Discursos Bento XVI 1085

1085 Aqui Maria está circundada pelos pais e mães da Igreja, da comunhão dos santos. E assim vemos e compreendemos precisamente nestes dias que não no eu isolado podemos ouvir realmente a Palavra: só no nós da Igreja, no nós da comunhão dos santos.

E o senhor, querido Padre Enrico, mostrou-nos, deu voz a cinco figuras exemplares do sacerdócio, começando com Inácio de Antioquia e chegando ao venerável Papa João Paulo II. Assim compreendemos realmente de novo o que significa ser sacerdote, tornar-se cada vez mais sacerdote.

O senhor ressaltou também que a consagração encaminha-se para a missão, é destinada a tornar-se missão. Nestes dias aprofundamos com a ajuda de Deus a nossa consagração. Assim, com coragem renovada, queremos agora enfrentar a nossa missão. O Senhor nos ajude. Obrigado pela sua ajuda, Padre Enrico.



Março de 2010



AOS BISPOS DE UGANDA EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM» Sexta-feira, 5 de Março de 2010



Eminência
Estimados Irmãos Bispos

É-me grato saudar-vos, Bispos de Uganda, por ocasião da vossa visita ad limina aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo. Agradeço ao Bispo Ssekamanya os amáveis sentimentos de comunhão com o Sucessor de Pedro, que ele manifestou em vosso nome. É de bom grado que retribuo, assegurando-vos as minhas orações e o meu afecto por vós e pelo Povo de Deus confiado aos vossos cuidados. De maneira particular, dirijo o meu pensamento àqueles que foram atingidos pelos recentes desabamentos na região de Bududa no vosso país. Elevo orações a Deus Todo-Poderoso, Pai de toda a misericórdia, a fim de que conceda o eterno repouso às almas das vítimas, e dê força e esperança a quantos sofrem as consequências deste trágico acontecimento.

A segunda assembleia especial para a África do Sínodo dos Bispos, celebrada recentemente, foi memorável no seu apelo a renovar esforços no serviço de uma evangelização mais profunda do continente (cf. Mensagem ao Povo de Deus, n. 15). O poder da palavra de Deus, o conhecimento e o amor de Jesus não podem deixar de transformar a vida das pessoas, melhorando o seu modo de pensar e de agir. À luz da mensagem evangélica, estais conscientes da necessidade de encorajar os católicos de Uganda a apreciar plenamente o sacramento do matrimónio e a sua unidade e indissolubilidade, e o direito sagrado à vida. Exorto-vos a ajudá-los, tanto os sacerdotes como os fiéis leigos, a resistir à tentação de uma cultura materialista do individualismo, que se arraigou em numerosos países. Continuai a exortar a uma paz duradoura, assente na justiça, na generosidade para com os necessitados e num espírito de diálogo e reconciliação. Enquanto promoveis o verdadeiro ecumenismo, permanecei particularmente próximos daqueles que são mais vulneráveis à difusão das seitas. Orientai-os a fim de que rejeitem os sentimentos superficiais e a pregação que esvazia a cruz de Cristo do seu poder (cf. 1Co 1,17); deste modo continuareis, como Pastores responsáveis, a conservá-los, bem como os seus filhos, fiéis à Igreja de Cristo. A este propósito, é-me grato saber que o vosso povo encontra consolação espiritual nas formas populares de evangelização, como as organizadas peregrinações ao Santuário dos Mártires de Uganda, em Namugongo, onde a presente pastoral activa dos Bispos e de numerosos sacerdotes orienta a piedade dos peregrinos para a sua renovação, quer como indivíduos quer como comunidades. Continuai a apoiar todos aqueles que, com um coração generoso, assistem as pessoas deslocadas e os órfãos nas regiões dilaceradas pela guerra. Encorajai aqueles que cuidam das pessoas angustiadas pela pobreza, pela sida e por outras enfermidades, ensinando-os a ver nas pessoas que são por eles ajudadas o rosto de Jesus (cf. Mt 25,40).

Por sua vez, uma evangelização renovada suscita uma cultura católica mais profunda, que se arraiga na família. A partir dos vossos relatórios quinquenais, tomo conhecimento do facto de que os programas de educação nas paróquias, nas escolas e nas associações, assim como as vossas próprias intervenções a respeito de temas de interesse comum, estão realmente a propagar uma cultura católica mais vigorosa. Um grande bem pode vir de leigos oportunamente preparados, que trabalham nos meios de comunicação, na política e na cultura. É necessário oferecer cursos para uma sua formação adequada, especialmente no campo da Doutrina Social da Igreja, aproveitando os recursos da Universidade dos Mártires de Uganda ou de outras instituições. Encorajai-os a ser activos e eloquentes ao serviço daquilo que é justo e nobre. Deste modo, a sociedade como um todo há-de beneficiar de cristãos formados e zelosos, que assumem funções de liderança ao serviço do bem comum. Os movimentos eclesiais também merecem o vosso apoio para uma sua contribuição positiva para a vida da Igreja em muitos sectores.

Os Bispos, como primeiros agentes de evangelização, são chamados a dar um testemunho clarividente da solidariedade concreta que brota da nossa comunhão em Cristo. Num espírito de caridade cristã, as Dioceses que dispõem de maiores recursos, tanto material como espiritualmente, deveriam ajudar aquelas que têm menos. Ao mesmo tempo, todas as comunidades têm o dever de lutar pela auto-suficiência. É importante que o vosso povo desenvolva um sentido de responsabilidade por si mesmo, pelas suas comunidades e pela própria Igreja, tornando-se mais profundamente imbuídos de um espírito católico de sensibilidade diante das necessidades da Igreja universal.

Os vossos sacerdotes, como ministros da evangelização comprometidos, já beneficiam enormemente da vossa solicitude e orientação paterna. Durante este Ano sacerdotal, oferecei-lhes a vossa assistência, o vosso exemplo e o vosso ensinamento claro. Exortai-os à oração e à vigilância, de maneira especial no que diz respeito às ambições egoístas, mundanas ou políticas, ou a um apego excessivo à família ou ao próprio grupo étnico. Continuai a promover as vocações, ocupando-vos do necessário discernimento dos candidatos, sua da motivação e formação, de modo particular da sua formação espiritual. Os presbíteros devem ser homens de Deus, capazes de orientar os outros através de conselhos sábios e de exemplos, ao longo dos caminhos do Senhor.

1086 Em Uganda, os religiosos e as religiosas são chamados a constituir um exemplo e um manancial de encorajamento para a Igreja inteira. Auxiliai-os mediante os vossos conselhos e as vossas orações, enquanto se comprometem para alcançar a meta da caridade perfeita e dar testemunho do Reino. Os sacerdotes e os religiosos exigem uma assistência constante nas suas vidas de celibato e de virgindade consagrada. Através do vosso exemplo, ensinai-lhes a beleza deste estilo de vida, da paternidade e da maternidade espirituais, mediante as quais eles podem enriquecer e aprofundar o amor dos fiéis pelo Criador e Doador de todos os benefícios. Os vossos catequistas constituem igualmente um grande recurso. Continuai a prestar atenção às suas necessidades e à sua formação apresentando-lhes, para os encorajar, o exemplo de mártires como o Beato Daudi Okello e o Beato Jildo Irwa.

Queridos Irmãos Bispos, exorto-vos juntamente com o Apóstolo Paulo: "Tu, porém, sê prudente em tudo, suporta os trabalhos, evangeliza e consagra-te ao teu ministério" (
2Tm 4,5). Nos bem-aventurados Mártires de Uganda, vós e o vosso povo têm modelos de grande coragem e suportação no sofrimento. Contai com as suas intercessões e lutai sempre para serdes dignos do seu legado. Enquanto vos confio, assim como aqueles que dependem da vossa solicitude pastoral, à salvaguarda amorosa de Maria Mãe da Igreja, concedo carinhosamente a todos vós a minha Bênção Apostólica.




AOS DIRIGENTES, FUNCIONÁRIOS E VOLUNTÁRIOS DA PROTECÇÃO CIVIL ITALIANA Sábado, 6 de Março de 2010

Prezados amigos

Sinto-me muito feliz por vos receber e dirigir as minhas cordiais boas-vindas a cada um de vós. Saúdo os Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio, bem como todas as Autoridades. Saúdo o Dr. Guido Bertolaso, Subsecretário da Presidência do Conselho de Ministros e Chefe do Departamento da Protecção Civil, e agradeço-lhe as amáveis palavras que me dirigiu em nome de todos, e tudo quanto realiza pela sociedade civil e por todos nós. Saúdo o Dr. Gianni Letta, Subsecretário da Presidência do Conselho de Ministros, presente neste encontro. Dirijo a minha saudação afectuosa aos numerosos voluntários e voluntárias, bem como aos representantes de alguns componentes do Serviço Nacional da Protecção Civil.

Este encontro foi precedido por um jubiloso momento de festa, animado também pelas execuções musicais da Instituição Sinfónica dos Abruzos. Dirijo a todos o meu grato pensamento. Quisestes percorrer novamente a actividade desempenhada pela Protecção Civil ao longo dos últimos dez anos, quer por ocasião de emergências nacionais e internacionais, quer na actividade de apoio a acontecimentos grandes e particulares. Como deixar de recordar, a este propósito, as intervenções a favor das vítimas do sismo de San Giuliano di Puglia e, principalmente, dos Abruzos? Eu mesmo, visitando no passado mês de Abril Onna e L'Aquila, pude constatar pessoalmente com que empenho vos prodigalizastes para assistir aqueles que tinham perdido os seus entes queridos e as suas casas. Parecem-me apropriadas as palavras que vos dirigi nessa circunstância: "Obrigado por aquilo que fizestes e sobretudo pelo amor com que o realizastes. Obrigado pelo exemplo que oferecestes" (Discurso no encontro com os fiéis e as pessoas empenhadas nos socorros, 28 de Abril de 2009). E como não pensar com admiração nos numerosos voluntários e voluntárias que garantiram assistência e segurança à enorme multidão de jovens, e não só, presente na inesquecível Jornada Mundial da Juventude de 2000, ou que veio a Roma para o último adeus ao Papa João Paulo II?

Estimados voluntários e voluntárias da Protecção Civil: sei que desejastes muito este encontro; posso assegurar-vos que este era também o meu profundo desejo. Vós constituís uma das expressões mais recentes e maduras da longa tradição de solidariedade, que mergulha as raízes no altruísmo e na generosidade do povo italiano. O voluntariado de Protecção Civil tornou-se um fenómeno nacional, que adquiriu uma índole de participação e de organização particularmente significativa, e hoje conta com cerca de um milhão e trezentos mil membros, subdivididos em mais de três mil organizações. As finalidades e os propósitos da vossa associação encontraram o reconhecimento em normas legislativas apropriadas, que contribuíram para a formação de uma identidade nacional do voluntariado de Protecção Civil, atenta às necessidades primárias da pessoa e do bem comum.

Os termos "protecção" e "civil" representam coordenadas específicas e manifestam de maneira profunda a vossa missão, diria a vossa "vocação": proteger as pessoas e a sua dignidade bens centrais da sociedade civil nos casos trágicos de calamidade e de emergência que ameaçam a vida e a segurança de famílias e de comunidades inteiras. Tal missão não consiste unicamente na gestão da emergência, mas numa contribuição pontual e meritória para a realização do bem comum, que representa sempre o horizonte da convivência humana, também e sobretudo nos momentos das grandes provações. Elas são uma ocasião de discernimento e não de desespero. Oferecem a oportunidade de formular um novo projecto social, orientado principalmente para a virtude e o bem de todos.

A dúplice dimensão da protecção, que se manifesta tanto durante como depois da emergência, é bem expressa pela figura do bom Samaritano, traçada pelo Evangelho de Lucas (cf. 10, 30-35). Sem dúvida, esta personagem demonstrou caridade, humildade e coragem, assistindo os desventurados no momento da máxima necessidade. E isto quando todos alguns por indiferença, outros por insensibilidade de coração olham para o outro lado. Porém, o bom Samaritano ensina a ir mais além da emergência e, poderíamos dizer, a predispor a volta à normalidade. Com efeito, ele cuida das feridas do homem caído no chão, mas em seguida preocupa-se em confiá-lo ao hospedeiro a fim de que, após a emergência, possa restabelecer-se.

Como nos ensina a página evangélica, o amor ao próximo não pode ser delegado: o Estado e a política, mesmo com os necessários cuidados pelo welfare, não podem substituí-lo. Como escrevi na Encíclica Deus caritas est: "O amor caritas será sempre necessário, mesmo na sociedade mais justa. Não há qualquer ordenamento estatal justo que possa tornar supérfluo o serviço do amor. Quem quer desfazer-se do amor, prepara-se para se desfazer do homem enquanto homem. Sempre haverá sofrimento que necessita de consolação e ajuda. Haverá sempre solidão. Existirão sempre também situações de necessidade material, para as quais é indispensável uma ajuda na linha de um amor concreto ao próximo" (n. 28b). Ele requer e exigirá sempre o compromisso pessoal e voluntário. Precisamente por este motivo, os voluntários não são "tapa-buracos" na rede social, mas pessoas que contribuem verdadeiramente para delinear o rosto humano e cristão da sociedade. Sem voluntariado, o bem comum e a sociedade não podem durar muito, porque o seu progresso e a sua dignidade dependem, em vasta medida, precisamente daquelas pessoas que fazem mais do que o seu dever.

Prezados amigos! O vosso compromisso constitui um serviço prestado à dignidade do homem, fundamentada sobre o seu ser criado à imagem e semelhança de Deus (cf. Gn 1,26). Como nos mostrou o episódio do bom Samaritano, existem olhares que podem cair no vazio, ou até no desprezo, mas há também olhares que podem expressar amor. Além de guardiães do território, sede cada vez mais ícones vivos do bom Samaritano, prestando atenção ao próximo, recordando a dignidade do homem e suscitando esperança. Quando uma pessoa não se limita unicamente a cumprir o seu próprio dever na profissão e na família, mas se compromete a favor dos outros, o seu coração dilata-se. Quem ama e serve gratuitamente o outro como próximo, vive e age em conformidade com o Evangelho e participa na missão da Igreja, que sempre considera o homem todo e deseja fazer-lhe sentir o amor de Deus.

1087 Caros voluntários e voluntárias, a Igreja e o Papa apoiam o vosso serviço precioso. A Virgem Maria, que vai "às pressas" visitar a prima Isabel para a ajudar (cf. Lc 1,39), seja o vosso modelo. Enquanto vos confio à intercessão do vosso padroeiro, São Pio de Pietrelcina, asseguro a minha recordação na prece e, com afecto, concedo a vós e aos vossos entes queridos a Bênção Apostólica.

VISITA À PARÓQUIA ROMANA DE SÃO JOÃO DA CRUZ

SAUDAÇÃO AOS CATEQUISTAS, MOVIMENTOS

E COMUNIDADES NO FINAL DA CELEBRAÇÃO DA MISSA Domingo, 7 de Março de 2010



Queridos irmãos e irmãs, de coração vos digo obrigado por esta bonita experiência pascal, que me proporcionastes com esta manhã de domingo. Documentei-me um pouco sobre a história da vossa paróquia, que começou precisamente do nada; construístes, entretanto, um bonito centro pastoral, edifícios, estruturas, mas sobretudo construístes a Igreja viva, de pedras vivas. Agora é agradável ver aqui como a Igreja é viva, vive da Palavra de Deus, da participação na sagrada Eucaristia, com tantos componentes da vida espiritual, os movimentos, todos unidos num único projecto pastoral na comum Igreja de Cristo.

Por isto vos estou muito grato e peço-vos que prossigais neste sentido: construir sempre a Igreja de pedras vivas, e deste modo, ser também um centro de irradiação da Palavra de Deus no nosso mundo, que tem tanta necessidade desta Palavra de Deus, da vida que vem de Deus.

Hoje, na primeira leitura, ouvimos precisamente esta auto-apresentação de Deus, que entra na história, se faz um de nós. E ouvimos que Deus é um Deus que nos ouve, que não está distante, que se interessa por nós, que é para nós e está connosco. E isto exige a nossa resposta, exige que também nós escutemos Deus, que também nós sejamos abertos à sua presença e assim céu e terra comunicam-se e tornam-se mais unidos e o mundo torna-se mais luminoso, mais agradável.

Obrigado por todo o vosso trabalho! Desejo-vos uma boa Páscoa e ulteriores progressos espirituais na comunhão com Cristo e na comunidade dos sacerdotes, sobretudo do vosso querido pároco. Ouvi que deu início à comunidade indo ao supermercado para conhecer o tipo de pessoas, e assim cresceu a paróquia. Obrigado senhor pároco, obrigado a todos vós. Boa Páscoa!



AOS PARTICIPANTES NO CURSO ANUAL

SOBRE O FORO ÍNTIMO PROMOVIDO PELA PENITENCIARIA APOSTÓLICA Quinta-feira, 11 de Março de 2010

Queridos amigos!

Estou feliz por me encontrar convosco e dirigir a cada um de vós as minhas boas-vindas, por ocasião do Curso anual sobre o Foro Íntimo, organizado pela Penitenciaria Apostólica. Saúdo cordialmente D. Fortunato Baldelli, que, pela primeira vez, como Penitenciário-Mor, guiou as vossas sessões de estudo e agradeço-lhe as gentis palavras que me dirigiu. Com ele saúdo D. Gianfranco Girotti, Regente, os funcionários da Penitenciaria e todos vós que, com a participação nesta iniciativa, manifestastes a forte exigência de aprofundar uma temática essencial para o ministério e a vida dos presbíteros.

O vosso Curso coloca-se, providencialmente, no Ano sacerdotal, que proclamei para o 150º aniversário do nascimento para o Céu de São João Maria Vianney, o qual exerceu de modo heróico e fecundo o ministério da Reconciliação. Como afirmei na Carta de proclamação: "Todos nós sacerdotes deveríamos sentir que nos dizem pessoalmente respeito aquelas palavras que ele [o Cura d'Ars] colocava nos lábios de Cristo: "Encarregarei os meus ministros de anunciar aos pecadores que estou sempre pronto para os receber, que a minha Misericórdia é infinita". Do Santo Cura d'Ars, nós sacerdotes podemos aprender não só uma inexaurível confiança no Sacramento da Penitência, que nos estimule a colocá-lo no centro das nossas preocupações pastorais, mas também o método do "diálogo de salvação" que nele se deve realizar". Onde afundam as raízes da heroicidade e da fecundidade, com que São João Maria Vianney viveu o próprio ministério de confessor? Em primeiro lugar, numa intensa dimensão penitencial pessoal. O conhecimento do próprio limite e a necessidade de recorrer à Misericórdia Divina para pedir perdão, para converter o coração e para ser amparado no caminho de santidade são fundamentais na vida do sacerdote: só quem experimentou primeiro a sua grandeza pode ser anunciador convicto e administrador da Misericórdia de Deus. Cada sacerdote se torna ministro da Penitência pela configuração ontológica com Cristo, Sumo e Eterno Sacerdote, que reconcilia a humanidade com o Pai; contudo, a fidelidade na administração do Sacramento da Reconciliação está confiada à responsabilidade do presbítero.

Vivemos num contexto cultural marcado pela mentalidade hedonista e relativista, que propende para eliminar Deus do horizonte da vida, não favorece a aquisição de um quadro claro de valores de referência e não ajuda a discernir o bem do mal e a maturar um justo sentido do pecado. Esta situação torna ainda mais urgente o serviço de administradores da Misericórdia Divina. De facto, não devemos esquecer que há uma espécie de círculo vicioso entre o ofuscamento da experiência de Deus e a perda do sentido do pecado. Contudo, se olharmos para o contexto cultural no qual viveu São João Maria Vianney, vemos que, em vários aspectos, não era muito diverso do nosso. Com efeito, também no seu tempo existia uma mentalidade hostil à fé, expressa por forças que procuravam até impedir o exercício do ministério. Nessas circunstâncias, o Santo Cura d'Ars fez "da igreja a sua casa", a fim de guiar os homens para Deus. Ele viveu com radicalidade o espírito de oração, a relação pessoal e íntima com Cristo, a celebração da Santa Missa, a Adoração eucarística e a pobreza evangélica, sendo para os seus contemporâneos um sinal tão evidente da presença de Deus, que estimulou muitos penitentes a aproximar-se do seu confessionário. Nas condições de liberdade em que é possível hoje exercer o ministério sacerdotal, é necessário que os presbíteros vivam de "modo sublime" a própria resposta à vocação, porque só quem se torna todos os dias presença viva e clara do Senhor pode suscitar nos fiéis o sentido do pecado, dar coragem e fazer nascer o desejo do perdão de Deus.

1088 Amados irmãos, é necessário voltar ao confessionário, como lugar no qual celebrar o Sacramento da Reconciliação, mas também como lugar onde "habitar" com mais frequência, para que o fiel possa encontrar misericórdia, conselho e conforto, sentir-se amado e compreendido por Deus e experimentar a presença da Misericórdia Divina, ao lado da Presença real na Eucaristia. A "crise" do Sacramento da Penitência, da qual se fala com frequência, interpela antes de tudo os sacerdotes e a sua grande responsabilidade de educar o Povo de Deus nas exigências radicais do Evangelho. Sobretudo, pede que eles se dediquem generosamente à escuta das confissões sacramentais; que guiem com coragem a grei, para que não se conforme com a mentalidade deste mundo (cf. Rm 12,2), mas saiba fazer opções também contra a corrente, evitando adaptações ou comprometimentos. Por isto é importante que o sacerdote tenha uma tensão ascética permanente, alimentada pela comunhão com Deus, e se dedique a uma actualização constante no estudo da teologia moral e das ciências humanas.

São João Maria Vianney sabia instaurar com os penitentes um verdadeiro "diálogo de salvação", mostrando a beleza e a grandeza da bondade do Senhor e suscitando aquele desejo de Deus e do Céu, do qual os santos são os primeiros portadores. Ele afirmava: "O Bom Deus sabe tudo. Ainda antes que vos confesseis, já sabe que voltareis a pecar e contudo perdoa-vos. Como é grande o Amor do nosso Deus, que chega a esquecer voluntariamente o futuro, para nos perdoar" (Monnin A., Il Curato d'Ars. Vita di Gian-Battista-Maria Vianney, vol. I Turim, 1870, p. 130). Compete ao sacerdote favorecer aquela experiência de "diálogo de salvação", que, nascendo da certeza de ser amado por Deus, ajuda o homem a reconhecer o próprio pecado e a introduzir-se, progressivamente, naquela dinâmica estável de conversão do coração, que leva à renúncia radical do mal e a uma vida segundo Deus (cf. Catecismo da Igreja Católica CEC 1431).

Queridos sacerdotes, como é extraordinário o ministério que o Senhor nos confiou! Assim como na Celebração Eucarística Ele se entrega nas mãos do sacerdote para continuar a estar presente entre o seu Povo, analogamente, no Sacramento da Reconciliação Ele confia-se ao sacerdote para que os homens façam a experiência do abraço com o qual o pai volta a receber o filho pródigo, restituindo-lhe a dignidade filial e reconstituindo-o plenamente herdeiro (cf. Lc 15,11-32). A Virgem Maria e o Santo Cura d'Ars nos ajudem a experimentar na nossa vida a largura, o comprimento, a altura e a profundidade do Amor de Deus (cf. Ef Ep 3,18-19), para sermos seus administradores fiéis e generosos. Agradeço-vos a todos de coração e de bom grado vos concedo a minha Bênção.

SAUDAÇÃO

AOS PARTICIPANTES NO CONGRESSO TEOLÓGICO

PROMOVIDO PELA CONGREGAÇÃO PARA O CLERO Sala da Bênção

Sexta-feira, 12 de Março de 2010


Senhores Cardeais
Queridos Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
Ilustres hóspedes

Estou feliz por me encontrar convosco nesta particular ocasião e saúdo todos vós com afecto. Dirijo um pensamento especial ao Cardeal Cláudio Hummes, Prefeito da Congregação para o Clero, enquanto lhe agradeço as palavras que me dirigiu. A minha gratidão vai a todo o Dicastério, pelo compromisso com que coordena as múltiplas iniciativas do Ano sacerdotal, entre as quais este Congresso teológico, sobre o tema: Fidelidade de Cristo, Fidelidade do Sacerdote". Alegro-me por esta iniciativa, que conta com a presença de mais de 50 bispos e 500 presbíteros, muitos dos quais são responsáveis nacionais ou diocesanos do clero e da formação permanente. A vossa atenção aos temas relativos ao Sacerdócio ministerial constitui um dos frutos deste Ano especial, que desejei proclamar precisamente para "promover o compromisso de renovação interior de todos os sacerdotes, para um seu testemunho evangélico mais vigoroso e incisivo no mundo de hoje" (Carta para a proclamação do Ano sacerdotal).

O tema da identidade presbiteral, objecto do vosso primeiro dia de estudo, é determinante para o exercício do sacerdócio ministerial no presente e no futuro. Numa época como a nossa, tão "policêntrica" e propensa a diluir todo o tipo de concepção trinitária, por muitos considerada contrária à liberdade e à democracia, é importante manter com clareza a peculiaridade teológica do Ministério ordenado, para não ceder à tentação de o reduzir às categorias culturais predominantes. Num contexto de secularização difundida, que exclui Deus de maneira progressiva da esfera pública e, tendencialmente, também da consciência social comum, muitas vezes o sacerdote parece "alheio" ao sentimento coral, precisamente pelos aspectos mais fundamentais do seu ministério, como aqueles de ser homem do sagrado, subtraído ao mundo para interceder a favor do mundo, constituído em tal missão por Deus e não pelos homens (cf. Hb He 5,1). Por este motivo, é importante ultrapassar reducionismos perigosos que, nas décadas passadas, utilizando categorias mais funcionalistas do que ontológicas, apresentavam o sacerdote quase como um "agente social", correndo o risco de atraiçoar o próprio Sacerdócio de Cristo. Como se revela cada vez mais urgente, a hermenêutica da continuidade para compreender de maneira mais adequada os textos do Concílio Ecuménico Vaticano II, analogamente parece necessária uma hermenêutica que poderíamos definir "da continuidade sacerdotal" que, começando a partir de Jesus de Nazaré, Senhor e Cristo, e passando através dos dois mil anos da história de grandeza e de santidade, de cultura e de piedade, que o Sacerdócio escreveu no mundo, chegue até aos nossos dias.

1089 Estimados irmãos sacerdotes, na época em que vivemos é particularmente importante que o apelo a participar no único Sacerdócio de Cristo no Ministério ordenado floresça no "carisma da profecia": há grande necessidade de presbíteros que falem de Deus ao mundo e que apresentem o mundo a Deus; homens não sujeitos a modas culturais efémeras, mas capazes de viver autenticamente aquela liberdade que somente a certeza da pertença a Deus é capaz de conferir. Como o vosso Congresso sublinhou oportunamente, hoje a profecia mais necessária é a da fidelidade que, começando a partir da Fidelidade de Cristo à humanidade, através da Igreja e do Sacerdócio ministerial, leve a viver o próprio sacerdócio na adesão total a Cristo e à Igreja. Efectivamente, o presbítero já não pertence a si mesmo mas, pelo selo sacramental por ele recebido (cf. Catecismo da Igreja Católica CEC 1563 Catecismo da Igreja Católica, nn. CEC 1563 CEC 1582), é "propriedade" de Deus. Este seu "ser de Outro" deve tornar-se reconhecível por parte de todos, através de um testemunho límpido.

No modo de pensar, falar, julgar os acontecimentos do mundo, servir e amar, e de se relacionar com as pessoas, também no hábito, o presbítero deve haurir força profética da sua pertença sacramental, do seu profundo ser. Por conseguinte, ele deve ter todo o cuidado de se subtrair à mentalidade predominante, que tende a associar o valor do ministro não tanto ao seu ser, mas somente à sua função, desconhecendo assim a obra de Deus, que incide na profunda identidade da pessoa do presbítero, configurando-o a Si de modo definitivo (cf. ibid., n. 1583).

Além disso, o horizonte da pertença ontológica a Deus constitui a justa moldura para compreender e confirmar, também nos nossos dias, o valor do celibato sagrado, que na Igreja latina é um carisma exigido para a Ordem sagrada (cf. Presbyterorum ordinis PO 16) e é tido em grandíssima consideração nas Igrejas Orientais (cf. CCIO, CIO 373). Ele é autêntica profecia do reino, sinal da consagração com coração indiviso ao Senhor e às "coisas do Senhor" (1Co 7,34), expressão do dom de si mesmo a Deus e aos outros (cf. Catecismo da Igreja Católica CEC 1579).

Por conseguinte, a vocação do sacerdote é excelsa e permanece um grande Mistério também para quantos a receberam como dom. Os nossos limites e as nossas debilidades devem induzir-nos a viver e a conservar com fé profunda esta dádiva preciosa, com a qual Cristo nos configurou consigo, tornando-nos partícipes da sua Missão salvífica. Com efeito, a compreensão do sacerdócio ministerial está vinculada à fé e exige, de maneira cada vez mais forte, uma continuidade radical entre a formação seminarística e a formação permanente. A vida profética incondicional, com a qual serviremos Deus e o mundo, anunciando o Evangelho e celebrando os Sacramentos, favorecerá o advento do Reino de Deus, já presente, eocrescimentodo Povo de Deus na fé.

Caríssimos sacerdotes, os homens e as mulheres do nosso tempo só nos pedem que sejamos sacerdotes até ao fundo, e nada mais. Os fiéis leigos encontrarão em muitas outras pessoas aquilo de que humanamente têm necessidade, mas só no sacerdote poderão encontrar aquela Palavra de Deus que deve estar sempre nos seus lábios (cf. Presbyterorum ordinis PO 4); a Misericórdia do Pai, abundante e gratuitamente concedida no Sacramento da Reconciliação; o Pão de Vida nova, "verdadeiro alimento oferecido aos homens" (cf. Hino do Ofício da Solenidade do "Corpus Domini" do Rito Romano). Peçamos a Deus, por intercessão da Bem-Aventurada Virgem Maria e de São João Maria Vianney, que possamos dar-lhe graças diariamente pelo grande dom da vocação e viver o nosso Sacerdócio com fidelidade plena e jubilosa. Obrigado a todos por este encontro! É de bom grado que concedo a cada um de vós a Bênção Apostólica.



AOS BISPOS DO SUDÃO EM VISITA

«AD LIMINA APOSTOLORUM» Sexta-feira, 13 de Março de 2010



Eminência
Estimados Irmãos Bispos

É com grande alegria que vos dou as boas-vindas, Bispos do Sudão, por ocasião da vossa visita quinquenal aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo. Estou grato a D. Deng Majak pelas amáveis palavras que me dirigiu em vosso nome. No espírito de comunhão no Senhor que nos une como sucessores dos Apóstolos, uno-me a vós em acção de graças pelo "melhor dom" (cf. 1Co 12,31) da caridade cristã, que é evidente nas vossas vidas e no serviço generoso dos sacerdotes, dos religiosos, das religiosas e dos fiéis leigos do Sudão. A vossa fidelidade ao Senhor e os frutos da vossa labuta no meio das dificuldades e dos sofrimentos oferecem um testemunho eloquente do poder da Cruz, que resplandece através das nossas limitações e debilidades humanas (cf. 1Co 1,25-27).

Bem sei como vós e os fiéis do vosso país aspiram à paz, e com quanta paciência estais a trabalhar pelo seu restabelecimento. Alicerçados na vossa fé e esperança em Cristo, Príncipe da Paz, espero que encontreis sempre no Evangelho os princípios necessários para modelar a vossa pregação e o vosso ensinamento, os vossos juízos e as vossas obras. Inspirados por tais princípios e fazendo ressoar as justas aspirações de toda a comunidade católica, tendes falado em uníssono na rejeição de "qualquer retorno à guerra" e no apelo ao estabelecimento da paz a todos os níveis da vida nacional (cf. Declaração dos Bispos do Sudão, For a Just and Lasting Peace [Para uma paz justa e duradoura], n. 4).

Se a paz consiste em lançar raízes profundas, é necessário envidar esforços concretos para diminuir os factores que contribuem para o mal-estar, particularmente a corrupção, as tensões étnicas, a indiferença e o egoísmo. Sem dúvida, iniciativas neste sentido demonstrar-se-ão fecundas, se estiverem fundamentadas na integridade, num sentido de fraternidade universal e nas virtudes da justiça, da responsabilidade e da caridade. Tratados e outros acordos, pedras angulares indispensáveis no processo de paz, só produzirão fruto se forem inspirados e acompanhados pelo exercício de uma liderança madura e moralmente justa.


Discursos Bento XVI 1085