Bento XVI Homilias 1119


Domingo, 25 de Outubro de 2009: SANTA MISSA PARA A CONCLUSÃO DA II ASSEMBLEIA ESPECIAL PARA A ÁFRICA DO SÍNODO

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Basílica Vaticana





Veneráveis Irmãos!
Queridos irmãos e irmãs!

Eis uma mensagem de esperança para a África: nós acabámos de ouvi-la da Palavra de Deus. É a mensagem que o Senhor da história não se cansa de renovar à humanidade oprimida e dominada em todas as épocas e em toda a terra, desde quando revelou a Moisés a sua vontade sobre os israelitas escravos no Egipto: "Eu vi a aflição do meu povo... e ouvi os seus clamores... conheço os seus sofrimentos. E desci para o libertar... e para o fazer sair do Egipto para uma terra fértil e espaçosa, uma terra que mana leite e mel" (
Ex 3,7-8). Qual é essa terra? Não é talvez o Reino da reconciliação, da justiça e da paz, ao qual toda a humanidade é chamada? O desígnio de Deus não muda. É o mesmo que foi profetizado por Jeremias, nos magníficos oráculos denominados "Livro da consolação", do qual foi tirada hoje a primeira leitura. É um anúncio de esperança para o povo de Israel, subjugado pela invasão do exército de Nabucodonosor, pela devastação de Jerusalém e do Templo e pela deportação para a Babilónia. Uma mensagem de alegria para o "resto" dos filhos de Jacob, que anuncia um futuro para eles, porque o Senhor os conduzirá para a sua terra, através de um caminho recto e acessível. As pessoas necessitadas de ajuda, como o cego e o coxo, a mulher grávida e a parteira, experimentarão a força e a ternura do Senhor: Ele é um Pai para Israel, pronto para cuidar dele como do primogénito (cf. Jr 31,7-9).

O desígnio de Deus não muda. Através dos séculos e das agitações da história, Ele dirige o seu olhar sempre para a mesma meta: o Reino da liberdade e da paz para todos. E isso implica a sua predilecção por aqueles que são privados de liberdade e paz, por aqueles que são violados na sua dignidade de pessoas humanas. Pensemos em particular nos irmãos e nas irmãs que em África sofrem por causa da pobreza, das doenças, das injustiças, das guerras e violências e das migrações forçadas. Estes filhos predilectos do Pai celeste são como o cego do Evangelho, Bartimeu, que "sentava à beira do caminho para mendigar" (Mc 10,46), às portas de Jericó. Precisamente por aquela estrada passa Jesus de Nazaré. É a estrada que conduz a Jerusalém, onde se consumará a Páscoa, a sua Páscoa sacrifical, ao encontro da qual o Messias vai por nós. É a estrada do seu êxodo, que é também o nosso: o único caminho que conduz à terra da reconciliação, da justiça e da paz. Naquela estrada o Senhor encontra Bartimeu, que perdeu a vista. Os seus caminhos cruzam-se, tornam-se um só. "Jesus, filho de David, tem compaixão de mim!" grita o cego com confiança. Responde Jesus: "Chamai-o!", e acrescenta: "Que queres que te faça?". Deus é luz e criador da luz. O homem é filho da luz, criado para ver a luz, mas perdeu a vista, e é obrigado a mendigar. Ao seu lado passa o Senhor, que se fez mendicante por nós: sedento da nossa fé e do nosso amor. "Que queres que te faça?". Deus sabe, mas pergunta; quer que seja o homem a falar. Quer que o homem fique em pé, reencontre a coragem para pedir o que lhe cabe pela sua dignidade. O Pai quer ouvir da voz do filho a livre vontade de ver novamente a luz, aquela luz para a qual foi criado. "Rabboni, que eu veja novamente"! E Jesus disse-lhe: "Vai, a tua fé te salvou". E logo recuperou a vista e seguiu Jesus na viagem" (Mc 10,51-52).

Queridos Irmãos, agradeçamos porque este "misterioso encontro entre a nossa pobreza e a grandeza de Deus" se realizou também na Assembleia sinodal para a África, que hoje se encerra. Deus renovou o seu convite: "Coragem! Levanta-te..." (Mc 10,49). Também a Igreja que está em África, por meio dos seus Pastores, provenientes de todos os países do Continente, de Madagáscar e das outras ilhas, acolheu a mensagem de esperança e de luz para seguir o caminho que conduz ao Reino de Deus. "Vai, a tua fé te salvou" (Mc 10,52). Sim, a fé em Jesus Cristo – quando é bem compreendida e praticada – guia os homens e os povos à liberdade na verdade, ou para usar as três palavras do tema sinodal, à reconciliação, à justiça e à paz. Bartimeu curado, ao seguir Jesus ao longo da estrada, representa a humanidade que, iluminada pela fé, se coloca a caminho rumo à terra prometida. Bartimeu, por sua vez, torna-se testemunha da luz; descreve e demonstra pessoalmente que foi curado, renovado, regenerado. Essa é a Igreja no mundo: uma comunidade de pessoas reconciliadas, agentes de justiça e de paz, "sal e luz" no meio da sociedade dos homens e das nações. Por isso, o Sínodo reafirmou com força – manifestando-o – que a Igreja é Família de Deus, na qual não podem existir divisões de género étnico, linguístico ou cultural. Testemunhos comovedores demonstraram-nos que até nos momentos mais sombrios da história humana, o Espírito Santo age e transforma os corações das vítimas e dos perseguidores, para que se identifiquem como irmãos. A Igreja reconciliada é um poderoso fermento de reconciliação em cada país e em todo o Continente africano.

A segunda leitura oferece-nos uma nova perspectiva: a Igreja, comunidade que segue Cristo no caminho do amor, tem uma forma sacerdotal. A categoria do sacerdócio, como chave interpretativa do mistério de Cristo, e consequentemente, da Igreja, foi introduzida no Novo Testamento pelo Autor da Carta aos Hebreus. A sua intuição baseia-se no Salmo 110, citado no trecho de hoje, quando o Senhor Deus, com solene juramento, assegura ao Messias: "Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec" (Ps 110,4). Esta referência evoca outra, extraída do Salmo 2, no qual o Messias anuncia o decreto do Senhor, que dele diz : "Tu és o meu filho, Eu hoje te gerei" (Ps 2,7). Esses textos descrevem a atribuição a Jesus Cristo do carácter sacerdotal não em sentido genérico, mas "segundo a ordem de Melquisedec", ou seja, o sacerdócio sumo e eterno, de origem divina e não humana. Se "todo o sumo sacerdote é escolhido entre os homens e constituído a favor dos homens como mediador nas coisas que dizem respeito a Deus" (He 5,1), só Ele, Cristo, o Filho de Deus, possui um sacerdócio que se identifica com a sua própria Pessoa, um sacerdócio único e transcendente, do qual depende a salvação universal. Cristo transmitiu o seu sacerdócio à Igreja mediante o Espírito Santo; portanto, a Igreja tem em si mesma, em cada um dos seus membros, na força do Baptismo, um carácter sacerdotal. Contudo – eis um aspecto decisivo – o sacerdócio de Jesus Cristo já não é primariamente ritual, mas existencial. A dimensão do rito não é abolida, mas, como se vê claramente na instituição da Eucaristia, assume o significado do Mistério pascal, que cumpre e supera antigos sacrifícios. Assim, nascem simultaneamente um novo sacrifício, um novo sacerdócio e também um novo templo, e os três coincidem com o Mistério de Jesus Cristo. Unida a Ele mediante os Sacramentos, a Igreja prolonga a sua acção salvífica, permitindo aos homens que sejam curados pela fé, como o cego Bartimeu. Assim, a Comunidade eclesial, ao seguir os passos do seu Mestre e Senhor, é chamada a percorrer decididamente o caminho do serviço e a partilhar plenamente a condição dos homens e das mulheres do seu tempo, para testemunhar a todos o amor de Deus, e assim, semear esperança.

Queridos amigos, a Igreja transmite esta mensagem de salvação, conjugando sempre a evangelização e a promoção humana. Tomemos como exemplo a histórica Encíclica Populorum progressio: o que o Servo de Deus Paulo VI elaborou em termos de reflexão, os missionários realizaram e continuam a realizar concretamente, promovendo um desenvolvimento respeitador das culturas locais e do meio ambiente, segundo uma lógica que agora, depois de mais de 40 anos, parece a única capaz de fazer com que o povo africano saia da situação de escravidão, fome e doenças. Isto significa transmitir o anúncio da esperança segundo uma "forma sacerdotal", ou seja, vivendo em primeira pessoa o Evangelho, procurando traduzi-lo em projectos e realizações coerentes com o princípio dinâmico fundamental, que é o amor. Nestas três semanas, a segunda Assembleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos confirmou o que o meu venerado predecessor João Paulo II já tinha focalizado bem, e que também eu quis aprofundar na recente Encíclica Caritas in veritate: ou seja, é preciso renovar o modelo de desenvolvimento global, de modo que seja capaz de "incluir todos os povos e não apenas aqueles adequadamente habilitados" (n. ). O que a doutrina social da Igreja sempre afirmou a partir da sua visão do homem e da sociedade, hoje é requerido também pela globalização (cf. ibid. ) Ela – é preciso recordar – não deve ser entendida de maneira fatalista, como se as suas dinâmicas fossem produzidas por forças impessoais anónimas e independentes da vontade humana. A globalização é uma realidade humana e como tal é modificável segundo um ou outro delineamento cultural. A Igreja trabalha com a sua concepção personalista e comunitária, para orientar o processo em termos de relacionamento, fraternidade e partilha (cf. ibid., n. ).

"Coragem, levanta-te!...". Assim se dirige hoje o Senhor da vida e da esperança à Igreja e às populações africanas, no final destas semanas de reflexão sinodal. Levanta-te, Igreja em África, família de Deus, porque te chama o Pai celeste que os teus antepassados evocavam como Criador, antes de conhecer a sua proximidade misericordiosa, revelada no seu Filho unigénito, Jesus Cristo. Empreende o caminho de uma nova evangelização com a coragem que provém do Espírito Santo. A urgente acção evangelizadora, da qual muito se falou nestes dias, inclui também um apelo premente à reconciliação, condição indispensável para instaurar na África relações de justiça entre os homens e para construir uma paz equilibrada e duradoura no respeito por cada indivíduo e cada povo; uma paz que tem necessidade e se abre à contribuição de todas as pessoas de boa vontade, além das respectivas pertenças religiosas, étnicas, linguísticas, culturais e sociais. Nesta missão empenhativa tu, Igreja peregrina na África do terceiro milénio, não estás sozinha. Toda a Igreja católica está próxima de ti com a oração e a solidariedade eficaz e, do Céu, acompanham-te os santos e santas africanos que, com a vida às vezes até ao martírio, testemunharam plena fidelidade a Cristo.

Coragem! Levanta-te, Continente africano, terra que acolheu o Salvador do mundo quando era Menino e teve que se refugiar com José e Maria no Egipto para salvar a vida da perseguição do rei Herodes. Recebe com entusiasmo renovado o anúncio do Evangelho para que a face de Cristo possa iluminar com o seu esplendor a multiplicidade das culturas e das linguagens das tuas populações. Enquanto oferece o pão da Palavra e da Eucaristia, a Igreja empenha-se também a trabalhar, com todos os meios disponíveis, a fim de que a nenhum africano falte o pão quotidiano. Por isso, juntamente com a obra de primeira urgência da evangelização, os cristãos são activos nas intervenções de promoção humana.

Queridos Padres sinodais, no final dessas minhas reflexões, desejo dirigir-vos a minha saudação mais cordial, agradecendo-vos a vossa edificante participação. Ao voltardes para casa, vós Pastores da Igreja em África, levai a minha bênção às vossas Comunidades. Transmiti a todos o apelo à reconciliação, à justiça e à paz que ressoou com frequência neste Sínodo. Ao concluir-se a Assembleia sinodal, não posso deixar de renovar o meu profundo reconhecimento ao Secretário-Geral do Sínodo dos Bispos e a todos os seus colaboradores. Exprimo um pensamento agradecido aos coros da comunidade nigeriana de Roma e do Colégio Etíope, que contribuíram para a animação desta liturgia. Enfim gostaria de agradecer a quantos acompanharam os trabalhos sinodais com a oração. A Virgem Maria recompense todos e cada um, e obtenha que a Igreja em África cresça em todas as partes daquele grande Continente, difundindo em todos os lugares o "sal" e a "luz" do Evangelho.






Quinta-feira, 5 de Novembro de 2009: SANTA MISSA EM SUFRÁGIO PELOS CARDEAIS E BISPOS FALECIDOS DURANTE O ANO

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Basílica Vaticana




Venerados Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
Amados irmãos e irmãs!

"Exultei quando me disseram: iremos para a casa do Senhor". As palavras do Salmo 122, que há pouco cantámos, convidam-nos a elevar o olhar do coração para a "casa do Senhor", para o Céu onde está misteriosamente reunida, na visão beatífica de Deus, a multidão de todos os Santos que a liturgia nos fez contemplar há alguns dias. À solenidade dos Santos seguiu-se a comemoração de todos os Fiéis defuntos. Estas duas celebrações, vividas num profundo clima de fé e de oração, ajudam-nos a compreender melhor o mistério da Igreja na sua totalidade e a aperceber-nos cada vez mais de que a vida deve ser uma contínua expectativa vigilante, uma peregrinação rumo à vida eterna, cumprimento último que dá sentido e plenitude ao nosso caminho terreno. Às portas da Jerusalém celeste já "estão os nossos pés" (
Ps 122,2).

A esta meta definitiva já chegaram os saudosos Cardeais: Avery Dulles, Pio Laghi, Stéphanos II Ghattas, Stephen Kim Sou-Hwan, Paul Joseph Ðenh Tung, Umberto Betti e Jean Margéot, e os numerosos Arcebispos e Bispos que nos deixaram durante este último ano. Recordemo-los com afecto e demos graças a Deus pelo bem que realizaram. Em seu sufrágio ofereçamos o Sacrifício eucarístico, recolhidos, como todos os anos, nesta Basílica de São Pedro. Pensemos neles na comunhão, real e misteriosa, que nos une a nós, peregrinos na terra, a quantos nos precederam no além, na certeza de que a morte não interrompe os vínculos de fraternidade espiritual selados pelos Sacramentos do Baptismo e da Ordem.

Nestes nossos venerados Irmãos apraz-nos reconhecer os servos dos quais fala a parábola evangélica há pouco proclamada: servos fiéis, que o dono, ao regressar das núpcias, encontrou acordados e preparados (cf. Lc 12,36-38); pastores que serviram a Igreja garantindo ao rebanho de Cristo os cuidados necessários; testemunhas do Evangelho que, na variedade dos dons e das tarefas, deram provas de vigilância laboriosa, de dedicação generosa à causa do Reino de Deus. Cada celebração eucarística, em que tantas vezes também eles participaram primeiro como fiéis e depois como sacerdotes, antecipa do modo mais eloquente quanto o Senhor prometeu: Ele mesmo, sumo e eterno Sacerdote, fará sentar os seus servos à mesa e passará para os servir (cf. Lc 12,37). Sobre a Mesa eucarística, banquete nupcial da Nova Aliança, Cristo, Cordeiro pascal faz-se nosso alimento, destrói a morte e doa-nos a sua vida, a vida sem fim. Irmãos e irmãs, também nós permaneçamos acordados e vigilantes: encontre-nos assim "o dono quando voltar das núpcias, chegando no meio da noite ou antes do alvorecer" (cf. Lc 12,38). Então, também nós, como servos do Evangelho, seremos Bem-Aventurados!

"As almas dos justos estão nas mãos de Deus" (Sg 3,1). A primeira leitura, tirada do livro da Sabedoria, fala de justos perseguidos, mortos injustamente. Mas se também a sua morte – ressaltava o Autor sagrado – se verifica em circunstâncias tão humilhantes e dolorosas que parecem uma desgraça, na realidade para quem tem fé não é assim: "eles estão na paz" e, mesmo se sofreram castigos aos olhos dos homens, "a sua esperança é cheia de imortalidade" (Sg 3,3-4). A separação dos próprios familiares é dolorosa, o acontecimento da morte é um enigma cheio de inquietude, mas para os crentes qualquer que seja o modo como acontece, está sempre iluminada pela "esperança da imortalidade". A fé ampara-nos nestes momentos humanamente cheios de tristeza e de angústia: "Aos teus olhos a vida não é tirada mas transformada – recorda a liturgia – e enquanto se destrói a habitação deste exílio terreno, é preparada uma habitação eterna no Céu" (Prefácio dos defuntos). Queridos irmãos e irmãs, sabemos bem e experimentamos no nosso caminho que não faltam dificuldades nem problemas nesta vida, que existem situações de sofrimento e de dor, momentos difíceis de compreender e de aceitar. Mas tudo adquire valor e significado se for considerado na perspectiva da eternidade. De facto, cada prova, acolhida com paciência perseverante e oferecida pelo Reino de Deus, vem em nosso benefício espiritual já aqui na terra e sobretudo na vida futura, no Céu. Estamos de passagem neste mundo, provados como o ouro, afirma a Sagrada Escritura (cf. Sg 3,6). Misteriosamente associados à paixão de Cristo, podemos fazer da nossa existência uma oferenda agradável ao Senhor, um sacrifício voluntário de amor.

No Salmo responsorial e depois na segunda leitura, tirada da primeira Carta de Pedro, encontramos como que um eco rs palavras do livro da Sabedoria. Enquanto o Salmo 122, retomando o cântico dos peregrinos que descem à Cidade santa e depois de um longo caminho chegam cheios de alegria às suas portas, projecta-nos no clima de festa do Paraíso, São Pedro exorta-nos, durante a peregrinação terrena, a manter viva no coração a perspectiva da esperança, de uma "esperança viva" (1P 1,3). Face ao inevitável dissolver-se do cenário deste mundo – escreve ele – é-nos dada a promessa de uma "herança que não se corrompe, não se mancha e não perece" (1P 1,4), porque Deus nos regenerou, na sua grande misericórdia, "mediante a ressurreição de Jesus Cristo dos mortos" (1P 1,3). Eis o motivo pelo qual devemos estar "repletos de alegria", mesmo se somos atormentados por vários sofrimentos. De facto, se perseverarmos no bem, a nossa fé, purificada de muitas provas, resplandecerá um dia em todo o seu esplendor e virá em nosso louvor, glória e honra, quando Jesus se manifestar na sua glória. Eis a razão da nossa esperança, que já nos faz exultar na terra "de alegria indizível e gloriosa", enquanto estamos a caminho rumo à meta da nossa fé: a salvação das almas (cf. 1P 1,6-8).

Queridos irmãos e irmãs, é com estes sentimentos que desejamos confiar à Divina Misericórdia estes Cardeais, Arcebispos e Bispos, com os quais trabalhámos juntos na vinha do Senhor. Libertados definitivamente do que permanece neles da humana fragilidade, o Pai celeste os acolha no seu Reino eterno e lhes conceda o prémio prometido aos servos bons e fiéis do Evangelho. Acompanhe-os, com a sua materna solicitude, a Virgem Santa, e lhes abra as portas do Paraíso. Que a Virgem ajude também a nós, ainda viandantes sobre a terra, a manter o olhar fixo na pátria que nos espera; nos encoraje a estar prontos "com as vestes cingidas aos nossos rins e as lâmpadas acesas" para acolher o Senhor "quando Ele chegar e bater à porta" (cf. Lc 12,35-36). Em qualquer hora e momento. Amém!








Domingo, 8 de Novembro de 2009: VISITA PASTORAL A BRESCIA E CONCESIO, CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA

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Praça Paulo VI - Bréscia



Amados irmãos e irmãs!

É grande a minha alegria por poder repartir convosco o pão da Palavra de Deus e da Eucaristia, aqui, no coração da Diocese de Bréscia, onde nasceu e teve a formação juvenil o Servo de Deus João Baptista Montini, Papa Paulo VI. Saúdo-vos a todos com afecto e agradeço-vos o vosso caloroso acolhimento! Agradeço em particular ao Bispo, D. Luciano Monari, as expressões que me dirigiu no início da celebração, e com ele saúdo os Cardeais, os Bispos, os sacerdotes e os diáconos, os religiosos e as religiosas, e todos os agentes pastorais. Agradeço ao Presidente da Câmara Municipal as suas palavras e o seu dom, e às demais Autoridades civis e militares. Dirijo um pensamento especial aos doentes que se encontram dentro da Catedral.

No centro da Liturgia da Palavra deste domingo – o 32º do Tempo Comum – encontramos a personagem da viúva pobre ou, mais precisamente, encontramos o gesto que ela realiza lançando no tesouro do Templo as últimas moedas que lhe restam. Um gesto que, graças ao olhar atento de Jesus, se tornou proverbial: "o óbolo da viúva", de facto, é sinónimo da generosidade de quem dá sem hesitações o pouco que possui. Mas ainda antes, gostaria de ressaltar a importância do ambiente no qual se desenvolve este episódio evangélico, ou seja, o Templo de Jerusalém, centro religioso do povo de Israel e coração de toda a sua vida. O Templo é o lugar do culto público e solene, mas também da peregrinação, dos ritos tradicionais, e das disputas rabínicas, como as que são mencionadas no Evangelho entre Jesus e os rabinos daquele tempo, nas quais, contudo, Jesus ensina com uma singular autoridade, a do Filho de Deus. Ele pronuncia juízos severos – como ouvimos – em relação aos escribas, devido à sua hipocrisia: de facto, eles, ao mesmo tempo que ostentavam grande religiosidade, exploravam as pessoas simples impondo obrigações que eles mesmos não cumpriam. Jesus demonstra-se afeiçoado ao Templo como casa de oração, mas precisamente por isto quer purificá-lo de usos impróprios, aliás, quer revelar o seu significado mais profundo, ligado ao cumprimento do seu próprio Mistério, o Mistério da Sua morte e ressurreição, na qual Ele mesmo se torna o Templo novo e definitivo, o lugar no qual se encontram Deus e o homem, o Criador e a Sua criatura.

O episódio do óbolo da viúva inscreve-se neste contexto e conduz-nos, através do próprio olhar de Jesus, a fixar a atenção sobre um pormenor fugaz mas decisivo: o gesto de uma viúva, muito pobre, que lança no tesouro do Templo duas moedas. Também a nós, como naquele dia aos discípulos, Jesus diz: Observai! Olhai bem o que faz aquela viúva, porque o seu acto contém um grande ensinamento; ele, de facto, exprime a característica fundamental de quantos são as "pedras vivas" deste novo Templo, isto é, o dom completo de si ao Senhor e ao próximo; a viúva do Evangelho, como também a do Antigo Testamento, dá tudo, dá-se a si mesma, e entrega-se nas mãos de Deus, pelos outros. É este o significado perene da oferta da viúva pobre, que Jesus exalta porque deu mais do que os ricos, os quais oferecem parte do que lhe é supérfluo, enquanto ela dá tudo o que tem para viver (cf.
Mc 12,44), e assim entregou-se a si mesma.

Queridos amigos! A partir deste ícone evangélico, desejo meditar brevemente sobre o mistério da Igreja, do Templo vivo de Deus, e assim prestar homenagem à memória do grande Papa Paulo VI, que consagrou toda a sua vida à Igreja. A Igreja é um organismo espiritual concreto que prolonga no espaço a oblação do Filho de Deus, um sacrifício aparentemente insignificante em relação às dimensões do mundo e da história, mas decisivo aos olhos de Deus. Como diz a Carta aos Hebreus – também no texto que acabamos de ouvir – a Deus bastou o sacrifício de Jesus, oferecido "de uma vez para sempre", para salvar o mundo inteiro (cf. He 9,26 He 9,28), porque naquela única oblação está condensado todo o Amor do Filho de Deus que se fez homem, como no gesto da viúva está concentrado todo o amor daquela mulher por Deus e pelos irmãos: nada falta e nada se poderia acrescentar. A Igreja, que incessantemente nasce da Eucaristia, da autodoação de Jesus, é a continuação deste dom, desta superabundância que se exprime na pobreza, do tudo que se oferece no fragmento. É o Corpo de Cristo que se doa totalmente, Corpo partido e compartilhado, em constante adesão à vontade da sua Cabeça. Sinto-me feliz por que estais a aprofundar a natureza eucarística da Igreja, guiados pela Carta pastoral do vosso Bispo.

É esta a Igreja que o Servo de Deus Paulo VI amou com um amor apaixonado e procurou, com todas as suas forças, fazer compreender e amar. Releiamos o seu Pensamento à morte, onde, na parte conclusiva, fala da Igreja. "Poderia dizer – escreve – que sempre a amei... e que por ela, e não por outras coisas, me parece ter vivido. Mas gostaria que a Igreja o soubesse". São os tons de um coração palpitante, que assim prossegue: "Finalmente, gostaria de a compreender toda, na sua história, no seu desígnio divino, no seu destino final, na sua complexa, total e unitária composição, na sua humana e imperfeita consistência, nas suas desventuras e nos seus sofrimentos, nas debilidades e nas misérias de muitos seus filhos, nos seus aspectos menos simpáticos, e no seu esforço perene de fidelidade, de amor, de perfeição e de caridade. Corpo místico de Cristo. Gostaria de a abraçar – continua o Papa – de a saudar, amar, em cada ser que a compõe, em cada Bispo e sacerdote que a assiste e guia, em cada alma que a vive e ilustra; abençoá-la". E as últimas palavras são para ela, como para a esposa de toda a vida: "E à Igreja, à qual tudo devo e que foi minha, que direi? As bênçãos de Deus estejam acima de ti; tem consciência da tua natureza e da tua missão; tem o sentido das necessidades verdadeiras e profundas da humanidade; e caminha pobre, isto é, livre, forte e amorosa rumo a Cristo".

O que se pode acrescentar a palavras tão nobres e intensas? Gostaria de ressaltar apenas a última visão da Igreja "pobre e livre", que a figura evangélica da viúva evoca. Deve ser assim a Comunidade eclesial, para conseguir falar à humanidade contemporânea. O encontro e o diálogo da Igreja com a humanidade deste nosso tempo eram uma preocupação especial de João Baptista Montini em todas as épocas da sua vida, desde os primeiros anos de sacerdócio até ao Pontificado. Ele dedicou todas as suas energias ao serviço de uma Igreja o mais possível conforme com o seu Senhor Jesus Cristo, de modo que, encontrando-a, o homem contemporâneo possa encontrar a Ele, Cristo, porque tem absoluta necessidade d'Ele. É este o anseio profundo do Concílio Vaticano II, ao qual corresponde a reflexão do Papa Paulo VI sobre a Igreja. Ele quis expor programaticamente alguns dos seus aspectos salientes na sua primeira encíclica, Ecclesiam suam, de 6 de Agosto de 1964, quando ainda não tinham sido publicadas as Constituições conciliares Lumen gentium e Gaudium et spes.

Com aquela primeira encíclica o Pontífice propunha-se explicar a todos a importância da Igreja para a salvação da humanidade e, ao mesmo tempo, a exigência de que se estabeleça uma relação de conhecimento mútuo e de amor entre a Comunidade eclesial e a sociedade (cf. Enchiridion Vaticanum, 2 p. 199,164). "Consciência", "renovação", "diálogo": são estas as três palavras escolhidas por Paulo VI para expressar os seus "pensamentos" dominantes – como ele define – no início do ministério petrino, e as três referem-se à Igreja. Antes de tudo, a exigência que ela aprofunde a consciência de si mesma: origem, natureza, missão, destino final; em segundo lugar, a sua necessidade de se renovar e purificar olhando para o modelo que é Cristo; por fim, o problema das suas relações com o mundo moderno (cf. ibid. , pp. 203-205,166-168). Queridos amigos – e dirijo-me de modo especial aos Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio – como não ver que a questão da Igreja, da sua necessidade no desígnio de salvação e da sua relação com o mundo, permanece também hoje absolutamente central? Aliás, que os progressos da secularização e da globalização a tornaram ainda mais radical, por um lado, no confronto com o esquecimento de Deus e, por outro, com as religiões não cristãs? A reflexão do Papa Montini sobre a Igreja é muito actual; e ainda mais precioso é o exemplo do seu amor por ela, inseparável do amor a Cristo. "O mistério da Igreja – lemos sempre na encíclica Ecclesiam suam – não é simples objecto de conhecimento teológico, deve ser um facto vivido, no qual ainda antes de uma sua clara noção a alma fiel pode ter quase uma experiência inata" (ibid., p. 229, n. 178). Isto pressupõe uma robusta vida interior, que é assim– prossegue o Papa – a "grande nascente da espiritualidade da Igreja, seu modo próprio de receber as irradiações do Espírito de Cristo, expressão radical e insubstituível da sua actividade religiosa e social, inviolável defesa e renascente energia no seu difícil contacto com o mundo profano" (ibid., p. 231, n. 179). Precisamente o cristão aberto, a Igreja aberta ao mundo precisam de uma robusta vida interior.

Caríssimos, que dom inestimável para a Igreja a lição do Servo de Deus Paulo VI! E como é entusiasmante colocar-se sempre de novo na sua escola! É uma lição que diz respeito a todos e a todos compromete, segundo os diversos dons e ministérios de que é rico o Povo de Deus, pela acção do Espírito Santo. Neste Ano Sacerdotal apraz-me ressaltar como ela interesse e diga respeito em particular aos sacerdotes, aos quais o Papa Montini destinou sempre um afecto e uma solicitude especiais. Na encíclica sobre o celibato sacerdotal ele escreveu: ""Conquistado por Jesus Cristo" (Ph 3,12) até ao abandono total de si mesmo a Ele, o sacerdote configura-se mais perfeitamente com Cristo também no amor com o qual o eterno Sacerdote amou a Igreja, seu corpo, oferecendo-se totalmente por ela... A virgindade consagrada dos ministros sagrados manifesta de facto o amor virginal de Cristo pela Igreja e a fecundidade virginal e sobrenatural desta união" (Sacerdotalis caelibatus, 26). Dedico estas palavras do grande Papa aos numerosos sacerdotes da Diocese de Bréscia, aqui bem representados, assim como aos jovens que se estão a formar no Seminário. E gostaria de recordar também as que Paulo VI dirigiu aos alunos do Seminário Lombardo a 7 de Dezembro de 1968, quando as dificuldades do pós-Concílio se somavam aos fermentos do mundo juvenil: "Tantos – disse – esperam do Papa gestos clamorosos, intervenções enérgicas e decisivas. O Papa considera que não deve seguir outra linha a não ser a da confiança em Jesus Cristo, ao qual interessa a sua Igreja mais do que a qualquer outro. Será Ele quem aplaca a tempestade... Não se trata de uma expectativa estéril ou inerte: mas de uma espera vigilante na oração. Esta é a condição que Jesus escolheu para nós, para que Ele possa agir em plenitude. Também o Papa precisa de ser ajudado com a oração" (Insegnamenti VI, [1968], 1189). Amados irmãos, os exemplos sacerdotais do Servo de Deus João Baptista Montini vos guiem sempre, e interceda por vós Santo Arcangelo Tadini, que há pouco venerei na breve paragem em Botticino.

Ao saudar e ao encorajar os sacerdotes, não posso esquecer, especialmente aqui em Bréscia, os fiéis leigos, que nesta terra demonstraram extraordinária vitalidade de fé e de obras, nos vários campos do apostolado associado e do compromisso social. Nos Insegnamenti de Paulo VI, queridos amigos brescianos, podeis encontrar indicações sempre preciosas para enfrentar os desafios do presente, sobretudo, como a crise económica, a imigração, a educação dos jovens. Ao mesmo tempo, o Papa Montini não perdia ocasião alguma para ressaltar a primazia da dimensão contemplativa, isto é, a primazia de Deus na experiência humana. E por isso não se cansava de promover a vida consagrada, na variedade dos seus aspectos. Ele amou intensamente a multiforme beleza da Igreja, reconhecendo nela o reflexo da beleza infinita de Deus, que transparece no rosto de Cristo.

Rezemos para que o esplendor da beleza divina resplandeça em cada uma das nossas comunidades e a Igreja seja sempre sinal luminoso de esperança para a humanidade do terceiro milénio. Obtenha-nos esta graça Maria, que Paulo VI quis proclamar, no final do Concílio Ecuménico Vaticano II, Mãe da Igreja. Amém!





Sábado, 28 de Novembro de 2009: CELEBRAÇÃO DAS VÉSPERAS DO PRIMEIRO DOMINGO DO ADVENTO

28119

Basílica Vaticana




Caros irmãos e irmãs

Com esta celebração vespertina, entramos no tempo litúrgico do Advento. Na leitura bíblica que há pouco ouvimos, tirada da Primeira Carta aos Tessalonicenses, o Apóstolo Paulo convida-nos a preparar a "vinda de nosso Senhor Jesus Cristo" (
1Th 5,23), conservando-nos irrepreensíveis com a graça de Deus. Paulo recorre precisamente à palavra "vinda", em latim, adventus, do qual deriva o termo Advento.

Reflictamos brevemente sobre o significado desta palavra, que pode traduzir-se com "presença", "chegada" e "vinda". Na linguagem do mundo antigo, era um termo técnico utilizado para indicar a chegada de um funcionário, a visita do rei ou do imperador a uma província. No entanto, podia indicar também a vinda da divindade, que sai do seu escondimento para se manifestar com poder, ou que é celebrada presente no culto. Os cristãos adoptaram a palavra "advento" para expressar a sua relação com Jesus Cristo: Jesus é o Rei, que entrou nesta pobre "província" denominada terra para visitar todos; na festa do seu advento faz participar quantos nele crêem, aqueles que acreditam na sua presença na assembleia litúrgica. Substancialmente, com a palavra adventus desejava-se dizer: Deus está aqui, não se retirou do mundo, não nos deixou sozinhos. Embora não O possamos ver nem tocar, como acontece com as realidades sensíveis, Ele está aqui e vem visitar-nos de múltiplos modos.

Portanto, o significado da expressão "advento" inclui também o de visitatio que, simples e propriamente, quer dizer "visita"; neste caso, trata-se de uma visita de Deus: Ele entra na minha vida e quer dirigir-se a mim. Na existência quotidiana, todos nós vivemos a experiência de ter pouco tempo para o Senhor e pouco tempo também para nós. Terminamos por ser absorvidos pelo "fazer". Não é porventura verdade que com frequência é precisamente a actividade que nos possui, a sociedade com os seus múltiplos interesses que monopoliza a nossa atenção? Não é talvez verdade que dedicamos muito tempo à diversão e a distracções de vários tipos? Às vezes, a realidade "arrebata-nos". O Advento, este tempo litúrgico forte que estamos a começar, convida-nos a reflectir silenciosamente para compreender uma presença. Trata-se de um convite a compreender que cada um dos acontecimentos do dia é um sinal que Deus nos faz, um vestígio da atenção que Ele tem por cada um de nós. Quantas vezes Deus nos faz sentir algo do seu amor! Manter, por assim dizer, um "diário interior" deste amor seria uma tarefa bonita e saudável para a nossa vida! O Advento convida-nos e estimula-nos a contemplar o Senhor que está presente. Não deveria porventura a certeza da sua presença ajudar-nos a ver o mundo com olhos diferentes? Não deveria acaso ajudar-nos a considerar toda a nossa existência como uma "visita", um modo como Ele pode vir ter connosco e estar ao nosso lado em cada situação?

Outro elemento fundamental do Advento é a espera, expectativa que é ao mesmo tempo esperança. O Advento leva-nos a compreender o sentido do tempo e da história como "kairós", como ocasião favorável para a nossa salvação. Jesus explicou esta realidade misteriosa mediante muitas parábolas: na narração dos servos convidados a esperar o retorno do dono; na parábola das virgens que esperam o esposo; ou naquelas da sementeira e da colheita. Na sua vida, o homem está constantemente à espera: quando é menino, deseja crescer; quando é adulto, tende para a realização e o sucesso; na idade avançada, aspira ao merecido descanso. Mas chega a hora em que ele descobre que esperou demasiado pouco se, para além da profissão ou da posição social, nada mais lhe resta para esperar. A esperança marca o caminho da humanidade, mas para os cristãos ela é animada por uma certeza: o Senhor está presente no fluxo da nossa vida, acompanha-nos, e um dia enxugará também as nossas lágrimas. Um dia, não distante, tudo encontrará o seu cumprimento no Reino de Deus, Reino de justiça e de paz.

No entanto, existem modos muito diferentes de esperar. Se o tempo não foi preenchido por um presente dotado de sentido, a espera corre o risco de se tornar insuportável; se se espera algo, mas neste momento não há nada, ou seja se o presente permanece vazio, cada instante que passa parece exageradamente longo, e a expectativa transforma-se num peso demasiado grave, porque o futuro permanece totalmente incerto. Ao contrário, quando o tempo é dotado de sentido, e em cada instante compreendemos algo de específico e de válido, então a alegria da espera torna o presente mais precioso.

Queridos irmãos e irmãs, vivamos intensamente o presente, em que já nos são concedidos os dons do Senhor, vivamo-lo projectados para o futuro, um porvir repleto de esperança. Deste modo, o Advento cristão torna-se ocasião para despertar em nós o autêntico sentido da espera, voltando ao coração da nossa fé que é o mistério de Cristo, o Messias esperado durante longos séculos e nascido na pobreza de Belém. Quando veio ao meio de nós, trouxe-nos e continua a oferecer-nos o dom do seu amor e da sua salvação. Presente entre nós, fala-nos de muitas maneiras: na Sagrada Escritura, no ano litúrgico, nos santos, nos acontecimentos da vida quotidiana e em toda a criação, que muda de aspecto se Ele se encontra por detrás dela, ou se a mesma está ofuscada pela neblina de uma origem incerta ou de um futuro inseguro. Por nossa vez, podemos dirigir-lhe a palavra, apresentar-lhe os sofrimentos que nos afligem, a impaciência e as interrogações que brotam do nosso coração. Estamos persuadidos de que nos ouve sempre! E se Jesus está presente, já não existe tempo algum sem sentido e vazio. Se Ele está presente, podemos continuar a esperar mesmo quando os outros já não conseguem garantir-nos qualquer apoio, até quando o presente se torna cansativo.

Queridos amigos, o Advento é o tempo da presença e da espera eterna. Precisamente por esta razão é, de modo particular, o tempo da alegria, de um júbilo interiorizado, que nenhum sofrimento pode anular. A alegria pelo facto de que Deus se fez Menino. Esta alegria, invisivelmente presente em nós, encoraja-nos a caminhar com confiança. Modelo e ajuda deste íntimo júbilo é a Virgem Maria, por meio da qual nos foi oferecido o Menino Jesus. Que Ela, discípula fiel do seu Filho, nos conceda a graça de viver este tempo litúrgico vigilantes e diligentes na esperança.

Amém!





Bento XVI Homilias 1119