Discursos Bento XVI 8411

AOS PARTICIPANTES NA ASSEMBLEIA PLENÁRIA DA PONTIFÍCIA COMISSÃO PARA A AMÉRICA LATINA Sexta-feira, 8 de Abril de 2011

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Sala do Consistório

Prezados Senhores Cardeais
Estimados Irmãos Bispos

1. Saúdo com afecto os Conselheiros e os membros da Pontifícia Comissão para a América Latina, aqui reunidos em Roma por ocasião da Assembleia Plenária. Saúdo especialmente o Senhor Cardeal Marc Ouellet, Prefeito da Congregação para os Bispos e Presidente da mencionada Pontifícia Comissão, agradecendo-lhe vivamente as palavras que me dirigiu em nome de todos para me apresentar os resultados destes dias de estudo e de reflexão.

2. O tema escolhido para este encontro, «Incidência da piedade popular no processo de evangelização da América Latina», aborda directamente um dos aspectos mais importantes para a tarefa missionária em que estão empenhadas as Igrejas particulares deste grande continente latino-americano. Os bispos que se reuniram em Aparecida para a v Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe, que tive o prazer de inaugurar durante a minha viagem ao Brasil, em Maio de 2007, apresentam a piedade popular como um espaço de encontro com Jesus Cristo e um modo de expressar a fé da Igreja. Portanto, não pode ser considerada como um aspecto secundário da vida cristã, pois isto «seria esquecer o primado da acção do Espírito e a iniciativa gratuita do amor de Deus» (Documento conclusivo, n. 263).

Esta simples expressão da fé tem as suas raízes precisamente no início da evangelização daquelas terras. Com efeito, na medida em que a mensagem salvífica de Cristo iluminava e estimulava as culturas autóctones, tecia-se gradualmente a rica e profunda religiosidade popular que caracteriza a vivência de fé dos povos latino-americanos que, como disse no discurso de inauguração da Conferência de Aparecida, constitui «o precioso tesouro da Igreja Católica na América Latina, que ela deve proteger, promover e, naquilo que for necessário, também purificar» (n. 1).

3. Para realizar a tarefa da nova evangelização na América Latina, segundo um processo que impregna todo o ser e o agir do cristão, não se pode pôr de lado as múltiplas demonstrações da piedade popular. Todas, bem focalizadas e oportunamente acompanhadas, propiciam um encontro fecundo com Deus, uma intensa veneração do Santíssimo Sacramento, uma profunda devoção à Virgem Maria, um alimentar o afecto pelo Sucessor de Pedro e uma tomada de consciência de pertença à Igreja. Que tudo sirva também para evangelizar, comunicar a fé, aproximar os fiéis aos sacramentos, reforçar os vínculos de amizade e de união familiar e comunitário, assim como para incrementar a solidariedade e o exercício da caridade.

Por conseguinte, a fé tem que ser a fonte principal da piedade popular, para que esta não se reduza a uma simples expressão cultural de uma determinada região. Além disso, deve estar em estrita relação com a sagrada Liturgia, que não pode ser substituída por expressão religiosa alguma. Neste sentido, não se pode esquecer, como afirma o Directório sobre a piedade popular e a liturgia, publicado pela Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, que «liturgia e piedade popular são expressões cultuais que devem ser postas em recíproca e fecunda relação: porém, a Liturgia deverá constituir o ponto de referência para “focalizar com lucidez e prudência os anseios de oração e de vida carismática” que se encontram na piedade popular; por sua vez a piedade popular, com os seu valores simbólicos e expressivos, poderá proporcionar à Liturgia algumas coordenadas para uma válida inculturação e estímulos para um eficaz dinamismo criador» (n. 58).

4. Na piedade popular encontram-se muitas expressões de fé ligadas às grandes celebrações do ano litúrgico, em que a população simples da América Latina reafirma o amor que sente por Jesus Cristo, no qual encontra a manifestação da proximidade de Deus, da sua compaixão e misericórdia. São numerosos os santuários dedicados à contemplação dos mistérios da infância, paixão, morte e ressurreição do Senhor, e a ele se dirigem multidões de pessoas para colocar nas suas mãos divinas os seus sofrimentos e alegrias, pedindo ao mesmo tempo abundantes graças e implorando o perdão dos seus pecados. Intimamente unida a Jesus está também a devoção dos povos da América Latina e do Caribe pela Santíssima Virgem Maria. Ela, desde dos alvores da evangelização, acompanha os filhos deste continente e é para eles fonte de inesgotável esperança. Por isso, recorre-se a Maria como Mãe do Salvador, para sentir constantemente a sua protecção amorosa sob muitas devoções. Da mesma forma, os santos são considerados como estrelas luminosas que constelam o coração de numerosos fiéis daqueles países, edificando-os com o seu exemplo e protegendo-os com a sua intercessão.

5. Todavia, não se pode negar que existem algumas formas desviadas de religiosidade popular que, em vez de promover uma participação activa na Igreja, pelo contrário criam mais confusão e podem favorecer uma prática religiosa meramente exterior e desvinculada de uma fé bem enraizada e interiormente viva. Neste sentido, quero recordar aqui o que escrevi aos seminaristas no ano passado: «A piedade popular tende para a irracionalidade e, às vezes, talvez mesmo para a exterioridade. No entanto, excluí-la, é completamente errado. Através dela, a fé entrou no coração dos homens, tornou-se parte dos seus sentimentos, dos seus costumes, do seu sentir e viver comum. Por isso a piedade popular é um grande património da Igreja. A fé fez-se carne e sangue. Sem dúvida a piedade popular deve ser sempre purificada, referida ao centro, mas merece a nossa estima; de modo plenamente real, ela faz de nós mesmos "Povo de Deus"» (Carta aos seminaristas, 18 de Outubro de 2010, n. 4).

6. Durante os encontros que tive nestes últimos anos, por ocasião das visitas ad limina, os Bispos de América Latina e do Caribe sempre me referiram sobre o que estão a realizar nas suas respectivas circunscrições eclesiástica para encaminhar e incentivar a Missão continental, com a qual o episcopado latino-americano quis relançar o processo de nova evangelização depois de Aparecida, convidando todos os membros da Igreja e colocarem-se num estado permanente de missão. Trata-se de uma escolha muito importante, pois com ela se quer regressar a um aspecto fundamental da obra da Igreja, isto é, dar prioridade à Palavra de Deus para que seja o alimento permanente da vida cristã e o centro de toda a acção pastoral.

Este encontro com a Palavra divina deve levar a uma transformação profunda da vida, para uma identificação radical com o Senhor e com o Evangelho, a tomar plena consciência que é necessário estar firmemente ancorados em Cristo, reconhecendo que «não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo» (Carta Encíclica Deus Caritas est ).

Neste sentido, estou feliz por saber que na América Latina está a crescer a prática da lectio divina nas paróquias e nas pequenas comunidades eclesiais, como uma forma comum de alimentar a oração e, desta maneira, dar firmeza à vida espiritual dos fiéis, dado que «nas palavras da Bíblia a piedade popular encontrará uma fonte inesgotável de inspiração, modelos insuperáveis de oração e fecundas propostas sobre diversas temáticas» (Directório sobre a piedade popular e a liturgia, n. 87).

7. Queridos irmão, agradeço-vos pelas válidas contribuições finalizadas a proteger, promover e purificar tudo o que está ligado às expressões da religiosidade popular na América Latina. Para alcançar este objectivo, será muito importante continuar a estimular a Missão continental, na qual deve encontrar um espaço especial tudo o que se refere a este âmbito pastoral, que constitui uma forma privilegiada para que a fé seja acolhida no coração do povo, sensibilize profundamente as pessoas e se manifeste vigorosa e operante através da caridade (cf.
Ga 5,6).

8. Ao concluir este agradável encontro e ao invocar o doce nome de Maria Santíssima, perfeita discípula e pedagoga da evangelização, dou-vos de coração a Bênção Apostólica, penhor da bondade divina.


PALAVRAS APÓS A PROJECÇÃO DO DOCUMENTÁRIO SOBRE JOÃO PAULO II «O PEREGRINO VESTIDO DE BRANCO» Sala do Consistório Sábado, 9 de Abril de 2011

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Eminências, Excelências

queridos irmãos e irmãs!

Desejo dirigir uma cordial saudação e também um vivo agradecimento aos produtores, aos realizadores deste documentário sobre o Venerável João Paulo II. Estou feliz por tê-lo visto aqui no Vaticano e por vos exprimir um vivo apreço pelo trabalho realizado, associando-me ao aplauso já expresso pelo Episcopado polaco e por alguns dos meus colaboradores.

Pela seriedade com a qual foi preparado, a qualidade da sua produção, este filme põe-se entre os contributos mais válidos oferecidos para o público por ocasião da próxima Beatificação do meu amado predecessor.

Já são numerosas as obras audiovisuais que têm por objecto a figura de João Paulo II, entre as quais vários documentários produzidos pelas emissoras televisivas. Este filme, «O peregrino vestido de branco», distingue-se neste panorama por diversos elementos, por exemplo as entrevistas a colaboradores estreitos, os testemunhos de personalidades ilustres e a riqueza da documentação. Tudo isto tem a finalidade de fazer emergir fielmente, quer a personalidade do Papa quer a sua incansável acção durante o longo Pontificado.

Gostaria de realçar mais uma vez os dois sustentáculos da sua vida e do seu ministério: a oração e o zelo missionário. João Paulo II foi um grande contemplativo e um importante apóstolo de Cristo. Deus escolheu-o para a sé de Pedro e conservou-o por longo tempo para que introduzisse a Igreja no terceiro milénio. Com o seu exemplo, guiou-nos a todos nesta peregrinação e continua agora a acompanhar-nos do Céu.

Obrigado mais uma vez a quantos de vários modos colaboraram para a realização deste filme que nos ajuda a enriquecer-nos com o testemunho luminoso do Papa João Paulo II. Com este sentimento de reconhecimento, abençoo de coração todos vós e os vossos entes queridos.


AO SENHOR FILIP VUCAK, NOVO EMBAIXADOR DA CROÁCIA JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS Segunda-feira, 11 de Abril de 2011

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Senhor Embaixador!

Sinto-me feliz por recebê-lo nesta circunstância solene da apresentação das Cartas com as quais Vossa Excelência é acreditado como Embaixador extraordinário e plenipotenciário da Croácia junto da Santa Sé. Agradeço-lhe as amáveis palavras que me dirigiu. Em troca, ficar-lhe-ia grato pela amabilidade de expressar ao Presidente da República, Sr. Ivo Josipovic, o qual tive o prazer de encontrar recentemente, os meus cordiais votos pela sua pessoa assim como pelo bem-estar e pela paz do povo croata.

O início da sua missão coincide felizmente com o vigésimo aniversário da independência da Croácia. E no próximo ano será o do estabelecimento das relações diplomáticas entre o seu país e a Santa Sé. As nossas relações são harmoniosas e serenas. A Santa Sé sempre teve pela Croácia uma solicitude particular. O meu distante predecessor, o papa Leão X, vendo a beleza da sua cultura e a profundidade da fé dos seus antepassados, definiu o seu país «scutum saldissimum et antemurale Christianitatis». Os seus valores antigos continuam a animar os nossos contemporâneos que enfrentaram, ainda há pouco tempo, dificuldades particulares. Por conseguinte, para fortalecer as gerações actuais, convém expor-lhes com clareza o rico património da história croata e da cultura cristã que a irrigou em profundidade e sobre a qual o seu povo sempre se apoiou nas adversidades.

Foi com satisfação que tomei conhecimento de que o seu Parlamento proclamou 2011 como o «Ano Bošcovic». Este jesuíta era físico, astrónomo, matemático, arquitecto, filósofo e diplomata. A sua existência demonstra a possibilidade de fazer conviver harmoniosamente a ciência e a fé, o serviço à mãe-pátria e o compromisso na Igreja. Este sábio cristão diz aos jovens que é possível realizar-se na sociedade actual e ser feliz nela sendo cristão. Por outro lado, os monumentos e os numerosos crucifixos espalhados no seu país são a demonstração clara desta feliz simbiose. Ao ver esta harmonia, os jovens serão orgulhosos do seu país, da sua história e da sua fé e sentir-se-ão cada vez mais herdeiros de um tesouro que hoje lhes compete fazer frutificar.

A Croácia está prestes a ser integrada plenamente na União europeia. A Santa Sé não pode deixar de se felicitar quando a família europeia se completa e recebe os Estados que, historicamente dela fazem parte. Senhor Embaixador, esta integração deverá ser feita no pleno respeito das especificidades croatas, da sua vida religiosa e da sua cultura. Seria ilusório pretender renegar a sua identidade para adoptar outra que nasceu em circunstâncias tão diferentes das que viram nascer e construir a da Croácia. Ao entrar na União europeia, o seu país não será unicamente receptor de um sistema económico e jurídico que tem as suas vantagens e limites, mas poderá igualmente dar a sua contribuição própria e tipicamente croata. Não se deve recear de reivindicar com determinação o respeito da sua história e da sua identidade religiosa e cultural. Vozes angustiantes contestam com surpreendente regularidade a realidade das raízes religiosas europeias. Tornou-se uma norma ser amnésico e negar a evidência histórica. Afirmar que a Europa não tem raízes cristãs, equivale a pretender que um homem pode viver sem oxigénio, sem alimento. Não devemos envergonhar-nos de recordar e de apoiar a verdade recusando, se necessário, o que lhe é contrário. Estou certo de que o seu país saberá defender a sua identidade com convicção e orgulho evitando os novos perigos que se apresentarão e que, com o pretexto de uma liberdade religiosa mal compreendida, são contrários ao direito natural, à família, e simplesmente à moral.

Gostaria de expressar também a minha satisfação pelo interesse dedicado pelo seu país a fim de que os Croatas na Bósnia e Herzegovina possam desempenhar o papel que lhes compete como um dos três povos constitutivos do país. Verifico também que, num desejo de paz e de sadias colaborações com os países da sua região geopolítica, a Croácia não deixa de dar a sua específica contribuição para facilitar o diálogo e a compreensão entre os povos com diferentes tradições, mas que vivem juntos há séculos. Encorajo a que continueis por este caminho que há-de consolidar a paz no respeito de cada um. No âmbito das suas fronteiras nacionais, os quatro Acordos assinados pelo seu país e a Santa Sé permitem, no respeito das especificidades próprias, debater sobre matérias de interesse comum. Será necessário prosseguir neste sentido para o bem das duas partes. Fico feliz por ver que a Croácia promove a liberdade religiosa e respeita a missão específica da Igreja.

Por todas estas razões, Senhor Embaixador, alegro-me profundamente por poder visitar o seu país daqui a poucas semanas. O meu predecessor, o venerável João Paulo II visitou-o três vezes, e eu próprio, quando era chefe de uma Congregação romana, o visitei várias vezes. Aceitei de bom grado o convite das Autoridades croatas e dos Bispos do seu nobre país. Como Vossa Excelência sabe, o tema escolhido para a viagem será: «Juntos, em Cristo!». É este «juntos» que eu desejo celebrar com o seu povo. Juntos não obstante as numerosas diferenças humanas, juntos com estas diferenças! E isto, em Cristo que acompanhou o povo croata ao longo dos séculos com bondade e misericórdia. Pela sua causa, desejo encorajar o seu país e a Igreja que se encontra convosco. Ela que acompanha com a mesma solicitude de Cristo, o destino e o andamento da sua nação desde as suas origens. Nesta feliz circunstância, gostaria de saudar calorosamente também os Bispos e os fiéis da Igreja católica na Croácia.

No momento em que inicia a sua nobre missão de representação junto da Santa Sé, expresso-lhe, Senhor Embaixador, os meus melhores votos pelo bom êxito da sua missão. Tenha a certeza de que encontrará sempre junto dos meus colaboradores o acolhimento e a compreensão de que poderá precisar. Ao confiar o seu país à protecção da Mãe de Deus, Nossa Senhora de Marija Bistrica, assim como à intercessão do beato Alojzije Stepinac, invoco de coração a abundância das Bênçãos divinas sobre Vossa Excelência, sobre a sua família e sobre os seus colaboradores, assim como sobre todo o povo croata e seus dirigentes.



A SUA BEATITUDE BÉCHARA PIERRE RAÏ NOVO PATRIARCA DE ANTIOQUIA DOS MARONITAS Quinta-feira 14 de abril de 2011

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Sala Clementina


Beatitude
Venerados Irmãos no Episcopado
Amados Filhos e Filhas da Igreja Maronita

Esta primeira visita ao Sucessor de Pedro depois da sua eleição à Sede Patriarcal de Antioquia dos Maronitas, é um momento privilegiado para a Igreja Universal. Alegro-me por recebê-lo aqui, com os Bispos maronitas, os sacerdotes, as pessoas consagradas e os fiéis, para solenizar a «Ecclesiastica Communio» que lhe manifestei por carta a 24 de Março passado. A sua eleição que teve lugar alguns dias depois do encerramento do Ano Santo, promulgado para celebrar o 1600 aniversário da morte de São Maron, surge como o fruto mais emimente das numerosas graças que ele obteve para a sua Igreja.

Saúdo calorosamente todos vós, que acompanhastes o vosso Patriarca para este grande momento de comunhão fraterna e de indefectível unidade da Igreja Maronita com a Igreja de Roma, ressaltando assim a importância da unidade visível da Igreja na sua catolicidade. Na ausência do Cardeal Nasrallah Pierre Sfeir, gostaria de lhe expressar o meu afecto e agradecimento por ter consagrado vinte e cinco anos da sua vida a guiar como Patriarca a Igreja Maronita no meio das turbulências da história.

Proximamente, esta comunhão eclesiástica encontrará a sua expressão mais autêntica na Divina Liturgia onde será partilhado o único Corpo e Sangue de Cristo. É nela que se manifesta a plenitude da comunhão entre o Sucessor do Príncipe dos Apóstolos e o 77º Sucessor de São Maron, Pai e Chefe da Igreja de Antioquia dos Maronitas, Sede Apostólica tão prestigiosa, onde os fiéis de Cristo receberam pela primeira vez o nome de «cristãos»! A vossa Igreja patriarcal, com a sua rica tradição espiritual, litúrgica e teológica, de tradição Antioquena, adornam sempre a Igreja inteira com este tesouro.

Dado que estais no centro do Médio Oriente, tendes uma enorme missão junto dos homens, aos quais o Amor de Cristo estimula a anunciar a Boa Nova da Salvação. Por ocasião do recente Sínodo que convoquei em Outubro de 2010, foi recordado, numerosas vezes, a urgência de propor de novo o Evangelho às pessoas que o conhecem pouco ou que se afastaram da Igreja. Com todas as forças vivas presentes no Líbano e no Médio Oriente, sei, Beatitude, que se preocupará por anunciar, testemunhar e viver na comunhão esta Palavra de vida a fim de reencontrar o fervor dos primeiros fiéis que «eram assíduos ao ensino dos apóstolos, à união fraterna, à fracção do pão, e às orações» (
Ac 2,42). Esta região do mundo que os patriarcas, os profetas, os apóstolos e o próprio Cristo abençoaram com a sua presença e pregação, aspira por esta paz duradoura que a Palavra de Verdade, acolhida e vivida, tem a capacidade de estabelecer.

Vós alcançareis este objectivo através de uma educação humana e espiritual, moral e intelectual dos jovens graças à vossa rede escolar e catequética, da qual conheço a qualidade. Faço fervorosos votos por que o vosso papel na sua formação seja cada vez mais reconhecido pela sociedade, para que os seus valores fundamentais sejam transmitidos, sem discriminação. Que deste modo os jovens de hoje se tornem homens e mulheres responsáveis nas suas famílias e na sociedade, para construir uma maior solidariedade e fraternidade entre todos os componentes da Nação. Transmiti aos jovens a minha estima e afecto recordando-lhes que a Igreja e a sociedade precisam do seu entusiasmo e da sua esperança. Para esta finalidade, convido-vos a intensificar a formação dos sacerdotes e dos numerosos jovens que o Senhor chama para as vossas eparquias e congregações religiosas. Que mediante o seu ensinamento e existência, eles sejam testemunhas autênticas do Verbo de Deus a fim de ajudar os fiéis a enraizar a sua vida e missão em Cristo!

Beatitude, dirijo-lhe votos fraternos para que o Espírito Santo o assista no desempenho do seu cargo. Que ele o conforte nas dificuldades e lhe conceda a alegria de ver crescer a Igreja em fervor e em número! No início do seu ministério, gostaria de lhe repetir as palavras de Cristo aos discípulos: «Não temas, pequenino rebanho, porque aprouve ao vosso Pai dar-vos o Reino» (Lc 12,32). Ao dirigir a todo o povo libanês as minhas calorosas saudações, confio-o de modo especial à intercessão de Nossa Senhora do Líbano, visto que Vossa Beatitude é filho da Ordem Maronita da Bem-Aventurada Virgem Maria, e também à de São Maron e de todos os santos e beatos libaneses. E concedo-lhe de todo o coração a Bênção Apostólica, assim como aos bispos e sacerdotes, aos religiosos, às religiosas e a todos os fiéis do seu Patriacado.



ENTREVISTA A BENTO XVI TRANSMITIDA NA ITÁLIA PELA RAI UNO NO PROGRAMA «À SUA IMAGEM. PERGUNTAS SOBRE JESUS» Sexta-feira, 22 de Abril de 2011

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Santo Padre, desejo agradecer-lhe a sua presença que nos enche de alegria e nos ajuda a recordar que hoje é o dia em que Jesus demonstra do modo mais radical o Seu amor, isto é, morrendo na cruz sendo inocente. É precisamente sobre o tema da dor inocente a primeira pergunta feita por uma criança japonesa de sete anos, que lhe diz: «Chamo-me Helena, sou japonesa e tenho sete anos. Sinto tanto medo porque a casa na qual me sentia segura tremeu tanto, e muitos dos meus coetâneos morreram. Não posso brincar no parque. Pergunto: por que devo ter tanto medo? Por que as crianças devem sentir tanta tristeza? Peço ao Papa, que fala com Deus, que me explique isto».

Querida Helena, saúdo-te de coração. Também surgem a mim as mesmas perguntas: por que é assim? Por que deveis sofrer tanto, enquanto outros vivem no conforto? E não temos as respostas, mas sabemos que Jesus sofreu como vós, inocente, que o Deus verdadeiro que se mostra em Jesus, está convosco. Isto parece-me muito importante, mesmo se não temos respostas, se permanece a tristeza: Deus está convosco, e tende a certeza que isto vos ajudará. E um dia poderemos até compreender por que era assim. Neste momento parece-me importante que saibais: «Deus ama-me», mesmo se parece que não me conhece. Não, ama-me, está comigo, e deveis ter a certeza de que no mundo, no universo, muitos estão convosco, pensam em vós, fazem na medida que lhes é possível algo por vós, para vos ajudar. E estar conscientes de que, um dia, eu compreenderei que este sofrimento não era vazio, não era em vão, mas que por detrás há um projecto bom, um projecto de amor. Não é um caso. Tem a certeza disto, nós estamos contigo, com todas as crianças japonesas que sofrem, queremos ajudar-vos com a oração, com a nossa oração, com as nossas acções e tende a certeza de que Deus vos ajuda. E neste sentido rezamos juntos para que para vós chegue quanto antes a luz.

A segunda pergunta apresenta-nos um calvário, porque temos uma mãe aos pés da cruz de um filho. É italiana, chama-se Maria Teresa, e diz-Lhe: «Santidade, a alma deste meu filho Francesco, em estado vegetativo desde o dia de Páscoa de 2009, abandonou o seu corpo, dado que ele já não está consciente, ou ainda está perto dele?».

Certamente a alma ainda está presente no corpo. Talvez, a situação, é como a de uma guitarra cujas cordas se partiram, assim não pode tocar. Também o instrumento do corpo é frágil, é vulnerável, e a alma não pode tocar, por assim dizer, mas permanece presente. Tenho também a certeza de que esta alma escondida sente em profundidade o vosso amor, mesmo se não compreende os pormenores, as palavras, etc., mas a presença de um amor sente-a. E por isso esta vossa presença, queridos pais, querida mãe, ao lado dele, por muitas horas todos os dias, é um acto verdadeiro de amor de grande valor, porque esta presença entra na profundidade desta alma escondida e o vosso acto é, por conseguinte, também um testemunho de fé em Deus, de fé no homem, de fé, digamos de compromisso pela vida, de respeito pela vida humana, até nas situações mais tristes. Por conseguinte, encorajo-vos a continuar, a saber que prestais um grande serviço à humanidade com este sinal de confiança, com este sinal de respeito da vida, com este amor por um corpo dilacerado, por uma alma sofredora.

A terceira pergunta leva-nos ao Iraque, entre os jovens de Bagdad, cristãos perseguidos que lhe enviam esta pergunta: «Salve, do Iraque, Santo Padre – dizem – Nós cristãos de Bagdad somos perseguidos como Jesus. Santo Padre, no seu parecer, de que modo podemos ajudar a nossa comunidade cristã a reconsiderar o desejo de emigrar para outros países, convencendo-a que partir não é a única solução?».

Em primeiro lugar, gostaria de saudar de coração todos os cristãos do Iraque, nossos irmãos, e devo dizer que rezo todos os dias pelos cristãos no Iraque. São os nossos irmãos sofredores, assim como noutras terras do mundo, e portanto estão particularmente próximos do nosso coração e nós devemos fazer, no que está ao nosso alcance, o possível para que possam permanecer, para que possam resistir à tentação de migrar, porque é muito compreensível nas condições em que vivem. Eu diria que é importante que estejamos próximos de vós, queridos irmãos no Iraque, que vos queremos ajudar, mesmo quando vindes, receber-vos realmente como irmãos. E naturalmente, as instituições, quantos têm na realidade uma possibilidade de fazer algo no Iraque por vós, devem fazê-lo. A Santa Sé está em contacto permanente com as diversas comunidades, não só com as comunidades católicas, com as outras comunidades cristãs, mas também com os irmãos muçulmanos, quer xiitas quer sunitas. E queremos fazer um trabalho de reconciliação, de compreensão, também com o governo, ajudá-lo neste caminho difícil de recompor uma sociedade dilacerada. Porque é este o problema, que a sociedade está profundamente dividida, dilacerada, que já não há esta consciência: «Nós somos nas diversidades um povo com uma história comum, onde cada qual tem o seu lugar». E devem reconstruir esta consciência de que, na diversidade, têm uma história em comum, uma comum determinação. E nós queremos, em diálogo, precisamente com os diversos grupos, ajudar o processo de reconstrução e encorajar-vos, queridos irmãos cristãos no Iraque, a ter confiança, paciência, confiança em Deus, a colaborar neste processo difícil. Tende a certeza da nossa oração.

A próxima pergunta é-lhe dirigida por uma mulher muçulmana da Costa do Marfim, um país que está em guerra há anos. Esta senhora, chama-se Bintù, e envia-lhe uma saudação em árabe que diz o seguinte: «Que Deus esteja entre todas as palavras que nos diremos e que Deus esteja contigo». É uma expressão que eles usam quando iniciam um discurso. E depois prossegue em francês: «Querido Santo Padre, aqui na Costa do Marfim, sempre vivemos em harmonia cristãos e muçulmanos. As famílias com frequência são formadas por membros de ambas as religiões; existe também uma diversidade de etnias, mas nunca tivemos problemas. Agora tudo mudou: a crise que vivemos, causada pela política, está a semear divisões. Quantos inocentes perderam a vida! Quantos refugiados, quantas mães e crianças traumatizadas! Os mensageiros exortaram à paz, os profetas exortaram à paz. Jesus é um homem de paz. Vossa Santidade, como Embaixador de Jesus, o que aconselharia para o nosso país?».

Gostaria de responder à saudação: Deus esteja contigo, te ajude sempre. E devo dizer que recebi cartas dilacerantes da Costa do Marfim, nas quais vejo toda a tristeza, a profundidade do sofrimento, e fico triste por podermos fazer tão pouco. Podemos fazer uma coisa, sempre: estar em oração convosco, e na medida do possível, faremos obras de caridade e sobretudo queremos ajudar, segundo as nossas possibilidades, os contactos políticos, humanos. Encarreguei o cardeal Turkson, que é presidente do nosso Conselho «Justiça e Paz» de ir à Costa do Marfim e procurar mediar, falar com os diversos grupos, com as diversas pessoas para encorajar um novo início. E sobretudo queremos fazer ouvir a voz de Jesus, no qual também a Senhora crê como profeta. Ele era sempre o homem da paz. Poderíamos esperar que, quando Deus viesse à terra, teria sido um homem de grande força, destruiria os poderes contrários, que seria um homem de uma violência forte como instrumento de paz. Nada disto: veio débil, veio apenas com a força do amor, totalmente sem violência até ser crucificado. E isto mostra-nos o verdadeiro rosto de Deus, que a violência nunca vem de Deus, nunca ajuda a dar as coisas boas, mas é um meio destruidor e não é o caminho para sair das dificuldades. Por conseguinte, é uma voz forte contra qualquer tipo de violência. E convido veementemente todas as partes a renunciar à violência, a procurar os caminhos da paz. Não podeis servir a recomposição do vosso povo com meios de violência, mesmo se pensais que tendes razão. O único caminho é renunciar à violência, recomeçar com o diálogo, com tentativas para encontrar juntos a paz, com nova atenção uns pelos outros, com nova disponibilidade a abrir-vos uns aos outros. E esta, querida Senhora, é a verdadeira mensagem de Jesus: procurai a paz com os meios da paz e abandonai a violência. Nós rezamos por vós, para que todos os componentes da vossa sociedade ouçam esta voz de Jesus e que desta forma volte a paz e a comunhão.

Santo Padre, a próxima pergunta é sobre o tema da morte e da Ressurreição de Jesus, e vem da Itália. É a seguinte: «Santidade, o que faz Jesus no espaço de tempo entre a morte e a Ressurreição? E visto que na oração do Credo se diz que Jesus, depois da morte, desceu à mansão dos mortos, podemos pensar que será uma coisa que acontecerá também a nós, depois da morte, antes de subir ao céu?».

Antes de tudo, não devemos imaginar esta descida da alma de Jesus como uma viagem geográfica, local, de um continente para outro. É uma viagem da alma. Deve-se ter presente que a alma de Jesus toca sempre o Pai, está sempre em contacto com o Pai, mas ao mesmo tempo esta alma humana expande-se até aos extremos confins do ser humano. Neste sentido, vai em profundidade, vai aos dispersos, vai a todos os que não chegaram à meta da sua vida, e assim transcende os continentes do passado. Esta palavra da descida do Senhor à mansão dos mortos quer sobretudo significar que também o passado é alcançado por Jesus, que a eficácia da Redenção não começa no ano zero ou trinta, mas vai também ao passado, abrange o passado, todos os homens de todos os tempos. Os Padres dizem, com uma imagem muito bonita, que Jesus toma pela mão Adão e Eva, isto é, a humanidade, e a guia em frente, guia-a para o alto. E cria deste modo o acesso a Deus, porque o homem, por si, não pode chegar à altura de Deus. Ele mesmo, sendo homem, tomando o homem pela mão, abre o acesso, abre o quê? A realidade a que nós chamamos Céu. Portanto esta descida à mansão dos mortos, ou seja na profundidade do passado da humanidade, é uma parte essencial da missão de Jesus, da sua missão de Redentor e não se aplica a nós. A nossa vida é diversa, nós já somos remidos pelo Senhor e chegamos diante do rosto do Juiz, depois da nossa morte, sob o olhar de Jesus, e este olhar por um lado será purificador: penso que todos nós, em maior ou menor medida, teremos necessidade de purificação. O olhar de Jesus purifica-nos e depois torna-nos capazes de viver com Deus, de viver com os Santos, de viver sobretudo em comunhão com os nossos entes queridos que nos precederam.

Também a próxima pergunta é sobre o tema da Ressureição e provém da Itália: «Santidade, quando as mulheres vão ao sepulcro, no domingo depois da morte de Jesus, não reconhecem o Mestre, confundem-no com outro. Acontece também aos apóstolos: Jesus tem que mostrar as feridas, partir o pão para ser reconhecido, precisamente, pelos gestos. É um corpo verdadeiro, de carne, mas também um corpo glorioso. O facto de que o seu corpo ressuscitado não possua as mesmas feições do de antes, o que significa? O que significa exactamente corpo glorioso? E será assim para nós a Ressurreição?».

Naturalmente, não podemos definir o corpo glorioso porque está além das nossas experiências. Podemos unicamente registar os sinais que Jesus nos deu para compreender pelo menos um pouco em que direcção devemos procurar esta realidade. Primeiro sinal: o túmulo está vazio. Isto é, Jesus não deixou o seu corpo à corrupção, mostrou-nos que também a matéria está destinada à eternidade, que realmente ressuscitou, que não permanece uma coisa perdida. Jesus tomou consigo também a matéria, e assim também a matéria tem a promessa da eternidade. Mas depois assumiu esta matéria numa nova condição de vida, este é o segundo ponto: Jesus já não morre, ou seja, está acima das leis da biologia, da física, porque submetido a elas morre-se. Por conseguinte, há uma nova condição, diversa, que nós não conhecemos, mas que se mostra no facto que Jesus, e é a grande promessa para todos nós que há um mundo novo, uma vida nova, rumo à qual nós estamos a caminho. E, estando nestas condições, Jesus tem a possibilidade de se fazer tocar, de dar a mão aos seus, de comer com eles, mas contudo está acima das condições da vida biológica, como nós a vivemos. E sabemos que, por um lado, é um verdadeiro homem, não um fantasma, que vive uma vida verdadeira, mas uma vida nova que já não está submetida à morte e que é a nossa grande promessa. É importante compreender isto, pelo menos na medida do possível, no que se refere à Eucaristia: na Eucaristia, o Senhor doa-nos o seu corpo glorioso, não nos dá a comer carne no sentido da biologia, doa-se a si mesmo, esta novidade que é Ele, entra no nosso ser homens, no nosso, no meu ser pessoa, como pessoa, e toca-nos interiormente com o seu ser, de modo que podemos deixar-nos penetrar pela sua presença, transformar na sua presença. É um aspecto importante, porque assim já estamos em contacto com esta nova vida, este novo tipo de vida, tendo Ele entrado em mim, e eu saí de mim e propago-me numa nova dimensão de vida. Eu penso que este aspecto da promessa, da realidade que Ele se doa a mim e me faz sair de mim, para o alto, é o aspecto mais importante: não se trata de registar coisas que não podemos compreender, mas de estar a caminho rumo à novidade que começa, sempre, de novo, na Eucaristia.

Santo Padre, a última pergunta é sobre Maria. Aos pés da cruz, assistimos a um diálogo comovedor entre Jesus, sua mãe e João, no qual Jesus diz a Maria: «Eis aí o teu Filho», e a João, «Eis a tua mãe». No seu último livro «Jesus de Nazaré», Vossa Santidade define-o «uma última ordem de Jesus». Como devemos entender estas palavras? Que significado tinham naquele momento e que significado têm hoje? E em tema de recomendação, tenciona renovar uma consagração à Virgem no início deste novo milénio?

Estas palavras de Jesus são sobretudo um gesto muito humano. Vemos Jesus como verdadeiro homem que faz um gesto humano, um gesto de amor pela mãe e confia a mãe ao jovem João para que tenha protecção. Uma mulher sozinha, no Oriente, naquele tempo, encontrava-se numa situação impossível. Confia a mãe a este jovem e ao jovem dá a mãe, portanto Jesus realmente age como homem com um sentimento profundamente humano. Isto parece-me muito belo, muito importante, que antes de qualquer teologia vemos nisto a verdadeira humanidade, o verdadeiro humanismo de Jesus. Mas naturalmente isto realiza diversas dimensões, não se refere só a este momento, mas diz respeito a toda a história. Em João Jesus confia todos nós, toda a Igreja, todos os discípulos futuros, à mãe e a mãe a nós. E isto realizou-se ao longo da história: cada vez mais a humanidade e os cristãos compreenderam que a mãe de Jesus é a sua mãe. E cada vez mais se recomendaram à Mãe: pensemos nos grandes santuários, pensemos nesta devoção a Maria onde o povo sente cada vez mais «Esta é a tua Mãe». E também alguns que quase têm dificuldade de acesso a Jesus na sua grandeza de Filho de Deus, se recomendam sem dificuldade à Mãe. Há quem diz: «Mas isto não tem fundamento bíblico!». Aqui responderia com São Gregório Magno: «Ao ler — diz ele — crescem as palavras da Escritura». Ou seja, desenvolvem-se na realidade, crescem, e cada vez mais na história se desenvolve esta Palavra. Vemos como todos podemos ser gratos porque a Mãe existe realmente, a todos nós é dada uma mãe. E podemos, com grande confiança, ir ter com esta Mãe, que é Mãe também para cada um dos cristãos. E por outro lado é válido de igual modo que a Mãe expressa também a Igreja. Não podemos ser cristãos sozinhos, com um cristianismo construído segundo a minha ideia. A Mãe é imagem da Igreja, da Mãe-Igreja, e confiando-nos a Maria devemos confiar-nos também à Igreja, viver a Igreja, ser a Igreja com Maria. E assim chego ao ponto da entrega: os Papas — quer Pio xii, quer Paulo vi, quer João Paulo ii — fizeram um grande acto de entrega a Nossa Senhora e parece-me, como gesto diante da humanidade, diante de Maria, que era um gesto muito importante. Penso que agora seja importante interiorizar este aspecto, deixar penetrar, realizá-lo em nós mesmos. Neste sentido, fui a alguns grandes santuários marianos no mundo: Lourdes, Fátima, Czestochowa, Altötting..., sempre com este sentido de concretização, de interiorizar este acto de entrega, para que se torne realmente o nosso acto. Penso que o acto grande, público, tenha sido feito. Talvez um dia seja necessário repeti-lo, mas no momento parece-me mais importante vivê-lo, realizá-lo, entrar nesta entrega, para que seja realmente nossa. Por exemplo, em Fátima, vi como as milhares de pessoas presentes entraram realmente nesta entrega, se confiaram, concretizaram em si mesmas, para si mesmas, esta entrega. Assim ela torna-se realidade na Igreja viva e desta forma cresce também a Igreja. A entrega comum a Maria, o deixar-se todos penetrar por esta presença e formar, entrar em comunhão com Maria, torna-nos Igreja, juntamente com Maria, realmente esta esposa de Cristo. Por conseguinte, actualmente não tenho a intenção de um novo acto público de entrega, mas por isso mesmo gostaria de convidar a entrar nesta entrega já feita, para que seja realidade vivida por nós todos os dias e assim cresça uma Igreja realmente mariana, que é Mãe e Esposa e Filha de Jesus.




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