Discursos João Paulo II 2001 - 3 de Dezembro de 2001

Apesar da opinião dos cépticos, foi possível observar que a Concordata não só contribuiu para melhorar a cooperação da Igreja e dos organismos do Estado em benefício do bem comum, alargando os espaços de liberdade das pessoas e da sociedade, mas que se tornou inclusivamente um instrumento ecuménico em relação às outras Igrejas e Comunidades confessionais na Polónia.

Neste mesmo espírito, a Igreja deseja estar sempre presente também no processo de preparação da Polónia para o seu pleno ingresso na Comunidade Europeia. É justo aspirar a fazer com que a Polónia tenha o seu devido lugar nos âmbitos políticos e económicos das estruturas da Europa unida. Porém, é necessário que esteja presente como um Estado dotado da sua própria índole espiritual e cultural, da sua inalienável tradição histórica, vinculada ao cristianismo desde os alvores da história. A Polónia não pode privar-se desta tradição, da sua identidade nacional. Tornando-se membro da Comunidade Europeia, a República da Polónia não pode renunciar a nenhum dos seus bens materiais e espirituais, que as gerações dos nossos antepassados defenderam à custa de sangue. Ao defender tais valores, a Igreja quer ser um parceiro e um aliado de quem governa o nosso País. Como afirmei no Parlamento da República, durante a minha peregrinação à Pátria, a Igreja "alerta contra uma redução da visão da Europa, que a considere exclusivamente nos seus aspectos económicos e políticos, assim como contra uma relação acrítica no que concerne a um modelo de vida consumista. Se quisermos que a nova unidade da Europa seja duradoura, devemos construir sobre estes valores espirituais, que outrora estiveram na sua base, tendo em consideração a riqueza e a diversidade das culturas e das tradições de cada uma das nações. Efectivamente, esta deve ser a grande Comunidade Europeia do Espírito" (Discurso aos Parlamentares da Polónia, 11 de Junho de 1999, em: ed. port. de L'Osservatore Romano de 19.6.1999, pág. 13, n. 6). Quero reiterar uma vez mais que "a experiência histórica própria da Nação polaca, a sua riqueza espiritual e cultural, podem contribuir de modo eficaz para o bem comum de toda a família humana, especialmente na consolidação da paz e da segurança na Europa" (Ibid., n. 7).

A Polónia encontra-se ainda diante de desafios enormes, vitais para a sociedade tanto do presente como do futuro. Tenho a esperança de que a Igreja e o Estado, conservando a sua autonomia e as suas tarefas específicas, enfrentem estes desafios de comum acordo. Não cesso de rezar a Deus, a fim de que estes esforços conjuntos proporcionem a cada polaco e a toda a Nação os frutos desejados.

Peço-lhe, Senhora Embaixadora, que transmita os meus cordiais bons votos ao Senhor Presidente e ao Governo da República da Polónia. Em conformidade com as indicações de São Paulo, oro para que as decisões e o trabalho de todos os responsáveis da estrutura constitucional da República e da sua posição no cenário da Europa e do mundo inteiro sejam orientados pela mais profunda solicitude pelo seu bem, e a fim de que o gerem de modo incessante.

A Vossa Excelência, Senhora Embaixadora, renovo os meus bons votos a fim de que o cumprimento da sua missão de mediação entre a República da Polónia e a Sé Apostólica lhe dê satisfação e alegria, e favoreça o bem comum de todos os filhos e filhas da nossa amada Pátria.




AOS PRELADOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL


DE HONDURAS EM VISITA "AD LIMINA"


Terça-feira, 4 de Dezembro de 2001

: Queridos Irmãos no Episcopado

1. É-me grato receber-vos neste dia, por ocasião da vossa visita ad Limina, que vos oferece a ocasião de realizar uma vez mais a peregrinação até aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo, e de renovar os vossos vínculos de comunhão com o Bispo de Roma e com a Igreja universal. Além disso, esta visita constitui uma ajuda para viver a missão de orientar a comunidade eclesial de Honduras, que tive o prazer de encontrar em 1983.

Agradeço cordialmente ao Senhor Cardeal Oscar Andrés Rodríguez Maradiaga, Arcebispo de Tegucigalpa e Presidente da Conferência Episcopal, as amáveis palavras que me dirigiu também em nome dos seus Irmãos Bispos, a quem saúdo, repetindo com o Apóstolo Paulo: "Graça e paz vos sejam dadas da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo" (Rm 1,7). De igual modo, peço-vos que transmitais a minha saudação afectuosa aos membros de cada uma das comunidades eclesiais do vosso querido País.

Sinto-me estreitamente unido a vós, para compartilhar "as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias" (Gaudium et spes, GS 1) dos cidadãos hondurenhos, tendo presente também o sofrimento e as ansiedades devidos à devastação causada pelo furacão "Mitch" no mês de Outubro de 1998 e, mais recentemente, pela tempestade tropical "Michelle". Diante de tais catástrofes, procurastes aliviar os sofrimentos do povo, já extremamente provado pela pobreza, e suscitar nele novas esperanças. De resto, formulo votos a fim de que os novos líderes políticos, recentemente eleitos, possam dar continuidade aos trabalhos de verdadeira reconstrução nacional, levando o País a um desenvolvimento autêntico, respeitando devidamente a dignidade da pessoa humana e os seus direitos fundamentais.

2. É também motivo de alegria e de esperança para a Igreja em Honduras a iminente comemoração dos quinhentos anos da celebração da primeira Missa em terra firme do Continente. Esta efeméride deve ser vivida como uma oportunidade providencial para começar um novo caminho repleto de iniciativas, recordando sempre as palavras do Senhor: "Eu estarei sempre convosco, até ao fim do mundo" (Mt 28,20). No documento que publicastes na perspectiva deste acontecimento, observais que "com as gratas recordações e as impressões ainda recentes dos grandes acontecimentos de espiritualidade do Grande Jubileu do Ano 2000, a Igreja que peregrina em Honduras eleva a sua acção de graças a Deus e convida com grande alegria a Igreja universal a unir-se a ela, louvando a Deus Pai, que salva pela fé no seu Filho Jesus Cristo, constituído como Senhor da História mediante a acção do Espírito Santo. Somos inspirados e impelidos pela consideração de que o nosso território foi escolhido pela Providência de Deus para que, no dia 14 de Agosto do ano de 1502, o humilde frei Alexandre celebrasse a primeira Missa numa localidade elevada e repleta de árvores, que hoje conhecemos com o nome de Baía de Trujillo" (V Centenario de la Primera Misa en el Continente Americano, Tegucigalpa, 3 de Janeiro de 2001). Trata-se de uma ocasião propícia para analisar a história dessa terra, que faz parte da história da vossa Nação, o que vos ajudará a compreender a acção providencial do Senhor e a olhar para o futuro com esperança, a revigorar a vossa fé e a dar um renovado impulso à vida eclesial em todos os seus aspectos.

3. Como Pastores, estais seriamente preocupados com a situação de pobreza persistente em Honduras, apesar de se tratar de um território fértil onde não faltam recursos materiais. Isto faz pensar na necessidade de aperfeiçoar a ordem social, promovendo uma maior justiça e estruturas que favoreçam uma distribuição mais equitativa dos bens e, sobretudo, de evitar que poucos cidadãos detenham a maior parte dos recursos, em detrimento da vasta maioria. Quando se verificam fenómenos como este, à penúria económica acrescenta-se o afastamento dos mais pobres que, fechados no seu próprio mundo, perdem a esperança de uma sociedade melhor. Por isso, o País sofre quando os camponeses se sentem marginalizados, as etnias indígenas esquecidas e os cidadãos mais necessitados de protecção são abandonados ao seu destino, como acontece com as crianças e os jovens.

Assim, é urgente promover a justiça verdadeira, já que "não atender a tal exigência poderia propiciar o irromper de uma tentação de resposta violenta, por parte das vítimas da injustiça", ou seja, "as populações excluídas da repartição equitativa dos bens, destinados originariamente a todos" (Sollicitudo rei socialis, SRS 10). A este propósito, quero recordar aquilo que disse na Exortação Apostólica pós-sinodal Ecclesia in America: "A Igreja deve permanecer atenta ao grito dos mais necessitados. Escutando a sua voz, ela deve viver com os pobres e participar dos seus sofrimentos" (n. 58). No que diz respeito a esta questão, há que promover a difusão do rico património da Doutrina Social da Igreja, com a qual os católicos conseguirão encorajar e favorecer iniciativas orientadas para a superação das situações de pobreza e de marginalização, que atingem muitas pessoas. Não se pode esquecer que a preocupação pela questão social faz parte da missão evangelizadora da Igreja (cf. Sollicitudo rei socialis, SRS 41), e que "a promoção humana faz parte da evangelização, uma vez que está orientada para a libertação integral do ser humano" (Discurso inaugural da IV Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, 12 de Outubro de 1992, n. 13).

Sem esquecer a importante contribuição da Igreja neste campo, convido-vos uma vez mais, queridos Irmãos, a insistir sobre a opção preferencial pelos pobres, que não é exclusiva nem exclui, programando também actividades pastorais nas aldeias e nas áreas rurais. As pessoas pobres e marginalizadas têm o direito de sentir a proximidade especial dos seus Pastores, recordando o que diz o Salmista: "Feliz aquele que socorre o necessitado" (Ps 41 [40] 2).

4. Um fenómeno não menos preocupante nos nossos dias, e que também se sente em Honduras, é constituído por uma determinada desintegração familiar. Como realçais nos vossos Relatórios quinquenais, numerosas famílias não vivem em conformidade com as normas cristãs. Quaisquer que sejam as circunstâncias causadoras desta situação problemática, não nos podem deixar passivos. A este respeito, na Encíclica Evangelium vitae escrevi: "Se é verdade que "o futuro da humanidade passa pela família", tem de se reconhecer que as actuais condições sociais, económicas e culturais frequentemente tornam mais árdua e penosa a tarefa da família ao serviço da vida. Para poder realizar a sua vocação de "santuário da vida", enquanto célula de uma sociedade que ama e acolhe a vida, é necessário e urgente que a família como tal seja ajudada e apoiada... Por seu lado, a Igreja deve promover incansavelmente uma pastoral familiar capaz de ajudar cada família a redescobrir, com alegria e coragem, a sua missão no que diz respeito ao Evangelho da vida" (n. 94). De resto, quando os lares são destruídos, produzem-se outras situações dramáticas, como a das mães solteiras ou ignoradas, que têm de lutar pelo sustento e pela educação dos seus filhos, e o problema das crianças abandonadas na rua; perante estes factos, a Igreja e a sociedade não podem permanecer insensíveis.

Por todos estes motivos, há que sensibilizar todos os ambientes disponíveis, inclusivamente os meios de comunicação social, para que fortaleçam o matrimónio e a família, e façam frente a certas campanhas ou modas que atentam abertamente contra a instituição familiar e contra a própria vida.

5. Diante do futuro da humanidade, é de importância fundamental fomentar uma educação apropriada das crianças e dos jovens. A sociedade hondurenha deve ter em consideração o facto de que a educação, que constitui um direito essencial de cada pessoa, se encontra na base do desenvolvimento dos indivíduos e da sociedade em geral. Como já escrevi na Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 1999: "Como não se preocupar ao constatar que, nalgumas regiões de entre as mais pobres do mundo, as oportunidades de formação, sobretudo no que diz respeito à instrução primária, têm realmente diminuído? [...] Quando se limitam as oportunidades de formação... preparam-se estruturas de discriminação capazes de condicionar [de maneira negativa] todo o desenvolvimento integral da sociedade" (n. 8). Todos estão interessados no campo da educação, mas não existe um esforço conjunto. A contribuição da Igreja em Honduras não pode limitar-se a alguns colégios. Às escolas católicas deve unir-se o testemunho dos professores e dos mestres cristãos, em ordem a assegurar uma formação adequada das futuras gerações.

6. A espiritualidade de comunhão, que "encarna e manifesta a própria essência do mistério da Igreja" (Novo millennio ineunte, 42) e constitui um "grande desafio que nos espera no milénio que começa" (Ibid., 43), deve aplicar-se com cuidado nas Igrejas particulares, e a responsabilidade dos seus Pastores consiste em promover a concórdia entre todos e, de maneira especial, a união dos sacerdotes entre si e à volta do seu Bispo. Por isso, exorto-vos encarecidamente a prodigalizar a vossa atenção para aqueles que são os vossos principais colaboradores, sem poupar esforços nem vos contentar com um trabalho de gestão e de organização do clero. Há necessidade da proximidade, da presença pessoal assídua, da cordialidade e do encorajamento na missão confiada a cada um, segundo o exemplo do Bom Pastor que chama as suas ovelhas "pelo nome" (Jn 10,3). Em Honduras, onde aos sacerdotes é frequentemente confiado um grande número de fiéis, às vezes distribuídos em regiões de acesso difícil e onde um número relevante deles abandonaram a sua terra de origem para servir as comunidades eclesiais hondurenhas, os Bispos devem mostrar-se diponíveis a acolhê-los, "considerando-os comos seus filhos e seus amigos" (Christus Dominus, CD 16).

Estas considerações põem em evidência a norma que prescreve a residência pessoal do Bispo diocesano na sua sede (cf. Código de Direito Canónico, cân. 395), assim como a urgência do seu estrito cumprimento. Além disso, desta forma pode dar-se o exemplo para que os párocos e ou outros colaboradores no ministério pastoral se dediquem de todo o coração à porção dos fiéis que lhes forem confiados, fazendo com que "renasça o sentido da comunidade paroquial, sobretudo na celebração conjunta da Missa dominical" (Sacrosanctum concilium, SC 42).

7. Outro âmbito em que o espírito de comunhão deve dar frutos abundantes em cada Igreja particular é o da vida consagrada. Os vários Institutos e Sociedades são portadores dos seus próprios carismas e hão-de conservar fielmente o espírito que herdaram da sua fundação, mas tendo em conta também o facto de que se trata de uma "graça que não diz respeito apenas a um Instituto, mas reverte em favor de toda a Igreja" (Vita consecrata, VC 49). Na vossa Pátria, onde os consagrados e as consagradas desempenham um papel importante nas tarefas evangelizadoras, é necessário que esta forma de vida "seja ainda mais estimada e promovida pelos Bispos, sacerdotes e comunidades cristãs" (Ecclesia in America, ), integrando-se contemporânea e plenamente na Igreja particular a que pertence (cf. ibid.). Por isso, ao coordenar os vários esforços e as diversas iniciativas, os Pastores não só devem visar uma maior eficácia na acção pastoral, mas um crescimento mais harmónico da comunidade eclesial, em que existe diversidade de carismas e de ministérios, mas há um só Senhor, e é "o mesmo Deus que opera tudo em todos" (1Co 12,6).

8. Embora se constate, com esperança, um pequeno incremento no número dos seminaristas em Honduras, contudo continua a ser urgente um generoso esforço na promoção das vocações para o sacerdócio e a vida de especial consagração. Por isso, além de pedir com insistência ao Senhor que "envie trabalhadores para a sua messe" (Mt 9,38) e de procurar fazer com que a vida exemplar dos sacerdotes e das pessoas consagradas atraiam as novas gerações, é necessário intensificar uma eficaz pastoral das vocações (cf. Novo millennio ineunte, 46).

À pastoral das vocações corresponde a apaixonante tarefa de suscitar profundas inquietações no coração dos jovens e de os preparar para acolher com generosidade o convite do Senhor: "Vem e segue-me!" (Mt 19,21). Não se pode evitar esta proposta de maneira explícita e directa. Porém, não se deve esquecer que a primeira resposta à vocação é apenas o início de um caminho. Com efeito, compreende-se cada vez melhor a importância decisiva que têm para a Igreja um cuidadoso discernimento das vocações e uma séria formação espiritual, humana, teológica e cultural dos candidatos ao sacerdócio e à vida consagrada. Em nenhum caso a escassez das vocações deve levar ao descuido no exame da sua idoneidade que, considerando as circunstâncias sociais e culturais do nosso tempo, na medida do possível, há-de ser ainda mais exigente do que no passado.

9. A participação dos leigos na vida eclesial hondurenha merece um reconhecimento especial. Estou a referir-me aos numerosos agentes de pastoral e aos delegados da Palavra de Deus, escolhidos e encarregados das celebrações apropriadas nos domingos, nos lugares onde o sacerdote não pode estar presente para celebrar a Eucaristia. Não se devem esquecer, tão-pouco, os diversos Movimentos eclesiais que, com o carisma que lhes é próprio, enriquecem a vida do Povo de Deus. Sem dúvida, os serviços que os fiéis leigos oferecem à Igreja são muito valiosos. Contudo, deve evitar-se o erro de pensar que podem substituir os ministros ordenados, quando o seu número é escasso. Aos mencionados agentes de pastoral, há que facilitar uma sólida preparação teológica na espiritualidade da comunhão, realçando a diferença entre o serviço eclesial dos fiéis leigos e os ministérios próprios e exclusivos da Ordem sagrada (cf. Lumen gentium, LG 10 cf. também Christifideles laici, CL 22).

Devem convidar-se os leigos comprometidos a colaborar de maneira activa e responsável na catequese para a primeira Comunhão e para a Confirmação, assim como na preparação dos noivos para o sacramento do Matrimónio. É de primária importância que os paroquianos ofereçam uma educação sistemática na fé católica, que não se limite a uma preparação superficial para receber os sacramentos da Iniciação cristã. Cada fiel tem o direito de receber da Igreja uma profunda formação na fé católica, apropriada à sua idade e condição, para assim crescer na fé. Além disso, as carências que se produzem neste campo podem ser uma das causas do afastamento de muitos fiéis e da sua passagem para as seitas.

10. Dilectos Irmãos, como já propus na Carta Apostólica Novo millennio ineunte, caminhemos de novo a partir de Jesus Cristo, contemplando sempre o seu rosto e fazendo-nos testemunhas do seu amor para nos fazermos ao largo. Na nossa caminhada repleta de esperança, procuremos estar cada vez mais com Ele, a fim de sermos enviados de novo para anunciar a sua mensagem salvífica a cada um dos nossos irmãos e irmãs.

Sobre cada um de vós, imploro a protecção constante da Virgem de Suyapa, para que vos acompanhe nestes novos desafios pastorais. E recomendo-lhe também os vossos sacerdotes, consagrados, consagradas e todos os filhos e filhas de Honduras, enquanto vos concedo do íntimo do coração a minha Bênção apostólica.





MENSAGEM DO SANTO PADRE


AOS VOLUNTÁRIOS DO MUNDO INTEIRO


NA CONCLUSÃO DO ANO QUE A ONU


DEDICOU AO VOLUNTARIADO








Queridos Voluntários

1. No fim deste ano, que as Nações Unidas dedicaram ao Voluntariado, desejo exprimir-vos o meu profundo e cordial apreço pela dedicação constante com que, em qualquer parte do mundo, ides ao encontro de todos os indigentes. Quer vos empenheis individualmente quer reunidos em associações específicas, vós representais para as crianças, os idosos, os doentes, as pessoas em dificuldade, os refugiados e os perseguidos um raio de esperança, que penetra as trevas da solidão e encoraja a superar a tentação da violência e do egoísmo.

O que leva um voluntário a dedicar a sua vida ao próximo? Em primeiro lugar, aquele mote inato no coração, que estimula cada ser humano a ajudar o seu semelhante. Trata-se de uma lei da existência. O voluntário sente uma alegria, que é muito maior do que a acção realizada, quando consegue oferecer algo de si próprio, gratuitamente, aos outros.

Precisamente por isto, o Voluntariado constitui um factor peculiar de humanização: graças às diversas formas de solidariedade e de serviço que promove e concretiza, torna a sociedade mais atenta à dignidade do homem e às múltiplas expectativas. Através da actividade que desempenha, o Voluntariado faz a experiência de que, só através da dedicação ao próximo, a criatura humana se realiza plenamente a si mesma.

2. Cristo, o Filho de Deus feito homem, comunica-nos a razão profunda desta experiência humana universal. Ao manifestar o rosto de Deus que é amor (cf. Jo Jn 4,8), Ele revela ao homem o amor como lei suprema do seu ser. Na vida terrena, Jesus fez com que a ternura divina fosse visível, despojando-se "a Si mesmo, tomando a condição de servo, tornando-Se semelhante aos homens" (Ph 2,7) e "por nós Se entregou a Deus como oferenda e sacrifício de agradável odor" (Ep 5,2). Partilhando até à morte as nossas vicissitudes terrenas, ensinou-nos a "caminhar na caridade".

Seguindo o seu exemplo, a Igreja, nestes dois milénios, não deixou de testemunhar este amor, escrevendo páginas edificantes graças a santos e santas que marcaram a sua história. Entre os mais recentes, penso em S. Maximiliano Kolbe, que se sacrificou para salvar um pai de família, e na Madre Teresa de Calcutá, que se consagrou aos mais pobres entre os pobres.

Através do amor a Deus e aos irmãos, o cristianismo manifesta todo o seu poder libertador e salvífico. A caridade representa a forma mais eloquente de evangelização porque, ao responder às necessidades corporais, revela aos homens o amor de Deus, providente e pai, sempre solícito por cada um. Não se trata de satisfazer apenas as necessidades materiais do próximo, como a fome, a sede, a carência, as curas médicas, mas de fazer com que conheça de maneira pessoal a caridade de Deus. Através do Voluntariado, o cristão torna-se testemunha desta caridade divina; anuncia-a e torna-a tangível com intervenções corajosas e proféticas.

3. Não é suficiente ir ao encontro de quem vive dificuldades materiais; é preciso responder, ao mesmo tempo, à sua sede de valores e de respostas profundas. É importante o tipo de ajuda que se oferece, mas mais importante é o sentimento com que ela é dada. Quer se trate de microprojectos ou de grandes realizações, o Voluntariado está chamado a ser em qualquer caso escola de vida sobretudo para os jovens, contribuindo para os educar para uma cultura de solidariedade e de acolhimento, aberto ao dom gratuito de si.

Quantos voluntários, ao empenhar-se corajosamente pelo próximo, conseguem descobrir a fé! Cristo, que pede para ser servido nos pobres, fala ao coração de quem se põe ao seu serviço. Faz experimentar a alegria do amor abnegado, amor que é fonte da verdadeira felicidade.

Faço sentidos votos para que o Ano Internacional do Voluntariado, durante o qual se realizaram numerosas iniciativas e manifestações, ajude a sociedade a valorizar cada vez mais as numerosas formas de Voluntariado, que representam um factor de crescimento e de civilização. Muitas vezes os voluntários substituem e antecipam as intervenções das instituições públicas, às quais compete reconhecer adequadamente as obras que surgiram, graças à sua coragem, e favoreçê-las sem sufocar o seu espírito original.

4. Queridos Irmãos e Irmãs, que constituís este "exército de paz espalhado em todas as partes da terra, sois um sinal de esperança para os nossos tempos. Onde quer que surjam situações desfavorecidas e de sofrimento, fazei frutificar os insuspeitáveis recursos de dedicação, bondade e até de heroísmo, que o homem leva no seu coração.

Fazendo-me voz dos pobres de todo o mundo, desejo dizer-vos obrigado pelo vosso incessante empenho. Prossegui com coragem o vosso caminho; as dificuldades nunca vos detenham. Cristo, o Bom Samaritano (cf. Lc Lc 10,30-37), seja o excelso modelo de referência para cada voluntário.
Imitai também Maria que, ao "ir apressadamente" socorrer a sua prima Isabel, se torna mensageira de alegria e de salvação (cf. Lc Lc 1,39-45). Que ela vos ensine o estilo da caridade humilde e efectiva e vos obtenha do Senhor a graça de O reconhecer nos pobres e nos que sofrem.

Com estes sentimentos, concedo de coração a todos vós, e a quantos encontrais todos os dias pelos caminhos do serviço ao homem, uma especial Bênção apostólica.

Vaticano, 5 de Dezembro de 2001.






AO NOVO EMBAIXADOR DE BANGLADESH


JUNTO À SANTA SÉ


6 de Dezembro de 2001


Senhor Embaixador

É com imenso prazer que lhe dou as boas-vindas ao Vaticano e aceito as Cartas Credenciais que o designam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário de Bangladesh junto da Santa Sé. Estou-lhe grato por me ter transmitido as saudações do Presidente, Sua Excelência o Senhor A. Q. M. Badruddoza Chowdhury, e do Primeiro-Ministro, Sua Excelênca o Senhor Begum Khaleda Zia, e peço que lhes assegure as minhas ardentes preces pelo bem-estar de toda a nação.

A partir dos dramáticos acontecimentos de 11 de Setembro, tornou-se mais claro do que nunca que há uma urgente necessidade daquilo que Vossa Excelência definiu como "diálogo construtivo para promover a compreensão entre as culturas e as civilizações". Em vez de se insistir sobre aquilo que os separa, os povos de diferentes culturas e religiões devem aprender a respeitar-se uns aos outros, assentes nas inúmeras verdades e valores fundamentais que compartilham entre si.

Como observei na Mensagem para o Dia Mundial da Paz do corrente ano, "o diálogo entre as culturas... assenta na consciência de que há valores comuns a todas as culturas, porque estão radicados na natureza da pessoa" (n. 16). E dado que o Islão e o Cristianismo adoram o único Deus, Criador do céu e da terra, existe um vasto espaço para o acordo e a cooperação recíproca. O conflito só nasce se o Islão ou o Cristianismo forem mal interpretados ou manipulados com finalidades políticas ou ideológicas.

Entre os valores que oferecem um terreno fértil para o diálogo fecundo, há um que sobressai: é a necessidade da solidariedade humana. Com o aumento da interdependência global, o destino comum da família humana e a urgente necessidade de uma cultura da solidariedade tornam-se mais evidentes. Contudo, esta interdependência crescente lançou também uma nova luz sobre as inúmeras desigualdades existentes no nosso mundo. Apesar das promessas feitas pela globalização, os desequilíbrios sociais e económicos pioraram e algumas das nações mais pobres conheceram um declínio ulterior. Em nome da paz no mundo e a fim de corresponder às exigências da justiça, estas nações e as suas populações devem ser ajudadas, não só mediante o auxílio imediato, mas também com a assistência educativa e tecnológica que as torne capazes de desempenhar o seu papel no processo de desenvolvimento global, sem ser excluídas ou marginalizadas. Não se trata de dispensar favores, mas de reconhecer o básico direito do homem à justa partilha dos recursos. A promoção da justiça é essencial para uma cultura da solidariedade.

Outro elemento de acordo quase universal entre os povos da terra é a aspiração à paz verdadeira.

Infelizmente, no mundo existem pessoas que desejam o conflito e sempre procurarão fomentar a destruição. Contudo, a maioria dos indivíduos e das nações estão preparados para fazer as opções corajosas exigidas para a edificação de uma paz autêntica. Numa época como esta, a busca da paz exigem da comunidade internacional decisões que não podem mais ser adiadas. Até mesmo o conflito mais obstinado e longo pode ser resolvido, se prevalecer o desejo da reconciliação.

Neste campo, a religião tem um importante papel a desempenhar. A visão da pessoa e do mundo, ensinada pela religião, determina em grande medida as atitudes e o modo de pensar, no momento de enfrentar o desafio representado pela construção de uma sociedade adequadamente ordenada.

Tanto os muçulmanos como os cristãos insistem sobre o carácter essencialmente transcendente da pessoa humana, criada por Deus para um destino superior, e sobre a necessidade de respeitar o elemento transcendente que existe em cada indivíduo. De resto, concordam que o Criador revelou também um estilo de vida, fundamentado sobre aquilo que Vossa Excelência define justamente como "valores e normas humanas fundamentais", e que têm a sua origem no próprio Deus. Num certo sentido, é no contexto destes valores e destas normas fundamentais que o Islão e o Cristianismo podem comprometer-se de modo mais fecundo no diálogo construtivo, tão necessário nesta época.

Um claro exemplo da possibilidade de tal diálogo deve ser visto no respeito que todos demonstram pelo valor da própria vida. Para o Islão e o Cristianismo, a vida humana constitui uma realidade sagrada e inviolável, dado que tem a sua origem e o seu destino no próprio Deus. Por conseguinte, nunca é possível invocar a paz e desprezar a vida, uma contradição que se observa com muita frequência nas sociedades humanas e no coração do homem. Nas culturas tanto orientais como ocidentais, ricas e pobres, tradicionais e pós-industriais, o respeito pela vida humana está a ser ameaçado e debilitado de muitas maneiras. Há necessidade de um notável esforço educativo, da parte de todas as tradições religiosas, para ensinar o valor sagrado da vida e propagar uma atitude de respeito por ela em todas as circunstâncias.

Nos valores compartilhados por todos os povos, encontramos aquilo que eu quis definir como "a lógica moral presente na vida humana, que torna possível o diálogo entre indivíduos e povos" (Discurso à Assembleia Geral das Nações Unidas, 5 de Outubro de 1995). Este é o ponto em que o Islão e o Cristianismo se podem e devem encontrar, não só num diálogo feito de palavras, mas num diálogo de serviço em benefício da paz no mundo.

Senhor Embaixador, estou persuadido de que a missão que Vossa Excelência está a assumir neste dia contribuirá para fortalecer os vínculos de amizade e de cooperação entre a sua Nação e a Santa Sé. E asseguro-lhe de que os vários departamentos da Cúria Romana estarão sempre prontos a assisti-lo no cumprimento dos seus deveres. Enquanto renovo os meus votos pelo bom êxito da sua tarefa e pela sua felicidade, invoco as abundantes bênçãos de Deus todo-poderoso sobre a sua pessoa, o Governo e o amado povo de Bangladesh.






AO NOVO EMBAIXADOR DO DJIBUTI


JUNTO À SANTA SÉ


6 de Dezembro de 2001

: Senhor Embaixador

1. Sinto-me feliz por receber Vossa Excelência para a apresentação das Cartas que o acreditam como primeiro Embaixador extraordinário e plenipotenciário da República do Djibuti junto da Santa Sé e agradeço-lhe as amáveis palavras que me dirigiu.

Fico-lhe grato, Senhor Embaixador, por transmitir a Sua Excelência o Senhor Presidente Ismaël Omar Guelleh o meu agradecimento pelos votos gentis que me enviou por seu intermédio, e por lhe exprimir o meu desejo mais cordial de prosperidade e de paz para todos os habitantes do país.

2. Vossa Excelência quis realçar a importância da paz e do diálogo para o bom entendimento entre as nações. No contexto dos acontecimentos destes últimos meses, a preservação da paz a nível internacional tornou-se uma prioridade para as Autoridades civis e para os cidadãos de todos os países do mundo. Vossa Excelência está consciente de que ela é, desde há muito tempo, uma preocupação constante da Santa Sé, que se esforça por encorajar as nações na busca paciente e abnegada da paz, preocupando-se permanentemente com as próprias condições do seu estabelecimento, para um diálogo respeitador da todas as partes em questão, sobretudo das minorias, às quais é necessário dar lugar em todas as sociedades, pondo no primeiro lugar aquilo que cada indivíduo pode oferecer para a edificação comum.

Quer a nível local quer regional ou mundial, o diálogo é uma necessidade, por um lado, para evitar confrontos e conflitos tragicamente dolorosos que vêem desencadear-se a violência entre os homens e entre os povos e, por outro lado, para garantir um entendimento sempre mais fraterno entre todos. A região do mundo na qual o seu país se encontra, o Nordeste da África, não se subtrai a estas situações de tensão ou de conflitos preocupantes. Senhor Embaixador, permita que eu preste aqui homenagem às Autoridades do seu país pela parte activa que tiveram na resolução do conflito da Somália, graças sobretudo à conferência de reconciliação, realizada em Arta no ano passado. Faço votos para que seja prosseguido e, se possível, alargado a outros lugares onde persistem os conflitos, o trabalho de grande alcance representado pela busca do convívio entre os diferentes protagonistas, preferindo em todos os casos a negociação e renunciando a qualquer forma de violência. Nesta perspectiva, é desejável que os verdadeiros artífices da paz prossigam a obra iniciada. Este é, sem dúvida, o caminho para a paz, uma paz sólida e duradoura, que todos os homens de boa vontade desejam.

3. Contudo, quer entre as pessoas, quer entre os diferentes componentes de uma nação ou entre os Estados, não pode haver uma paz sólida e duradoura sem a justiça, isto é, se não são garantidas a todos as condições de vida que respeitem a sua dignidade. Esta exigência de justiça requer, sem dúvida, uma partilha mais equitativa dos recursos entre ricos e pobres a todos os níveis da vida social, e a instauração de uma verdadeira cultura da solidariedade (cf. Mensagem para o Dia mundial da paz de 2001, n. 17). Isto pertence aos direitos fundamentais e requer que se desenvolva no nosso mundo, no início deste novo milénio, um diálogo renovado e frutuoso entre as culturas e as religiões, no desejo de um reconhecimento recíproco, a fim de permitir um serviço comum do homem que seja verdadeiramente respeitador dos valores morais e espirituais.

Trabalhar para suscitar, manter e intensificar este diálogo é uma das missões da Santa Sé, que continuará a empenhar-se neste sentido. Senhor Embaixador, a sua presença neste lugar também dá testemunho do interesse e do apego do seu país, "terra de intercâmbio e de encontro", como recordou Vossa Excelência, à defesa destes valores, que são a expressão da dignidade fundamental de todos os seres humanos, e que, como tal, devem ser respeitados.

4. Senhor Embaixador, sinto-me feliz por poder saudar, através da sua pessoa, a comunidade católica da República do Djibuti. Ela é pouco numerosa, mas está activamente empenhada no progresso económico e social da nação, bem como no serviço da educação dos jovens. Tenho conhecimento de que a presença das escolas católicas é apreciada, tanto devido à competência educativa dos formadores como pela qualidade dos valores humanos que transmitem. A Igreja católica, no seu país, mantém boas relações com toda a população e com as diferentes autoridades religiosas. Ela deseja praticar o diálogo fraterno com todos, no respeito mútuo, com vista a uma melhor estima recíproca e à busca do bem comum. Permita-me saudar afectuosamente, por seu intermédio, todos os membros da comunidade católica, o seu Bispo e os seus sacerdotes, e encorajá-los a testemunhar incansavelmente o amor de Deus por todos os homens, mediante uma caridade criativa.

5. No momento em que inicia a sua missão de representação junto da Santa Sé, apresento-lhe, Senhor Embaixador, os meus melhores votos para a sua feliz realização e para dar continuidade e desenvolvimento às relações harmoniosas entre a Santa Sé e a República do Djibuti. Garanto-lhe que encontrará sempre nos meus colaboradores um acolhimento atento e uma compreensão cordial, a fim de o ajudar na sua nobre função.

Sobre Vossa Excelência, a sua família, os seus colaboradores e todo o povo do Djibuti, invoco a abundância das Bênçãos do Todo-Poderoso.







Discursos João Paulo II 2001 - 3 de Dezembro de 2001