Discursos Bento XVI 30221

À COMUNIDADE EMANUEL Sala del Consistorio Quinta-feira 3 de Fevereiro de 2011

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Prezados Irmãos no Episcopado
Estimados amigos

Estou feliz por vos receber no momento em que a Comunidade Emanuel se prepara para celebrar o vigésimo aniversário da morte do seu fundador, Pierre Goursat, cuja causa de beatificação foi iniciada no ano passado. Que o exemplo da sua vida de fé e do seu compromisso missionário vos estimulem e sejam para vós um apelo constante a caminhar rumo à santidade! Durante os próximos meses vós haveis de celebrar também o trigésimo aniversário do serviço da fidesco nos países mais necessitados, o quadragésimo aniversário de fundação da Comunidade e o vigésimo aniversário do reconhecimento dos seus estatutos por parte do Pontifício Conselho para os Leigos. Juntamente convosco, dou graças a Deus por esta obra! A cada um e a cada uma de vós, sacerdotes e leigos, dirijo as minhas cordiais saudações. Saúdo de modo particular o Moderador da Comunidade — a quem agradeço as amáveis palavras que me dirigiu — os membros do Conselho internacional, os responsáveis dos grandes serviços, assim como os Bispos provenientes da Comunidade. Que a vossa peregrinação a Roma, neste início do ano jubilar, seja a ocasião de renovar o vosso compromisso a permanecer fervorosos discípulos de Cristo, na fidelidade à Igreja e aos seus Pastores!

Caros amigos, a profunda graça da vossa Comunidade deriva da adoração eucarística. Desta adoração nasce a compaixão por todos os homens, enquanto desta compaixão provém a sede de evangelizar (cf. Estatutos, Preâmbulo, I). Portanto, no espírito do carisma que vos é próprio, encorajo-vos a aprofundar a vossa vida espiritual reservando um lugar essencial ao encontro pessoal com Cristo, o Emanuel, o Deus connosco, a fim de vos deixar transformar por Ele e de fazer amadurecer em vós o desejo apaixonado da missão. Na Eucaristia, vós encontrais a nascente de todos os compromissos no seguimento de Cristo, e na sua adoração vós purificais o vosso olhar sobre a vida do mundo. «com efeito, não podemos reservar para nós o amor que celebramos neste sacramento: por sua natureza, pede para ser comunicado a todos. Aquilo de que o mundo tem necessidade é do amor de Deus, é de encontrar Cristo e acreditar n’Ele» (Exortação Apostólica pós-sinodal Sacramentum caritatis, 84). Uma vida autenticamente eucarística que é uma vida missionária. Num mundo muitas vezes desorientado e à procura de novas razões de vida, a luz de Cristo deve ser levada a todos. Sede no meio dos homens e das mulheres de hoje fervorosos missionários do Evangelho, sustentados por uma vida radicalmente tomada por Cristo! Tende sede de anunciar a Palavra de Deus!

Hoje, a urgência deste anúncio faz-se sentir de modo particular nas famílias, tão frequentemente desagregadas, entre os jovens ou nos ambientes intelectuais. Contribuí para renovar a partir de dentro o dinamismo apostólico das paróquias, desenvolvendo as suas orientações espirituais e missionárias! Encorajo-vos ainda a prestar atenção às pessoas que voltam para a Igreja e que não beneficiaram de uma catequese aprofundada. Ajudai-as a enraizar a sua fé numa vida autenticamente teologal, sacramental e eclesial! O trabalho levado a cabo, de modo particular pela fidesco dá testemunho também do vosso compromisso a favor das populações dos países mais desfavorecidos. Que em toda a parte a vossa caridade faça resplandecer o amor de Cristo, tornando-se assim uma força para a construção de um mundo mais justo e fraterno!

Convido particularmente a vossa Comunidade a viver uma comunhão genuína entre os seus membros. Esta comunhão, que não é simples solidariedade humana entre membros de uma única família espiritual, está assente sobre a vossa relação com Cristo e sobre um compromisso comum ao seu serviço. A vida comunitária que desejais desenvolver, no respeito pela condição de vida de cada um, será então para a sociedade um testemunho vivo do amor fraterno que deve animar todos os relacionamentos humanos. A comunhão fraterna é já um anúncio do mundo novo que Cristo veio instaurar.

Que esta mesma comunhão, que não é um fechar-se em si mesmo, seja também eficaz com as Igrejas locais. Com efeito, cada carisma está relacionado com o crescimento do Corpo de Cristo na sua totalidade. Portanto, a obra missionária deve adaptar-se incessantemente às realidades da Igreja particular, numa solicitude permanente pelo concerto e a colaboração com os pastores, sob a autoridade do Bispo. Além disso, o reconhecimento mútuo da diversidade das vocações na Igreja e da sua contribuição indispensável para a evangelização constitui um sinal eloquente da unidade dos discípulos de Cristo e da credibilidade do seu testemunho.

A Virgem Maria, Mãe do Emanuel, ocupa um lugar importante na espiritualidade da vossa Comunidade. Recebei-a «na vossa casa», como fez o Discípulo bem-amado, a fim de que Ela seja verdadeiramente a Mãe que vos oriente para o seu Filho divino e que vos ajude a permanecer-lhe fiéis. Enquanto vos confio à sua intercessão materna, concedo-vos do íntimo do coração, a cada um e a cada uma de vós, assim como a todos os membros da Comunidade Emanuel, a minha Bênção apostólica.




À PLENÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL DA ASSINATURA APOSTÓLICA Sala do Consistório Sexta-feira, 4 de Fevereiro de 2011

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Senhores Cardeais
Venerados Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
Caros Irmãos e Irmãs

Antes de tudo, desejo transmitir a minha cordial saudação ao Prefeito da Assinatura Apostólica, Senhor Cardeal Raymond Leo Burke, a quem agradeço o discurso com que introduziu este encontro. Saúdo os Senhores Cardeais e os Bispos membros do Supremo Tribunal, o Secretário, os Oficiais e todos os colaboradores que desempenham o seu ministério quotidiano neste Dicastério. Dirijo também uma cordial saudação aos Refendários e aos Advogados.

Esta é a primeira oportunidade de me encontrar com o Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica depois da promulgação da Lex propria, que assinei em 21 de Junho de 2008. Precisamente durante a preparação de tal lei sobressaiu o desejo dos Membros da Assinatura, de poder dedicar — na forma comum a cada Dicastério da Cúria Romana (cf. Const. Apost. Pastor bonus Pastor bonus, 28 de Junho de 1988, art. 11; Regulamento Geral da Cúria Romana, 30 de Abril de 1999, arts. 112-117) — uma Congregatio plenaria periodica à promoção da recta administração da justiça na Igreja (cf. Lex propria, art. 112). Com efeito, a tarefa deste Tribunal não se esgota no exercício supremo da função judicial, mas conhece também como seu ofício, no âmbito executivo, a vigilância sobre a recta administração da justiça no Corpus Ecclesiae (cf. Const. Apost. Pastor bonus, art. 121; Lex propria, art. 32). Isto comporta, entre outras coisas, como a Lex propria indica, a colectânea actualizada de informações sobre o estado e a actividade dos tribunais locais, através do relatório anual que cada tribunal deve enviar à Assinatura Apostólica; a organização e a elaboração dos dados que deles derivam; a definição de estratégias para a valorização dos recursos humanos e institucionais nos tribunais locais, assim como o exercício constante da função de orientação dirigida aos Moderadores dos tribunais diocesanos e interdiocesanos, aos quais compete institucionalmente a responsabilidade directa pela administração da justiça. Trata-se de uma obra coordenada e paciente, destinada sobretudo a oferecer aos fiéis uma administração da justiça recta, pronta e eficaz, como eu pedia, no que se refere às causas de nulidade matrimonial, na Exortação Apostólica Sacramentum caritatis: «Nos casos em que surgirem legitimamente dúvidas sobre a validade do Matrimónio sacramental contraído, deve fazer-se tudo o que for necessário para verificar o fundamento das mesmas. Há que assegurar, pois, no pleno respeito do direito canónico, a presença no território dos tribunais eclesiásticos, o seu carácter pastoral, a sua actividade correcta e imediata; é necessário haver, em cada diocese, um número suficiente de pessoas preparadas para o solícito funcionamento dos tribunais eclesiásticos. Recordo que “é uma obrigação grave tornar a actuação institucional da Igreja nos tribunais cada vez mais acessível aos fiéis”» (n. 29). Nessa ocasião, não deixei de me referir à Instrução Dignitas connubii, que oferece aos Moderadores e aos ministros dos tribunais, sob a forma de vade-mécum, as normas necessárias para que as causas de nulidade matrimoniais sejam tratadas e definidas do modo mais rápido e seguro. Para garantir que os tribunais eclesiásticos estejam presentes no território e que o seu ministério seja adequado às justas exigências de rapidez e simplicidade às quais os fiéis têm direito na exposição das suas causas, é desempenhada a actividade desta Assinatura Apostólica quando, segundo a sua competência, ela promove a erecção de tribunais interdiocesanos; provê com prudência à dispensa dos títulos académicos dos ministros dos tribunais, apesar da verificação pontual da sua perícia real no direito substantivo e processual; concede as necessárias dispensas de leis processuais quando o exercício da justiça exige, num caso especial, a relaxatio legis para alcançar o fim desejado pela lei. Também esta é uma importante obra de discernimento e de aplicação da lei processual.

A vigilância sobre a recta administração da justiça seria, porém, carente se não compreendesse inclusive a função de tutela da recta jurisprudência (cf. Lex propria, art. 111 § 1). Os instrumentos de conhecimento e intervenção, que a Lex propria e a posição institucional garantem a esta Assinatura Apostólica, permitem um trabalho que, em sinergia com o Tribunal da Rota Romana (cf. Const. Apost. Pastor bonus, art. 126), reve-la-se providencial para a Igreja. As exortações e as prescrições com as quais esta Assinatura Apostólica acompanha as respostas aos Relatórios anuais dos tribunais locais não raro recomendam aos respectivos Moderadores o conhecimento e a adesão, quer às directrizes propostas nas anuais alocuções pontifícias à Rota Romana, quer à comum jurisprudência rotal sobre aspectos específicos que se revelam urgentes para os tribunais individualmente. Portanto, encorajo também a reflexão, que vos empenhará nestes dias, sobre a recta jurisprudência a propor aos tribunais locais em matéria de error iuris como motivo de nulidade matrimonial.

Este Supremo Tribunal está, outrossim, comprometido num outro âmbito delicado da administração da justiça, que lhe foi confiado pelo Servo de Deus Paulo VI; com efeito, a Assinatura conhece as controvérsias surgidas por um acto do poder administrativo eclesiástico e a ela conferidas através do recurso legitimamente proposto contra actos administrativos singulares, emanados ou aprovados por Dicastérios da Cúria Romana (cf. Const. Apost. Regimini Ecclesiae universae, 15 de Agosto de 1967, n. 106; CDC,
CIC 1445 § 2; Const. Apost. Pastor bonus, art. ; Lex propria, art. 34). Trata-se de um serviço de importância primária: a predisposição de instrumentos de justiça — da composição pacífica das controvérsias à abordagem e definição judicial das mesmas — constitui a oferta de um lugar de diálogo e de restabelecimento da comunhão na Igreja. Com efeito, se é verdade que a injustiça deve ser enfrentada antes de tudo com as armas espirituais da oração, da caridade, do perdão e da penitência, todavia não se pode excluir em alguns casos a oportunidade e a necessidade de que ela seja enfrentada com os instrumentos processuais. Antes de tudo, eles constituem lugares de diálogo, que às vezes levam à concórdia e à reconciliação. Não é por acaso que o ordenamento processual prevê que in limine litis, aliás, em cada fase do processo, se dê espaço e ocasião para que «sempre que alguém se julgar prejudicado por um decreto, é sumamente desejável que se evite a contenda entre ele e o autor do decreto, e que se procure de comum acordo uma adequada solução entre ambos, aproveitando-se inclusive da mediação e do esforço de pessoas ponderadas, de modo que seja evitada ou dirimida a controvérsia por um caminho idóneo» (CDC, CIC 1733 § 1). São também encorajadas para este fim iniciativas e normativas destinadas à instituição de ofícios ou conselhos que tenham como tarefa, segundo normas a definir, procurar e sugerir soluções equitativas (cf. ibid. § 2).

Nos outros casos, ou seja, quando não é possível resolver a controvérsia pacificamente, o desenvolvimento do processo contencioso administrativo comportará a definição judicial da controvérsia: também neste caso, a actividade do Supremo Tribunal visa a reconstituição da comunhão eclesial, ou seja, o restabelecimento de uma ordem objectiva em conformidade com o bem da Igreja. Somente esta comunhão restabelecida e justificada através da motivação da decisão judicial pode conduzir, no conjunto eclesial, a uma paz e concórdia autênticas. É o que significa o famoso princípio: Opus iustitiae pax. O difícil restabelecimento da justiça está destinado a reconstruir relações justas e ordenadas entre os fiéis e entre si e a Autoridade eclesiástica. Com efeito, a paz interior e a colaboração espontânea dos fiéis na missão da Igreja brotam da consciência restabelecida de cumprir plenamente a própria vocação. A justiça, que a Igreja busca através do processo contencioso administrativo, pode ser considerada como início, exigência mínima e contemporaneamente expectativa de caridade, indispensável e ao mesmo tempo insuficiente, se relacionada com a caridade da qual a Igreja vive. Contudo, o Povo de Deus peregrino sobre a terra não poderá realizar a sua identidade de comunidade de amor, se nele não se tiver respeito pelas exigências da justiça.

A Maria Santíssima, Speculum iustitiae e Regina pacis, confio o ministério precioso e delicado que a Assinatura Apostólica desempenha ao serviço da comunhão na Igreja, enquanto manifesto a cada um de vós a certeza da minha estima e do meu apreço. Sobre vós e o vosso compromisso quotidiano, invoco a luz do Espírito Santo, enquanto concedo a todos a minha Bênção apostólica.




AOS PARTICIPANTES NA PLENÁRIA DA CONCREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA Sala do Consistório

Segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011




Senhores Cardeais
1253 Venerados Irmãos no Episcopado
e no Sacerdócio
queridos irmãos e irmãs!

Dirijo a cada um de vós a minha cordial saudação nesta visita por ocasião da reunião plenária da Congregação para a Educação Católica. Saúdo o Cardeal Zenon Grocholewski, Prefeito do Dicastério, agradecendo as suas gentis palavras, assim como o Secretário, o Subsecretário, os Oficiais e os Colaboradores.

As temáticas que enfrentais nestes dias têm como denominador comum a educação e a formação, que constituem hoje um dos desafios mais urgentes que a Igreja e as suas instituições são chamadas a enfrentar. Parece que a obra educativa se tornou cada vez mais árdua pois, numa cultura que com demasiada frequência faz do relativismo o próprio credo, falta a luz da verdade, aliás é considerado perigoso falar da verdade, insinuando assim a dúvida sobre os valores básicos da existência pessoal e comunitária. Por isso, é importante o serviço que prestam no mundo numerosas instituições formativas que se inspiram na visão cristã do homem e da realidade: educar é um acto de amor, exercício da «caridade intelectual», que requer responsabilidade, dedicação e coerência de vida. O trabalho da vossa Congregação e as escolhas que fareis nestes dias de reflexão e de estudo certamente contribuirão para responder à actual «emergência educativa».

A vossa Congregação, criada em 1915 por Bento XV, há quase cem anos realiza a sua obra preciosa ao serviço das várias Instituições católicas de formação. Entre estas, sem dúvida, o seminário é uma das mais importantes para a vida da Igreja e, por conseguinte, exige um projecto formativo que tenha em consideração o contexto antes mencionado. Várias vezes realcei o modo como o seminário representa uma etapa preciosa da vida, no qual o candidato ao sacerdócio faz a experiência de ser «discípulo de Jesus». Para este tempo destinado à formação, é exigido um determinado destaque, um certo «deserto», porque o Senhor fala ao coração como uma voz que só se ouve se houver silêncio (cf.
1R 19,12); mas é exigida também a disponibilidade para viver juntos, amar a «vida de família» e a dimensão comunitári, que antecipam aquela «fraternidade sacramental» que deve caracterizar cada presbítero diocesano (cf. Presbyterorum ordinis PO 8) e que eu quis evocar inclusive na minha recente Carta aos seminaristas: «Uma pessoa não se torna sacerdote sozinha. É necessária a “comunidade dos discípulos”, o conjunto daqueles que querem servir a Igreja de todos».

Nestes dias estais a estudar também o esboço do documento sobre a Internet e a formação nos seminários. A internet, pela sua capacidade de superar as distâncias e de colocar as pessoas em contacto recíproco, apresenta grandes possibilidades para a Igreja e a sua missão. Com o necessário discernimento para um uso inteligente e prudente, é um instrumento que pode servir não só para os estudos, mas também para a acção pastoral dos futuros presbíteros nos vários campos eclesiais, como a evangelização, a acção missionária, a catequese, os projectos educativos e a gestão das instituições. Também neste campo é de extrema importância poder contar com formadores adequadamente preparados para que sejam guias fiéis e sempre actualizados, a fim de orientar os candidatos ao sacerdócio no uso correcto e positivo dos meios informáticos.

Depois, este ano celebra-se o LXX aniversário da Pontifícia Obra para as Vocações Sacerdotais, instituída pelo Venerável Pio XII a fim de favorecer a colaboração entre a Santa Sé e as Igrejas locais no precioso trabalho de promoção das vocações ao ministério ordenado. Tal evento poderá ser uma ocasião para conhecer e valorizar as iniciativas vocacionais mais significativas, promovidas nas Igrejas locais. É preciso que a pastoral vocacional, além de realçar o valor da chamada universal a seguir Jesus, insista mais claramente sobre o perfil do sacerdócio ministerial, caracterizado pela sua configuração específica com Cristo, que o distingue essencialmente dos outros fiéis e se põe ao serviço deles.

Além disso, iniciastes uma revisão de quanto prescreve a Constituição apostólica Sapientia christiana sobre os estudos eclesiásticos, relativos ao direito canónico, aos Institutos Superiores de Ciências Religiosas e, recentemente, à filosofia. A teologia é um sector sobre o qual se deve reflectir particularmente. É importante tornar cada vez mais sólido o vínculo entre a teologia e o estudo da Sagrada Escritura, de modo que esta seja realmente a sua alma e coração (cf. Verbum Domini, 31). Contudo, o teólogo não deve esquecer de ser também aquele que fala a Deus. Portanto, é indispensável manter estreitamente unidas a teologia e a oração pessoal e comunitária, especialmente litúrgica. A teologia é scientia fidei e a oração alimenta a fé. Na união com Deus, de qualquer modo, o mistério é saboreado, faz-se próximo, e esta proximidade é luz para a inteligência. Gostaria de realçar também a conexão da teologia com as outras disciplinas, considerando que ela é ensinada nas Universidades católicas e, em muitos casos, nas civis. O beato John Henry Newman falava de «círculo do saber», circle of knowledge, para indicar que existe uma interdependência entre os vários ramos do saber; mas Deus e só Ele tem relação com a totalidade do real; consequentemente, eliminar Deus significa interromper o círculo do saber. Nesta perspectiva as Universidades católicas, com as suas bem delineadas identidade e abertura à «totalidade» do ser humano, podem desenvolver uma obra preciosa para promover a unidade do saber, orientando estudantes e professores para a Luz do mundo, a «luz verdadeira que a todo o homem ilumina» (Jn 1,9). São considerações válidas também para as escolas católicas. Antes de tudo, é preciso ter coragem para anunciar o valor «amplo» da educação, para formar pessoas sólidas, capazes de colaborar com os outros e dar sentido à própria vida. Hoje fala-se de educação intercultural, objecto de estudo inclusive na vossa Plenária. Neste âmbito, requer-se uma fidelidade corajosa e inovativa, que saiba conjugar consciência clara da própria identidade e abertura à alteridade, pelas exigências do viver juntos nas sociedades multiculturais. Também para este fim, emerge o papel educativo do ensino da Religião católica como disciplina escolar em diálogo interdisciplinar com as outras. De facto, ele contribui largamente não só para o desenvolvimento integral do estudante, mas inclusive para o conhecimento do outro, para a compreensão e o respeito recíproco. Para que tais objectivos sejam alcançados deve-se prestar particular atenção à formação dos dirigentes e formadores, não só sob o ponto de vista profissional, mas também religioso e espiritual, a fim de que, com a coerência da própria vida e o envolvimento pessoal, a presença do educador cristão se torne expressão de amor e testemunho da verdade.

Queridos irmãos e irmãs, agradeço-vos quanto fazeis com o vosso trabalho competente ao serviço das instituições educativas. Mantende sempre o olhar fixo em Cristo, o único Mestre, para que com o seu Espírito torne eficaz o vosso trabalho. Confio-vos à materna protecção de Maria Santíssima, Sedes Sapientiae, e de coração concedo a todos a Bênção Apostólica.






AOS PARTICIPANTES NA ASSEMBLEIA GERAL DA FRATERNIDADE SACERDOTAL DOS MISSIONÁRIOS DE SÃO CARLOS BORROMEU Sala Clementina

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Sábado, 12 de Fevereiro de 2011




Estimados irmãos e amigos

É com verdadeira alegria que vivo este encontro convosco, sacerdotes e seminaristas da Fraternidade de São Carlos, aqui congregados por ocasião do seu nascimento. Saúdo e agradeço ao fundador e superior-geral, Mons. Massimo Camisasca, o seu conselho e todos vós, parentes e amigos, que acompanhais a comunidade. De modo particular, saúdo o Arcebispo da Diocese moscovita da Mãe de Deus, D. Paolo Pezzi, e Pe. Julián Carrón, Presidente da Fraternidade de Comunhão e Libertação, que exprimem simbolicamente os frutos e a raiz da obra da Fraternidade de São Carlos. Este momento traz à minha memória a longa amizade com Mons. Luigi Giussani e dá testemunho da fecundidade do seu carisma.

Nesta ocasião, gostaria de responder a duas perguntas que o nosso encontro me sugere: qual é o lugar do sacerdócio ordenado na vida da Igreja? Qual é o lugar da vida comum na experiência presbiteral?

O vosso nascimento a partir do movimento de Comunhão e Libertação, e a vossa referência vital à experiência eclesial que ele representa, põem diante dos nossos olhos uma verdade que se foi confirmando com particular clareza a partir do século XIX e que encontrou uma expressão significativa na teologia do Concílio Vaticano II. Refiro-me ao facto de que o sacerdócio cristão não é um fim em si mesmo. Ele foi desejado por Jesus em função do nascimento e da vida da Igreja. Por isso, cada sacerdote pode dizer aos fiéis, parafraseando santo Agostinho: Vobiscum christianus, pro vobis sacerdos. A glória e a alegria do sacerdócio consistem em servir Cristo e o seu Corpo místico. Ele representa uma vocação muito bonita e singular no interior da Igreja, que torna presente Cristo, porque participa do único e eterno Sacerdócio de Cristo. A presença de vocações presbiterais é um sinal seguro da verdade e da vitalidade de uma comunidade cristã. Com efeito, Deus chama sempre, também ao sacerdócio; não existe um crescimento verdadeiro e fecundo na Igreja, sem uma autêntica presença presbiteral que a sustenha e alimente. Por isso, estou grato a todos aqueles que dedicam as suas energias à formação dos sacerdotes e à reforma da vida sacerdotal. Com efeito, como toda a Igreja, também o sacerdócio tem necessidade de se renovar continuamente, encontrando na vida de Jesus as formas mais essenciais do seu próprio ser.

Os diversos caminhos possíveis para esta renovação não podem deixar de lado qualquer elemento irrenunciável. Antes de tudo, uma profunda educação na meditação e na oração, vividas como diálogo com o Senhor ressuscitado, presente na sua Igreja. Em segundo lugar, um estudo da teologia que permita encontrar as verdades cristãs na forma de uma síntese ligada à vida da pessoa e da comunidade: com efeito, unicamente um olhar sapiencial pode valorizar a força que a fé possui, de iluminar a vida e o mundo, conduzindo continuamente rumo a Cristo, Criador e Salvador.

Durante o curso breve mas intenso da sua história, a Fraternidade de São Carlos salientou o valor da vida comum. Também eu falei várias vezes disto nas minhas intervenções, antes e depois da minha chamada ao Sólio de Pedro. «É importante que os sacerdotes não vivam isolados em algum lugar, mas estejam juntos em pequenas comunidades, se encorajem uns aos outros e assim façam a experiência do estar juntos no seu serviço a Cristo e na renúncia pelo reino dos Céus, e também adquiram cada vez mais consciência disto» (Luz do mundo, Cidade do Vaticano 2010, p. 208). As urgências deste momento saltam aos nossos olhos. Penso, por exemplo, na carência de sacerdotes. A vida comum não é, acima de tudo, uma estratégia para responder a estas necessidades. E ela também não é, por si só, apenas uma forma de ajuda diante da solidão e da debilidade do homem. Sem dúvida, tudo isto pode existir, mas unicamente se a vida fraterna for concebida e vivida como um caminho para se imergir na realidade da comunhão. Efectivamente, a vida comum é expressão do dom de Cristo, que é a Igreja, e é prefigurada na comunidade apostólica, que deu lugar aos presbitérios. Com efeito, nenhum sacerdote administra algo que lhe é próprio, mas participa juntamente com os outros irmãos num dom sacramental que provém directamente de Jesus.

Por conseguinte, a vida comum manifesta uma ajuda que Cristo confere à nossa existência, chamando-nos através da presença dos irmãos, a uma configuração cada vez mais profunda com a sua própria Pessoa. Viver com os outros significa aceitar a necessidade de uma conversão pessoal contínua e, sobretudo, descobrir a beleza de tal caminho, a alegria da humildade, da penitência, mas também da conversão, do perdão recípoco e do sustentamento mútuo. «Ecce quam bonum et quam iucundum habitare fratres in unum» (
Ps 133 [132], 1).

Ninguém pode assumir a força regeneradora da vida comum sem a oração, sem ter em consideração a experiência e o ensinamento dos santos, de maneira particular dos Padres da Igreja, e sem uma existência sacramental vivida com fidelidade. Se não entrarmos no diálogo eterno que o Filho mantém com o Pai, no Espírito Santo, nenhuma vida comum autêntica é possível. É necessário estar com Jesus para poder estar com os outros. Este é o coração da missão. Na companhia de Jesus e dos irmãos, cada sacerdote pode encontrar as energias necessárias para poder ocupar-se dos homens, para responder às necessidades espirituais e materiais que encontra, para ensinar com palavras sempre novas, ditadas pelo amor, as verdades eternas da fé, das quais também os nossos contemporâneos têm sede.

Caros irmãos e amigos, continuai a ir pelo mundo inteiro para levar a todos a comunhão que nasce do Coração de Cristo! A experiência dos Apóstolos com Jesus seja sempre o farol que ilumina a vossa vida sacerdotal! Encorajando-vos a continuar pelo caminho traçado ao longo destes anos, é de bom grado que concedo a minha Bênção a todos os sacerdotes e aos seminaristas da Fraternidade de São Carlos, às Missionárias de São Carlos, bem como aos seus familiares e amigos.




AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL DAS FILIPINAS EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLUM»

Sala do Consistório

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Sexta-feira, 18 de Fevereiro de 2011




Prezados Irmãos Bispos!

É-me grato receber-vos hoje, por ocasião da vossa visita ad limina. Asseguro os meus sinceros bons votos e ofereço as minhas orações por vós e por todos os fiéis confiados aos vossos cuidados pastorais. A vossa presença junto dos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo fortalece a profunda unidade que já existe entre a Igreja nas Filipinas e a Santa Sé. Dado que no vosso país os vínculos estreitos entre os Católicos e o Sucessor de Pedro foram sempre uma característica importante da fé, rezo para que esta comunhão possa continuar a crescer e prosperar enquanto enfrentais os actuais desafios do vosso apostolado.

No momento em que as Filipinas continuam a encarar muitos desafios na âmbito do desenvolvimento económico, devemos reconhecer que estes obstáculos a uma vida de felicidade e de realização plena não são os únicos problemas a serem abordados pela Igreja. A cultura filipina depara-se também com as questões mais complexas que dizem respeito ao secularismo, ao materialismo e ao consumismo do nosso tempo. Quando a autossuficiência e a liberdade são separadas da sua dependência de Deus e da sua realização N’Ele, o ser humano cria para si mesmo um destino falso e não consegue ver a felicidade eterna pela qual foi criado. O caminho rumo à redescoberta do autêntico destino da humanidade pode ser encontrado unicamente no restabelecimento da prioridade de Deus no coração e na mente de cada pessoa.

Em primeiro lugar, para manter Deus no centro da vida dos fiéis, a vossa pregação e a do vosso clero devem ser focalizadas, de modo que cada católico compreenda na sua intimidade a realidade, capaz de transformar a vida, de que Deus existe, que nos ama e que em Cristo ele responde às perguntas mais profundas da nossa vida. Por conseguinte, a vossa importante tarefa na evangelização consiste em propor uma relação pessoal com Cristo como chave para a realização plena. Neste contexto, o Segundo Conselho Plenário das Filipinas continua a ter efeitos benéficos, fazendo com que muitas dioceses realizassem programas pastorais baseados na transmissão da Boa Nova da salvação. Contemporaneamente, é necessário reconhecer que as novas iniciativas no âmbito da evangelização serão fecundas somente se, pela graça de Deus, aqueles que as propõem forem pessoas que deveras acreditam e vivem pessoalmente a mensagem do Evangelho.

Certamente, esta é uma das razões devido à qual as comunidades eclesiais de base tiveram um impacto tão positivo no país inteiro. Trabalhando junto com as paróquias locais estas comunidades demonstraram, onde foram constituídas e guiadas por pessoas motivadas pela força do amor de Cristo, ser dignos instrumentos de evangelização. De forma análoga, a Igreja nas Filipinas é afortunada por ter um número de organizações laicas que continuam a atrair as pessoas para o Senhor. Para poder enfrentar as questões do nosso tempo, os leigos devem escutar a mensagem do Evangelho na sua totalidade, compreender as suas implicações na sua vida pessoal e na sociedade em geral, e por conseguinte converter-se constantemente ao Senhor. Portanto, exorto-vos a dedicar uma atenção especial à guia destes grupos, para que a primazia de Deus possa permanecer em primeiro plano.

Esta primazia é particularmente importante quando se trata de evangelizar os jovens. Noto com prazer que, no vosso país, a fé desempenha um papel muito importante na vida de muitos jovens, graças sobretudo ao esforço paciente da Igreja local de se aproximar dos jovens a todos os níveis. Encorajo-vos a continuar a recordar aos jovens que as seduções deste mundo não satisfarão os seus desejos de felicidade. Só a verdadeira amizade com Deus poderá romper as cadeias de solidão da qual sofre a nossa frágil humanidade e estabelecer uma comunhão autêntica e duradoura com o próximo, uma ligação espiritual que suscitará imediatamente em nós o desejo de servir aqueles que amamos em Cristo. É necessário também demonstrar aos jovens a importância dos sacramentos como instrumentos da graça e da ajuda de Deus. Isto é válido especialmente para o sacramento do matrimónio, que santifica a vida conjugal desde o seu início, para que a presença de Deus possa ajudar os jovens casais nas suas batalhas.

Por sua natureza, o cuidado pastoral dos jovens que visa estabelecer a primazia de Deus nos seus corações tende não só a produzir vocações para o matrimónio cristão, mas também abundantes e diferentes chamadas. É-me grato constatar o sucesso das iniciativas locais destinadas a promover numerosas vocações ao sacerdócio e à vida religiosa. Todavia, a falta de servidores de Cristo cada vez mais comprometidos, quer no país quer no estrangeiro é ainda urgente. Os vossos relatórios quinquenais revelam que em várias dioceses o número de sacerdotes e o correspondente número de paróquias ainda não são suficientes para responder às necessidades espirituais da grande e crescente população católica. Portanto, rezo convosco para que os jovens filipinos que se sentem chamados ao sacerdócio e à vida religiosa respondam com generosidade ao que o Espírito sugere. Possa a missão evangelizadora da Igreja ser apoiada pelos dons maravilhosos que o Senhor oferece àqueles que chama! Da vossa parte, como Pastores deveis desejar oferecer a estas jovens vocações um plano de formação integral bem estruturado e atentamente aplicado, de modo que as suas propensões iniciais rumo a uma vida de serviço a Cristo e aos seus fiéis possa alcançar um pleno amadurecimento espiritual e humano.

Queridos Irmãos no Episcopado, com estas reflexões garanto-vos as minhas orações e confio-vos à intercessão de são Lorenzo Ruiz. Que o seu exemplo de inabalável fidelidade a Cristo seja para vós um encorajamento no vosso empenho apostólico. Sobre todos vós, os sacerdotes, os religiosos e os fiéis confiados aos vossos cuidados, invoco de coração a minha Bênção Apostólica como penhor de paz e alegria.




Discursos Bento XVI 30221