Bento XVI Homilias 18410


Terça-feira, 20 de Abril de 2010: CAPELA PAPAL PARA AS EXÉQUIAS DO CARDEAL TOMÁŠ ŠPIDLÍK, S.J.

20410
Basílica Vaticana, Altar da Cátedra



Venerados Irmãos
Ilustres Senhores e Senhoras
Queridos irmãos e irmãs!

Entre as últimas palavras pronunciadas pelo saudoso cardeal Spidlík, encontram-se estas: "Procurei toda a vida o rosto de Jesus, e agora estou feliz e sereno porque estou prestes a vê-lo". Este pensamento maravilhoso – tão simples, quase infantil na sua expressão, mas tão profundo e verdadeiro – remete imediatamente para a oração de Jesus, que ressoou há pouco no Evangelho: "Pai, quero que aqueles que Me deste, onde Eu estiver, também eles estejam Comigo para que vejam a Minha glória, a glória que Tu me deste; porque Tu Me amas-Te antes da fundação do mundo" (
Jn 17,24). É belo e confortador meditar esta correspondência entre o desejo do homem, que aspira por ver o rosto do Senhor, e o desejo do próprio Jesus. Na realidade, a de Cristo é muito mais que uma aspiração: é uma vontade. Jesus diz ao Pai: "quero que aqueles que Me deste, onde Eu estiver, também eles estejam Comigo". E é precisamente aqui, nesta vontade, que encontramos a "rocha", o fundamento sólido para crer e esperar. De facto, a vontade de Jesus coincide com a de Deus Pai, e com a obra do Espírito Santo constitui para o homem uma espécie de "abraço" seguro, forte e meigo, que o conduz à vida eterna.

Que dom imenso ouvir esta vontade de Deus pelos seus lábios! Penso que os grandes homens de fé vivem imersos nesta graça, têm o dom de sentir com força especial esta verdade, e assim podem atravessar também as provas duras, como as atravessou padre Tomás Spidlík, sem perder a confiança, e aliás conservando um vivo senso de humor, que certamente é um sinal de inteligência mas também de liberdade interior. Sob este perfil, era evidente a semelhança entre o nosso saudoso cardeal e o Venerável João Paulo II: ambos tinham tendência para as piadas e para as brincadeiras, mesmo tendo vivido na juventude vicissitudes pessoais difíceis e em certos aspectos semelhantes. A Providência fê-los encontrar e colaborar para o bem da Igreja, sobretudo para que ela aprenda a respirar plenamente "com os seus dois pulmões", como gostava de dizer o Papa eslavo.

Esta liberdade e presença de espírito têm o seu fundamento objectivo na Ressurreição de Cristo. Apraz-me ressaltá-lo porque estamos no tempo litúrgico pascal e porque o sugerem a primeira e a segunda leitura bíblica desta celebração. Na sua primeira pregação, no dia de Pentecostes, São Pedro, cheio do Espírito Santo, anuncia o cumprimento em Jesus Cristo do Salmo 16: É maravilhoso ver como o Espírito Santo revele aos Apóstolos toda a beleza daquelas palavras na plena luz interior da Ressurreição: "Eu via, constantemente, o Senhor diante de mim, / por estar à minha direita, a fim de eu não vacilar. / Por isso é que o meu coração se alegra e a minha língua exulta, / e até a minha carne repousará na esperança" (Ac 2,25-26 cf. Ps 16,8-9). Esta oração encontra um cumprimento superabundante quando Cristo, o Santo de Deus, não é abandonado no inferno. Ele foi o primeiro a conhecer "os caminhos da vida" e ficou repleto de alegria com a presença do Pai (cf. Ac 2,27 Ps 16,11). A esperança e a alegria de Jesus Ressuscitado são também a esperança e a alegria dos seus amigos, graças à acção do Espírito Santo. O padre Spidlík demonstrava-o habitualmente com o seu modo de viver, e este seu testemunho tornava-se cada vez mais eloquente com o passar dos anos, porque, não obstante a idade avançada e os inevitáveis achaques, o seu espírito permanecia fresco e jovem. O que é isto senão amizade com o Senhor Ressuscitado?

Na segunda leitura, São Pedro bendiz a Deus que "na sua grande misericórdia nos regenerou dos mortos, mediante a ressurreição de Jesus Cristo, para uma esperança viva". E acrescenta: "Então rejubilareis, se bem que vos sejam ainda necessárias diversas provações" (1P 1,3 1P 1,6). Também aqui sobressai claramente como a esperança e a alegria sejam realidades teologais que promanam do mistério da Ressurreição de Cristo e do dom do seu Espírito. Poderíamos dizer que o Espírito Santo as tira do coração de Cristo Ressuscitado e as transforma no coração dos seus amigos.

Introduzi propositadamente a imagem do "coração", porque, como muitos de vós sabeis, o padre Spidlík escolheu-a para o lema do seu brasão cardinalício: "Ex toto corde", "com todo o coração". Esta expressão encontra-se no Livro do Deuteronómio, dentro do primeiro e fundamental mandamento da lei, quando Moisés diz ao povo: "Escuta, ó Israel! O Senhor, nosso Deus, é o único Senhor! Amarás ao Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças" (Dt 6,4-5). "Com todo o teu coração – ex toto corde" refere-se portanto ao modo com que Israel deve amar o seu Deus. Jesus confirma a primazia deste mandamento, ao qual associa o do amor ao próximo, afirmando que ele é "semelhante" ao primeiro e que de ambos dependem toda a lei e os profetas (cf. Mt 22,37-39). Escolhendo este lema, o nosso venerado Irmão colocava, por assim dizer, a sua vida dentro do mandamento do amor, inscrevia-a toda na primazia de Deus e da caridade.

Há outro aspecto, um ulterior significado da expressão "ex toto corde", que certamente o padre Spidlík tinha presente e pretendia manifestar com o seu lema. Sempre partindo da raiz bíblica, o símbolo do coração representa na espiritualidade oriental a sede da oração, do encontro entre o homem e Deus, mas também com os outros homens e com a criação. E aqui é preciso recordar que no brasão do cardeal Spidlík o coração, que sobressai no escudo, contém uma cruz em cujos braços se entrelaçam as palavras PHOS e ZOE, "luz" e "vida", que são nomes de Deus. Portanto, o homem que acolhe plenamente, ex toto corde, o amor de Deus, acolhe a luz e a vida, e torna-se por sua vez luz e vida na humanidade e no universo.

Mas quem é este homem? Quem é este "coração" do mundo, a não ser Jesus Cristo? É Ele a Luz e a Vida, porque n'Ele "habita corporalmente toda a plenitude da divindade" (Col 2,9). E aqui apraz-me recordar que o nosso defunto Irmão foi um membro da Companhia de Jesus, ou seja, um filho espiritual daquele Santo Inácio que põe no centro da fé e da espiritualidade a contemplação de Deus no mistério de Cristo. Neste símbolo do coração encontram-se Oriente e Ocidente, num sentido não devocionista mas profundamente cristológico, como ressaltaram outros teólogos jesuítas do século passado. E Cristo, figura central da Revelação, é também o princípio formal da arte cristã, um âmbito que teve no padre Spidlík um grande mestre, inspirador de ideias e projectos expressivos, que encontraram uma síntese importante na Capela Redemptoris Mater do Palácio Apostólico.

Gostaria de concluir voltando ao tema da Ressurreição, citando um texto muito amado pelo cardeal Spidlík, um trecho dos Hinos sobre a Ressurreição de Santo Efrém, o Sírio:

"Do alto Ele desceu como Senhor,
do ventre saiu como um servo,
a morte ajoelhou-se diante d'Ele no Sheol, e a Vida
adorou-o na sua ressurreição.
Bendita é a sua vitória!" (n. 1, 8).

A Virgem Mãe de Deus acompanhe a alma do nosso venerado Irmão no abraço da Santíssima Trindade, onde "com todo o coração" louvará eternamente o seu Amor infinito. Amém.





                                                                                  Maio de 2010

Domingo, 2 de Maio de 2010: VISITA PASTORAL A TURIM, CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA

20510
Praça São Carlos



Prezados irmãos e irmãs!

Estou feliz por me encontrar convosco neste dia de festa e por celebrar para vós esta solene Eucaristia. Saúdo cada um dos presentes, de modo particular o Pastor da vossa Arquidiocese, Cardeal Severino Poletto, a quem agradeço as calorosas expressões que me dirigiu em nome de todos. Saúdo também os Arcebispos e os Bispos presentes, os Sacerdotes, os Religiosos, as Religiosas e os representantes das Associações e dos Movimentos eclesiais. Dirijo um pensamento deferente ao Presidente da Câmara Municipal, Doutor Sérgio Chiamparino, grato pelo cortês discurso de saudação, ao representante do Governo e às Autoridades civis e militares, com um particular agradecimento a quantos ofereceram generosamente a sua colaboração para a realização desta minha Visita pastoral. Estendo o meu pensamento a quantos não puderam estar presentes, de modo especial aos doentes, às pessoas sozinhas e a quantos se encontram em dificuldade. Confio ao Senhor a cidade de Turim e todos os seus habitantes nesta celebração eucarística que, como todos os domingos, nos convida a participar de modo comunitário na dúplice mesa da Palavra de verdade e do Pão de vida eterna.

Estamos no tempo pascal, que é o tempo da glorificação de Jesus. O Evangelho que há pouco ouvimos recorda-nos que esta glorificação se realizou mediante a paixão. No mistério pascal, paixão e glorificação estão estreitamente ligadas entre si, formam uma unidade inseparável. Jesus afirma: "Agora foi glorificado o Filho do Homem, e Deus foi glorificado nele" (
Jn 13,31), e fá-lo quando Judas sai do Cenáculo para pôr em prática o plano da sua traição, que conduzirá à morte do Mestre: precisamente naquele momento tem início a glorificação de Jesus. O evangelista João fá-lo compreender claramente: com efeito, não diz que Jesus foi glorificado somente depois da sua paixão, por meio da ressurreição, mas mostra que a sua glorificação começou precisamente com a paixão. Nela, Jesus manifesta a sua glória, que é glória do amor, que se entrega totalmente a si mesmo. Ele amou o Pai, cumprindo a sua vontade até ao fim, com uma doação perfeita; amou a humanidade, dando a sua vida por nós. Assim, já na sua paixão Ele é glorificado, e Deus é glorificado nele. Mas a paixão – como expressão muito real e profunda do seu amor – é apenas um início. Por isso, Jesus afirma que a sua glorificação será também futura (cf. v. Jn 13,32). Depois o Senhor, no momento em que anuncia a sua partida deste mundo (cf. v. Jn 13,33), quase como testamento aos seus discípulos, para continuar de modo novo a sua presença no meio deles, dá-lhes um mandamento: "Um novo mandamento vos dou: que vois ameis uns aos outros; assim como Eu vos amei, vós também vos deveis amar uns aos outros" (v. Jn 13,34). Se nos amarmos uns aos outros, Jesus continuará a estar presente no meio de nós, a ser glorificado no mundo.

Jesus fala de um "novo mandamento". Mas qual é a sua novidade? Já no Antigo Testamento, Deus tinha dado o mandamento do amor; agora, porém, este mandamento tornou-se novo, enquanto Jesus lhe acrescenta um suplemento muito importante: "Assim como Eu vos amei, vós também vos deveis amar uns aos outros". O que é novo é precisamente este "amar como Jesus amou". Todo o nosso amor é precedido pelo seu amor e refere-se a este amor, insere-se neste amor, realiza-se precisamente por este amor. O Antigo Testamento não apresentava modelo algum de amor, mas formulava apenas o preceito de amar. Jesus, ao contrário, deu-se-nos como modelo e fonte de amor. Trata-se de um amor sem limites, universal, capaz de transformar também todas as circunstâncias negativas e todos os obstáculos em ocasiões para progredir no amor. E vemos nos santos desta Cidade a realização deste amor, sempre da fonte do amor de Jesus.

Nos séculos passados, a Igreja que está em Turim conheceu uma rica tradição de santidade e de serviço generoso aos irmãos – como recordou o Cardeal Arcebispo e o Senhor Presidente da Câmara Municipal – graças à obra de zelosos sacerdotes, religiosos e religiosas de vida activa e contemplativa e de fiéis leigos. Então, as palavras de Jesus adquirem uma ressonância particular para esta Igreja de Turim, uma Igreja generosa e activa, a começar pelos seus presbíteros. Dando-nos o novo mandamento, Jesus pede-nos que vivamos o seu próprio amor, do seu próprio amor, que é o sinal verdadeiramente credível, eloquente e eficaz para anunciar ao mundo a vinda do Reino de Deus. Obviamente, só com as nossas forças somos fracos e limitados. Existe sempre em nós uma resistência ao amor e na nossa existência há muitas dificuldades que provocam divisões, ressentimentos e rancores. Mas o Senhor prometeu-nos que estará presente na nossa vida, tornando-nos capazes deste amor generoso e total, que sabe superar todos os obstáculos, inclusive aqueles que estão nos nossos corações. Se estivermos unidos a Cristo, poderemos amar verdadeiramente deste modo. Amar os outros como Jesus nos amou só é possível com aquela força que nos é comunicada na relação com Ele, especialmente na Eucaristia, na qual se torna presente de maneira real o seu Sacrifício de amor que gera amor: é a verdadeira novidade no mundo e a força de uma glorificação permanente de Deus, que se glorifica na continuidade do amor de Jesus no nosso amor.

Então, gostaria de transmitir uma palavra de encorajamento, em particular aos Sacerdotes e aos Diáconos desta Igreja, que se dedicam com generosidade ao trabalho pastoral, como também aos Religiosos e às Religiosas. Às vezes, ser trabalhadores na vinha do Senhor pode ser cansativo, os compromissos multiplicam-se, as exigências são muitas e não faltam problemas: sabei haurir diariamente da relação de amor com Deus na oração, a força para transmitir o anúncio profético de salvação; voltai a centrar a vossa existência no essencial do Evangelho; cultivai uma dimensão real de comunhão e de fraternidade no interior do presbitério, das vossas comunidades e nos relacionamentos com o Povo de Deus; testemunhai no ministério o poder do amor que vem do Alto, vem do Senhor presente no meio de nós.

A primeira leitura que ouvimos apresenta-nos precisamente um modo particular de glorificação de Jesus: o apostolado e os seus frutos. No final da sua primeira viagem apostólica, Paulo e Barnabé voltam para as cidades já visitadas e reanimam os discípulos, exortando-os a permanecer firmes na fé porque, como eles dizem, "temos que sofrer muitas tribulações para entrar no Reino de Deus" (Ac 14,22). Caros irmãos e irmãs, a vida cristã não é fácil; sei que também em Turim não faltam dificuldades, problemas e preocupações: penso, de modo particular, naqueles que vivem concretamente a sua existência em condições de precariedade, por causa da falta de trabalho, da incerteza em relação ao futuro, do sofrimento físico e moral; penso nas famílias, nos jovens, nas pessoas idosas que muitas vezes vivem na solidão, nos marginalizados e nos imigrados. Sim, a vida leva a enfrentar muitas dificuldades, numerosos problemas, mas é precisamente a certeza que nos vem da fé, a certeza de que não estamos sozinhos, que Deus ama cada um sem distinção e está próximo de cada um com o seu amor, que torna possível enfrentar, viver e superar o cansaço dos problemas quotidianos. Foi o amor universal de Cristo ressuscitado que impeliu os Apóstolos a saírem de si mesmos, a difundirem a palavra de Deus, a prodigalizarem-se sem reservas pelo próximo, com coragem, alegria e serenidade. O Ressuscitado possui uma força de amor que ultrapassa todos os limites e não se detém diante de qualquer obstáculo. E a Comunidade cristã, especialmente nas realidades mais comprometidas sob o ponto de vista pastoral, deve ser instrumento concreto deste amor de Deus.

Exorto as famílias a viverem a dimensão cristã do amor nos simples gestos quotidianos, nos relacionamentos familiares, superando divisões e incompreensões, cultivando a fé que torna a comunhão ainda mais sólida. Também no rico e diversificado mundo da Universidade e da cultura, não venha a faltar o testemunho do amor de que fala o Evangelho hodierno, na capacidade da escuta atenta e do diálogo humilde na busca da Verdade, convictos de que é a própria Verdade que vem ao nosso encontro e nos conquista. Desejo encorajar também o esforço, muitas vezes difícil, daqueles que são chamados a administrar o Estado: a colaboração para perseguir o bem comum e tornar a Cidade cada vez mais humana e vivível é um sinal de que o pensamento cristão sobre o homem nunca é contrário à sua liberdade, mas a favor de uma maior plenitude, que só encontra a sua realização numa "civilização do amor". A todos, em particular aos jovens, quero dizer que nunca percam a esperança, aquela que vem de Cristo Ressuscitado, da vitória de Deus sobre o pecado, o ódio e a morte.

A segunda leitura hodierna mostra-nos precisamente o êxito final da Ressurreição de Jesus: é a nova Jerusalém, a cidade santa, que desce do céu, de Deus, pronta como uma esposa ataviada para o seu esposo (cf. Ap 21,2). Aquele que foi crucificado, que compartilhou o nosso sofrimento, como nos recorda também de maneira eloquente o santo Sudário, é aquele que ressuscitou e nos quer reunir todos no seu amor. Trata-se de uma esperança maravilhosa, "forte" e sólida porque, como diz o Apocalipse: "(Deus) enxugará as lágrimas dos seus olhos; não haverá mais morte, nem pranto, nem gritos, nem dor, porque as primeiras coisas passaram" (Ap 21,4). O santo Sudário, não comunica porventura esta mesma mensagem? Nele vemos, como que reflectidos, os nossos padecimentos nos sofrimentos de Cristo: "Passio Christi. Passio hominis". Precisamente por isso, ele é um sinal de esperança: Cristo enfrentou a cruz para pôr um limite ao mal; para nos fazer entrever, na sua Páscoa, a antecipação daquele momento em que também para nós, todas as lágrimas serão enxugadas e já não haverá morte, nem pranto, nem gritos, nem dor.

O trecho do Apocalipse termina com a afirmação: "Aquele que se sentava no trono disse: "Eis que Eu renovo todas as coisas"" (Ap 21,5). A primeira coisa absolutamente nova, realizada por Deus, foi a Ressurreição de Jesus, a sua glorificação celestial. Ela é o início de toda uma série de "coisas novas", em que também nós participamos. "Coisas novas" são um mundo repleto de alegria, em que não existem mais sofrimentos, nem abusos, em que já não há rancor nem ódio, mas somente o amor que vem de Deus e que transforma tudo.

Amada Igreja que está em Turim, vim ao meio de vós para vos confirmar na fé. Desejo exortar-vos, com força e com carinho, a permanecer firmes naquela fé que recebestes e que dá sentido à vida, que dá força de amar; a nunca perder a luz da esperança em Cristo Ressuscitado, que é capaz de transformar a realidade e renovar todas as coisas; a viver na cidade, nos bairros, nas comunidades e nas famílias, de maneira simples e concreta, o amor de Deus: "Assim como Eu vos amei, vós também vos deveis amar uns aos outros".





Segunda-feira, 3 de Maio de 2010: CAPELA PAPAL PARA AS EXÉQUIAS DO CARDEAL PAUL AUGUSTIN MAYER, O.S.B.

30510
Basílica Vaticana, Altar da Cátedra



Venerados Irmãos
Ilustres Senhores e Senhoras
Queridos irmãos e irmãs!

Também para o nosso amado Irmão Cardeal Paul Augustin Mayer chegou a hora de deixar este mundo. Ele nasceu há quase um século na minha terra, precisamente em Altötting, onde se localiza o célebre Santuário mariano ao qual estão ligados muitos dos nossos afectos e recordações bávaros. Este é o destino da existência humana: floresce da terra – num ponto exacto do mundo – e é chamada para o Céu, a pátria da qual misteriosamente provém. "Desiderat anima mea ad te, Deus" (
Ps 42,2). Neste verbo "desiderat" está o homem todo, o seu ser carne e espírito, terra e céu. É o mistério originário da imagem de Deus no homem. O jovem Paul – que depois como monge passou a chamar-se Augustin Mayer – estudou este tema nos escritos de Clemente Alexandrino, para o doutorado em teologia. É o mistério da vida eterna, depositado em nós como uma semente desde o Baptismo, e que pede para ser acolhido ao longo da viagem da nossa vida, até ao dia no qual entregamos o espírito a Deus Pai.

"Pater, in manus tuas commendo spiritum meum" (Lc 23,46).As últimas palavras de Jesus na cruz guiam-nos na oração e na meditação, enquanto estamos reunidos ao redor do altar para dirigir a extrema saudação ao nosso saudoso Irmão. Todas as nossas celebrações exequiais se colocam sob o sinal da esperança: no último suspiro de Jesus na cruz (cf. Lc 23,46 Jn 19,30), Deus doou-se inteiramente à humanidade, preenchendo o vazio aberto pelo pecado e restabelecendo a vitória da vida sobre a morte. Por isso, cada homem que morre no Senhor participa pela fé neste acto de amor infinito, de qualquer modo entrega o espírito juntamente com Cristo, na esperança certa de que a mão do Pai o ressuscitará dos mortos e o introduzirá no Reino da vida.

"A esperança não engana – afirma o apóstolo Paulo, escrevendo aos cristãos de Roma – porque o amor de Deus foi derramado nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado" (Rm 5,5). A grande e indefectível esperança, fundada sobre a sólida rocha do amor de Deus, garante-nos que a vida de quem morre em Cristo "não é tirada, mas transformada"; e que "enquanto se destrói a morada deste exílio terreno, prepara-se uma habitação eterna no céu" (Prefácio dos Defuntos, I). Numa época como a nossa, na qual o medo da morte lança muitas pessoas no desespero e na busca de consolações ilusórias, o cristão distingue-se pelo facto de que põe a sua segurança em Deus, num Amor tão grande que é capaz de renovar o mundo. "Eu renovo todas as coisas" (Ap 21,5), declara – quase no final do Livro do Apocalipse – Aquele que está sentado no trono. A visão da nova Jerusalém exprime a realização do desejo mais profundo da humanidade: viver juntos na paz, sem a ameaça da morte, gozando a plena comunhão com Deus e entre nós. A Igreja e, em particular, a comunidade monástica, constituem uma prefiguração sobre a terra desta meta final. É uma antecipação imperfeita, marcada pelos limites e pelos pecados, e por conseguinte precisa sempre de conversão e purificação; e, contudo, na comunidade eucarística sente-se já a vitória do amor de Cristo sobre o que divide e mortifica. "Congregavit nos in unum Christi amor""O amor de Cristo reuniu-nos na unidade": é o lema episcopal do nosso venerado Irmão que nos deixou. Como filho de São Bento, experimentou a promessa do Senhor: "Quem vencer receberá estas coisas como herança; Eu serei seu Deus e ele será meu filho" (Ap 21,7).

Formado pela escola dos Padres Beneditinos da Abadia de São Miguel em Metten, em 1931 emitiu a profissão monástica. Em toda a sua existência procurou realizar o que São Bento diz na Regra: "Nada se anteponha ao amor de Cristo". Depois dos estudos em Salisburgo e em Roma, empreendeu uma longa e apreciada actividade de ensino no Pontifício Ateneu Santo Anselmo, do qual se tornou Reitor em 1949, desempenhando este encargo por 17 anos. Exactamente naquele período foi fundado o Pontifício Instituto Litúrgico, que se tornou um ponto de referência fundamental para a preparação dos formadores no campo da Liturgia. Após o Concílio, foi eleito Abade da sua amada Abadia de Metten e desempenhou tal encargo por 5 anos, e em 1972 o Servo de Deus Paulo VI nomeou-o Secretário da Congregação para os Religiosos e os Institutos Seculares e quis ordená-lo Bispo pessoalmente a 13 de Fevereiro de 1972.

Durante os anos de serviço nessa Congregação promoveu a actuação progressiva das disposições do Concílio Vaticano II, relativas às famílias religiosas. Neste âmbito particular, na sua qualidade de religioso, demonstrou uma acentuada sensibilidade eclesial e humana. Em 1984, o Venerável João Paulo II confiou-lhe o encargo de Prefeito da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, criando-o Cardeal no Consistório de 25 de Maio de 1985 com o Titulo de Santo Anselmo no Aventino. Em seguida, nomeou-o primeiro Presidente da Pontifícia Comissão "Ecclesia Dei"; e também neste novo e delicado encargo o Cardeal Mayer confirmou-se zeloso e fiel servidor, procurando aplicar o conteúdo do seu lema: "O amor de Cristo congregou-nos na unidade".

Amados Irmãos, a nossa vida em cada instante está nas mãos do Senhor, sobretudo no momento da morte. Por isso, com a confiante invocação de Jesus na cruz: "Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito", queremos acompanhar o nosso Irmão Paul Augustin, enquanto realiza a sua passagem deste mundo para o Pai. Neste momento o meu pensamento não pode deixar de se dirigir para o Santuário de Nossa Senhora das Graças de Altötting. Espiritualmente voltados para aquele lugar de peregrinação, confiemos à Virgem Santa a nossa oração de sufrágio pelo saudoso Cardeal Mayer. Ele nasceu próximo daquele Santuário, conformou a sua vida com Cristo segundo a Regra beneditina e morreu à sombra desta Basílica Vaticana. Nossa Senhora, São Pedro e São Bento acompanhem este fiel discípulo do Senhor ao seu Reino de luz e de paz. Amém.





Sexta-feira, 7 de Maio de 2010: CAPELA PAPAL PARA AS EXÉQUIAS DO CARDEAL LUIGI POGGI

7510
Basílica Vaticana, Altar da Cátedra





Venerados Irmãos
Ilustres Senhores e Senhoras
Queridos irmãos e irmãs!

Estais reunidos em volta do altar do Senhor para acompanhar com a celebração do Sacrifício eucarístico, no qual se actualiza o Mistério pascal, a última viagem do querido Cardeal Luigi Poggi, que o Senhor chamou a Si. Ao dirigir a cada um de vós a minha cordial saudação, agradeço em particular ao Cardeal Sodano que, como Decano do Colégio Cardinalício, presidiu à Santa Missa exequial.

O Evangelho que foi proclamado nesta celebração ajuda-nos a viver mais intensamente o triste momento de destaque da vida terrena do nosso saudoso Irmão. A dor pela perda da sua pessoa é aliviada pela esperança na ressurreição, fundada na própria palavra de Jesus: "Esta é, pois, a vontade do meu Pai: que todo aquele que vê o Filho e nele crê tenha a vida eterna; e Eu o ressuscitarei no último dia" (
Jn 6,40). Diante do mistério da morte, para o homem que não tem fé tudo pareceria irremediavelmente perdido. Então, é a palavra de Cristo que ilumina o caminho da vida e dá valor a cada um dos seus momentos. Jesus Cristo é o Senhor da vida e veio para ressuscitar no último dia tudo aquilo que o Pai lhe confiou (cf. Jn 6,39). Esta é inclusive a mensagem que Pedro anuncia com grande força no dia de Pentecostes (cf. Ac 2,14 Ac 2,22-28). Ele afirma que não era possível que Jesus ficasse sob o domínio da morte. Deus ressuscitou-o, libertando-o dos grilhões da morte. Na cruz, Cristo restituiu a vitória que se devia manifestar com a superação da morte, isto é, com a sua ressurreição.

Neste horizonte de fé o nosso saudoso Irmão conduziu toda a sua existência, consagrada a Deus e ao serviço dos irmãos, tornando-se assim testemunha daquela fé corajosa que sabe confiar-se a Deus. Podemos dizer que toda a missão sacerdotal do Cardeal Luigi Poggi foi dedicada ao serviço directo à Santa Sé. Nasceu em Piacenza a 25 de Novembro de 1917; depois dos estudos eclesiásticos no Colégio "Alberoni" e a ordenação sacerdotal a 28 de Julho de 1940, prosseguiu os estudos em Roma, obtendo a licença "in utroque iure" e desempenhando o ministério sacerdotal em algumas paróquias romanas. Depois de ter entrado na Pontifícia Academia Eclesiástica, em 1945 iniciou o seu trabalho na então primeira secção da Secretaria de Estado: anos difíceis, durante os quais não se poupou no serviço à Igreja. Após o primeiro encargo, na Primavera de 1963, junto do governo da República tunisina para alcançar um "modus vivendi" entre a Santa Sé e o Governo daquele país acerca da situação jurídica da Igreja católica na Tunísia, em Abril de 1965 foi nomeado Delegado Apostólico para a África Central, com dignidade de Arcebispo e jurisdição sobre os Camarões, Chade, Congo-Brazzaville, Gabão e República Centro-Africana. Em Maio de 1969 foi nomeado Núncio Apostólico no Peru, onde permaneceu até Agosto de 1973, quando foi chamado para Roma com a qualificação de Núncio Apostólico com encargos especiais, particularmente para manter contactos com os Governos da Polónia, Hungria, Checoslováquia, Roménia e Bulgária, com a finalidade de melhorar a situação da Igreja católica naqueles países.

Em Julho de 1974 foram estabelecidas as relações entre a Santa Sé e o governo polaco e D. Poggi foi nomeado Chefe da Delegação da Santa Sé para os contactos permanentes de trabalho com o Governo da Polónia. Naquele período realizou numerosas viagens à Polónia, encontrando-se com muitas personalidades políticas e eclesiásticas, tornando-se, na escola do seu superior Cardeal Agostino Casaroli, um protagonista da ostpolitik vaticana nos países do bloco comunista. A 19 de Abril de 1986 foi nomeado Núncio Apostólico na Itália; desde então também esta Nunciatura foi encarregada de estudar os processos relativos às nomeações episcopais no país. E, também no mesmo período, como Representante pontifício, geriu uma delicada fase de reorganização das dioceses italianas. Criado e publicado Cardeal no Consistório de 26 de Novembro de 1994, foi nomeado pelo Venerável João Paulo ii, arquivista e bibliotecário da Santa Igreja Romana, permanecendo neste encargo até Março de 1998.

Queridos irmãos, há pouco foram proclamadas as palavras de São Paulo: "Se morrermos com Cristo acreditamos que também com Ele viveremos" (Rm 6,8). Esta página da Carta aos Romanos constitui um dos textos fundamentais do Leccionário litúrgico. De facto, ela é-nos proposta todos os anos no decorrer da Vigília pascal. Pensemos nessas palavras iluminadas de São Paulo enquanto dirigimos a última saudação ao querido Cardeal Luigi Poggi. Quantas vezes ele as terá lido, meditado e comentado! O que o Apóstolo escreve a propósito da mística união do baptizado com Cristo morto e ressuscitado, ele está a vivê-lo na realidade ultraterrena, livre dos condicionamentos impostos à natureza humana pelo pecado. Com efeito – como afirma São Paulo – no mesmo trecho "quem está morto está justificado do pecado" (Rm 6,7). A união sacramental, mas real, com o Mistério pascal de Cristo abre ao baptizado a perspectiva de participar na sua própria glória. E isto tem uma consequência já para a vida presente porque se, pelo baptismo, já participamos na ressurreição de Cristo, então agora já "podemos caminhar numa vida nova" (Rm 6,4). Eis porque a piedosa morte de um irmão em Cristo, mais ainda quando é marcado pelo carácter sacerdotal, é sempre motivo de admiração íntima e grata pelo desígnio da paternidade divina, que nos liberta do poder das trevas e nos transfere para o reino do seu Filho dilecto (cf. Col 1,13).

Enquanto, para este nosso Irmão, invocamos a materna intercessão da Bem-Aventurada Virgem Maria, Rainha dos Apóstolos e Mãe da Igreja, confiemos a sua alma eleita ao Pai da vida, para que o receba no lugar preparado para os seus amigos, servidores fiéis do Evangelho e da Igreja.

Amém!





VIAGEM APOSTÓLICA A PORTUGAL NO 10º ANIVERSÁRIO DA BEATIFICAÇÃO

DE JACINTA E FRANCISCO, PASTORINHOS DE FÁTIMA (11-14 DE MAIO DE 2010)



Lisboa, Terça-feira, 11 de Maio de 2010: SANTA MISSA

11510

Praça Terreiro do Paço de Lisboa





Queridos Irmãos e Irmãs,
Jovens amigos!

«Ide fazer discípulos de todas as nações, […] ensinai-lhes a cumprir tudo quanto vos mandei. E Eu estou sempre convosco, até ao fim dos tempos» (
Mt 28,20). Estas palavras de Cristo ressuscitado revestem-se de um significado particular nesta cidade de Lisboa, donde partiram em grande número gerações e gerações de cristãos – bispos, sacerdotes, consagrados e leigos, homens e mulheres, jovens e menos jovens –, obedecendo ao apelo do Senhor e armados simplesmente com esta certeza que lhes deixou: «Eu estou sempre convosco». Glorioso é o lugar conquistado por Portugal entre as nações pelo serviço prestado à dilatação da fé: nas cinco partes do mundo, há Igrejas locais que tiveram origem na missionação portuguesa.

Nos tempos passados, a vossa saída em demanda de outros povos não impediu nem destruiu os vínculos com o que éreis e acreditáveis, mas, com sabedoria cristã, pudestes transplantar experiências e particularidades abrindo-vos ao contributo dos outros para serdes vós próprios, em aparente debilidade que é força. Hoje, participando na edificação da Comunidade Europeia, levai o contributo da vossa identidade cultural e religiosa. De facto, Jesus Cristo, assim como Se uniu aos discípulos a caminho de Emaús, assim também caminha connosco segundo a sua promessa: «Estou sempre convosco, até ao fim dos tempos». Apesar de ser diferente da dos Apóstolos, temos também nós uma verdadeira e pessoal experiência da presença do Senhor ressuscitado. A distância dos séculos é superada e o Ressuscitado oferece-Se vivo e operante, por nós, no hoje da Igreja e do mundo. Esta é a nossa grande alegria. No rio vivo da Tradição eclesial, Cristo não está a dois mil anos de distância, mas está realmente presente entre nós e dá-nos a Verdade, dá-nos a luz que nos faz viver e encontrar a estrada para o futuro.

Presente na sua Palavra, na assembleia do Povo de Deus com os seus Pastores e, de modo eminente, no sacramento do seu Corpo e do seu Sangue, Jesus está connosco aqui. Saúdo o Senhor Cardeal-Patriarca de Lisboa, a quem agradeço as calorosas palavras que me dirigiu, no início da celebração, em nome da sua comunidade que me acolhe e que abraço nos seus quase dois milhões de filhos e filhas; a todos vós aqui presentes – amados Irmãos no episcopado e no sacerdócio, prezadas mulheres e homens consagrados e leigos comprometidos, queridas famílias e jovens, baptizados e catecúmenos – dirijo a minha saudação fraterna e amiga, que estendo a quantos estão unidos connosco através da rádio e da televisão. Sentidamente agradeço a presença do Senhor Presidente da República e demais Autoridades, com menção particular do Presidente da Câmara de Lisboa que teve a amabilidade de honrar-me com a entrega das chaves da cidade.

Lisboa amiga, porto e abrigo de tantas esperanças que te confiava quem partia e pretendia quem te visitava, gostava hoje de usar as chaves que me entregas para alicerçar as tuas esperanças humanas na Esperança divina. Na leitura há pouco proclamada da Epístola de São Pedro, ouvimos dizer: «Eu vou pôr em Sião uma pedra angular, escolhida e preciosa. E quem nela acreditar não será confundido». E o Apóstolo explica: «Aproximai-vos do Senhor. Ele é a pedra viva, rejeitada, é certo, pelos homens, mas aos olhos de Deus escolhida e preciosa» (1P 2,6 1P 2,4). Irmãos e irmãs, quem acreditar em Jesus não será confundido: é Palavra de Deus, que não Se engana nem pode enganar. Palavra confirmada por uma «multidão que ninguém pode contar e provém de todas as nações, tribos, povos e línguas», e que o autor do Apocalipse viu vestida de «túnicas brancas e com palmas na mão» (Ap 7,9). Nesta multidão incontável, não estão apenas os Santos Veríssimo, Máxima e Júlia, aqui martirizados na perseguição de Diocleciano, ou São Vicente, diácono e mártir, padroeiro principal do Patriarcado; Santo António e São João de Brito que daqui partiram para semear a boa semente de Deus noutras terras e gentes, ou São Nuno de Santa Maria que, há pouco mais de um ano, inscrevi no livro dos Santos. Mas é formada pelos «servos do nosso Deus» de todos os tempos e lugares, em cuja fronte foi traçado o sinal da cruz com «o sinete de marcar do Deus vivo» (Ap 7,2): o Espírito Santo. Trata-se do rito inicial cumprido sobre cada um de nós no sacramento do Baptismo, pelo qual a Igreja dá à luz os «santos».

Sabemos que não lhe faltam filhos insubmissos e até rebeldes, mas é nos Santos que a Igreja reconhece os seus traços característicos e, precisamente neles, saboreia a sua alegria mais profunda. Irmana-os, a todos, a vontade de encarnar na sua existência o Evangelho, sob o impulso do eterno animador do Povo de Deus que é o Espírito Santo. Fixando os seus Santos, esta Igreja local concluiu justamente que a prioridade pastoral hoje é fazer de cada mulher e homem cristão uma presença irradiante da perspectiva evangélica no meio do mundo, na família, na cultura, na economia, na política. Muitas vezes preocupamo-nos afanosamente com as consequências sociais, culturais e políticas da fé, dando por suposto que a fé existe, o que é cada vez menos realista. Colocou-se uma confiança talvez excessiva nas estruturas e nos programas eclesiais, na distribuição de poderes e funções; mas que acontece se o sal se tornar insípido?

Para isso é preciso voltar a anunciar com vigor e alegria o acontecimento da morte e ressurreição de Cristo, coração do cristianismo, fulcro e sustentáculo da nossa fé, alavanca poderosa das nossas certezas, vento impetuoso que varre qualquer medo e indecisão, qualquer dúvida e cálculo humano. A ressurreição de Cristo assegura-nos que nenhuma força adversa poderá jamais destruir a Igreja. Portanto a nossa fé tem fundamento, mas é preciso que esta fé se torne vida em cada um de nós. Assim há um vasto esforço capilar a fazer para que cada cristão se transforme em testemunha capaz de dar conta a todos e sempre da esperança que o anima (cf. 1P 3,15): só Cristo pode satisfazer plenamente os anseios profundos de cada coração humano e responder às suas questões mais inquietantes acerca do sofrimento, da injustiça e do mal, sobre a morte e a vida do Além.

Queridos Irmãos e jovens amigos, Cristo está sempre connosco e caminha sempre com a sua Igreja, acompanha-a e guarda-a, como Ele nos disse: «Eu estou sempre convosco, até ao fim dos tempos» (Mt 28,20). Nunca duvideis da sua presença! Procurai sempre o Senhor Jesus, crescei na amizade com Ele, comungai-O. Aprendei a ouvir e a conhecer a sua palavra e também a reconhecê-Lo nos pobres. Vivei a vossa vida com alegria e entusiasmo, certos da sua presença e da sua amizade gratuita, generosa, fiel até à morte de cruz. Testemunhai a alegria desta sua presença forte e suave a todos, a começar pelos da vossa idade. Dizei-lhes que é belo ser amigo de Jesus e que vale a pena segui-Lo. Com o vosso entusiasmo, mostrai que, entre tantos modos de viver que hoje o mundo parece oferecer-nos – todos aparentemente do mesmo nível –, só seguindo Jesus é que se encontra o verdadeiro sentido da vida e, consequentemente, a alegria verdadeira e duradoura.

Buscai diariamente a protecção de Maria, a Mãe do Senhor e espelho de toda a santidade. Ela, a Toda Santa, ajudar-vos-á a ser fiéis discípulos do seu Filho Jesus Cristo.





Bento XVI Homilias 18410