Ecclesia in Oceania PT 34

Assistência sanitária


34 Jesus curou os doentes e consolou os aflitos. Depois de ressuscitado, continua o seu ministério de cura e consolação através daqueles que levam a misericórdia divina aos débeis e doentes. Este ministério da Igreja na Oceânia constitui, para muitas pessoas, a prova mais saliente e tangível do amor de Deus. A missão messiânica da misericórdia,(121) feita de cura e perdão, deve ser continuada sem parcimónia e segundo modalidades novas que correspondam às necessidades actuais.

A história da assistência sanitária na Oceânia demonstra a sua estreita ligação com a missão da Igreja e como engloba os vários âmbitos sanitários, incluindo o fornecimento dos mais elementares serviços médicos às zonas mais remotas. A Igreja foi das primeiras instituições a ocupar-se daqueles que eram segregados pela sociedade como, por exemplo, os leprosos e os doentes da SIDA. Além disso, administra escolas hospitalares, onde os profissionais da saúde são excelentemente preparados. Devido à crise actual que atravessa a prestação e o financiamento dos cuidados médicos na Oceânia, algumas instituições estão a passar sérias dificuldades, mas não se pode permitir que isso comprometa o empenho fundamental da Igreja nesta área.

O ensinamento da Igreja sobre a dignidade da pessoa humana e a sacralidade da vida deve ser exposto aos responsáveis das leis e das decisões judiciárias, sobretudo quando as suas posições têm consequências sobre a saúde, a administração dos hospitais e a prestação dos serviços médicos. Hoje os hospitais e as instituições sanitárias católicas estão na vanguarda da luta que a Igreja trava pela vida humana, desde o momento da concepção até à sua morte natural. Os Padres Sinodais reconheceram o zelo das congregações religiosas que fundaram o sistema sanitário católico na Oceânia. A Igreja e a sociedade inteira têm para com elas uma dívida imensa de gratidão. A sua presença nos hospitais deve continuar, juntamente com leigos preparados para trabalhar com os diversos institutos de vida consagrada segundo o espírito do seu carisma. Estas pessoas fazem com que o Evangelho da vida seja proclamado sem ambiguidades numa sociedade que muitas vezes se sente confusa relativamente aos valores morais. Para se neutralizar a influência duma « cultura da morte », os Padres Sinodais recomendaram que se incitem todos os cristãos a darem a sua ajuda para que a grande herança do serviço sanitário católico não seja comprometida.(122)

As universidades católicas têm uma função mestra a desempenhar na educação de profissionais da saúde capazes de aplicar a doutrina católica aos novos desafios que incessantemente se levantam no campo médico. De toda a forma possível, devem ser promovidas e, onde não existam, instituídas as associações de médicos católicos, de enfermeiros e de agentes sanitários. Os administradores e o pessoal das instituições católicas precisam de formação para aplicar os princípios morais católicos na sua vida profissional. Esta é uma tarefa delicada, quando alguns dos que trabalham em hospitais católicos não estão familiarizados com estes princípios ou não concordam com eles; mas, se a doutrina for apresentada de forma apropriada, tais pessoas acabam muitas vezes por sentir a paz que deriva de viver em harmonia com a verdade e cooperam de boa vontade.

A fé na cruz redentora de Cristo dá novo significado à doença, ao sofrimento e à morte. Os Padres Sinodais apontaram a necessidade de apoiar aqueles que possuem ou administram estruturas para testemunhar a compaixão de Cristo a quantos sofrem, de modo particular a pessoas inválidas, aos doentes da SIDA, aos idosos, aos moribundos, aos povos indígenas e aos que vivem em áreas isoladas.(123) Uma particular atenção reservaram os bispos a quantos prestam tais serviços nas áreas mais remotas, como a selva, ilhas pequenas ou o sertão australiano. Muitas vezes dispondo de escassos recursos e pouco apoio económico, eles oferecem, com o seu zelo, um poderoso testemunho do amor de Deus pelo pobre, o doente e o abandonado. Quer trabalhem em hospitais, quer cuidem dos idosos, quer prestem outras formas de assistência sanitária ao mais pequeno dos seus irmãos e irmãs (cf. Mt
Mt 25,40), saibam que a Igreja aprecia imenso a sua dedicação e generosidade e agradece-lhes por estarem na vanguarda da caridade cristã.

Serviços sociais


35 Jesus, ao longo da sua vida na terra, era sensível a toda a fraqueza e aflição humana. « No centro do seu ensino pôs as oito bem-aventuranças, que são dirigidas aos homens provados por diversos sofrimentos na vida temporal ».(124) Seguindo os passos do Senhor, a missão caritativa da Igreja estende-se aos mais necessitados: os órfãos, os pobres, as pessoas sem abrigo, os abandonados e excluídos. Uma tal missão é cumprida por quem cuida dos necessitados através de iniciativas pessoais ou mediante instituições criadas para acorrer às várias necessidades a nível paroquial, diocesano, nacional e internacional.

Não há lugar aqui para um elenco exaustivo dos serviços sociais prestados pela Igreja na Oceânia; de alguns, porém, foi feita menção especial na Aula Sinodal. A Igreja oferece serviços de consultoria a sujeitos com dificuldades pessoais ou sociais procurando reforçar as famílias, a fim de prevenir separações matrimoniais e divórcios ou tratar as suas dolorosas consequências. Dar alimento aos pobres, instituir centros de assistência para várias categorias de pessoas, ajudar os que não têm abrigo e os « meninos de rua » são apenas uma pequena parte do apostolado social da Igreja na Oceânia. De forma silenciosa e reservada, alguns grupos paroquiais e associações apostólicas trabalham para remediar as feridas frequentemente encobertas causadas pela pobreza nos subúrbios ou nas áreas rurais. Grupos há que ajudam a levar a paz e a reconciliação entre clãs, tribos ou outros grupos em conflito. As mulheres, sobretudo mães, gozam duma eficácia extraordinária na promoção de meios pacíficos para resolver conflitos.(125) A solicitude da Igreja estende-se também às pessoas dependentes do álcool, das drogas, do jogo de azar, e às vítimas de abuso sexual. Os Padres Sinodais mencionaram também os refugiados e quantos procuram asilo: o seu número está a crescer e a sua dignidade humana reclama que sejam acolhidos e tratados com os devidos cuidados. Dado que as nações da Oceânia dependem dos oceanos e dos mares, os Padres Sinodais preocuparam-se também dos marinheiros, que trabalham muitas vezes em duras condições e vivem sujeitos a muitas provações.

É frequente haver voluntários que oferecem o seu tempo, energias e serviços profissionais a estas formas de apostolado, sem qualquer remuneração. É que quantos escolheram, como modo de vida, amar sacrificando-se a si próprios, não o fizeram à espera de agradecimento ou recompensa humana, nem haveria uma adequada; toda a sua preocupação é desempenhar a parte que lhes cabe na missão eclesial de proclamar a verdade de Jesus Cristo, seguir o seu caminho e viver a sua vida. Estas pessoas são de importância fundamental em qualquer planificação para uma nova evangelização dos povos da Oceânia. A fé é despertada pela pregação da palavra de Deus, e a esperança é alimentada pela promessa do seu Reino, mas a caridade é infundida pelo Espírito Santo, « Senhor que dá a vida ».


CAPÍTULO IV

VIVENDO A VIDA DE JESUS CRISTO NA OCEÂNIA

« Quando Jesus acabou de falar, disse a Simão: "Faz-te ao largo; e vós lançai as redes para a pesca". Simão respondeu: "Mestre, trabalhámos durante toda a noite e nada apanhámos, mas, porque Tu o dizes, lançarei as redes". Assim fizeram e apanharam uma grande quantidade de peixe. As redes estavam a romper-se e eles fizeram sinal aos companheiros que estavam na outra barca para que os viessem ajudar. Vieram e encheram as duas barcas, a ponto de se irem afundando» (Lc 5,4-7).



VIDA ESPIRITUAL E SACRAMENTAL

Vinde, Espírito Santo!


36 « O amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo, que nos foi concedido » (Rm 5,5). Quando « o Verbo Se fez carne e habitou entre nós » (Jn 1,14), Deus irrompeu na história humana para nos tornar « participantes da natureza divina » (2P 1,4). Viver em Cristo implica um novo modo de existir que é obra do Espírito. São Paulo diz que temos de « revestir-nos do homem novo, criado em conformidade com Deus na justiça e santidade verdadeiras » (Ep 4,24). A Igreja na Oceânia foi enriquecida pelo Espírito Santo com muitos dons. Apesar da grande diversidade de culturas e tradições, ela é uma só na fé, esperança e caridade, na doutrina e disciplina católica, na comunhão da Santíssima Trindade.(126) Nesta comunhão, todos são chamados a viver a vida de Cristo no contexto da sua actividade quotidiana, a patentear os frutos maravilhosos do Espírito (cf. Gal Ga 5,22-23) e a ser testemunhas do amor e da misericórdia de Deus no mundo.

O espírito de interioridade


37 A Assembleia Especial deu realce à importância fundamental que têm, para a Igreja na Oceânia, a oração e a vida interior de união com Cristo. Os indígenas conservaram o gosto pelo silêncio, pela contemplação e pelo sentido do mistério na vida. A actividade frenética da vida moderna com todas as suas pressões torna indispensável que os cristãos procurem o silêncio orante e a contemplação como condição e manifestação duma fé viva. Quando Deus deixa de estar no centro da vida humana, fica vazia e sem sentido a própria existência.(127)

Os Padres Sinodais reconheceram a necessidade de dar novo impulso e encorajamento à vida espiritual de todos os fiéis. Muitas vezes o próprio Jesus « retirou-Se para um lugar solitário e ali Se pôs em oração » (
Mc 1,35); observa o evangelista: « A sua fama espalhava-se cada vez mais, juntando-se grandes multidões para O ouvirem e para que os curasse dos seus males. Mas Ele retirava-Se para lugares solitários e entregava-Se aí à oração » (Lc 5,15-16). A oração de Jesus é um exemplo para nós, sobretudo quando nos sentimos oprimidos pelas aflições e responsabilidades da vida diária. Os Padres Sinodais assinalaram a grande importância da vida de oração para fazer frente ao impacto crescente da secularização e do materialismo em toda a região; e, como incentivos à vida interior, encorajaram a participação na Santa Missa, a visita ao Santíssimo Sacramento, a via-sacra, o terço e outras práticas devocionais, como também a oração em família.(128) A presença de comunidades de vida contemplativa na Oceânia é um apelo particularmente forte ao espírito de interioridade, que nos ajuda a experimentar a presença de Deus no nosso coração. Este espírito de interioridade é fundamental também na inspiração e orientamento das iniciativas pastorais, porque dá a força dum genuíno amor apostólico no qual se reflecte o amor de Deus.

Lectio divina e Sagrada Escritura


38 A Igreja « exorta com ardor e insistência todos os fiéis (...) a que "aprendam a sublime ciência de Jesus Cristo" (Ph 3,8) com a leitura frequente das divinas Escrituras (...). Lembrem-se, porém, de que a leitura da Sagrada Escritura deve ser acompanhada de oração, para que seja possível o diálogo entre Deus e o homem; "porque a Ele falamos, quando rezamos; a Ele ouvimos, quando lemos os divinos oráculos" ».(129) A palavra de Deus do Antigo e Novo Testamento é fundamental para todos os crentes em Cristo, e constitui a fonte inexaurível da evangelização. A santidade de vida e uma actividade apostólica eficaz nascem da escuta constante da palavra de Deus. Um renovado apreço pela Sagrada Escritura permite-nos voltar às fontes da nossa fé e encontrar a verdade de Deus em Cristo. A familiaridade com as Escrituras é exigida a todos os crentes, mas de modo particular aos seminaristas, sacerdotes e religiosos. É preciso animá-los a empenharem-se na lectio divina, aquela meditação tranquila e devota da Sagrada Escritura que consente à palavra de Deus falar ao coração humano. Esta forma de oração, privada ou em grupo, aprofundará o seu amor pela Bíblia, tornando-a parte essencial e elemento vivificante da sua vida quotidiana.(130)

Por esta razão, é preciso que a Sagrada Escritura seja acessível a todos na Oceânia, traduzida, conveniente e fielmente, no maior número possível de línguas vernáculas. Já se realizou um trabalho altamente louvável de tradução bíblica, mas há ainda muito a fazer. Contudo, não é suficiente dar aos numerosos grupos linguísticos um texto bíblico que possam ler; para ajudá-los a compreender o que lêem, há necessidade duma formação bíblica sólida e contínua para aqueles que são chamados a proclamar e a ensinar a palavra de Deus.(131)

Liturgia


39 Os Padres Sinodais reflectiram longamente sobre a importância da liturgia nas Igrejas particulares da Oceânia, e fizeram votos de que estas continuem a aperfeiçoar a sua vida litúrgica para que os fiéis possam penetrar mais profundamente no mistério de Cristo. Reconheceram como um dos frutos do Concílio Vaticano II a maior participação do povo de Deus na liturgia, daí resultando, como se esperava, um maior sentido da missão. A vida cristã ficou robustecida com a renovada compreensão e estima da liturgia, especialmente do sacrifício eucarístico. O Concílio tinha considerado a renovação da liturgia como um processo para chegar a um aprofundamento dos ritos sagrados, e nesta linha muitas Igrejas particulares estão empenhadas na reflexão teórica e actuação prática duma verdadeira inculturação das formas de culto, com o devido respeito pela integridade do Rito Romano. Adequadas traduções dos textos litúrgicos e um uso apropriado de símbolos tirados das culturas locais podem evitar a sensação de estranheza cultural aos indígenas, quando eles se aproximam do culto da Igreja.(132) Deste modo, as palavras e sinais da liturgia serão os mesmos da sua alma.

A eucaristia


40 A eucaristia completa a iniciação do cristão, sendo a fonte e o cume da vida cristã. Cristo está real e substancialmente presente no sacramento do seu Corpo e Sangue, oferecidos em sacrifício pela salvação do mundo e partilhados pelos fiéis na comunhão. Desde a sua origem, a Igreja não cessou de obedecer ao mandamento do Senhor: « Fazei isto em memória de Mim » (1Co 11,24). Os católicos da Oceânia têm clara noção do lugar central da eucaristia nas suas vidas; sabem que a celebração regular e devota do sacrifício eucarístico os torna capazes de seguir o caminho da santidade pessoal e de cumprir o seu dever na missão da Igreja. Com grande satisfação reconheceram os Padres Sinodais esta estima generalizada e grande amor pelo maior sacramento da Igreja.

Ao mesmo tempo, porém, mostraram-se preocupados com tantas comunidades da Oceânia que ficam longos períodos sem a celebração da eucaristia.(133) E isso por muitas razões: a escassez cada vez maior de sacerdotes disponíveis para o ministério pastoral, o aumento da pobreza rural e a fuga para as cidades, sobretudo na Austrália, provocando uma diminuição da população e o isolamento de muitas comunidades, as enormes distâncias entre muitas ilhas traduzem-se frequentemente na impossibilidade de ter um sacerdote residente. Por tudo isso, muitas comunidades se reúnem no Dia do Senhor para actos de culto que não são a celebração da eucaristia; e há necessidade de muita sensatez e coragem para enfrentar esta lamentável situação. Faço minha a insistência do Sínodo para que haja maior empenho em despertar vocações para a vida sacerdotal e distribuir os sacerdotes de forma mais equitativa por todo o continente.

O sacramento da penitência


41 « Torna-se aqui importante reflectirmos sobre o facto de Cristo querer que o sacramento da penitência seja fonte e sinal de uma radical misericórdia, reconciliação e paz. A Igreja serve melhor o mundo quando ela é precisamente o que deve ser: uma comunidade reconciliada e reconciliadora de discípulos de Cristo. (...) A Igreja é tanto mais ela mesma, quanto mais realiza a obra de mediação e de reconciliação, no amor e no poder de Jesus Cristo, mediante o sacramento da penitência ».(134) À luz desta certeza, os Padres Sinodais deram graças a Deus por verem, na maioria das dioceses da Oceânia, o sacramento da penitência intensamente praticado e estimado como fonte de graça salutar.

Mas observaram também que algumas Igrejas particulares enfrentam sérios desafios pastorais no âmbito deste sacramento; sobretudo nas sociedades evoluídas, muitos fiéis mostram-se confusos ou indiferentes quanto à realidade do pecado e à necessidade do sacramento da penitência para o seu perdão. Às vezes, não alcançam o verdadeiro sentido da liberdade humana. A redescoberta do lugar fundamental que tem este sacramento na vida do povo de Deus constitui um profundo desejo dos bispos, tendo insistido para que « seja ministrada uma catequese mais ampla sobre a responsabilidade pessoal, a realidade do pecado e o sacramento da reconciliação, lembrando aos católicos a terna misericórdia de Jesus Cristo que lhes é oferecida através deste sacramento e a necessidade da absolvição sacramental para os pecados graves cometidos depois do baptismo. Em virtude da ajuda deste sacramento para o progresso espiritual, os sacerdotes devem ser encorajados não só a fazerem do sacramento da reconciliação um momento importante da sua vida, mas também a garantirem, como parte vital do seu ministério, o devido aproveitamento por parte dos fiéis ».(135)A experiência do recente Jubileu ensina que chegou o tempo para uma renovada catequese e prática deste grande sacramento da misericórdia.

A unção dos enfermos


42 O amor compassivo de Cristo é oferecido, de modo especial, aos doentes e atribulados. Isto vê-se no cuidado que tem a Igreja por todos os que sofrem no corpo e na alma. A renovada Liturgia dos Doentes foi um dos contributos mais positivos para quantos atravessam situações em que a vida corre perigo: doenças graves, operações cirúrgicas arriscadas, ou a velhice. Os idosos sofrem frequentemente por causa do isolamento e da solidão. As celebrações comunitárias da unção dos enfermos são de grande ajuda e consolação para os doentes e atribulados, e tornam-se uma fonte de esperança para aqueles que os assistem. Os Padres Sinodais testemunharam especial gratidão a quantos acompanham os doentes e moribundos por oferecerem um precioso testemunho do amor do próprio Cristo no momento em que o doente e o moribundo poderiam ser considerados um peso.(136)


O POVO DE DEUS

A vocação dos leigos


43 No discipulado cristão, é fundamental a experiência de sentir-se chamado como Mateus: « Partindo Jesus dali, viu um homem chamado Mateus, sentado ao telónio, e disse-lhe: "Segue-Me"! E ele levantou-se e seguiu-O » (Mt 9,9). No baptismo, todos os cristãos receberam o chamamento à santidade. Toda a vocação pessoal é um chamamento a partilhar a missão da Igreja; tendo em vista as necessidades da nova evangelização, é urgente recordar aos leigos a sua particular vocação na Igreja. Os Padres Sinodais congratularam-se pelo « trabalho e testemunho de um número tão grande de leigos que muito têm contribuído para o crescimento da Igreja na Oceânia ».(137) De facto, aparecem verdadeiramente empenhados desde os primórdios da Igreja na Oceânia no seu crescimento e missão, e continuam a fazê-lo com a sua colaboração em várias formas de serviço, sobretudo como catequistas nas paróquias, formadores na preparação para os sacramentos, animadores das actividades juvenis, guias de pequenos grupos e comunidades.

Num mundo que precisa de ver e ouvir a verdade de Cristo, os leigos são, nas várias profissões, testemunhas vivas do Evangelho. Animar a ordem temporal nos seus múltiplos elementos é a vocação fundamental dos leigos.(138) Os Padres Sinodais asseguraram o seu total apoio « aos leigos, homens e mulheres, que vivem a sua vocação cristã principalmente na vida diária, animando as várias realidades da ordem temporal: "os bens da vida e da família, a cultura, os bens económicos, as artes e profissões, as instituições políticas, as relações internacionais e outras semelhantes" ».(139) A Igreja apoia e anima os leigos na sua missão de estabelecer a justa escala de valores na ordem temporal e assim encaminhá-la através de Cristo para Deus. Deste modo, a Igreja torna-se o fermento que leveda toda « a farinha » (cf. Mt Mt 13,33) da ordem temporal.

Os jovens na Igreja


44 Em muitos países da Oceânia, os jovens constituem a maioria da população, enquanto noutros, como Austrália e Nova Zelândia, tal já não se verifica. Os Padres Sinodais desejaram transmitir à juventude da Igreja na Oceânia a convicção de que é chamada a ser « o sal da terra (...) e a luz do mundo » (Mt 5,13 Mt 5,14); quiseram que os jovens soubessem que são uma parte vital da Igreja actual, e que os responsáveis não cessam de procurar modos adequados para envolvê-los cada vez mais na vida e missão da Igreja. Os jovens católicos são chamados a seguir Jesus não somente depois como adultos, mas já como discípulos em vias de maturação. Possam eles sentirem-se sempre atraídos pela figura cativante de Jesus e estimulados pelo desafio dos valores sublimes do Evangelho. Deste modo serão capazes de tomar sobre os seus ombros o apostolado activo a que a Igreja os chama, e desempenhar, felizes e decididos, a sua parte na vida da Igreja a todos os níveis: universal, nacional, diocesano e local.(140) Hoje, « os jovens vivem uma cultura própria. É essencial que os responsáveis eclesiais estudem a cultura e a linguagem dos jovens, acolham e introduzam os seus aspectos positivos na vida e missão da Igreja ».(141)

Entretanto, este é também um tempo em que os jovens têm de enfrentar grandes dificuldades: muitos não conseguem encontrar emprego, frequentemente deslocam-se para as cidades maiores onde a pressão do isolamento, da solidão e do desemprego os arrastam para situações subversivas. Alguns são impelidos para o uso de drogas ou para outras formas de toxicodependência, e até para o suicídio. Apesar disso, mesmo nestas situações, os jovens andam frequentemente à procuram duma vida que só Cristo lhes pode oferecer. Por isso, é indispensável que a Igreja proclame o Evangelho aos jovens de modo que eles o possam compreender e lhes permita agarrar a mão de Cristo que nunca deixa de vir ao seu encontro, sobretudo nos dias cinzentos.

Convencidos da necessidade de os jovens serem evangelizadores dos jovens, os membros do Sínodo recordaram o apelo que fiz à juventude quando visitei a região: « Não tenhais medo de vos empenhar na tarefa de fazer Cristo conhecido e amado, em particular entre as numerosas pessoas da vossa idade, que constituem a maior parte da população ».(142) Com os Padres Sinodais, convido os jovens da Igreja a tomarem em consideração, na oração, a possibilidade de seguir Jesus como sacerdotes ou na vida consagrada, porque a necessidade é grande. Os bispos louvaram os jovens pelo seu forte sentido de justiça, integridade pessoal, respeito pela dignidade humana, atenção para com os indigentes, e preocupação pelo meio ambiente. São sinais duma grande generosidade de espírito, que não deixarão de dar fruto na vida actual da Igreja, como sempre aconteceu no passado.

Em muitos lugares, as peregrinações da juventude constituem uma iniciativa positiva na vida dos jovens católicos.(143) A peregrinação fez parte durante muito tempo da vida cristã e pode ser de grande ajuda para conferir um sentido de identidade e pertença. Os Padres Sinodais reconheceram a importância do Dia Mundial da Juventude vendo nele uma oportunidade para os jovens experimentarem uma genuína communio, como se verificou de forma extraordinária durante o Grande Jubileu. Reúnem-se para escutar a palavra de Deus apresentada numa linguagem acessível, reflectir sobre a mesma na oração, tomar parte em liturgias e encontros de oração estimulantes.(144)Repetidas vezes tenho constatado como muitos deles são por natureza abertos ao mistério de Deus revelado no Evangelho. Possa o mistério glorioso de Jesus Cristo cumular sempre de paz e alegria os jovens da Oceânia!

Matrimónio e vida familiar


45 « Uma revelação e actuação específica da comunhão eclesial é constituída pela família cristã, que, por isso também, se pode e deve chamar "Igreja doméstica" ».(145) A família, considerada na sua raiz última, é imagem da communio inefável da Santíssima Trindade. Pela procriação e educação dos filhos, a família compartilha a obra de Deus na criação e, como tal, constitui uma grande força para a evangelização dentro da Igreja e para além dos seus confins. « A Igreja e a sociedade na Oceânia muito dependem da qualidade da vida familiar »,(146) o que implica uma grande responsabilidade para os cristãos que celebraram a aliança conjugal; por isso, « é necessária uma conveniente preparação dos noivos que desejam receber o sacramento do matrimónio ».(147)

A família, como instituição, sempre necessitará de todo o cuidado pastoral da Igreja, mas há que ter em conta as exigências e responsabilidades das famílias mais numerosas. A Igreja e as autoridades civis devem empenhar-se a fornecer os serviços e ajudas possíveis para apoiar os pais e as famílias. A Igreja tem particularmente a peito a liberdade das mulheres na decisão matrimonial, e também o seu direito a serem respeitadas no âmbito do matrimónio. A poligamia, que ainda existe em alguns lados, é uma causa grave de exploração da mulher. Alargando o horizonte, os Padres Sinodais mostraram-se preocupados pela condição social da mulher na Oceânia, insistindo para que seja respeitado o princípio de salário igual para trabalho igual e facultado à mulher o acesso ao mundo do trabalho. Ao mesmo tempo, é extremamente importante que as mães não sejam penalizadas quando têm de ficar em casa a cuidar dos filhos, já que a dignidade da maternidade e da paternidade é muito grande, e o cuidado dos filhos o valor mais importante.

Nas famílias cujos pais são ambos católicos, é mais fácil que eles partilhem a sua fé com os filhos. Embora reconhecendo com gratidão os matrimónios mistos que são bem sucedidos a alimentar a fé tanto de ambos os esposos como dos filhos, o Sínodo encoraja os esforços pastorais tendentes a promover matrimónios entre pessoas da mesma fé.(148)

Hoje na Oceânia, como noutras partes aliás, o matrimónio e a família estão a ser vítimas de muitas pressões que podem corroer a sua função de célula basilar da sociedade humana, com graves consequências para a própria sociedade. Como fiz notar quando estive na Austrália, « o conceito cristão do matrimónio e da família está a ser contestado por uma nova visão secular, pragmática e individualista, que conquistou terreno no campo legislativo e tem uma certa "aprovação" no sector da opinião pública ».(149) Cientes disto, os Padres Sinodais afirmaram haver urgente necessidade de « programas pastorais que dêem apoio às famílias a braços com sérios problemas da sociedade moderna; muitas delas, tanto na cultura urbana como na tradicional, sofrem gravemente por causa do alcoolismo, da droga e doutras dependências, especialmente a do jogo de azar. (...) Face às dificuldades que hoje se levantam para o matrimónio e a família, com o triste cenário da falta de harmonia nos casais, das separações e dos divórcios »,(150) o Sínodo recomendou uma renovada catequese sobre os ideais do matrimónio cristão: uma aliança que, em Cristo, dura toda a vida, baseando-se na generosa doação de ambos e num amor sem reservas. Esta visão admirável do matrimónio e da família oferece uma verdade salutar para os indivíduos e a sociedade inteira; por isso, os princípios teológicos que estão na base da doutrina católica hão-de ser, cuidadosa e convictamente, explicados a todos.(151)

Os programas de enriquecimento espiritual no matrimónio podem ajudar os casais a aprofundarem a dedicação às suas obrigações e a alegria no dom do amor conjugal. Quando o matrimónio estiver de algum modo ameaçado, os sacerdotes prestem toda a solicitude possível àqueles que se encontram na aflição. O Sínodo reconheceu o grande zelo de tantos pais que ficaram sozinhos a prover ao crescimento e à educação dos filhos, e manifestou profundo apreço a tais pessoas que procuram viver o Evangelho frequentemente em circunstâncias difíceis. A elas e seus filhos, será preciso que os sacerdotes, as escolas católicas e os catequistas prestem especial atenção.(152)

As mulheres na Igreja


46 A longa série de santos de todos os tempos põe em evidência que as mulheres sempre contribuíram com dons próprios e indispensáveis para a vida da Igreja, e que, sem estes dons, a comunidade cristã ficaria irremediavelmente mais pobre.(153) Hoje mais do que nunca, a Igreja precisa das capacidades e energias e também da santidade das mulheres, se se quer que a nova evangelização produza os frutos ardentemente esperados. E, enquanto algumas mulheres se sentem ainda marginalizadas na Igreja e também na sociedade inteira, muitas outras provaram um profundo sentido de realização contribuindo para a vida paroquial, participando na liturgia, na vida de oração e nas actividades apostólicas e caritativas da Igreja na Oceânia. É importante que a Igreja, a nível local, consinta às mulheres de desempenharem a sua legítima parte na missão eclesial; nunca deveriam sentir-se postas de lado. Há muitas formas do apostolado laical e muitos programas de formação para leigos abertos às mulheres, como há também várias funções de responsabilidade onde podem largamente colocar os seus dons ao serviço da missão da Igreja.(154)

Novos movimentos eclesiais


47 Um dos « sinais dos tempos » para Igreja na Oceânia é a afirmação de novos movimentos eclesiais, que são um fruto mais do Concílio Vaticano II. Oferecem um poderoso estímulo e apoio aos católicos de todas as idades no seu esforço de viverem mais intensamente a vida de discipulado; além disso, tem desabrochado, no âmbito de alguns deles, um bom número de vocações para o sacerdócio e para a vida consagrada, o que é motivo para dar graças. Com o seu auxílio, muitos católicos estão a redescobrir Cristo com maior profundidade, experiência esta que lhes consente de permanecerem fiéis, não obstante as dificuldades, nas culturas deste tempo; ajudando as pessoas a crescerem na dimensão cristã, os movimentos são portadores de muitos dons de santidade e de serviço para a Igreja.(155) Acolhendo-os como sinais do Espírito Santo em acção na Igreja, os Padres Sinodais pedem-lhes que trabalhem dentro das estruturas das Igrejas particulares para ajudarem a construir a communio da diocese onde se encontram. Ao bispo local compete « exercer o discernimento pastoral quanto ao seu acolhimento e orientação, pedindo-lhes que respeitem os planos pastorais da diocese ».(156)


MINISTÉRIOS ORDENADOS E VIDA CONSAGRADA

Vocações e seminários


48 Vista a função essencial do sacerdócio e a grande importância da vida consagrada na missão da Igreja, os Padres da Assembleia Especial assinalaram o testemunho dado por bispos, sacerdotes e pessoas de vida consagrada através da sua oração, fidelidade, generosidade e simplicidade de vida.(157) A messe onde trabalham é grande, e o seu número relativamente pequeno. Contudo a Oceânia tem muitos jovens, que constituem um precioso tesouro espiritual, havendo certamente muitos dentre eles que foram chamados ao sacerdócio ou à vida consagrada. « Desejaria que um número cada vez maior dos vossos jovens pudesse ouvir atentamente e aceitar prontamente as palavras de Cristo que falam de uma especial escolha pessoal da parte de Deus para uma fecundidade apostólica: "Não fostes vós que Me escolhestes, fui Eu que vos escolhi e vos nomeei para irdes e dardes fruto, e o vosso fruto permanecer" (Jn 15,16) ».(158) Os Padres Sinodais sublinharam a preocupante penúria de sacerdotes e de consagrados na Oceânia. A promoção das vocações é uma responsabilidade urgente de toda a comunidade católica. Cada bispo deveria esforçar-se por instituir e fazer funcionar um plano para promover as vocações sacerdotais e religiosas a todos os níveis: na diocese, na paróquia, na escola e na família. Os Padres Sinodais olham com esperança para o futuro, pedindo « ao dono da messe que mande trabalhadores para a sua messe » (Lc 10,2), firmes na fé que « Deus providenciará » (Gn 22,8).

Nos seminários, os sacerdotes do futuro são formados à imagem do Bom Pastor, « unindo-se a Cristo no conhecimento da vontade do Pai e no dom de si mesmos pelo rebanho que lhes foi confiado ».(159) Cada bispo é responsável pela formação do clero no contexto da cultura e tradição local. A tal respeito, os Padres Sinodais pediram para « ser tomados em séria consideração modelos mais flexíveis e criativos de formação e aprendizagem »,(160) que tenham em conta os elementos essenciais duma formação bem integrada dos candidatos ao sacerdócio na Oceânia: formação humana, intelectual, espiritual e pastoral.(161) Ao mesmo tempo, os bispos « acautelaram contra excessos de clericalismo ou de secularismo e para os perigos duma insuficiente preparação académica, resultado por vezes da formação dos seminários de hoje, que esquecem as necessidades profundas dos seminaristas a nível intelectual e espiritual ».(162)

Uma especial atenção deve ser dada à situação de algumas Igrejas na Oceânia, nomedamente às da Papuásia-Nova Guiné, das Ilhas Salomão e de outras nações insulares do Pacífico, onde foram abertos novos seminários para responder ao número crescente de seminaristas que esperam ser formados nas suas próprias regiões e na sua cultura. Ao mesmo tempo que davam graças pelo dom precioso de novas vocações, os Padres Sinodais constataram a necessidade dum corpo docente local, adequadamente preparado para os objectivos académicos e educativos. Foram feitas algumas propostas para se ultrapassar a situação crítica actual, nomeadamente a partilha de pessoal no âmbito do Continente. Aos sacerdotes diocesanos locais deveriam ser oferecidas mais oportunidades de estudos superiores feitos quer na região quer fora. É preciso elaborar um programa mutuamente acordado de intercâmbios para solucionar as várias carências referidas. A preocupação prioritária dos bispos é a formação humana e pastoral integral dos seminaristas no seu próprio contexto cultural. Ocorrem soluções capazes de prover ao necessário apoio económico dos seminários, que constituem actualmente um pesado fardo para muitas dioceses. Quando os recursos forem insuficientes na Oceânia, será preciso fazer apelo às estruturas mais amplas da Igreja, às ordens, congregações e institutos religiosos para ajudarem as jovens Igrejas na formação de pessoal local qualificado.(163) O futuro da Igreja na Oceânia depende em grande parte precisamente disto, porque a Igreja não pode viver sem o sacerdócio sacramental, nem funcionar bem sem bons padres.


Ecclesia in Oceania PT 34