Discursos Bento XVI 1425


VISITA PASTORAL À PARÓQUIA ROMANA DE SANTA MARIA DAS GRAÇAS NO BAIRRO CASAL BOCCONE


III Domingo de Advento "Gaudete", 11 de Dezembro de 2011

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Saudação do Papa às crianças

Queridas crianças

Desejo um bom domingo a todos! Sabemos que o Natal está próximo: preparemo-nos não só com os presentes de Natal, mas com o nosso coração. Pensemos que Cristo, o Senhor, está perto de nós, entra na nossa vida e nos dá luz e alegria. São Paulo diz hoje na Carta aos Tessalonicenses: «Orai sem cessar». Naturalmente, isto não significa que devemos dizer sempre palavras de oração, mas significa que não devemos perder o contacto com Deus no nosso coração. Se houver este contacto, haverá um motivo de alegria. A todos vós, desejo todo o júbilo do Natal e toda a alegria da presença de Jesus Cristo Menino, que é Deus no nosso coração. Muitas felicidades! Bom Domingo e um santo Natal desde já!

* * *

No final da missa, no átrio da igreja, o Papa despediu-se da comunidade paroquial, improvisando as seguintes palavras.

Prezados amigos, um abraço espiritual para todos vós! Obrigado pela vossa presença e pela cordialidade do acolhimento. Era como na África, esta cordialidade tão bonita e aberta, os corações abertos e vivos. Para mim é uma grande alegria ver como a Igreja vive aqui na cidade de Roma: nesta nova paróquia participa-se realmente na Eucaristia e prepara-se o Natal.

Preparar o Natal hoje é muito difícil. E sei que os compromissos são numerosos. Mas preparar o Natal não consiste somente em comprar, preparar e pensar, mas também em manter o contacto com o Senhor, ir ao seu encontro. E parece-me muito importante não esquecer esta dimensão. Eu já disse às crianças que são Paulo afirma: «Orai sem cessar», ou seja, não percais o contacto com Deus. E este não é um peso acrescentado aos outros, mas a força que nos ajuda a fazer tudo o que é necessário. E desejo-vos, neste sentido, um contacto permanente com Jesus, assim como a sua alegria e a sua força de viver neste mundo. Bom Advento e feliz Natal. Obrigado a todos vós.




A ONZE NOVOS EMBAIXADORES JUNTO DA SANTA SÉ

POR OCASIÃO DA APRESENTAÇÃO

DAS CARTAS CREDENCIAIS

Sala Clementina
Quinta-feira, 15 de Dezembro de 2011



Senhoras e Senhores

É com alegria que vos recebo esta manhã no Palácio Apostólico para a apresentação das Cartas que vos acreditam como Embaixadores Extraordinários e Plenipotenciários dos vossos respectivos países junto da Santa Sé: Trindade e Tobago, República da Guiné-Bissau, Confederação Suíça, Burundi, Tailândia, Paquistão, Moçambique, Quirguistão, Principado de Andorra, Sri Lanka e Burkina Faso. Agradeço-vos as amáveis palavras que me dirigistes da parte dos vossos Chefes de Estado. Peço-vos a amabilidade de lhes transmitir as minhas saudações deferentes e os meus votos respeitosos para as suas pessoas e para a alta missão que desempenham ao serviço dos respectivos países e povos. De igual modo desejo saudar, através de vós, todas as autoridades civis e religiosas da vossa nação, assim como todos os vossos concidadãos. Naturalmente, dirijo as minhas orações e os meus pensamentos também às comunidades católicas presentes no vosso país.

1427 A unidade da família humana é hoje considerada uma realidade. Graças aos meios de comunicação social que ligam todas as regiões do planeta entre si, aos transportes que facilitam os intercâmbios humanos, às redes comerciais que tornam as economias interdependentes, aos desafios que adquirem uma dimensão mundial como a protecção do meio ambiente e a importância dos fluxos migratórios, os homens compreenderam que de hoje em diante têm um destino comum. Ao lado dos aspectos positivos, esta tomada de consciência é às vezes considerada como um peso, no sentido que aumenta consideravelmente o âmbito de responsabilidade de todos, e confere à resolução dos problemas uma complexidade tanto maior quanto mais numerosos são os protagonistas. Isso não pode ser negado, todavia o olhar da humanidade sobre si mesma deve evoluir para descobrir nesta interdependência não uma ameaça, mas uma vantagem: os homens têm que trabalhar em conjunto e uns para os outros. Todos somos responsáveis por todos, e é importante ter uma concepção positiva da solidariedade. É o impulso concreto para um desenvolvimento humano integral que permita que a humanidade caminhe rumo à sua realização. Ao considerar todos os âmbitos onde a solidariedade merece ser praticada, devemos considerar como um sinal positivo da cultura actual, a exigência, cada vez mais presente na consciência dos nossos contemporâneos, de uma solidariedade intergeracional. Ela encontra as suas raízes naturais na família, que deve ser apoiada adequadamente a fim de que possa continuar a cumprir a sua missão essencial na sociedade. Ao mesmo tempo, a educação dos jovens é a forma privilegiada para ampliar o campo da solidariedade e promovê-la de forma sustentável. Neste âmbito, encorajo todos, independentemente do nível de responsabilidade, e especialmente os governantes a demonstrar criatividade, a receber e investir o dinheiro necessário para doar aos jovens as bases éticas fundamentais, ajudando-os sobretudo a formar-se, e a lutar contra os males da sociedade como o desemprego, a droga, a criminalidade e a falta de respeito pela pessoa. A preocupação pelo destino das gerações futuras conduz a um progresso significativo na percepção da unidade do ser humano. Não se deve recear que esta responsabilidade comum e compartilhada para o bem de todos os seres humanos se confronte com a diversidade cultural e religiosa, como num beco sem saída. O pluralismo das culturas e das religiões não se opõe à busca comum da verdade, do bem o do bom. Esclarecida e apoiada pela luz da Revelação, a Igreja encoraja os homens a confiar na razão que, se purificada pela fé, «eleva-a, permitindo-lhe assim dilatar os seus próprios espaços para se inserir num campo de pesquisa insondável, como o próprio mistério» (Discurso por ocasião do x aniversário da Carta Encíclica Fides et ratio FR 16 Fides et ratio, 16 de Outubro de 2008). Por conseguinte, ela é capaz de superar os condicionamentos partidários ou interesseiros, para reconhecer o bem universal do qual todos os homens necessitam. A paz e a harmonia social e religiosa tão desejados estão ligados não só a um quadro legislativo justo e adequado, mas também à qualidade moral de cada cidadão, porque: «a solidariedade se apresenta sob dois aspectos completares: o de princípio social e o de virtude moral» (Compêndio da Doutrina social da Igreja, n. 193).

A solidariedade desempenha plenamente o seu papel de virtude social quando pode contar com estruturas de subsidiariedade e com a determinação firme e perseverante de cada pessoa que trabalha para o bem comum, na consciência de uma responsabilidade comum. Os novos desafios com os quais os vossos países se confrontam hoje fazem certamente apelo a uma mobilização de inteligências e de criatividade do homem para lutar contra a pobreza e para uma utilização mais eficaz e sadia das energias e dos recursos disponíveis. Tanto a nível individual quanto político, é necessário agir de maneira firme por um compromisso mais concreto e amplamente compartilhado em relação ao respeito e à protecção da criação. Por conseguinte, encorajo vivamente as autoridades políticas do vosso país a trabalhar neste sentido.

Por fim, fazer crescer a responsabilidade de todos comporta também uma vigilância activa e eficaz sobre o respeito e a promoção da dignidade humana perante todas as tentativas de a limitar, inclusive de a negar ou de uma instrumentalização de cada pessoa. Uma atitude semelhante pode contribuir para evitar que o agir social se torne muito facilmente objecto dos interesses particulares e das lógicas de poder que provocam a destruição da sociedade e acentuam a pobreza. É baseando-se na noção do desenvolvimento integral da pessoa humana que a solidariedade poderá realizar-se e permitir uma maior justiça. A este respeito, compete não só às religiões salvaguardar a primazia do espírito, mas também aos Estados, sobretudo através de uma política cultural que favoreça o acesso de todos ao bem do espírito, valorize a riqueza dos vínculos sociais e nunca desencoraje o homem de perseguir livremente a busca espiritual.

No início da vossa missão junto da Santa Sé desejo garantir-vos, Excelências, que encontrareis sempre junto dos meus colaboradores a escuta atenta e a ajuda da qual podereis ter necessidade. Invoco de bom grado sobre vós, as vossas famílias, os membros da vossa missão diplomática, assim como sobre as nações que representais, abundantes Bênçãos divinas.



POR OCASIÃO DA TROCA DE VOTOS NATALÍCIOS

COM OS CARDEAIS, A CÚRIA ROMANA E A FAMÍLIA PONTIFÍCIA Sala Clementina

Quinta-feira, 22 de Dezembro de 2011



Senhores Cardeais,
Venerados Irmãos no Episcopado e no Presbiterado,
Amados irmãos e irmãs!

Um momento como este que vivemos hoje reveste-se sempre de particular intensidade. O Santo Natal já está perto e a grande família da Cúria Romana sente-se impelida a reunir-se para trocar entre si venturosos votos que encerram o desejo de viver, com alegria e verdadeiro fruto espiritual, a festa de Deus que encarnou e pôs a sua tenda no meio de nós (cf. Jn 1,14). Esta ocasião permite-me não só apresentar-vos os meus votos pessoais, mas também exprimir a cada um de vós o agradecimento, meu e da Igreja, pelo vosso generoso serviço; peço-vos que o façais chegar também a todos os colaboradores que formam a nossa grande família. Um obrigado particular ao Cardeal Decano Ângelo Sodano, que se fez intérprete dos sentimentos dos presentes e de quantos trabalham nos diversos Departamentos da Cúria, do Governatorado, incluindo aqueles que realizam o seu ministério nas Representações Pontifícias espalhadas por todo o mundo. Todos nós estamos empenhados em fazer com que o pregão que os Anjos proclamaram na noite de Belém – «Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens do seu agrado» (Lc 2,14) – ressoe por toda a terra levando alegria e esperança.

1428 No fim deste ano, a Europa encontra-se no meio duma crise económica e financeira que, em última análise, se fundamenta na crise ética que ameaça o Velho Continente. Embora certos valores como a solidariedade, o serviço aos outros, a responsabilidade pelos pobres e atribulados sejam em grande parte compartilhados, todavia falta muitas vezes a força capaz de motivar e induzir o indivíduo e os grandes grupos sociais a abraçarem renúncias e sacrifícios. O conhecimento e a vontade caminham, necessariamente, lado a lado. A vontade de preservar o lucro pessoal obscurece o conhecimento e este, enfraquecido, é incapaz de revigorar a vontade. Por isso, desta crise surgem interrogações fundamentais: Onde está a luz que possa iluminar o nosso conhecimento não apenas com ideias gerais, mas também com imperativos concretos? Onde está a força que sublime a nossa vontade? São questões às quais o nosso anúncio do Evangelho, a nova evangelização, deve dar resposta, para que a mensagem se torne acontecimento, o anúncio se torne vida.

Com efeito, a grande temática tanto deste ano como dos anos futuros gira à volta disto: Como anunciar hoje o Evangelho? Como pode a fé, enquanto força viva e vital, tornar-se realidade hoje? Os acontecimentos eclesiais deste ano que está a terminar referiam-se todos, em última análise, a este tema. Entre eles contam-se as minhas viagens à Croácia, a Espanha para a Jornada Mundial da Juventude, à minha pátria da Alemanha e, por fim, à África – ao Benim – para a entrega da Exortação pós-sinodal sobre justiça, paz e reconciliação; documento este, que se deve traduzir em realidade concreta nas diversas Igrejas particulares. Não posso esquecer também as viagens a Veneza, a São Marino, a Ancona para o Congresso Eucarístico e à Calábria. E tivemos, enfim, a significativa jornada de Assis, com o encontro entre as religiões e entre as pessoas em busca de verdade e de paz; jornada concebida como um novo impulso na peregrinação para a verdade e a paz. A instituição do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização constitui, simultaneamente, um prenúncio do Sínodo sobre o mesmo tema que terá lugar no próximo ano. E entra também neste contexto o Ano da Fé, na comemoração da abertura do Concílio há cinquenta anos. Cada um destes acontecimentos revestiu-se de acentuações próprias. Na Alemanha, país onde teve origem a Reforma, naturalmente teve uma importância particular a questão ecuménica com todas as suas fadigas e esperanças. Indivisivelmente associada com ela, levanta-se sempre de novo, no centro da disputa, a questão: O que é uma reforma da Igreja? Como se realiza? Quais são os seus caminhos e os seus objectivos? É com preocupação que fiéis crentes, e não só, notam como as pessoas que frequentam regularmente a Igreja se vão tornando sempre mais idosas e o seu número diminui continuamente; notam como se verifica uma estagnação nas vocações ao sacerdócio; como crescem o cepticismo e a descrença. Então que devemos fazer? Existem discussões sem fim a propósito do que se deve fazer para haver uma inversão de tendência. E certamente é preciso fazer tantas coisas; mas o fazer, por si só, não resolve o problema. O cerne da crise da Igreja na Europa, é a crise da fé. Se não encontrarmos uma resposta para esta crise, ou seja, se a fé não ganhar de novo vitalidade, tornando-se um convicção profunda e uma força real graças ao encontro com Jesus Cristo, permanecerão ineficazes todas as outras reformas.

Neste sentido, o encontro com a jubilosa paixão pela fé, na África, foi um grande encorajamento. Lá não se sentia qualquer indício desta lassidão da fé, tão difusa entre nós, não havia nada deste tédio de ser cristão que se constata sempre de novo no meio de nós. Apesar de todos os problemas, de todos os sofrimentos e penas que existem, sem dúvida, precisamente na África, sempre se palpava a alegria de ser cristão, o ser sustentado pela felicidade interior de conhecer Cristo e pertencer à sua Igreja. E desta alegria nascem também as energias para servir Cristo nas situações opressivas de sofrimento humano, para se colocar à sua disposição em vez de acomodar-se no próprio bem-estar. Encontrar esta fé disposta ao sacrifício e, mesmo no meio deste, jubilosa é um grande remédio contra a lassidão de ser cristão que experimentamos na Europa.

E um remédio contra a lassidão do crer foi também a magnífica experiência da Jornada Mundial da Juventude, em Madrid. Esta foi uma nova evangelização ao vivo. De forma cada vez mais clara vai-se delineando, nas Jornadas Mundiais da Juventude, um modo novo e rejuvenescido de ser cristão, que poder-se-ia caracterizar em cinco pontos.

1. Em primeiro lugar, há uma nova experiência da catolicidade, da universalidade da Igreja. Foi isto que impressionou, de forma muito viva e imediata, os jovens e todos os presentes: Vimos de todos os continentes e, apesar de nunca nos termos visto antes, conhecemo-nos. Falamos línguas diferentes e possuímos costumes de vida diversos e formas culturais diversas; e no entanto sentimo-nos imediatamente unidos como uma grande família. Separação e diversidade exteriores ficaram relativizadas. Todos somos tocados pelo mesmo e único Senhor Jesus Cristo, no qual se nos manifestou o verdadeiro ser do homem e, conjuntamente, o próprio Rosto de Deus. As nossas orações são as mesmas. Em virtude do mesmo encontro interior com Jesus Cristo, recebemos no mais íntimo de nós mesmos a mesma formação da razão, da vontade e do coração. E, por fim, a liturgia comum constitui uma espécie de pátria do coração e une-nos numa grande família. Aqui o facto de todos os seres humanos serem irmãos e irmãs não é apenas uma ideia mas torna-se uma experiência comum real, que gera alegria. E assim compreendemos também de maneira muito concreta que, apesar de todas as fadigas e obscuridades, é bom pertencer à Igreja universal, à Igreja Católica, que o Senhor nos deu.

2. E disto nasce, depois, um novo modo de viver o ser homem, o ser cristão. Para mim, uma das experiências mais importantes daqueles dias foi o encontro com os voluntários da Jornada Mundial da Juventude: eram cerca de 20.000 jovens, tendo todos, sem excepção, disponibilizado semanas ou meses da sua vida para colaborar na preparação técnica, organizativa e temática das actividades da Jornada Mundial da Juventude, e tornando, precisamente assim, possível o desenvolvimento regular de tudo. Com o próprio tempo, o homem oferece sempre uma parte da sua própria vida. No fim, estes jovens estavam, visível e «palpavelmente», inundados duma grande sensação de felicidade: o tempo dado tinha um sentido; precisamente no dom do seu tempo e da sua força laboral, encontraram o tempo, a vida. E então tornou-se-me evidente uma coisa fundamental: estes jovens ofereceram, na fé, um pedaço de vida, e não porque isso lhes fora mandado, nem porque se ganha o céu com isso, nem mesmo porque assim se escapa ao perigo do inferno. Não o fizeram, porque queriam ser perfeitos. Não olhavam para trás, para si mesmos. Passou-me pela mente a imagem da mulher de Lot, que, olhando para trás, se transformou numa estátua de sal. Quantas vezes a vida dos cristãos se caracteriza pelo facto de olharem sobretudo para si mesmos; por assim dizer, fazem o bem para si mesmos. E como é grande, para todos os homens, a tentação de se preocuparem antes de mais nada consigo mesmos, de olharem para trás para si mesmos, tornando-se assim interiormente vazios, «estátuas de sal»! Em Madrid, ao contrário, não se tratava de aperfeiçoar-se a si mesmo ou de querer conservar a própria vida para si mesmo. Estes jovens fizeram o bem – sem olhar ao peso e aos sacrifícios que o mesmo exigia – simplesmente porque é bom fazer o bem, é bom servir os outros. É preciso apenas ousar o salto. Tudo isto é antecedido pelo encontro com Jesus Cristo, um encontro que acende em nós o amor a Deus e aos outros e nos liberta da busca do nosso próprio «eu». Assim recita uma oração atribuída a São Francisco Xavier: Faço o bem, não porque em troca entrarei no céu, nem porque de contrário me poderíeis mandar para o inferno. Faço-o por Vós, que sois o meu Rei e meu Senhor. Este mesmo comportamento fui encontrá-lo também na África, por exemplo nas Irmãs de Madre Teresa que se prodigalizam pelas crianças abandonadas, doentes, pobres e atribuladas, sem se importarem consigo mesmas, tornando-se, precisamente assim, interiormente ricas e livres. Tal é o comportamento propriamente cristão. Para mim, ficou memorável também o encontro com os jovens deficientes na fundação de São José, em Madrid, onde voltei a encontrar a mesma generosidade de colocar-se à disposição dos outros; uma generosidade de se dar, que, em última análise, nasce do encontro com Cristo que Se deu a Si mesmo por nós.

3. Um terceiro elemento que vai, de forma cada vez mais natural e central, fazendo parte das Jornadas Mundiais da Juventude e da espiritualidade que delas deriva, é a adoração. Restam inesquecíveis em mim aqueles momentos no Hydepark, durante a minha viagem à Inglaterra, quando dezenas de milhares de pessoas, na sua maioria jovens, responderam à presença do Senhor no Santíssimo Sacramento com um profundo silêncio, adorando-O. E sucedeu o mesmo, embora em medida menor, em Zagreb e de novo em Madrid depois do temporal que ameaçava arruinar todo o encontro nocturno por causa dos microfones que não funcionavam. Deus é, sem dúvida, omnipresente; mas a presença corpórea de Cristo ressuscitado constitui algo mais, constitui algo de novo. O Ressuscitado entra no meio de nós. E então não podemos senão dizer como o apóstolo Tomé: Meu Senhor e meu Deus! A adoração é, antes de mais nada, um acto de fé; o acto de fé como tal. Deus não é uma hipótese qualquer, possível ou impossível, sobre a origem do universo. Ele está ali. E se Ele está presente, prostro-me diante d’Ele. Então a razão, a vontade e o coração abrem-se para Ele, a partir d’Ele. Em Cristo ressuscitado, está presente Deus feito homem, que sofreu por nós porque nos ama. Entramos nesta certeza do amor corpóreo de Deus por nós, e fazemo-lo amando com Ele. Isto é adoração, e isto confere depois um cunho próprio à minha vida. E só assim posso celebrar convenientemente a Eucaristia e receber devidamente o Corpo do Senhor.

4. Outro elemento importante das Jornadas Mundiais da Juventude é a presença do sacramento da Penitência, que tem vindo, com naturalidade sempre maior, a fazer parte do conjunto. Deste modo, reconhecemos que necessitamos continuamente de perdão e que perdão significa responsabilidade. Proveniente do Criador, existe no homem a disponibilidade para amar e a capacidade de responder a Deus na fé. Mas, proveniente da história pecaminosa do homem (a doutrina da Igreja fala do pecado original), existe também a tendência contrária ao amor: a tendência para o egoísmo, para se fechar em si mesmo, ou melhor, no mal. Incessantemente a minha alma fica manchada por esta força de gravidade em mim, que me atrai para baixo. Por isso, temos necessidade da humildade que sempre de novo pede perdão a Deus, que se deixa purificar e que desperta em nós a força contrária, a força positiva do Criador, que nos atrai para o alto.

5. Por fim, como última característica, que não se deve descurar na espiritualidade das Jornadas Mundiais da Juventude, quero mencionar a alegria. Donde brota? Como se explica? Seguramente são muitos os factores que interagem; mas, a meu ver, o factor decisivo é esta certeza que deriva da fé: Eu sou desejado; tenho uma missão na história; sou aceite, sou amado. Josef Pieper mostrou, no seu livro sobre o amor, que o homem só se pode aceitar a si mesmo, se for aceite por outra pessoa qualquer. Precisa que haja outra pessoa que lhe diga, e não só por palavras: É bom que tu existas. Somente a partir de um «tu» é que o «eu» pode encontrar-se si mesmo. Só se for aceite, é que o «eu» se pode aceitar a si mesmo. Quem não é amado, também não se pode amar a si mesmo. Este saber-se acolhido provém, antes de tudo, doutra pessoa. Entretanto todo o acolhimento humano é frágil; no fim de contas, precisamos de um acolhimento incondicional; somente se Deus me acolher e eu estiver seguro disso mesmo é que sei definitivamente: É bom que eu exista; é bom ser uma pessoa humana. Quando falta ao homem a percepção de ser acolhido por Deus, de ser amado por Ele, a pergunta sobre se existir como pessoa humana seja verdadeiramente coisa boa, deixa de encontrar qualquer resposta; torna-se cada vez mais insuperável a dúvida acerca da existência humana. Onde se torna predominante a dúvida sobre Deus, acaba inevitavelmente por seguir-se a dúvida acerca do meu ser homem. Hoje vemos quão difusa é esta dúvida! Vemo-lo na falta de alegria, na tristeza interior que se pode ler em muitos rostos humanos. Só a fé me dá esta certeza: É bom que eu exista; é bom existir como pessoa humana, mesmo em tempos difíceis. A fé faz-nos felizes a partir de dentro. Esta é uma das maravilhosas experiências das Jornadas Mundiais da Juventude.

Alongaria demasiado o nosso encontro falar agora também, de modo detalhado, do encontro de Assis, como a importância do acontecimento mereceria. Limitamo-nos a agradecer a Deus, porque nós – os representantes das religiões do mundo e também os representantes do pensamento em busca da verdade – pudemos, naquele dia, encontrar-nos num clima de amizade e de respeito mútuo, no amor à verdade e na responsabilidade comum pela paz. Por isso podemos esperar que, daquele encontro, tenha nascido uma disponibilidade nova para servir a paz, a reconciliação e a justiça.

Queria enfim agradecer do íntimo do coração a todos vós pelo apoio que prestais para levar por diante a missão que o Senhor nos confiou como testemunhas da sua verdade, e desejo a todos vós a alegria que Deus nos quis dar na encarnação do seu Filho. Um santo Natal para todos vós! Obrigado!





AO CORPO DIPLOMÁTICO ACREDITADO JUNTO DA SANTA SÉ PARA A TROCA DE BONS VOTOS DE INÍCIO DE ANO Sala Régia

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Segunda-feira, 9 de Janeiro de 2012




Senhoras e Senhores Embaixadores,

É sempre para mim um grande prazer poder receber-vos, ilustres Membros do Corpo Diplomático acreditados junto da Santa Sé, neste esplêndido cenário da Sala Régia, a fim de vos formular os meus ardentes votos para o ano que inicia. Desejo, em primeiro lugar, agradecer ao vosso Decano, o Embaixador Alejandro Valladares Lanza, bem como ao Vice-Decano, o Embaixador Jean-Claude Michel, pelas palavras deferentes com que se fizeram intérpretes dos vossos sentimentos e dirijo uma saudação especial a todos os que participam pela primeira vez no nosso encontro. E os meus votos estendem-se, por vosso intermédio, a todas as nações de que sois representantes e com as quais a Santa Sé mantém relações diplomáticas. Motivo de alegria para nós é o facto de a Malásia se ter juntado a esta comunidade no decurso do último ano. O diálogo que mantendes com a Santa Sé favorece a partilha de impressões e informações, bem como a colaboração em âmbitos de carácter bilateral ou multilateral de particular interesse. A vossa presença aqui hoje recorda a importante contribuição dada pela Igreja às vossas sociedades em sectores como a educação, a saúde e a assistência. Sinais da cooperação entre a Igreja Católica e os Estados são os Acordos que foram assinados, em 2011, com o Azerbaijão, Montenegro e Moçambique. O primeiro já foi ratificado; espero que em breve ocorra o mesmo com os outros dois, e cheguem a bom termo aqueles que estão em fase de negociação. De igual modo, a Santa Sé deseja estabelecer um diálogo profícuo com as Organizações internacionais e regionais; e, nesta linha, apraz-me sublinhar o facto de os países membros da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) terem acolhido a nomeação dum Núncio Apostólico acreditado junto da organização. Não posso deixar de mencionar que a Santa Sé reforçou a sua longa colaboração com a Organização Internacional para as Migrações ao tornar-se membro pleno da mesma, no passado mês de Dezembro. Isto dá testemunho do empenhamento da Santa Sé e da Igreja Católica ao lado da comunidade internacional na busca de soluções adequadas para este fenómeno que se reveste de muitos aspectos, desde a protecção da dignidade das pessoas até à solicitude pelo bem comum das comunidades que os recebem e daquelas donde provêm.

Durante o ano findo, encontrei-me pessoalmente com numerosos Chefes de Estado e de Governo e também com destacados representantes das vossas nações que participaram na cerimónia da Beatificação do meu bem-amado Predecessor, o Papa João Paulo II. Também por ocasião do sexagésimo aniversário da minha Ordenação Sacerdotal houve diversos representantes dos vossos países que tiveram a amabilidade de estar presentes. A todos eles e a quantos encontrei nas minhas viagens apostólicas à Croácia, San Marino, Espanha, Alemanha e Benim, renovo a minha gratidão pela delicadeza manifestada. Além disso, dirijo uma saudação especial aos países da América Latina e das Caraíbas que festejaram, em 2011, o bicentenário da sua independência. No passado dia 12 de Dezembro, quiseram sublinhar a sua ligação à Igreja Católica e ao Sucessor do Príncipe dos Apóstolos com a participação de eminentes representantes da comunidade eclesial e de autoridades institucionais na solene celebração que teve lugar na Basílica de São Pedro, durante a qual dei a conhecer a minha intenção de visitar proximamente o México e Cuba. Desejo, por fim, saudar o Sudão do Sul que, no passado mês de Julho, se constituiu como um Estado soberano. Lamentando as tensões e confrontos que se foram sucedendo nestes últimos meses, espero que todos unam os seus esforços para que se abra finalmente um período de paz, liberdade e progresso para as populações do Sudão e do Sudão do Sul.

Senhoras e Senhores Embaixadores,

O encontro de hoje desenrola-se tradicionalmente no termo das festas do Natal, quando a Igreja celebra a vinda do Salvador. Ele vem na obscuridade da noite, e no entanto a sua presença torna-se imediatamente fonte de luz e alegria (cf.
Lc 2,9-10). Verdadeiramente torna-se sombrio o mundo, quando não é iluminado pela luz divina! Verdadeiramente fica na escuridão o mundo, quando o homem deixa de reconhecer a sua ligação com o Criador, pondo assim em perigo também as suas relações com as outras criaturas e com a própria criação. Infelizmente, o momento actual está marcado por um profundo mal-estar, sendo uma expressão dramática disto mesmo as diversas crises económicas, políticas e sociais.

A este respeito, não posso deixar de mencionar, antes de mais nada, as graves e preocupantes consequências da crise económica e financeira mundial. Esta não atinge só as famílias e as empresas dos países economicamente mais avançados, onde a mesma teve origem, criando uma situação na qual muitos, sobretudo entre os jovens, se sentiram desorientados e frustrados nas suas aspirações por um futuro sereno, mas tal crise marcou profundamente também a vida dos países em vias de desenvolvimento. Não devemos desanimar, mas redesenhar decididamente o nosso caminho com novas formas de compromisso. A crise pode e deve ser um incentivo para meditar sobre a existência humana e a importância da sua dimensão ética, antes mesmo de reflectir sobre os mecanismos que governam a vida económica: não só para procurar conter as perdas individuais ou das economias nacionais, mas para nos impormos novas regras que assegurem a todos a possibilidade de viver dignamente e desenvolver as suas capacidades em benefício da comunidade inteira.

Desejo ainda lembrar que os efeitos do actual momento de incerteza afectam particularmente os jovens. Do seu mal-estar nasceram os fermentos que nos últimos meses investiram, por vezes duramente, várias regiões. Refiro-me antes de mais ao Norte da África e ao Médio Oriente, onde os jovens – que, para além do mais, sofrem pobreza e desemprego e temem pela ausência de perspectivas seguras – lançaram aquilo que veio a tornar-se um amplo movimento de reivindicação de reformas e de participação mais activa na vida política e social. É difícil actualmente traçar um balanço definitivo dos recentes acontecimentos e compreender plenamente as suas consequências para os equilíbrios da Região. O optimismo inicial cedeu, entretanto, o passo ao reconhecimento das dificuldades deste momento de transição e mudança, e parece-me evidente que a senda adequada para prosseguir no caminho empreendido passe pelo reconhecimento da dignidade inalienável de toda a pessoa humana e dos seus direitos fundamentais. O respeito da pessoa deve estar no centro das instituições e das leis, deve conduzir ao fim de toda e qualquer violência e prevenir contra o risco de que a atenção devida às solicitações dos cidadãos e a necessária solidariedade social se transformem em meros instrumentos para manter ou conquistar o poder. Convido a comunidade internacional a dialogar com os actores dos processos em curso, no respeito dos povos e com a consciência de que a construção de sociedades estáveis e reconciliadas, contrapostas a toda a discriminação injusta, particularmente de ordem religiosa, constitui um horizonte mais amplo e transcendente que o dos prazos eleitorais. Sinto uma grande preocupação pelas populações dos países nos quais continuam tensões e violências, particularmente na Síria, onde espero que se ponha rapidamente termo ao derramamento de sangue e comece um diálogo frutuoso entre os actores políticos, favorecido pela presença de observadores independentes. Na Terra Santa, onde as tensões entre palestinianos e israelitas têm repercussões sobre os equilíbrios de todo o Médio Oriente, é preciso que os responsáveis destes dois povos adoptem decisões corajosas e clarividentes a favor da paz. Soube com satisfação que, na sequência duma iniciativa do Reino da Jordânia, foi retomado o diálogo; espero que o mesmo continue a fim de se chegar a uma paz duradoura, que garanta o direito de ambos os povos a viver em segurança em Estados soberanos e dentro de fronteiras seguras e, internacionalmente, reconhecidas. Por sua vez, a comunidade internacional deve estimular a sua criatividade e as iniciativas de promoção deste processo de paz, no respeito dos direitos de cada parte. Sigo também com grande atenção o desenrolar dos factos no Iraque, deplorando os atentados que ainda recentemente causaram a perda de numerosas vidas humanas, e encorajo as suas autoridades a continuarem, firmes, pelo caminho duma plena reconciliação nacional.

O Beato João Paulo II lembrava que «o caminho da paz é também o caminho dos jovens»[1], constituindo eles «a juventude das nações e das sociedades, a juventude de todas as famílias e da humanidade inteira»[2]. Por isso, os jovens pressionam-nos para que sejam consideradas seriamente as suas exigências de verdade, justiça e paz. Nesta linha, foi a eles que dediquei a Mensagem anual para a celebração do Dia Mundial da Paz, intitulada Educar os jovens para a justiça e a paz. A educação é um tema crucial para todas as gerações, pois depende dela tanto o desenvolvimento saudável de cada pessoa como o futuro da sociedade inteira. Por isso mesmo, aquela constitui uma tarefa de primária grandeza num tempo difícil e delicado. Para além de um objectivo claro, como é o de levar os jovens a um pleno conhecimento da realidade e, consequentemente, da verdade, a educação tem necessidade de lugares. Dentre estes, conta-se em primeiro lugar a família, fundada sobre o matrimónio entre um homem e uma mulher; não se trata duma simples convenção social, mas antes da célula fundamental de toda a sociedade. Por conseguinte, as políticas que atentam contra a família ameaçam a dignidade humana e o próprio futuro da humanidade. O quadro familiar é fundamental no percurso educativo e para o próprio desenvolvimento dos indivíduos e dos Estados; consequentemente, são necessárias políticas que o valorizem e colaborem para a sua coesão social e diálogo. É na família que a pessoa se abre ao mundo e à vida e, como tive ocasião de lembrar durante a minha viagem à Croácia, «a abertura à vida é um sinal da abertura ao futuro»[3]. Neste contexto de abertura à vida, recebi com satisfação a recente sentença do Tribunal de Justiça da União Europeia, que proíbe atribuir alvarás em processos relativos às células estaminais embrionárias humanas, e também a Resolução da Assembleia parlamentar do Conselho da Europa que condena a selecção pré-natal em função do sexo.

Mais em geral, visando sobretudo o mundo ocidental, estou convencido de que se opõem à educação dos jovens e, consequentemente, ao futuro da humanidade as medidas legislativas que permitem, quando não incentivam, o aborto por motivos de conveniência ou por razões médicas discutíveis.

1430 Continuando a nossa reflexão, um papel também essencial no desenvolvimento da pessoa é desempenhado pelas instituições educativas: estas são as primeiras instâncias que colaboram com a família e estão a cumprir mal a sua função precisamente quando falta uma harmonia de objectivos com a realidade familiar. É preciso implementar políticas de formação para que a educação escolar seja acessível a todos e que a mesma, mais do que promover o desenvolvimento cognoscitivo da pessoa, cuide do crescimento harmonioso da personalidade, incluindo nisso a sua abertura ao Transcendente. A Igreja Católica sempre esteve particularmente activa no campo das instituições escolares e académicas, cumprindo uma obra apreciável ao lado das instituições estatais. Por isso espero que esta contribuição seja reconhecida e valorizada também pelas legislações nacionais.

Nesta perspectiva, é bem compreensível que uma obra educativa eficaz exija igualmente o respeito da liberdade religiosa. Esta caracteriza-se por uma dimensão individual, bem como por uma dimensão colectiva e uma dimensão institucional. Trata-se do primeiro dos direitos do homem, porque expressa a realidade mais fundamental da pessoa. Muitas vezes, por variados motivos, este direito é ainda limitado ou espezinhado. Não posso evocar este tema sem começar por saudar a memória do ministro paquistanês Shahbaz Bhatti, cuja luta incansável pelos direitos das minorias terminou com uma morte trágica. E não se trata, infelizmente, dum caso único. Em numerosos países, os cristãos são privados dos direitos fundamentais e postos à margem da vida pública; noutros, sofrem ataques violentos contra as suas igrejas e as suas casas. Às vezes, vêem-se constrangidos a abandonar países que eles mesmos ajudaram a edificar, por causa de tensões contínuas e por políticas que frequentemente os relegam para a condição de espectadores secundários da vida nacional. Noutras partes do mundo, encontram-se políticas tendentes a marginalizar o papel da religião na vida social, como se ela fosse causa de intolerância em vez de uma apreciável contribuição na educação para o respeito da dignidade humana, para a justiça e a paz. O terrorismo religiosamente motivado ceifou, no ano passado, também numerosas vítimas, sobretudo na Ásia e na África. Por esta razão, como lembrei em Assis, os responsáveis religiosos devem repetir, com vigor e firmeza, que «esta não é a verdadeira natureza da religião. Ao contrário, é a sua deturpação e contribui para a sua destruição»[4]. A religião não pode ser usada como pretexto para pôr de lado as regras da justiça e do direito em favor do «bem» que ela persegue. Nesta perspectiva, tenho o gosto de recordar, como fiz no meu país natal, que a visão cristã do homem constituiu a verdadeira força inspiradora para os Pais constituintes da Alemanha, como aliás o foi para os Pais fundadores da Europa unida. Queria mencionar também alguns sinais encorajadores no campo da liberdade religiosa. Refiro-me à alteração legislativa, pela qual a personalidade jurídica pública das minorias religiosas foi reconhecida na Geórgia; penso também na sentença do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos favorável à presença do Crucifixo nas salas de aulas italianas. E, precisamente falando da Itália, desejo dirigir-lhe uma saudação particular na conclusão dos 150 anos da sua unificação política. As relações entre a Santa Sé e o Estado italiano atravessaram momentos difíceis depois da unificação. Mas, com o passar do tempo, prevaleceram a concórdia e a vontade mútua de cooperar, cada qual no seu próprio campo, para favorecer o bem comum. Espero que a Itália continue a promover uma relação equilibrada entre a Igreja e o Estado, constituindo deste modo um exemplo para o qual as outras nações possam olhar com respeito e interesse.

Quanto ao continente africano, que visitei de novo indo recentemente ao Benim, é essencial que a cooperação entre as comunidades cristãs e os Governos ajude a percorrer um caminho de justiça, paz e reconciliação, onde os membros de todas as etnias e religiões sejam respeitados. É triste constatar como está ainda distante, em vários países deste continente, um tal objectivo. Penso, em particular, na recrudescência das violências que afectam a Nigéria – como o indicam os atentados perpetrados contra várias igrejas durante o período natalício –, nas sequelas da guerra civil na Costa do Marfim, na instabilidade que persiste na Região dos Grandes Lagos e na urgência humanitária nos países do Corno da África. Peço uma vez mais à comunidade internacional que ajude, com solicitude, a encontrar uma solução para a crise que há anos perdura na Somália.

Finalmente, sinto o dever de sublinhar que uma educação correctamente entendida não pode deixar de favorecer o respeito pela criação. Não podemos esquecer as graves calamidades naturais que, ao longo de 2011, afectaram várias regiões do Sudeste asiático e os desastres ecológicos como o da central nuclear de Fukushima no Japão. A salvaguarda do ambiente, a sinergia entre a luta contra a pobreza e a luta contra as alterações climáticas constituem áreas importantes para a promoção do desenvolvimento humano integral. Por isso espero que, depois da XVII sessão da Conferência dos Estados Membros da Convenção da ONU sobre as Alterações Climáticas, que recentemente terminou em Durban, a comunidade internacional se prepare para a Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável («Rio+20») como uma autêntica «família das nações», ou seja, com grande sentido de solidariedade e responsabilidade para com as gerações presentes e as do futuro.

Senhoras e Senhores Embaixadores,

O nascimento do Príncipe da Paz ensina-nos que a vida não acaba no nada, que o seu destino não é a corrupção mas a imortalidade. Cristo veio para que os homens tenham a vida e a tenham em abundância (cf.
Jn 10,10). «Somente quando o futuro é certo como realidade positiva, é que se torna vivível também o presente»[5]. Animada pela certeza da fé, a Santa Sé continua a dar à Comunidade internacional o seu contributo próprio, guiada por um duplo intento que o Concílio Vaticano II – cujo cinquentenário se celebra este ano – definiu claramente: proclamar a sublime vocação do homem e a presença nele dum germe divino, e oferecer à humanidade uma cooperação sincera a fim de instaurar a fraternidade universal que a esta vocação corresponde[6]. Neste espírito, renovo a todos vós, extensivos aos membros das vossas famílias e aos vossos colaboradores, os meus votos mais cordiais para este novo ano.

Agradeço pela vossa atenção.



[1] Carta apostólica por ocasião do Ano Internacional da Juventude Dilecti amici (31 de Março de 1985), 15.
[2] Ibidem, 1.
[3] Homilia da Missa por ocasião do Dia Nacional das Famílias Católicas Croatas (Zagreb, 5 de Junho de 2011).
[4] Discurso na Jornada de reflexão, diálogo e oração pela paz e a justiça no mundo (Assis, 27 de Outubro de 2011).
[5] Carta encíclica Spe salvi (30 de Novembro de 2007), 2.
[6] Cf. Const. past. sobre a Igreja no mundo contemporâneo Gaudium et spes, 3.





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