Discursos Bento XVI 19311

NA CONCLUSÃO DOS EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS DA CURIA ROMANA Sábado, 19 de Março de 2011

19311 Capela "Redemptoris Mater"


Galeria fotográfica

Queridos Irmãos
Estimado Padre Léthel!

No final deste caminho de reflexão, meditação e oração em companhia dos Santos amigos do Papa João Paulo II, gostaria de vos dizer de coração: obrigado a Vossa Reverência, Pe. Léthel, pela sua guia segura, pela riqueza espiritual que nos proporcionou. Os Santos: Vossa Reverência mostrou-no-los como «estrelas» no firmamento da História e, com o seu entusiasmo e alegria, inseriu-nos na roda destes Santos e mostrou-nos que precisamente os Santos «pequenos» são os Santos «grandes». Mostrou-nos que a scientia fidei e a scientia amoris caminham juntas e se completam, que a razão grande e o grande amor estão juntos, aliás, que o amor grande vê mais do que a razão sozinha.

A Providência quis que estes Exercícios se concluam com a festa de são José, meu Padroeiro pessoal e Padroeiro da Santa Igreja: um santo humilde, um trabalhador humilde, que foi tornado digno de ser Guarda do Redentor.

São Mateus caracteriza são José com uma palavra: «Era um justo», «dikaios», de «dike», e na visão do Antigo Testamento, como a encontramos por exemplo no Salmo 1, «justo» é o homem que está imerso na Palavra de Deus, que vive na Palavra de Deus, que vive a Lei não como «jugo», mas como «alegria», vive — poderíamos dizer — a Lei como «Evangelho». São José era justo, estava imerso na Palavra de Deus, escrita, transmitida na sabedoria do seu povo, e precisamente deste modo estava preparado e chamado a conhecer o Verbo Encarnado — o Verbo que veio ao nosso meio como homem —, e predestinado a guardar, a proteger este Verbo Encarnado; esta permanece a sua missão para sempre: guardar a Santa Igreja e Nosso Senhor.

Recomendamo-nos neste momento à sua custódia, rezamos para que nos ajude no nosso serviço humilde. Prossigamos com coragem sob esta protecção. Sejamos gratos pelos Santos humildes, rezemos ao Senhor para que torne também a nós humildes no nosso serviço e, desta forma, santos na companhia dos Santos.

Mais uma vez obrigado a Si, Pe. Léthel, pela sua inspiração. Obrigado!



AOS BISPOS SÍRIO MALACARES EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM» Sexta-feira 25 de Março de 2011

25311
Prezados Irmãos Bispos

Dou as boas-vindas a todos vós aqui hoje, por ocasião da vossa peregrinação ad limina Apostolorum. Estou grato a Sua Beatitude Baselios Cleemis pelos seus sentimentos de devoção, que me dirigiu em vosso nome. Através de vós, envio as minhas saudações a todos os sacerdotes, religiosos e fiéis leigos das vossas eparquias, e garanto-lhes as minhas preces pelo seu bem-estar espiritual e material. Estes momentos que passamos juntos constituem uma ocasião privilegiada para aprofundar os vínculos de fraternidade e de comunhão entre a Sé de Pedro e a Igreja sírio-malancar, em 2005 felizmente promovida a Igreja Arquiepiscopal Maior pelo Venerável João Paulo II.

As tradições apostólicas que conservais gozam da sua plena fecundidade espiritual, quando são vividas em união com a Igreja universal. Neste sentido, fazeis bem em seguir os passos do Servo de Deus Mar Ivanios, que conduziu os vossos predecessores e os seus fiéis à plena comunhão com a Igreja católica. Como os vossos antepassados, também vós sois chamados, no seio da única família de Deus, a dar continuidade, com fidelidade firme, àquilo que vos foi transmitido. Todos os bispos católicos compartilham uma profunda solicitude pela fidelidade a Jesus Cristo e aspiram àquela mesma unidade que Ele desejou para os seus discípulos (cf.
Jn 17,11), contudo conservando a sua legítima diversidade. Pois «esta é a intenção da Igreja católica: que permaneçam salvas e íntegras as tradições de cada Igreja particular ou rito. E ela mesma quer, igualmente, adaptar a sua forma de vida às várias necessidades dos tempos e lugares» (Orientalium Ecclesiarum OE 2). Cada geração deve enfrentar os desafios da Igreja, de acordo com as suas capacidades e em harmonia com o resto do Corpo Místico de Cristo. Por conseguinte, encorajo-vos a fomentar o afecto, entre os vossos sacerdotes e o povo em geral, pela herança litúrgica e espiritual que vos foi transmitida, construindo constantemente sobre a vossa comunhão com a Sé de Pedro.

O depósito da fé legado pelos Apóstolos e fielmente transmitido até aos nossos tempos constitui um dom precioso da parte do Senhor. Trata-se daquela mensagem de salvação, que foi revelada na pessoa de Jesus, cujo Espírito une os fiéis de todos os tempos e lugares, concedendo-nos a comunhão com o Pai e com o seu Filho, a fim de que a nossa alegria possa ser completa (cf. 1Jn 1,1-4). Vós e os vossos sacerdotes sois chamados a promover esta comunhão, através da palavra e do sacramento, e a revigorá-la mediante uma catequese sólida, de tal modo que a Palavra de Vida, Jesus Cristo, e o dom da vida divina — a comunhão com ele — possam ser conhecidas no mundo inteiro (cf. Verbum Domini, 2). Em virtude das suas raízes antigas e da sua história ilustre, a Cristandade na Índia oferece desde há muito tempo a sua contribuição específica para a cultura e a sociedade, bem como para as suas expressões religiosas e espirituais. É através da determinação a viver o Evangelho, «o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê» (Rm 1,16), que quantos servis poderão por sua vez oferecer uma contribuição mais eficaz para todo o corpo de Cristo e para a sociedade indiana, em benefício de todos. Possa o vosso povo continuar a florescer pela pregação da palavra de Deus e pela promoção de uma comunhão fundamentada no amor de Deus.

Dou-me conta dos desafios específicos que muitas das vossas paróquias devem enfrentar, para oferecer o devido cuidado pastoral e o apoio mútuo, especialmente quando nem sempre há um pároco à disposição. E no entanto, as paróquias menores, tendo em mente a realidade social que os cristãos enfrentam no contexto cultural mais vasto, têm também as suas oportunidades para uma edificação e assistência verdadeiramente fraternas. Como sabeis, as pequenas comunidades cristãs deram um testemunho saliente na história da Igreja. Do mesmo modo como nos tempos apostólicos, a Igreja nesta nossa época há-de prosperar com certeza na presença de Cristo vivo, que prometeu estar sempre connosco (cf. Mt 28,20) e ajudar-nos (cf. 1Co 1,8). É esta presença divina que deve permanecer no âmago da vida, da fé e do testemunho do vosso povo, e que vós, seus Pastores, sois chamados a velar a fim de que, mesmo quando tiverem que viver afastados da sua comunidade, não vivam contudo longe de Cristo. Com efeito, é importante recordar que as comunidades cristãs constituem o «âmbito apropriado onde percorrer um itinerário pessoal e comunitário relativo à Palavra de Deus, de modo que esta esteja verdadeiramente no fundamento da vida espiritual» (Verbum Domini, 72).

Uma das formas para desempenhar o vosso papel de mestres da fé para a comunidade cristã é através dos programas de formação na catequese e na fé, que se realizam sob a vossa orientação. Dado que «esta instrução está assente na Sagrada Escritura, na Tradição, na Liturgia, no magistério e na vida da Igreja» (cf. Christus Dominus CD 14), é com prazer que observo a variedade e a quantidade de programas que utilizais no tempo presente. Juntamente com a celebração dos sacramentos, tais programas ajudarão a assegurar que quantos se encontram sob os vossos cuidados sejam sempre capazes de explicar a razão da sua esperança em Cristo. Efectivamente, a catequese e o desenvolvimento espiritual contam-se entre os desafios mais importantes que os Pastores de almas devem enfrentar, e é por isso que vos encorajo calorosamente a perseverar ao longo do caminho que escolhestes, enquanto procurais formar o vosso povo num conhecimento e num amor mais profundos pela fé, ajudados pela graça de Deus e pela vossa confiança humilde na sua Providência.

Com estes pensamentos, renovo os meus sentimentos de afeição e de estima fraternas por vós. Enquanto invoco a intercessão do Apóstolo s. Tomé, grande Padroeiro da Índia, asseguro-vos as minhas preces e concedo-vos de bom grado, assim como a quantos estão confiados às vossas atenções, a minha Bênção Apostólica como penhor de graça e de paz no Senhor Jesus Cristo.



AOS PARTICIPANTES NO CURSO PROMOVIDO PELA PENITENCIARIA APOSTÓLICA Sala das Bênçãos, 25 de Março de 2011

25321

Prezados amigos

Estou muito feliz por dirigir as minhas cordiais boas-vindas a cada um de vós. Saúdo o Cardeal Fortunato Baldelli, Penitenciário-Mor, e agradeço-lhe as amáveis palavras que me dirigiu. Saúdo o Regente da Penitenciaria, D. Gianfranco Girotti, os funcionários, os colaboradores e todos os participantes no Curso sobre o Foro Interno, que já se tornou um encontro tradicional e uma importante ocasião para aprofundar os temas relativos ao Sacramento da Penitência.

Desejo meditar convosco sobre um aspecto às vezes não suficientemente considerado, mas de grande relevância espiritual e pastoral: o valor pedagógico da Confissão sacramental. Se é verdade que é sempre necessário salvaguardar a objectividade dos efeitos do Sacramento e a sua correcta celebração, segundo as normas do Rito da Penitência, não é inoportuno ponderar sobre quanto ele pode educar a fé, tanto do ministro como do penitente. A disponibilidade fiel e generosa dos sacerdotes à escuta das confissões, segundo o exemplo dos grandes santos da história, de são João Maria Vianney a são João Bosco, de são José Maria Escrivá a são Pio de Pietrelcina, de são José Cafasso a são Leopoldo Mandic, indica-nos a todos o modo como o confessionário pode ser um «lugar» real de santificação.

De que modo o Sacramento da Penitência educa? Em que sentido a sua celebração tem um valor pedagógico, em primeiro lugar para os ministros? Poderíamos começar a partir do reconhecimento de que a missão sacerdotal constitui um ponto de observação singular e privilegiado do qual, quotidianamente, nos é concedido contemplar o esplendor da Misericórdia divina. Quantas vezes, na celebração do Sacramento da Penitência, o presbítero assiste a verdadeiros milagres de conversão que, renovando o «encontro com um acontecimento, com uma Pessoa» (Carta Encíclica Deus caritas est ), fortalecem a sua própria fé. No fundo, confessar significa assistir a tantas «professiones fidei» quantos são os penitentes, e contemplar a obra de Deus misericordioso na história, ver concretamente os efeitos salvíficos da Cruz e da Ressurreição de Cristo, em todos os tempos e para cada homem. Não raro, somos postos diante de verdadeiros dramas existenciais, que não encontram uma resposta nas palavras dos homens, mas são abraçados e assumidos pelo Amor divino, que perdoa e transforma: «Mesmo que os vossos pecados fossem vermelhos como a púrpura, ficariam brancos como a neve!» (
Is 1,18). Conhecer e, de certo modo, visitar o abismo do coração humano, até nos aspectos mais obscuros, se por um lado se põe à prova a humanidade e a fé do próprio sacerdote, por outro, alimenta nele a certeza de que a última palavra sobre o mal do homem e da história é de Deus, é da sua Misericórdia, capaz de renovar todas as coisas (cf. Ap 21,5). Depois, quanto pode aprender o sacerdote de penitentes exemplares pela sua vida espiritual, pela seriedade com que realizam o exame de consciência, pela transparência no reconhecimento do pecado pessoal e pela docilidade ao ensinamento da Igreja e a às indicações do confessor. Da administração do Sacramento da Penitência podemos receber profundas lições de humildade e de fé! É uma exortação muito forte para cada sacerdote à consciência da própria identidade. Só em virtude da nossa humanidade, não poderíamos ouvir as confissões dos irmãos! Se eles nos procuram, é somente porque somos presbíteros, configurados com Cristo Sumo e Eterno Sacerdote, e tornados capazes de agir no seu Nome e na sua Pessoa, tornar realmente presente Deus que perdoa, renova e transforma. A celebração do Sacramento da Penitência tem um valor pedagógico para o sacerdote, em vista da sua fé, da verdade e da pobreza da sua pessoa, e alimenta nele a consciência da identidade sacramental.

Qual é o valor pedagógico do Sacramento da Penitência para os penitentes? Devemos admitir previamente que ele depende, antes de tudo, da obra da Graça e dos efeitos objectivos do Sacramento da alma do fiel. Certamente, a Reconciliação sacramental é um dos momentos em que a liberdade pessoal e a consciência de si são chamadas a manifestar-se de modo particularmente evidente. Talvez seja também por este motivo que, numa época de relativismo e de uma consciência consequentemente atenuada do próprio ser, se debilitou inclusive a prática sacramental. O exame de consciência tem um importante valor pedagógico: ele educa a considerar com sinceridade a própria existência, a confrontá-la com a verdade do Evangelho e a avaliá-la com parâmetros não apenas humanos, mas conferidos pela Revelação divina. O confronto com os Mandamentos, com as Bem-Aventuranças e, principalmente, com o Preceito do amor, constitui a primeira grande «escola penitencial».

No nosso tempo, caracterizado pelo barulho, pela distracção e pela solidão, o diálogo do penitente com o confessor pode representar uma das poucas, se não a única ocasião para ser escutado verdadeiramente, e em profundidade. Dilectos sacerdotes, não deixeis de reservar o espaço oportuno para o exercício do ministério da Penitência no confessionário: ser acolhido e escutado constitui inclusive um sinal humano do acolhimento e da bondade de Deus em relação aos seus filhos. Além disso, a confissão integral dos pecados educa o penitente para a humildade, o reconhecimento da sua fragilidade pessoal e, ao mesmo tempo, para a consciência da necessidade do perdão de Deus e a confiança de que a Graça divina pode transformar a sua vida. Do mesmo modo, a escuta das admoestações e dos conselhos do confessor é importante para o juízo sobre os actos, para o caminho espiritual e para a cura interior do penitente. Não podemos esquecer quantas conversões e quantas existências realmente santas começaram num confessionário! O acolhimento da penitência e a escuta das palavras «absolvo-te dos teus pecados» representam, enfim, uma autêntica escola de amor e de esperança, que orienta para a plena confiança em Deus Amor, revelado em Jesus Cristo, para a responsabilidade e o compromisso da conversão contínua.

Caros sacerdotes, o facto de sermos nós os primeiros a experimentar a Misericórdia divina e de sermos os seus instrumentos humildes, educa-nos para uma celebração cada vez mais fiel do Sacramento da Penitência e para uma profunda gratidão a Deus, que «nos confiou o ministério da reconciliação» (1Co 5,18). À Bem-Aventurada Virgem Maria, Mater misericordiae e Refugium peccatorum, confio os frutos do vosso Curso sobre o Foro Interno e o ministério de todos os Confessores, enquanto vos abençoo com grande afecto.




AOS FIÉIS DA DIOCESE ITALIANA DE TERNI-NARNI-AMELIA Sala Paulo VI Sábado, 26 de Março de 2011

26311

Estimados irmãos e irmãs

Estou muito feliz por vos receber esta manhã e por vos dirigir a minha cordial saudação às autoridades presentes, às trabalhadoras e aos trabalhadores, bem como a todos vós que viestes em peregrinação até à Sé de Pedro. Dirijo uma saudação particular ao vosso Bispo, D. Vincenzo Paglia, a quem agradeço as palavras que me dirigiu também em vosso nome. Viestes numerosos para este encontro — lamento que alguns não tenham podido entrar — aproveitando a ocasião do trigésimo aniversário da visita de João Paulo II a Terni. Hoje, queremos recordá-lo de maneira especial pelo amor que demonstrou pelo mundo do trabalho; quase podemos ouvi-lo repetir as primeiras palavras que ele pronunciou, logo que chegou a Terni: «A principal finalidade desta visita, que se realiza no dia de São José... consiste em trazer uma palavra de encorajamento a todos os trabalhadores... e exprimir-lhes-ei a minha solidariedade, a minha amizade e o meu afecto» (Discurso às autoridades, Terni, 19 de Março de 1981). Faço meus estes sentimentos, e abraço-vos cordialmente a todos vós e as vossas famílias. No dia da minha eleição, também eu me apresentei convictamente como um «humilde trabalhador na vinha do Senhor» e, hoje, juntamente convosco, gostaria de recordar todos os trabalhadores e confiá-los à tutela de são José trabalhador.

Terni é caracterizada pela presença de uma das maiores fábricas de aço, que contribuiu para o crescimento de uma significativa realidade operária. Um caminho marcado por luzes, mas também por momentos difíceis, como aquele que estamos a viver nos dias de hoje. A crise da estrutura industrial está a pôr à dura prova a vida da cidade, que deve reconsiderar o seu futuro. Em tudo isto está envolvida também a vossa vida de trabalhadores e a vida das vossas famílias. Nas palavras do vosso Bispo, senti o eco das preocupações que trazeis no coração. Sei que a Igreja diocesana as faz suas e sente a responsabilidade de permanecer ao vosso lado para vos comunicar a esperança do Evangelho e a força para edificar uma sociedade mais justa e mais digna do homem. E fá-lo a partir da nascente, isto é, da Eucaristia. Na sua primeira carta pastoral, A Eucaristia salva o mundo, o vosso Bispo indicou-vos qual é a fonte da qual beber e para a qual voltar, para viver a alegria da fé e a paixão para melhorar o mundo. Assim, a Eucaristia do Domingo tornou-se o fulcro da obra pastoral da Diocese. Trata-se de uma escolha que deu os seus frutos; aumentou a participação na Eucaristia dominical, onde tem início o compromisso da própria Diocese para o caminho da vossa Terra. Com efeito, da Eucaristia, onde Cristo se torna presente no seu gesto supremo de amor por todos nós, aprendemos a habitar a sociedade como cristãos, para a tornar mais hospitaleira, mais solidária, mais atenta às necessidades de todos, particularmente dos mais frágeis, e mais rica de amor. Santo Inácio de Antioquia, bispo e mártir, definia os cristãos como aqueles que «vivem segundo o Domingo» (iuxta dominicum viventes), ou seja, «segundo a Eucaristia». Viver de maneira «eucarística» significa viver como um único Corpo, uma única família, uma sociedade unida pelo amor. A exortação a serem «eucarísticos» não é um simples convite moral dirigido à sociedade, às pessoas individualmente; é muito mais: é a exortação a participar no próprio dinamismo de Jesus, que oferece a sua vida pelos outros, para que todos sejam um só.

É neste horizonte que se insere também o tema do trabalho, que hoje vos preocupa com os seus problemas, sobretudo o do desemprego. É importante ter sempre presente que o trabalho constitui um dos elementos fundamentais, tanto da pessoa humana como da sociedade em geral. As condições de trabalho difíceis ou precárias tornam difíceis e precárias as condições da própria sociedade, as condições de uma vida ordenada em conformidade com as exigências do bem comum. Na Encíclica Caritas in veritate — como recordava D. Paglia — exortei a não deixar «que se continue a perseguir como prioritário o objectivo do acesso ao trabalho para todos, ou da sua manutenção» (n. 32). Gostaria de recordar também o grave problema da segurança no trabalho. Sei que tivestes de enfrentar várias vezes esta trágica realidade. É necessário pôr em campo todos os esforços para que a cadeia das mortes e dos acidentes seja interrompida. Além disso, o que dizer sobre a precariedade do trabalho, sobretudo no que se refere ao mundo juvenil? Trata-se de um aspecto que não deixa de criar angústia em numerosas famílias! O Bispo mencionava também a difícil situação da indústria química da vossa cidade, assim como as problemáticas no campo siderúrgico. Estou-vos particularmente próximo, enquanto deposito nas mãos de Deus todas as vossas ansiedades e preocupações e formulo votos a fim de que, na lógica da gratuidade e da solidariedade, se possam superar estes momentos, para que seja garantido um trabalho seguro, digno e estável.

Queridos amigos, o trabalho ajuda a pessoa a estar mais próxima de Deus e do próximo. O próprio Jesus foi um trabalhador, aliás, passou uma boa parte da sua vida terrena em Nazaré, na oficina de José. O evangelista Mateus recorda que as pessoas falavam de Jesus como do «filho do carpinteiro» (
Mt 13,55), e em Terni João Paulo II falou sobre o «Evangelho do trabalho», afirmando que foi «escrito sobretudo pelo facto que o Filho de Deus, da mesma substância do Pai, tornando-se homem trabalhou com as próprias mãos. Melhor, o seu trabalho, que foi verdadeiro trabalho físico, ocupou a maior parte da sua vida nesta terra, e entrou assim na obra da redenção do homem e do mundo» (Discurso aos operários, Terni, 19 de Março de 1981). Já isto nos fala da dignidade do trabalho, aliás, da dignidade específica do trabalho humano, que está inserido no próprio mistério da redenção. É importante compreendê-lo nesta perspectiva cristã. Muitas vezes, ao contrário, ele é considerado unicamente como instrumento de lucro, se não mesmo, em várias situações no mundo, como meio de exploração e, por conseguinte, de ofensa contra a própria dignidade da pessoa. Gostaria de mencionar também o problema do trabalho no Domingo. Infelizmente, nas nossas sociedades o ritmo do consumo corre o risco de nos privar também do sentido da festa e do Domingo, como Dia do Senhor e da comunidade.

Prezados trabalhadores e trabalhadoras, caros amigos todos, gostaria de concluir estas minhas breves palavras, recordando-vos que a Igreja sustém, conforta e encoraja todos os esforços para garantir a todos um trabalho seguro, digno e estável. O Papa está próximo de vós, está ao lado das vossas famílias, dos vossos filhos, dos vossos jovens e dos vossos idosos, e traz todos vós no coração diante de Deus. O Senhor abençoe a vós, o vosso trabalho e o vosso futuro. Obrigado!




VISITA AO SACRÁRIO DAS FOSSAS ARDEATINAS Domingo, 27 de Março de 2011

27311
Fossas Ardeatinas


Queridos irmãos e irmãs!

Aceitei de bom grado o convite, que me foi dirigido pela «Associação nacional das famílias italianas dos mártires mortos pela liberdade da pátria», a realizar uma peregrinação a este sacrário, amado por todos os italianos, sobretudo pelo povo romano. Saúdo o Cardeal Vigário, o Rabino-Chefe, o Presidente da Associação e especialmente os familiares das vítimas, como também todos os presentes.

«Creio em Deus e na Itália / creio na ressurreição / dos mártires e dos heróis / creio no renascimento / da pátria e na / liberdade do povo». Estas palavras foram gravadas na parede de uma cela de tortura, na Via Tasso, em Roma, durante a ocupação nazi. São o testamento de uma pessoa desconhecida, que naquela cela foi aprisionada, e demonstram que o espírito humano permanece livre até nas situações mais difíceis. «Creio em Deus e na Itália»: esta frase emocionou-me pois este ano celebra-se também o 150º aniversário da unidade da Itália, mas sobretudo porque afirma a primazia da fé, da qual haurir a confiança e a esperança para a Itália e para o seu futuro. O que aconteceu aqui em 24 de Março de 1944 é ofensa gravíssima a Deus, porque é a violência deliberada do homem contra o homem. É a consequência mais execrável da guerra, de qualquer guerra, porque Deus é vida, paz, comunhão.

Como os meus Predecessores, vim aqui rezar e renovar a memória. Vim invocar a Misericórdia divina, a única que pode preencher os vazios, os abismos abertos pelos homens quando, impelidos pela violência cega, renegam a própria dignidade de filhos de Deus e irmãos entre si. Também eu, como Bispo de Roma, cidade consagrada pelo sangue dos mártires do Evangelho do Amor, venho prestar homenagem a estes irmãos, mortos a pouca distância das antigas catacumbas.

«Creio em Deus e na Itália». Naquele testamento gravado num lugar de violência e de morte, a ligação entre a fé e o amor pela pátria revela-se em toda a sua pureza, sem retórica alguma. Quem escreveu aquelas palavras fê-lo só por convicção íntima, como testemunho extremo da verdade em que se acredita, que torna nobre a alma humana também na extrema humilhação. Cada homem é chamado a realizar desta forma a própria dignidade: testemunhando aquela verdade que reconhece com a própria consciência.

Impressionou-me outro testemunho, que foi encontrado precisamente nas Fossas Ardeatinas. Uma folha de papel sobre a qual uma das vítimas escreveu: «Deus, meu grande Pai, oremos para que tu possas proteger os judeus das bárbaras perseguições. 1 Pater noster, 10 Ave Maria, 1 Gloria Patri». Naquele momento tão trágico, tão desumano, no coração daquela pessoa havia a invocação mais alta: «Deus, meu grande Pai». Pai de todos! Como nos lábios de Jesus, agonizante na cruz: «Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito». Naquele nome, «Pai», existe a garantia da esperança; a possibilidade de um futuro diferente, livre do ódio e da vingança, um futuro de liberdade e de fraternidade para Roma, a Europa e o mundo. Sim, onde quer que esteja, em qualquer continente, seja qual for o povo ao qual pertence, o homem é filho daquele Pai que está nos céus, é irmão de todos em humanidade. Mas este ser filho e irmão não é óbvio. Infelizmente, as Fossas Ardeatinas demonstram tudo isto. É necessário desejá-lo, é preciso dizer sim ao bem e não ao mal. É necessário acreditar no Deus do amor e da vida, e rejeitar qualquer falsa imagem divina, que atraiçoa o seu santo Nome e atraiçoa por conseguinte o homem, feito à sua imagem.

Portanto, neste lugar, doloroso memorial do mal mais abominável, a resposta mais verdadeira é a de se dar as mãos, como irmãos, e dizer: Pai nosso, nós cremos em Ti, e com a força do teu amor desejamos caminhar unidos em paz, em Roma, na Itália, na Europa, no mundo inteiro. Amém.




AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL SÍRIO-MALABAR EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM» Quinta-feira, 7 de Abril de 2011

7411
Sala do Consistório




Queridos Irmãos Bispos!

Dou as boas-vindas a todos vós aqui hoje, por ocasião da vossa peregrinação ad limina Apostolorum, num momento tristemente marcado pelo falecimento do Cardeal Varkey Vithayathil. Perante todos vós, desejo mais uma vez agradecer a Deus pelo precioso e válido serviço que prestou durante muitos anos por toda a Igreja na Índia. Possa o nosso misericordioso Salvador receber a sua nobre alma no paraíso e que ele descanse em paz na comunhão com todos os santos.

Estou grato a Sua Beatitude Mar Bosco Puthur pelos seus sentimentos de devoção, que me dirigiu em vosso nome. A vossa presença é uma eloquente expressão dos profundos vínculos espirituais que unem a Igreja Sírio-Malabar à Igreja universal, na fidelidade à oração de Cristo para todos os seus discípulos. (cf.
Jn 17,21). Vós trazeis ao túmulo dos Apóstolos Pedro e Paulo a alegria e a esperança de toda a Igreja Sírio-Malabar, que o meu Predecessor, o venerável João Paulo II, elevou com alegria à Igreja Arquiepiscopal-Mor em 1992. Dirijo as minhas saudações aos sacerdotes, às religiosas e religiosos, aos membros do movimento laico, às famílias e especialmente aos jovens que são a esperança da Igreja.

O Concílio Vaticano II ensinou que «também os Bispos, designados pelo Espírito Santo, sucedem aos Apóstolos como pastores da alma e, juntamente com o Sumo Pontífice e sob a sua autoridade, têm a missão de perpetuar o obra de Cristo, o eterno Pastor» (Christus Dominus CD 2). Por conseguinte, o encontro de hoje constitui uma parte essencial da vossa visita ad limina Apostolorum; é também uma ocasião para reforçar a consciência sobre o dom divino e a responsabilidade recebida na a ordenação através da qual vos tornastes membros do Colégio episcopal. Uno-me a vós para pedir a intercessão dos Apóstolos pelo vosso ministério. Eles, que foram os primeiros a receber o mandato de apascentar o rebanho de Cristo, continuam a guiar a Igreja e a vigiar do céu sobre ela, e permanecem, com a própria santidade de vida ensinamento e exemplo, um modelo e uma fonte de inspiração para todos os Bispos.

A vossa visita também me oferece a preciosa oportunidade para agradecer a Deus pelo dom de comunhão na fé apostólica e na vida do Espírito que vos une entre vós e com o vosso povo. Por um lado, com a inspiração e a graça, e por outro com a oração e empenho humilde, este precioso dom de comunhão com o Deus Uno e Trino e entre vós tornar-se-á cada vez mais rico e profundo. Todos os Bispos, por sua vez, são chamados a ser ministros da unidade (cf. ibidem 6) na sua específica igreja e dentro da igreja universal. Esta responsabilidade é de especial importância num país como a Índia onde a unidade da Igreja se manifesta na abundante variedade do seus ritos e tradições. Encorajo-vos a fazer o possível para cultivar a comunhão entre vós e com todos os Bispos católicos no mundo inteiro, e a ser testemunhas vivas da comunhão entre os vossos sacerdotes e os fiéis. Deixai que o amável ensinamento de São Paulo continue a guiar o vosso coração e o vosso empenho apostólico: «Que a vossa caridade seja sincera, aborrecendo o mal e aderindo ao bem. Amai-vos uns aos outros com amor fraternal, adiantando-vos em honrar uns aos outros. Tende entre vós os mesmos sentimentos» (Rm 12, 9-10, 16). Desta maneira, a unidade do Deus Uno e Trino será proclamada e vivida no mundo, e portanto a nossa nova vida em Cristo vivida cada vez mais profundamente em benefício de toda a Igreja católica.

Dentro deste ministério de comunhão solicita uma expressão «privilegiada de partilha da vida divina é constituída pelo sacramento do matrimónio e da vida familiar. As rápidas e dramáticas transformações que fazem parte da sociedade contemporânea no mundo inteiro trazem consigo não só difíceis desafios, mas também novas possibilidades de proclamar a verdade libertadora da mensagem do Evangelho para transformar e edificar todos os relacionamentos humanos. O vosso apoio, queridos Irmãos Bispos, e o dos vossos sacerdotes e da vossa comunidade para uma sólida e completa educação dos jovens na castidade e responsabilidade não só lhes permitirá abranger a natureza autêntica do matrimónio, mas beneficiará a cultura indiana na sua totalidade. Infelizmente, a Igreja já não pode contar com o apoio total da sociedade na promoção do significado cristão do matrimónio entendido como união permanente e indissolúvel finalizada à procriação e santificação dos cônjuges. Fazeis com que as vossas famílias olhem para o Senhor e para as suas palavras de salvação para uma completa e verdadeira visão positiva da vida e do relacionamento dos cônjuges, tão necessária para o bem da família humana inteira. Deixem que a vossa pregação e catequese neste âmbito seja paciente e constante.

No centro de muitos trabalhos educativos e de caridade desempenhados nas vossas Eparquias estão presentes várias comunidades religiosas, homens e mulheres, que se dedicam ao serviço de Deus e do próximo. Desejo manifestar o apreço da Igreja perante a caridade, a fé e o enorme trabalho destes religiosos, que professando e vivendo as recomendações de pobreza, castidade e obediência do evangelho oferecem um exemplo de devoção total ao Mestre divino e, portanto, ajudam consideravelmente para que o homem de Deus seja perfeito e apto para toda a boa obra (cf. 2Tm 3,17). A vocação para a vida religiosa e a aspiração à caridade perfeita apaixonam em qualquer idade, mas deveriam ser alimentadas por um renovamento espiritual constante, cultivadas por superiores que devem cuidar seriamente da formação humana, intelectual e espiritual, dos seus irmão de hábito e do seu ulterior aperfeiçoamento. (cf. Perfectae Caritatis PC 11). A Igreja continua a insistir para que a preparação para a profissão religiosa seja caracterizada por um longo e atento discernimento finalizado a garantir que, antes dos votos perpétuos, cada candidato seja profundamente enraizado em Cristo, firme na sua capacidade de autêntico e jubiloso compromisso na doação de si a Jesus Cristo e à sua Igreja. Além disso, por sua natureza, a formação nunca está completa, mas é permanente e deve ser parte integrante da vida quotidiana de cada indivíduo e comunidade. Neste âmbito há ainda muito para fazer, utilizando os numerosos recursos disponíveis na vossa Igreja, sobretudo através de uma formação aprofundada na prática da oração, as particulares tradições espirituais e litúrgicas do rito dos Sírio-Malabar e as exigências intelectuais de uma sólida prática pastoral. Encorajo-vos, em estreita colaboração com os superiores, a planear concretamente uma sólida formação permanente, de modo que os religiosos e as religiosas continuem a ser válidas testemunhas da presença de Deus no mundo e do nosso eterno destino, de modo que a doação completa de si mesmo a Deus através da vida religiosa possa resplandecer com toda a sua perfeição e pureza diante do género humano.

Com estes pensamentos, renovo os meus sentimentos de afecto e estima fraternas por vós. Enquanto invoco a intercessão do Apóstolo s. Tomé, grande Padroeiro da Índia, asseguro-vos as minhas preces e concedo-vos de bom grado, assim como a quantos estão confiados aos vossos cuidados, a minha Bênção Apostólica em penhor de graça e paz no Senhor Jesus Cristo.




Discursos Bento XVI 19311