Bento XVI Homilias 44509

Quinta-feira, 14 de Maio de 2009: CELEBRAÇÃO DAS VÉSPERAS COM OS BISPOS, SACERDOTES, RELIGIOSOS, RELIGIOSAS, MOVIMENTOS ECLESIAIS E AGENTES PASTORAIS DA GALILEIA

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Basílica Superior da Anunciação - Nazaré



Irmãos Bispos
Padre Guardião
Caros irmãos e irmãs em Cristo

É para mim motivo de profunda emoção estar presente convosco hoje, precisamente no lugar onde a Palavra de Deus se fez carne e veio habitar no meio de nós. Como é oportuno encontrar-nos aqui reunidos para entoar a Oração das Vésperas da Igreja, dando louvor e graças a Deus pelas maravilhas que Ele realizou por nós! Agradeço ao Arcebispo D. Sayah pelas palavras de boas-vindas e, através dele, saúdo todos os membros da comunidade maronita aqui na Terra Santa. Saúdo os sacerdotes, os religiosos, os membros dos movimentos eclesiais e os agentes da pastoral vindos de toda a Galileia. Mais uma vez, elogio a atenção demonstrada pelos Frades da Custódia durante muitos séculos, na manutenção de lugares santos como este. Saúdo o Patriarca Latino emérito, Sua Beatitude Michel Sabbah, que durante mais de vinte anos governou o seu rebanho nestas terras. Saúdo os fiéis do Patriarcado Latino e o seu Patriarca actual, Sua Beatitude Fouad Twal, assim como os membros da comunidade greco-melquita, aqui representada pelo Arcebispo D. Elias Chacour. E neste lugar onde o próprio Jesus cresceu em maturidade e aprendeu a língua hebraica, saúdo os cristãos de língua hebraica, que são para nós uma evocação das raízes judaicas da nossa fé.

O que aconteceu aqui em Nazaré, longe dos olhares do mundo, foi um gesto singular de Deus, uma intervenção poderosa na história através da qual uma criança foi concebida para trazer a salvação ao mundo inteiro. O prodígio da Encarnação continua a desafiar-nos a abrir a nossa inteligência às possibilidades ilimitadas do poder transformador de Deus, do seu amor por nós e do seu desejo de estar em comunhão connosco. Aqui, o eterno Filho de Deus tornou-se homem e assim fez com que nós, seus irmãos e irmãs, pudéssemos compartilhar a sua filiação divina. Aquele movimento de abaixamento de um amor que se esvaziou a si mesmo tornou possível o movimento contrário, de exaltação, em que também nós somos elevados para participar da própria vida de Deus (cf.
Ph 2,6-11).

O Espírito que "desceu sobre Maria" (cf. Lc 1,35) é o mesmo Espírito que pairou sobre as águas na aurora da Criação (cf. Gn 1,2). Isto recorda-nos que a Encarnação foi um novo acto criativo. Quando nosso Senhor Jesus Cristo foi concebido por obra do Espírito Santo no seio virginal de Maria, Deus uniu-se à nossa humanidade criada, entrando numa nova relação permanente connosco e inaugurando uma nova Criação. A narração da Anunciação ilustra a extraordinária amabilidade de Deus (cf. Madre Julian de Norwich, Revelações, 77-79). Ele não se impõe e si mesmo, não predetermina simplesmente o papel que Maria desempenhará no seu plano para a nossa salvação, mas procura em primeiro lugar o seu consenso. Claramente, na Criação original Deus não pediu o consenso às suas criaturas, mas nesta nova Criação, sim. Maria está no lugar de toda a humanidade. Ela fala por todos nós, quando responde ao convite do Anjo. São Bernardo descreve como toda a plêiade celeste esperava com vigorosa impaciência a sua palavra de consenso, que deu cumprimento à união nupcial entre Deus e a humanidade. A atenção de todos os coros angélicos concentrou-se neste momento, no qual teve lugar um diálogo que daria início a um novo e definitivo capítulo da história do mundo. Maria disse: "Faça-se em mim segundo a tua palavra". E a Palavra de Deus tornou-se carne.

Reflectir sobre este mistério gozoso incute-nos esperança, a esperança certa de que Deus continuará a conduzir a nossa história, a agir com o poder criativo para alcançar as finalidades que para o cálculo humano parecem impossíveis. Isto desafia-nos a abrir-nos à acção transformadora do Espírito Criador que nos renova, nos faz um só com Ele e nos completa com a sua vida. Convida-nos, com especial amabilidade, a dar o consenso para que Ele habite em nós, a acolher a Palavra de Deus nos nossos corações, tornando-nos capazes de responder a Ele com amor e ir com amor uns ao encontro dos outros.

No Estado de Israel e nos Territórios Palestinianos os cristãos formam uma minoria da população. Às vezes talvez tenhais a impressão de que a vossa voz tenha pouca importância. Muitos dos vossos amigos cristãos emigraram, na esperança de encontrar noutras paragens maior segurança e melhores perspectivas. A vossa situação traz à mente a da jovem Virgem Maria, que levou uma vida escondida em Nazaré, dispondo de muito pouco para a sua vida quotidiana, em termos de riqueza e de influência mundana. Para citar as palavras de Maria no seu grande hino de louvor, o Magnificat, Deus olhou para a humilde condição da sua serva e encheu de bens os famintos. Tiremos a força do cântico de Maria, que daqui a pouco entoaremos em união com a Igreja do mundo inteiro! Tende a coragem de ser fiéis a Cristo e de permanecer aqui na terra que Ele santificou com a sua própria presença! Como Maria, também vós tendes um papel a desempenhar no plano divino da salvação, levando Cristo ao mundo, dando testemunho dele e difundindo a sua mensagem de paz e de unidade. Por isso, é essencial que estejais unidos entre vós, de tal forma que a Igreja na Terra Santa possa ser claramente reconhecida como "sinal e instrumento de comunhão com Deus e de unidade de todo o género humano" (Lumen gentium LG 1). A vossa unidade na fé, na esperança e no amor é um fruto do Espírito Santo que habita em vós e vos torna capazes de ser instrumentos eficazes da paz de Deus, ajudando-vos a construir uma reconciliação genuína entre os diversos povos que reconhecem Abraão como seu pai na fé. Pois como Maria proclamou alegremente no seu Magnificat, Deus recorda-se sempre da "sua misericórdia, conforme tinha dito a nossos pais, em favor de Abraão e da sua descendência, para sempre" (Lc 1,54-55).

Caros amigos em Cristo, tende a certeza de que eu me recordo continuamente de vós nas minhas orações, e peço-vos que façais o mesmo em relação a mim. Dirigimo-nos agora ao nosso Pai celestial, que neste lugar olhou para a humilde condição da sua serva, e entoemos os seus louvores em união com a Bem-Aventurada Virgem Maria, com todos os coros dos anjos e dos santos, e com a Igreja inteira em todas as regiões do mundo.





VISITA PASTORAL A CASSINO E A MONTECASSINO


Domingo, 24 de Maio de 2009: CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA

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Solenidade da Ascensão do Senhor

Cassino, Praça Miranda


Caros irmãos e irmãs

"Ides receber uma força, a do Espírito Santo, que descerá sobre vós e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia, na Samaria e até aos confins do mundo" (
Ac 1,8). Com estas palavras Jesus despede-se dos Apóstolos, como ouvimos na primeira Leitura. Imediatamente depois, o autor sagrado acrescenta que "se elevou à vista deles e uma nuvem subtraiu-o a seus olhos" (Ac 1,9). É o mistério da Ascensão, que no dia de hoje celebramos solenemente. Mas que tencionam comunicar-nos a Bíblia e a liturgia, dizendo que Jesus "foi elevado"? Compreende-se o sentido desta expressão, não a partir de um único texto, nem sequer de um só livro do Novo Testamento, mas na escuta atenta de toda a Sagrada Escritura. Com efeito, o uso do verbo "elevar" é de origem veterotestamentária, e refere-se à tomada de posse da realeza. Portanto, a Ascensão de Cristo significa a tomada de posse do Filho do homem crucificado e ressuscitado na realeza de Deus sobre o mundo.

Porém, existe um sentido mais profundo, imperceptível imediatamente. Na página dos Actos dos Apóstolos afirma-se em primeiro lugar que Jesus "se elevou" (Ac 1,9) e depois acrescenta-se que "foi arrebatado" (Ac 1,11). O acontecimento é descrito não como uma viagem para o alto, mas sim como uma acção do poder de Deus, que introduz Jesus no espaço da proximidade divina. A presença da nuvem, que "o subtraiu aos seus olhos" (Ac 1,9), evoca uma antiquíssima imagem da teologia veterotestamentária, e insere a narração da Ascensão na história de Deus com Israel, da nuvem do Sinai e acima da tenda da aliança do deserto, até à nuvem luminosa sobre o mundo da Transfiguração. Em última análise, apresentar o Senhor envolvido na nuvem evoca o mesmo mistério expresso pelo simbolismo do "sentar à direita de Deus. Em Cristo, que subiu ao céu, o ser humano entrou de modo inaudito e novo na intimidade de Deus; o homem já encontra para sempre espaço em Deus. O "céu", esta palavra céu, não indica um lugar acima das estrelas, mas algo muito mais ousado e sublime: indica o próprio Cristo, a Pessoa divina que acolhe plenamente e para sempre a humanidade, Aquele em quem Deus e o homem estão para sempre inseparavelmente unidos. O céu é o ser do homem em Deus. E nós aproximamo-nos do céu, aliás, entramos no céu, na medida em que nos aproximamos de Jesus e entramos em comunhão com Ele. Portanto, a hodierna solenidade da Ascensão convida-nos a uma profunda comunhão com Cristo morto e ressuscitado, invisivelmente presente na vida de cada um de nós.

Nesta perspectiva compreendemos por que motivo o evangelista Marcos afirma que, depois da Ascensão, os discípulos voltaram para Jerusalém "repletos de alegria" (Lc 24,52). A causa da sua alegria está no facto de que aquilo que tinha acontecido não era na verdade uma separação, uma ausência permanente do Senhor: aliás, eles já tinham a certeza de que o Crucificado-Ressuscitado estava vivo, e nele as portas de Deus, as portas da vida eterna, foram abertas para sempre à humanidade. Por outras palavras, a sua Ascensão não comportava a sua ausência temporária do mundo, mas principalmente inaugurava a nova, definitiva e insuprimível forma da sua presença, em virtude da sua participação no poder régio de Deus. Caberá precisamente a eles, aos discípulos que se tornaram intrépidos graças ao poder do Espírito Santo, tornar perceptível a sua presença mediante o testemunho, a pregação e o compromisso missionário. A solenidade da Ascensão do Senhor deveria encher-nos também a nós de serenidade e de entusiasmo, precisamente como aconteceu com os Apóstolos que, do Monte das Oliveiras, voltaram a partir "repletos de alegria". Como eles, também nós aceitando o convite dos "dois homens em trajes resplandecentes", não devemos permanecer a fixar o céu mas, sob a guia do Espírito Santo, temos que ir a toda a parte e proclamar o anúncio salvífico da morte e ressurreição de Cristo. Acompanham-nos e são-nos de conforto as suas próprias palavras, com as quais se encerra o Evangelho segundo São Mateus. "E Eu estarei sempre convosco, até ao fim do mundo" (Mt 28,20).

Caros irmãos e irmãs, a índole histórica do mistério da Ressurreição e da Ascensão de Cristo ajuda-nos a reconhecer e a compreender a condição transcendente da Igreja, que não nasceu e não vive para suprir à ausência do seu Senhor "desaparecido", mas sobretudo encontra a razão do seu ser e da sua missão na presença permanente embora invisível de Jesus, uma presença que actua através do poder do seu Espírito. Com outros termos, poderíamos dizer que a Igreja não desempenha a função de preparar a vinda de um Jesus "ausente" mas, ao contrário, vive e age para proclamar a sua "presença gloriosa" de maneira histórica e existencial. Desde o dia da Ascensão, cada comunidade cristã progride no seu itinerário terreno rumo ao cumprimento das promessas messiânicas, alimentada pela Palavra de Deus alimentada pelo Corpo e Sangue do seu Senhor. Esta é a condição da Igreja – recorda o Concílio Vaticano II – enquanto "continua o seu peregrinar entre as perseguições do mundo e as consolações de Deus, anunciando a cruz e a morte do Senhor até que Ele venha" (Lumen gentium LG 8).

Irmãos e irmãs desta querida comunidade diocesana, a solenidade do dia de hoje exorta-nos a consolidar a nossa fé na presença real de Jesus na história; sem Ele, nada podemos realizar de eficaz na nossa vida e no nosso apostolado. Como recorda o Apóstolo Paulo na segunda Leitura, Ele "a uns, constituiu Apóstolos, a outros, Profetas, a outros, Evangelistas, Pastores e Doutores, para o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério para a edificação do Corpo de Cristo" (Ep 4,11-12), ou seja a Igreja. E isto, para alcançar "a unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus" (Ep 4,13), dado que a vocação comum de todos é formar "um só corpo e um só Espírito, como existe uma só esperança no chamamento que recebestes" (Ep 4,4). É nesta perspectiva que se insere esta minha visita hodierna que, como o vosso Pastor recordou, tem como finalidade encorajar-vos a "construir, fundar e reedificar" constantemente a vossa comunidade diocesana sobre Cristo. Como? É o próprio São Bento que no-lo indica, recomendando na sua Regra a nada antepor a Cristo: "Christo nihil omnino praeponere" (RB 62,11).

Portanto, dou graças a Deus pelo bem que a vossa comunidade está a realizar sob a orientação do seu Pastor, Padre Abade Pietro Vittorelli, a quem saúdo com afecto e agradeço as amáveis palavras que me dirigiu em nome de todos. Juntamente com ele, saúdo a comunidade monástica, os Bispos, os sacerdotes, os religiosos e as religiosas aqui presentes. Saúdo as autoridades civis e militares, em primeiro lugar o Presidente da Câmara Municipal, a quem estou grato pelo discurso de boas-vindas com que me recebeu na chegada a esta Piazza Miranda que a partir de hoje, embora eu não seja digno disto, receberá o meu nome. Saúdo os catequistas, os agentes que trabalham no campo da saúde, os jovens e quantos se interessam de vários modos pela difusão do Evangelho nesta terra rica de história, que durante a segunda guerra mundial conheceu momentos de enorme sofrimento. Disto dão testemunho silencioso os diversos cemitérios que circundam a vossa cidade renascida, entre os quais recordo de modo particular o polaco, o alemão e o da Commonwealth. Finalmente, dirijo a minha saudação a todos os habitantes de Cassino e dos centros circunvizinhos: a cada um, de modo especial aos enfermos e aos que sofrem, chegue a certeza do meu carinho e da minha oração.

Prezados irmãos e irmãs, sentimos ressoar nesta nossa celebração o apelo de São Bento a conservar o coração fixo em Cristo, a nada antepor a Ele. Isto não nos distrai mas, pelo contrário, impele-nos ainda mais a comprometer-nos na construção de uma sociedade em que a solidariedade seja manifestada por sinais concretos. Mas como? A espiritualidade beneditina, que vós conheceis bem, propõe um programa evangélico resumido neste mote: ora et labora et lege, a oração, o trabalho e a cultura. Antes de tudo, a oração, que constitui a herança mais bonita legada por São Bento aos monges, mas inclusive à vossa Igreja particular: ao vosso Clero, em grande parte formado no Seminário diocesano, durante séculos hospedado na Abadia de Montecassino, aos seminaristas, às numerosas pessoas educadas nas escolas e nos "recreadores" beneditinos, e nas vossas paróquias, enfim a todos vós que viveis nesta terra. Elevando o olhar de todas as aldeias e lugares da diocese, podeis admirar aquela evocação constante ao céu que é o mosteiro de Montecassino, ao qual subis todos os anos em procissão na vigília de Pentecostes. A oração, para a qual todas as manhãs o sino de São Bento com os seus repiques graves convida os monges, é a vereda silenciosa que nos conduz directamente ao Coração de Deus; é o respiro da alma que nos restitui a paz nas tempestades da vida. Além disso, na escola de São Bento, os monges cultivaram sempre um amor especial pela Palavra de Deus na lectio divina, que hoje se tornou património comum de muitas pessoas. Sei que a vossa Igreja diocesana, fazendo suas as indicações da Conferência Episcopal Italiana, dedica grande atenção ao aprofundamento bíblico e, além disso, inaugurou um itinerário de estudo das Sagradas Escrituras, este ano dedicado ao evangelista Marcos, e que continuará no próximo quadriénio para depois terminar, se Deus quiser, com uma peregrinação à Terra Santa. Possa a escuta atenta da Palavra divina alimentar a vossa oração e tornar-vos profetas de verdade e de amor num compromisso conjunto de evangelização e de promoção humana.

Outro ponto fulcral da espiritualidade beneditina é o trabalho. Humanizar o mundo do trabalho é típico da alma do monaquismo, e este é também o esforço da vossa comunidade, que procura estar ao lado dos numerosos trabalhadores da grande indústria presente em Cassino e das empresas a ela ligadas. Sei como é crítica a situação de muitos operários. Exprimo a minha solidariedade a quantos vivem numa precariedade preocupadora, nos trabalhadores em regime de lay-off ou até demitidos. A ferida do desemprego que aflige este território induza os responsáveis do Estado, os empresários e quantos têm a possibilidade a procurar, com a contribuição de todos, soluções válidas para a crise do emprego, criando novos postos de trabalho para a salvaguarda das famílias. A este propósito, como deixar de recordar que hoje a família tem necessidade urgente de ser melhor tutelada, dado que está fortemente ameaçada nas próprias raízes da sua instituição? Além disso, penso nos jovens que têm dificuldade de encontrar uma actividade de trabalho digna, que lhes permita construir uma família. Gostaria de lhes dizer: queridos amigos, não desanimeis, a Igreja não vos abandona! Sei que 25 jovens da vossa Diocese participaram na passada Jornada Mundial da Juventude em Sydney: valorizando esta extraordinária experiência espiritual, sede fermento evangélico no meio dos vossos amigos e coetâneos; com a força do Espírito Santo, sede os novos missionários nesta terra de São Bento!

Enfim, também a atenção ao mundo da cultura e da educação pertence à vossa tradição. O célebre Arquivo e a Biblioteca de Montecassino reúnem inúmeros testemunhos do compromisso de homens e mulheres que meditaram e investigaram como melhorar a vida espiritual e material do homem. Na vossa Abadia toca-se com a mão o "quaerere Deum", ou seja, o facto de que a cultura europeia foi a busca de Deus e a disponibilidade à sua escuta. E isto é válido inclusive na nossa época. Sei que vós estais a trabalhar com este mesmo espírito na Universidade e nas escolas, para que se tornem laboratórios de conhecimento, de investigação e de paixão para o futuro das novas gerações. Sei também que, em preparação para esta minha visita, recentemente realizastes um congresso sobre o tema da educação, para estimular em todos aprofunda determinação a transmitir aos jovens os valores irrenunciáveis do nosso património humano e cristão. No hodierno esforço cultural, que visa criar um novo humanismo, fiéis à tradição beneditina, vós tendes justamente a intenção de salientar também a atenção ao homem frágil, débil, às pessoas portadoras de deficiência e aos imigrantes. E estou-vos grato por me terdes oferecido a possibilidade de inaugurar no dia de hoje a "Casa da Caridade", onde se edifica com os factos uma cultura atenta à vida.

Estimados irmãos e irmãs, não é difícil compreender que esta vossa comunidade, esta porção de Igreja que vive nos arredores de Montecassino, é herdeira e depositária da missão imbuída do espírito de São Bento de proclamar que na nossa vida ninguém e nada deve ser anteposto a Jesus; a missão de construir, em nome de Cristo, uma nova humanidade caracterizada pela hospitalidade e pela assistência aos mais frágeis. Que vos ajude e vos acompanhe o vosso santo Patriarca, com a sua irmã Santa Escolástica, e vos protejam os santos Padroeiros e principalmente Maria, Mãe da Igreja e Estrela da nossa esperança.

Amém!



Domingo, 24 de Maio de 2009: CELEBRAÇÃO DAS VÉSPERAS COM OS ABADES BENEDITINOS E A COMUNIDADE DE MONGES E MONJAS

24509

Solenidade da Ascensão do Senhor

Basílica da Abadia de Montecassino



Queridos irmãos e irmãs
da grande família beneditina!

Na conclusão da hodierna visita, é-me particularmente grato deter-me neste lugar sagrado, nesta Abadia, quatro vezes destruída e reconstruída, a última vez depois dos bombardeamentos da II Guerra Mundial de há 65 anos. "Succisa virescit": as palavras do seu novo brasão indicam bem a sua história. Montecassino, como secular sobreiro plantado por São Bento, foi "devastado" pela violência da guerra, mas ressurgiu mais vigoroso. Também eu tive a ocasião várias vezes de gozar da hospitalidade dos monges, e nesta Abadia transcorri momentos inesquecíveis de tranquilidade e de oração. Esta tarde entramos nela cantando as Laudes regiae para celebrar juntos as Vésperas da solenidade da Ascensão de Jesus. A cada um de vós manifesto a alegria de partilhar este momento de oração, saudando-vos a todos com afecto, grato pelo acolhimento que me dedicastes e a quantos me acompanham nesta peregrinação apostólica. Saúdo em particular o Abade Dom Pietro Vittorelli, que se fez intérprete dos vossos comuns sentimentos. Faço a minha saudação extensiva aos Abades, às Abadessas e às comunidades beneditinas aqui presentes.

Hoje a liturgia convida-nos a contemplar o mistério da Ascensão do Senhor. Na breve leitura, tirada da Primeira Carta de Pedro, fomos exortados a fixar o olhar no nosso Redentor, que morreu "de uma vez para sempre pelos pecados" a fim de nos reconduzir a Deus, à cuja direita se encontra "depois de ter subido ao céu e ter obtido a soberania sobre os anjos, os Principados e os Poderes" (cf.
1P 3,18 1P 3,22). "Elevado ao alto" e tornado invisível aos olhos dos seus discípulos, contudo Jesus não os abandonou: de facto, "tendo morrido no corpo, mas não no espírito" (1P 3,18), Ele está agora presente de modo novo, interior nos crentes, e n'Ele a salvação é oferecida a cada ser humano sem diferença de povo, língua nem cultura. A Primeira Carta de Pedro contém referências claras aos acontecimentos cristológicos fundamentais da fé cristã. A preocupação do Apóstolo é a de frisar o alcance universal da salvação em Cristo. Encontramos uma ideia análoga em São Paulo, do qual estamos a celebrar o bimilénio do nascimento, que escreveu à comunidade de Corinto: "Ele (Cristo) morreu por todos a fim de que aqueles que vivem não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que morreu e ressuscitou por eles" (2Co 5,15).

Não mais viver para si mesmos, mas para Cristo: eis o que dá sentido pleno à vida de quem se deixa conquistar por Ele. Manifesta-o claramente a vicissitude humana e espiritual de São Bento, que, tendo deixado tudo, se pôs no fiel seguimento de Jesus Cristo. Encarnando o Evangelho na própria existência, tornou-se iniciador de um vasto movimento de renascimento espiritual e cultural no Ocidente. Gostaria de fazer aqui menção a um acontecimento extraordinário da sua vida, referido pelo biógrafo São Gregório Magno e que vós certamente conheceis bem. Poder-se-ia quase dizer que também o santo Patriarca foi "elevado ao alto" numa experiência mística indescritível. Na noite de 29 de Outubro de 540 – lê-se na biografia – enquanto, estando à janela, "com os olhar fixo nalgumas estrelas absorvia-se na contemplação divina, o santo sentia que o coração se lhe inflamava... Para ele o firmamento estrelado era como a cortina bordada que revelava o Santo dos Santos. A um certo ponto a sua alma sentia-se transportada para a outra parte do véu, para contemplar manifestamente o rosto d'Aquele que habita numa luz inacessível" (cf. A. I. Schuster, Storia di san Benedetto e dei suoi tempi, Ed. Abbazia di Viboldone, Milão, 1965, p. 11 e ss.). Sem dúvida, analogamente a quanto aconteceu com Paulo depois do seu arrebatamento ao céu, também para São Bento, precisamente depois desta extraordinária experiência espiritual, teve que iniciar uma vida nova. De facto, se a visão foi passageira, os efeitos permaneceram, a sua própria fisionomia – referem os biógrafos – foi modificada, o seu aspecto permaneceu sempre sereno e de aspecto sempre angélico e, mesmo vivendo na terra, compreendia-se que com o coração já estava no Paraíso.

São Bento recebeu este dom divino certamente não para satisfazer a sua curiosidade intelectual, mas antes porque o carisma do qual Deus o tinha dotado tivesse a capacidade de reproduzir no mosteiro a própria vida do céu e restabelecer nele a harmonia da criação mediante a contemplação e o trabalho. Portanto, justamente, a Igreja o venera como "eminente mestre de vida monástica" e "doutor de sabedoria espiritual no amor à oração e ao trabalho"; "guia brilhante de povos à luzdo Evangelho" que "elevado ao céu por um caminho luminoso" ensina aos homens de todos os tempos a procurar Deus e as riquezas eternas por Ele preparadas (cf. Prefácio do Santo no suplemento monástico no MR, 1980, 153).

Sim, Bento foi exemplo luminoso de santidade e indicou aos monges Cristo como único grande ideal; foi mestre de civilização que, propondo uma equilibrada e adequada visão das exigências divinas e das finalidades últimas do homem, teve sempre muito presentes também as necessidades e as razões do coração, para ensinar e suscitar uma fraternidade autêntica e constante, para que no conjunto dos relacionamentos sociais não se perdesse de vista uma unidade de espírito capaz de construir e alimentar sempre a paz. Não ocasionalmente é a palavra Pax que recebe os peregrinos e os visitadores nas portas desta Abadia, reconstruída depois da imane tragédia do segundo conflito mundial; ela eleva-se como silenciosa admoestação a rejeitar qualquer forma de violência para construir a paz: nas famílias, nas comunidades, entre os povos e em toda a humanidade. São Bento convida cada pessoa que sobe a este Monte a procurar a paz e a segui-la: "inquire pacem et sequere eam (Ps 33,14-15)" (Regra, Prefácio, RB 1,17).

Na sua escola os mosteiros tornaram-se, ao longo dos séculos, fervorosos centros de diálogo, de encontro e de benéfica fusão entre povos diversos, unificados pela cultura evangélica da paz. Os monges souberam ensinar com a palavra e com o exemplo a arte da paz actuando de modo concreto os três "vínculos" que Bento indica como necessários para conservar a unidade do Espírito entre os homens: a Cruz, que é a própria lei de Cristo; o livro, isto é, a cultura; e o arado, que indica o trabalho, o senhorio sobre a matéria e sobre o tempo. Graças à actividade dos mosteiros, desempenhada no tríplice compromisso quotidiano da oração, do estudo e do trabalho, povos inteiros do continente europeu conheceram um autêntico resgate e um benéfico desenvolvimento moral, espiritual e cultural, educando-se no sentido da continuidade com o passado, na acção concreta pelo bem comum, na abertura a Deus e à dimensão transcendente. Rezemos para que a Europa saiba sempre valorizar este património de princípios e de ideais cristãos que constitui uma imensa riqueza cultural e espiritual.

Porém, isto só é possível se acolhermos o constante ensinamento de São Bento, ou seja, o "quaerere Deum", procurar Deus, como compromisso fundamental do homem. O ser humano não se realiza plenamente a si mesmo, não pode ser deveras feliz sem Deus. Compete sobretudo a vós, queridos monges, ser exemplos viventes desta interior e profunda relação com Ele, realizando sem sujeições o programa que o vosso Fundador sintetizou no "nihil amori Christi praeponere", "nada antepor ao amor de Cristo" (Regra RB 4,21). Consiste nisto a santidade, proposta válida para cada cristão, e mais do que nunca na nossa época na qual se sente a necessidade de ancorar a vida e a história em firmes referências espirituais. Por isso, queridos irmãos e irmãs, é actual como nunca a vossa vocação e é indispensável a vossa missão de monges.

Deste lugar, onde repousam os seus despojos mortais, o santo Padroeiro da Europa continua a convidar todos a prosseguir a sua obra de evangelização e de promoção humana. Encoraja em primeiro lugar a vós, queridos monges, a permanecer fiéis ao espírito das origens e a ser intérpretes autênticos do seu programa de renascimento espiritual e social. Que o Senhor vos conceda este dom, por intercessão do vosso Santo Fundador, da irmã Santa Escolástica e dos Santos e Santas da Ordem. E a celeste Mãe do Senhor, que hoje invocamos como "Ajuda dos cristãos", vele sobre vós e proteja esta Abadia e todos os vossos mosteiros, assim como a comunidade diocesana que vive nos arredores de Montecassino. Amém!






Domingo, 31 de Maio de 2009: SOLENIDADE DE PENTECOSTES

31509

Basílica de São Pedro





Cada vez que celebramos a Eucaristia, vivemos na fé o mistério que se realiza no altar, ou seja, participamos no supremo gesto de amor que Cristo realizou com a sua morte e ressurreição. O único e idêntico centro da liturgia e da vida cristã — o mistério pascal — adquire então, nas diversas solenidades e festas, "formas" específicas, com ulteriores significados e com particulares dons da graça. Entre todas as solenidades, o Pentecostes distingue-se por importância, porque nela se verifica aquilo que o próprio Jesus anunciara como a finalidade de toda a sua missão na terra. Com efeito, enquanto subia para Jerusalém, declarara aos discípulos: "Vim lançar fogo sobre a terra; e que quero Eu, senão que ele já tenha sido ateado?" (
Lc 12,49). Estas palavras encontram a sua mais evidente realização cinquenta dias depois da ressurreição, no Pentecostes, antiga festa judaica que na Igreja se tornou a festividade por excelência do Espírito Santo: "Viram, então, aparecer umas línguas de fogo... e todos ficaram cheios de Espírito Santo" (Ac 2,3-4). O verdadeiro fogo, o Espírito Santo, foi trazido sobre a terra por Cristo. Ele não o arrebatou dos deuses, como fez Prometeu segundo o mito grego, mas fez-se mediador do "dom de Deus", obtendo-o para nós com o maior gesto de amor da história: a sua morte na cruz.

Deus quer continuar a doar este "fogo" a cada geração humana e, naturalmente, é livre de o fazer como e quando o quer. Ele é espírito, e o espírito "sopra onde quer" (cf. Jn 3,8). Porém, existe um "caminho normal" que o próprio Deus escolheu para "lançar fogo sobre a terra": este caminho é Jesus, o seu Filho Unigénito encarnado, morto e ressuscitado. Por sua vez, Jesus Cristo constituiu a Igreja como o seu Corpo místico, para que prolongue a sua missão na história. "Recebei o Espírito Santo" — disse o Senhor aos Apóstolos, na tarde da ressurreição, acompanhando estas palavras com um gesto compreensivo: "soprou" sobre eles (cf. Jn 20,22). Assim, manifestou que lhes transmitia o seu Espírito, o Espírito do Pai e do Filho. Agora, caros irmãos e irmãs, na hodierna solenidade a Escritura diz-nos mais uma vez como deve ser a comunidade, como devemos ser nós para receber o dom do Espírito Santo. Na narração, que descreve o acontecimento do Pentecostes, o Autor sagrado recorda que os discípulos "se encontravam todos reunidos no mesmo lugar". Este "lugar" é o Cenáculo, a "sala no andar de cima" onde Jesus realizara a última Ceia com os seus Apóstolos, onde lhes aparecera ressuscitado; aquela sala que se tinha tornado, por assim dizer, a "sede" da Igreja nascente (cf. Ac 1,13). Todavia, mais do que insistir sobre o lugar físico, os Actos dos Apóstolos tencionam acentuar a atitude interior dos discípulos: "Todos, unidos pelo mesmo sentimento, se entregavam assiduamente à oração" (Ac 1,14). Por conseguinte, a concórdia dos discípulos é a condição para que venha o Espírito Santo; e a condição prévia da concórdia é a oração.

Queridos irmãos e irmãs, isto é válido também para a Igreja de hoje, é válido para nós que estamos aqui congregados. Se quisermos que o Pentecostes não se reduza a um simples rito ou a uma comemoração até muito sugestiva, mas seja um acontecimento actual de salvação, temos que nos predispor em expectativa religiosa do dom de Deus, mediante a escuta humilde e silenciosa da sua Palavra. A fim de que o Pentecostes se renove no nosso tempo, talvez seja necessário — sem nada tirar à liberdade de Deus — que a Igreja esteja menos "angustiada" com as actividades e mais dedicada à oração. É quanto nos ensina a Mãe da Igreja, Maria Santíssima, Esposa do Espírito Santo. Este ano o Pentecostes é celebrado precisamente no último dia de Maio, em que habitualmente se comemora a festa da Visitação. Também ela foi uma espécie de pequeno "pentecostes", que fez jorrar a alegria e o louvor dos corações de Isabel e de Maria, uma estéril e a outra virgem, e ambas se tornaram mães graças à extraordinária intervenção divina (cf. Lc 1,41-45). A música e o canto, que acompanham esta nossa liturgia, ajudam-nos também eles a sermos concordes na oração, e por isso exprimo o profundo reconhecimento ao Coro da Catedral e à Kammerorchester de Köln. Com efeito, para esta liturgia, no bicentenário da morte de Joseph Haydn, foi escolhida muito oportunamente a sua Harmoniemesse, a última "Missa" composta pelo grande músico, uma sublime sinfonia para a glória de Deus. A todos vós que viestes para esta circunstância, dirijo a minha saudação mais cordial.

Para indicar o Espírito Santo, na narração do Pentecostes os Actos dos Apóstolos recorrem a duas imagens principais: a imagem da tempestade e do fogo. Claramente, São Lucas tem em mente a teofania do Sinai, descrita nos livros do Êxodo (cf. Ex 19,16-19) e do Deuteronómio (cf. Dt 4,10-12 Dt 4,36). No mundo antigo, a tempestade era vista como um sinal do poder divino, em cuja presença o homem se sentia subjugado e terrorizado, mas gostaria de sublinhar também mais um aspecto: a tempestade é descrita como "vento impetuoso", e isto faz pensar no ar, que distingue o nosso planeta dos outros astros e nos permite viver nele. O que o ar é para a vida biológica, o Espírito Santo é para a vida espiritual; e dado que existe uma poluição atmosférica que envenena o ambiente e os seres vivos, assim há também uma poluição do coração e do espírito, que mortifica e envenena a existência espiritual. Do mesmo modo como não podemos habituar-nos aos venenos do ar — e por isso o compromisso ecológico representa hoje em dia uma prioridade — da mesma forma deveríamos agir com relação àquilo que corrompe o espírito. No entanto, parece que a muitos produtos que poluem a mente e o coração, e que circulam nas nossas sociedades por exemplo, as imagens que espectacularizam o prazer, a violência e o desprezo pelo homem e pela mulher a isto parece que nos habituamos sem dificuldades. Também isto é liberdade, diz-se, sem reconhecer que tudo aquilo que polui, intoxica a alma principalmente das novas gerações e acaba por condicionar a sua própria liberdade. A metáfora do vento impetuoso do Pentecostes faz pensar no modo como, ao contrário, é precioso respirar o ar puro, quer com os pulmões, o ar físico, quer com o coração, o ar espiritual, o ar salubre do espírito que é a caridade!

A outra imagem do Espírito Santo que encontramos nos Actos dos Apóstolos é o fogo. No início mencionei o confronto entre Jesus e a figura mitológica de Prometeu, que evoca um aspecto característico do homem moderno. Apropriando-se das energias do cosmos — o "fogo" — hoje o ser humano parece afirmar-se como deus e desejar transformar o mundo excluindo, pondo de lado ou até rejeitando o Criador do universo. O homem já não quer ser imagem de Deus, mas de si mesmo; declara-se autónomo, livre e adulto. Evidentemente, tal atitude revela uma relação não autêntica com Deus, consequência de uma imagem falsa que se constrói dele, como o filho pródigo da parábola evangélica que pensa em realizar-se a si mesmo, afastando-se da casa do pai. Nas mãos de um homem assim, o "fogo" e as suas enormes potencialidades tornam-se perigosos: podem voltar-se contra a vida e contra a própria humanidade, como demonstra a história. Como perene admoestação permanecem as tragédias de Hiroxima e Nagasáqui, onde a energia atómica, utilizada para finalidades bélicas, semeou morte em proporções inauditas.

Na verdade, poder-se-iam encontrar muitos exemplos, menos graves e no entanto igualmente sintomáticos, na realidade de todos os dias. A Sagrada Escritura revela-nos que a energia capaz de mover o mundo não é uma força anónima e cega, mas a acção do "espírito de Deus que se movia sobre a superfície das águas" (Gn 1,2) no início da criação. E Jesus Cristo "trouxe à terra" não a força vital, que já habitava nela, mas o Espírito Santo, ou seja, o amor de Deus que "renova a face da terra", purificando-a do mal e libertando-a do domínio da morte (cf. Ps 103,29-30 [104], 29-30). Este "fogo" puro, essencial e pessoal, o fogo do amor, desceu sobre os Apóstolos, reunidos em oração com Maria no Cenáculo, para fazer da Igreja o prolongamento da obra renovadora de Cristo.

Finalmente, ainda se tira um último pensamento da narração dos Actos dos Apóstolos: o Espírito Santo vence o medo. Sabemos como os discípulos se tinham refugiado no Cenáculo depois do aprisionamento do seu Mestre e aí permaneceram segregados com o temor de padecer a mesma sorte. Depois da ressurreição de Jesus, este seu medo não desapareceu repentinamente. Mas eis que no Pentecostes, quando o Espírito Santo pairou sobre eles, os homens saíram sem temor e começaram a anunciar a todos a boa notícia de Cristo crucificado e ressuscitado. Não tinham medo algum, porque se sentiam nas mãos do mais forte. Sim, queridos irmãos e irmãs, onde entra, o Espírito de Deus afasta o medo; faz-nos conhecer e sentir que estamos nas mãos de uma Omnipotência de amor: independentemente do que acontece, o seu amor infinito não nos abandona. Demonstram-no o testemunho dos mártires, a coragem dos confessores da fé, o impulso intrépido dos missionários, a sinceridade dos pregadores e o exemplo dos missionários, alguns dos quais são inclusive adolescentes e crianças. Demonstra-o a própria existência da Igreja que, não obstante os limites e as culpas dos homens, continua a atravessar o oceano da história, impelida pelo sopro do Espírito e animada pelo seu fogo purificador. Com esta fé e esta esperança jubilosa repitamos no dia de hoje, por intercessão de Maria: "Enviai o vosso Espírito, Senhor, para renovar a face da terra!".




Bento XVI Homilias 44509