime é intolerável e totalmente inaceitável. Recentemente, numa audiência geral, confirmei que o Shoah deveria ser "para todos uma admoestação contra o esquecimento, a negação e o reducionismo, por que a violência feita contra um só ser humano é violência contra todos" (28 de Janeiro de 2009).

Este capítulo terrível da nossa história jamais deverá ser esquecido. A lembrança como justamente se diz é memoria futuri, uma admoestação a nós para o futuro, e uma convocação para lutar pela reconciliação. Lembrar significa fazer todo o possível para prevenir qualquer repetição desta catástrofe na família humana através da construção de pontes de amizade duradoura. Rezo com fervor por que a memória deste terrível crime reforce a nossa determinação para curar as feridas que por muito tempo mancharam as relações entre cristãos e judeus. É meu sincero desejo que a amizade da qual agora desfrutamos cresça cada vez mais forte para que o irrevocável empenho da Igreja por relações respeitosas e harmoniosas com o povo da Aliança produza frutos em abundância.

PALAVRAS

POR OCASIÃO DO CONCERTO PELOS 80 ANOS

DO ESTADO DA CIDADE DO VATICANO Quinta-feira, 12 de Fevereiro de 2009



Senhores Cardeais
Venerados Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
Ilustres Senhores e Senhoras

No final desta bonita tarde, estou feliz por dirigir uma cordial saudação a todos vós, que participastes no concerto promovido por ocasião do 80º aniversário de fundação do Estado da Cidade do Vaticano. Saúdo as Autoridades religiosas, civis e militares, as ilustres Personalidades, com um pensamento especial para os Prelados da Cúria Romana e os colaboradores dos vários departamentos do Governatorato do Vaticano aqui reunidos para recordar, também com esta iniciativa, uma celebração tão significativa. Desejo sobretudo manifestar a minha gratidão ao Senhor Cardeal Giovanni Lajolo, Presidente da Comissão para o Estado da Cidade do Vaticano, a quem estou grato inclusive pelas expressões de carinho e devoção, que me dirigiu no início do concerto. Estendo a minha saudação ao Secretário-Geral, D. Renato Boccardo, bem como aos outros responsáveis do Governatorato e exprimo o meu reconhecimento naturalmente a todos aqueles que cooperaram de vários modos para a organização e a realização deste acontecimento musical.

Persuadido de que estou a interpretar os sentimentos de todos os presentes, desejo dirigir uma especial palavra de agradecimento e de apreço aos componentes da RTE Concert Orchestra (Orquesta da Radiotelevisão Irlandesa), aos coristas da Our Lady's Choral Society, de Dublim, ao Director Proinnsias O Duinn, ao Maestro do Coro Paul Ward e aos solistas. Desejo reservar uma breve saudação à numerosa representação de fiéis de Dublim, vindos para acompanhar o Coral da sua Cidade.

Foi-nos oferecida a execução de trechos do célebre oratório Messiah de Georg Friedrich Händel, capaz de criar uma fascinante atmosfera espiritual, graças a uma rica antologia de textos sagrados do Antigo e do Novo Testamento, que constituem como que o tecido de toda a partitura musical. A Orquestra e o Coro conseguiram igualmente evocar de maneira admirável a figura do Messias, de Cristo, à luz das profecias messiânicas veterotestamentárias. Assim, a riqueza do contraponto musical e a harmonia do canto ajudaram-nos a contemplar o intenso e arcano mistério da fé cristã. Mais uma vez, parece evidente como a música e o canto, graças ao seu hábil entrelaçamento com a fé, podem revestir um exímio valor pedagógico no âmbito religioso. A música, como arte, pode ser um modo particularmente grandioso de anunciar Cristo, uma vez que consegue tornar perceptível o seu mistério com uma eloquência inteiramente sua.

863 Este concerto, com que se tencionava fazer memória de um aniversário significativo para o Estado da Cidade do Vaticano, insere-se no programa do Congresso organizado para esta circunstância, sobre o tema: "Um pequeno território para uma grande missão". Sem dúvida, não é este o momento para um discurso a respeito de tal acontecimento histórico, ao qual diversos especialistas estão a oferecer no Congresso a contribuição da sua competência, sob inúmeros aspectos. Além disso, terei a oportunidade de me encontrar com os participantes destes dias de estudo no próximo sábado, e de lhes dirigir a minha palavra. Também nesta circunstância, faço questão de agradecer a quantos contribuíram para tornar solene uma celebração tão significativa para a Igreja católica. Comemorando os oitenta anos da Civitas Vaticana, sente-se a necessidade de reconhecer o mérito daqueles que foram e são os protagonistas destas oito décadas de história de um pequeno espaço de terra. Em primeiro lugar, gostaria de recordar o protagonista principal, o meu venerado Predecessor Pio XI. Ao anunciar a assinatura dos Pactos lateranenses e sobretudo a constituição do Estado da Cidade do Vaticano, ele desejou referir-se a São Francisco de Assis. Disse que a nova realidade soberana era, para a Igreja como também para o Pobrezinho, "aquele tanto de corpo que era suficiente para conservar unida a alma" (cf. Discurso de 11 de Fevereiro de 1929). Peçamos ao Senhor, que orienta solidamente a sorte da "Barca de Pedro" no meio das vicissitudes nem sempre tranquilas da história, que continue a velar sobre este pequeno Estado. Peçamos-lhe, principalmente, que assista com o poder do seu Espírito Aquele que está ao timão da Barca, o Sucessor de Pedro, a fim de que possa desempenhar com fidelidade e eficazmente o seu ministério, como fundamento da unidade da Igreja católica, que possui no Vaticano o seu centro visível e que se espalha até aos confins do mundo. Confio esta oração à intercessão de Maria, Virgem Imaculada e Mãe da Igreja, e enquanto renovo em nome dos presentes um cordial agradecimento aos idealizadores desta tarde, aos valorosos membros da orquestra, aos cantores, de maneira particular aos solistas, asseguro a cada um uma recordação na oração e, sobre todos, imploro a Bênção de Deus.




AOS BISPOS DA NIGÉRIA EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM» Sábado, 14 de Fevereiro de 2009



Queridos irmãos Bispos

É com grande alegria que vos recebo, Bispos da Nigéria, por ocasião da vossa visita ad limina aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo. Como Sucessor de Pedro, alegro-me por este encontro que fortalece os nossos vínculos de comunhão e de amor fraterno, permitindo-nos renovar em conjunto a sagrada responsabilidade que exercemos na Igreja. Estou grato ao Arcebispo Job pelas amáveis palavras que me dirigiu em vosso nome. Quanto a mim, estou feliz por expressar os meus sentimentos de respeito e de gratidão a vós e a todos os fiéis da Nigéria.

Irmãos, desde a vossa última visita ad limina, o Deus Todo-Poderoso abençoou com um crescimento generoso a Igreja que está no vosso país. Isto é especialmente visível no número de novos cristãos que receberam Cristo nos seus corações e aceitaram jubilosamente a Igreja como "coluna e sustentáculo da verdade" (1Tm 3,15). As abundantes vocações sacerdotais e religiosas constituem também um sinal preclaro da obra do Espírito no meio de vós. Por estas bênçãos, dou graças a Deus e manifesto o meu apreço a vós e aos presbíteros, aos religiosos, às religiosas e aos catequistas que têm trabalhado na vinha do Senhor.

A expansão na Igreja exige uma atenção especial no delineamento diocesano e na formação das pessoas através de actividades permanentes de formação para facilitar o aprofundamento necessário da fé do vosso povo (cf. Ecclesia in Africa ). Dos vossos relatórios vejo que estais bem conscientes dos passos fundamentais necessários: o ensino da arte da oração, o encorajamento da participação na liturgia e nos sacramentos, a pregação sábia e relevante, a instrução catequética e a orientação espiritual e moral. A partir deste fundamento, a fé floresce na virtude cristã e faz nascer paróquias vibrantes e um serviço generoso à comunidade mais vasta. Vós mesmos, juntamente com os vossos presbíteros, deveis orientar com humildade, desapego das ambições mundanas, oração, obediência à vontade de Deus e transparência no governo. Deste modo, tornais-vos um sinal de Cristo Bom Pastor.

A celebração da liturgia constitui uma fonte privilegiada de renovação na vida cristã. Elogio-vos nos vossos esforços por manter o equilíbrio adequado entre os momentos de contemplação e os gestos externos de participação e de alegria no Senhor. Com esta finalidade, há que prestar atenção à formação litúrgica dos sacerdotes e evitar excessos alheios. Continuai ao longo deste caminho, tendo em mente que o diálogo de amor e veneração do Senhor é ressalvado em grande medida pela prática da adoração eucarística nas paróquias, nas comunidades religiosas e noutros lugares oportunos (cf. Sacramentum caritatis, 67).

O próximo Sínodo dos Bispos para a África abordará, entre outros temas, a questão da agitação étnica. A maravilhosa imagem da Jerusalém celestial, a congregação de inúmeros homens e mulheres de todas as tribos, línguas e nações, que foram resgatados pelo sangue de Cristo (cf. Ap 5,9), encoraja-vos a a enfrentar o desafio do conflito étnico onde quer que se manifeste, mesmo no interior da Igreja. Expresso o meu apreço àqueles de vós que aceitaram uma missão pastoral fora dos limites do vosso próprio grupo regional ou linguístico, e agradeço aos sacerdotes e às pessoas que vos acolheram e ajudaram. A vossa prontidão a adaptar-vos aos outros é um sinal eloquente de que, como nova família de todos os que acreditam em Cristo (cf. Mc 3,31-35), na Igreja não há lugar para qualquer tipo de divisão. É necessário ensinar os catecúmenos e os neófitos a aceitar esta verdade, enquanto eles assumem o compromisso de Cristo e de uma vida de amor cristão. Todos os fiéis, especialmente os seminaristas e os sacerdotes, hão-de crescer em maturidade e generosidade, permitindo que a mensagem do Evangelho purifique e ultrapasse qualquer limite das perspectivas locais.

A selecção sábia e ponderada dos seminaristas é vital para o bem-estar espiritual do vosso país. A sua formação pessoal deve ser garantida através da direcção espiritual regular, da reconciliação sacramental, da oração e da meditação sobre a Sagrada Escritura. Na palavra de Deus, os seminaristas e os presbíteros hão-de encontrar os valores que distinguem o bom sacerdote que se consagra ao Senhor no corpo e no espírito (cf. 1Co 7,34). Eles aprenderão a servir com desapego pessoal e caridade pastoral aqueles que forem confiados aos seus cuidados, fortalecidos pela graça que há em Jesus Cristo (cf. 2 Tm 2, 1).

Gostaria de salientar a tarefa do Bispo, que consiste em apoiar a importante realidade social e eclesial da vida matrimonial e familiar. Com a cooperação de sacerdotes e leigos bem preparados, de peritos e cônjuges, haveis de exercer com responsabilidade e zelo a vossa solicitude nesta área de prioridade pastoral (cf. Familiaris consortio FC 73). Cursos para noivos e o ensinamento catequético geral e específico sobre o valor da vida humana, do matrimónio e da família hão-de fortalecer os vossos fiéis leigos para enfrentar os desafios que lhes são apresentados pelas mudanças na sociedade. Analogamente, não deixeis de encorajar as associações ou os movimentos que, validamente, assistem os cônjuges a viverem os seus compromissos de fé e de vida matrimonial.

Como um importante serviço à nação, tendes assumido o vosso compromisso no diálogo inter-religioso, de forma especial com o islão, onde com paciência e perseverança, estão a ser instaurados fortes relacionamentos de respeito, de amizade e de cooperação prática com pessoas de outras religiões. Através dos vossos esforços, como promotores de boa vontade diligentes e incansáveis, a Igreja tornar-se-á um sinal e um instrumento mais claros de comunhão com Deus e da unidade de toda a raça humana (cf. Lumen gentium LG 1).

864 O vosso compromisso em vista de haurir dos princípios católicos, comentários iluminados a respeito dos problemas nacionais correntes é muito apreciado. A lei natural, inscrita pelo Criador no coração de cada ser humano (cf. Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2009, n. 8), e o Evangelho, propriamente entendido e aplicado às realidades cívicas e políticas, não reduzem de maneira alguma a série de opções políticas válidas. Pelo contrário, eles constituem uma garantia oferecida a todos os cidadãos de uma vida de liberdade, com respeito pela sua dignidade de pessoas, e salvaguarda contra a manipulação ideológica e o abuso, baseados na lei do mais forte (cf. Discurso na sessão plenária da Comissão teológica internacional, 5 de Dezembro de 2008). Com confiança no Senhor, continuai a exercer a vossa autoridade episcopal na porfia contra práticas injustas e corrupção, e contra todas as causas e formas de discriminação e criminalidade, de modo especial o tratamento degradador das mulheres e a prática deplorável dos raptos. Promovendo a Doutrina Social da Igreja, ofereceis a vossa contribuição leal para o vosso país e participais na consolidação de uma ordem nacional alicerçada na solidariedade e numa cultura dos direitos humanos.

Meus queridos Bispos, exorto-vos com as palavras do Apóstolo Paulo: "Estai vigilantes, permanecei firmes na fé, sede corajosos e fortes. Que entre vós tudo se faça com amor" (
1Co 16,13-14). Peço-vos que comuniqueis as minhas saudações ao vosso amado povo, especialmente aos numerosos fiéis que dão testemunho de Cristo na esperança, através da oração e do sofrimento (cf. Spe salvi ). Transmiti o meu caloroso afecto tam bém àqueles que servem na família, nas paróquias e nas estações missionárias, nos campos da educação, da assistência à saúde e nos sectores da caridade cristã. Enquanto vos confio, bem como aqueles que foram confiados à vossa solicitude pastoral, à intercessão do Beato Cyprian Michael Iwene Tansi e à salvaguarda maternal de Maria, Mãe da Igreja, concedo-vos cordialmente a minha Bênção Apostólica.




AOS PARTICIPANTES DO CONGRESSO PROMOVIDO POR OCASIÃO DO 80ªºANIVERSÁRIO DA FUNDAÇÃO DO ESTADO DA CIDADE DO VATICANO Sala Clementina, 14 de Fevereiro de 2009



Senhores Cardeais
Venerados Irmãos no Episcopado
e no Sacerdócio
Gentis Senhores e Senhoras!

No final desta agradável circunstância, sinto-me feliz por dirigir uma cordial saudação a todos vós, que participastes no congresso promovido por ocasião do 80º aniversário da fundação do Estado da Cidade do Vaticano. "Um pequeno território para uma grande missão" foi o tema sobre o qual a vossa atenção se deteve, reflectindo juntos sobre o valor espiritual e civil que este pequeno Estado soberano assume, colocado totalmente ao serviço da grande missão confiada por Jesus Cristo ao apóstolo Pedro e aos seus Sucessores. Agradeço ao Senhor Cardeal Giovanni Lajolo não só a saudação que me dirigiu em vosso nome, mas também o compromisso que ele e os seus colaboradores do Governatorato prodigalizaram para solenizar a meta significativa dos oitenta anos de existência e de actividade do Estado do Vaticano.

Expresso vivo aprazimento pelas celebrações e pelas diversas iniciativas comemorativas destes dias, destinadas a fazer conhecer melhor a história e a fisionomia da Civitas Vaticana. Ela, oitenta anos depois da sua fundação, constitui uma realidade pacificamente adquirida, mesmo se nem sempre bem compreendida nas suas razões de ser e nas multíplices tarefas que é chamada a desempenhar. Quem trabalha quotidianamente ao serviço da Santa Sé ou quem vive na Cidade dá por certo que existe no coração de Roma um pequeno Estado soberano, mas nem todos sabem que ele é fruto de um processo histórico bastante atormentado, que tornou possível a sua constituição, motivada por outros ideais de fé e por clarividente consciência das finalidades que devia satisfazer. Poderíamos assim dizer que a celebração, que justifica o nosso encontro de hoje, convida a olhar com mais viva consciência para o que o Estado da Cidade do Vaticano significa e é.

Quando se volta com a memória ao dia 11 de Fevereiro de 1929, não se pode deixar de pensar de novo com profundo reconhecimento naquele que dos Pactos Lateranenses foi o primeiro e principal artífice e protagonista, o meu venerado Predecessor Pio XI: foi o Papa da minha infância, para o qual olhamos com tanta veneração e amor. Justamente nestes dias o seu nome ressoou várias vezes, porque ele foi com lúcida clarividência e vontade indómita o verdadeiro fundador e o primeiro construtor do Estado da Cidade do Vaticano. De resto, os estudos históricos ainda a decorrer sobre o pontificado fazem-nos compreender cada vez mais a grandeza do Papa Ratti, o qual guiou a Igreja nos anos difíceis entre as duas guerras mundiais. Com mão firme ele deu grande impulso à acção eclesial nas suas múltiplas dimensões: pensamos na expansão missionária, no cuidado pela formação dos ministros de Deus, na promoção da actividade dos fiéis leigos na Igreja e na sociedade, na intensa relação com a comunidade civil. Durante o seu pontificado o "Papa Bibliotecário" teve que enfrentar as perseguições que a Igreja sofria em países como o México e a Espanha e a luta a que levaram os totalitarismos nacional-socialismo e fascismo que surgiram e se consolidaram naqueles anos. Na Alemanha é inesquecível a sua grande Encíclica Mit brennender Sorge, como forte sinal contra o nazismo. Permanece-se deveras admirados perante a obra sábia e forte deste Pontífice, que para a Igreja quis só aquela liberdade que lhe permitisse desempenhar integralmente a sua missão. Também o Estado do Vaticano, que surgiu depois dos Pactos Lateranenses e sobretudo do Tratado, foi considerado por Pio XI um instrumento para garantir a independência necessária de qualquer poder humano, a fim de dar à Igreja e ao seu Supremo Pastor a possibilidade de cumprir plenamente o mandato recebido de Cristo Senhor. Depois, quanto esta pequena, mas completa, realidade estadual fosse útil e benéfica para a Santa Sé, para a Igreja, assim como para Roma e para o mundo inteiro, vê-se logo dez anos mais tarde, quando eclodiu a segunda guerra mundial, que chegou com as suas violências e sofrimentos até às portas do Vaticano.

Pode-se então afirmar que ao longo de oito decénios da sua existência, o Estado Vaticano demonstrou-se um instrumento dúctil e sempre à altura das exigências que lhe apresentavam e continuam a apresentar quer a missão do Papa, quer as necessidades da Igreja, quer as sempre mudadas condições da sociedade. Precisamente por isto, sob a guia dos meus venerados Predecessores desde o Servo de Deus Pio XII ao Papa João Paulo II realizou-se, e ainda hoje se realiza sob o olhar de todos, uma constante adequação das normas, das estruturas e dos meios deste singular Estado edificado em volta do Túmulo do Apóstolo Pedro. O significativo aniversário, que nestes dias estamos a comemorar, é portanto motivo de profundo agradecimento ao Senhor, que guia o destino da sua Igreja nas vicissitudes muitas vezes atormentadas do mar da história, e assiste o seu Vigário na terra no desempenho do seu cargo de Christianae religionis summus Antistes. A minha gratidão estende-se a quantos foram no passado e são hoje protagonistas da vida do Estado da Cidade do Vaticano, alguns conhecidos, mas muitos desconhecidos no seu humilde e precioso serviço. Dirijo aos membros da actual comunidade de vida e de trabalho do Governatorato e das outras estruturas do Estado o meu pensamento agradecido, interpretando assim os sentimentos de todo o povo de Deus. Ao mesmo tempo, gostaria de encorajar quantos trabalham nos diversos departamentos e serviços vaticanos a desempenhar as suas tarefas não só com honestidade e competência profissional, mas também com uma consciência sempre viva de que o seu trabalho constitui um precioso serviço à causa do reino de Deus.


Discursos Bento XVI 860