AUDIÊNCIAS 2002

JOÃO PAULO II


AUDIÊNCIA


Quarta-feira 30 de janeiro de 2002

Hino a Deus criador




Amados Irmãos e Irmãs:

1. O sol, com o seu progressivo resplandecer no céu, com o esplendor da sua luz, com o calor benéfico dos seus raios, conquistou a humanidade desde as suas origens. Os seres humanos manifestaram de muitas formas a sua gratidão por esta fonte de vida e de bem-estar com um entusiasmo que, com frequência, se eleva alcançando o cume da autêntica poesia. O maravilhoso Salmo 18, do qual foi proclamada a primeira parte, não é apenas uma oração em forma de hino com uma intensidade extraordinária; ele é também um cântico poético elevado ao sol e à sua irradiação sobre a terra. Nisto o salmista insere-se na longa série dos cantores do antigo Próximo Oriente, que exaltam o astro do dia que brilha nos céus e que domina longamente nas suas regiões com o seu calor ardente. Basta pensar no célebre hino a Anton, composto pelo Faraó Akhnaton no séc. XIV a.C., dedicado ao disco solar considerado uma divindade.

Mas para o homem da Bíblia há uma diferença radical em relação a estes hinos solares: o sol não é um Deus, mas uma criatura ao serviço do único Deus e criador. É suficiente recordar as palavras do Génesis: "Deus disse: Haja luzeiros no firmamento dos céus para diferenciarem o dia da noite e servirem de sinais, determinando as estações, os dias e os anos... Deus fez dois grandes luzeiros: o maior para presidir ao dia, e o menor para presidir à noite... E Deus viu que isto era bom" (1, 14.16.18).

2. Antes de percorrer os versículos do Salmo escolhido pela Liturgia, lançamos um olhar ao seu conjunto. O Salmo 18 é parecido com um díptico. Na primeira parte (vv. 2-7) a que agora se tornou a nossa oração encontramos um hino ao Criador, cuja misteriosa grandeza se manifesta no sol e na lua. Ao contrário, na segunda parte do Salmo (vv. 8-15), encontramos um hino sapiencial à Torah, ou seja, à Lei de Deus.

As duas partes estão ligadas por uma orientação comum: Deus esclarece o universo com o brilho do sol e ilumina a humanidade com o esplendor da sua Palavra contida na Revelação bíblica.

Trata-se quase de um sol duplo: o primeiro é uma epifania cósmica do Criador, o segundo é uma manifestação histórica e gratuita de Deus Salvador. Não é por acaso que a Torah, a Palavra divina, é descrita com características "solares": "Os Seus mandamentos são luminosos, deleitam o coração" (cf. v. 9).

3. Mas, por agora, dirijamo-nos à primeira parte do Salmo. Ela inicia-se com uma maravilhosa personificação dos céus, que são para o Autor sagrado testemunhos eloquentes da obra criadora de Deus (vv. 2-5). De facto, eles "narram", "anunciam", as maravilhas da obra divina (cf. v. 2).

Também o dia e a noite são representados como mensageiros que transmitem a grande notícia da criação. Trata-se de um testemunho silencioso, que contudo se faz ouvir com vigor, como uma voz que percorre todo o universo.

Com o olhar interior da alma, com a intuição religiosa que não se deixa distrair pela superficialidade, o homem e a mulher podem descobrir que o mundo não é mudo, mas fala do Criador. Como diz o antigo sábio, "pela grandeza e beleza das criaturas pode-se, por analogia, chegar ao conhecimento do seu Autor" (Sg 13,5). Também São Paulo recorda aos Romanos que "desde a criação do mundo, as Suas (de Deus) perfeições invisíveis,... tornam-se visíveis quando as Suas obras são consideradas pela inteligência" (Rm 1,20).

4. Depois, o hino começa a falar do sol. O globo luminoso é descrito pelo poeta inspirado como um herói guerreiro que sai do quarto nupcial onde passou a noite, isto é, sai do seio das trevas e inicia a sua corrida incansável no céu (vv. 6-7). É semelhante a um atleta que nunca pára nem se cansa, enquanto todo o nosso planeta está envolvido pelo seu calor irresistível.

Por conseguinte, o sol é comparado a um esposo, a um herói, a um campeão que, por ordem divina, todos os dias deve realizar uma tarefa, uma conquista e uma corrida nos espaços siderais. E eis que o Salmista indica agora o sol irradiante no céu, enquanto a terra inteira está envolvida pelo seu calor, o ar é imóvel, nenhum ângulo do horizonte está privado da sua luz.

5. A imagem solar do Salmo é retomada pela liturgia pascal cristã para descrever o êxodo triunfador de Cristo da escuridão do sepulcro, e a sua entrada na plenitude da vida nova da ressurreição. A liturgia bizantina canta nas Matinas do Sábado Santo: "Assim como o sol surge depois da noite todo radiante na sua luminosidade renovada, assim também Vós, Verbo, resplandecereis com um brilho renovado quando, depois da morte, deixardes o vosso leito nupcial". Uma Estrofe (a primeira), a das Matinas de Páscoa relaciona a revelação cósmica com o acontecimento pascal de Cristo: "O céu rejubile e exulte com ele também a terra, porque todo o universo, o visível e o invisível, participa desta festa: Cristo, nossa alegria perene, ressuscitou". E outra Estrofe (a terceira) acrescenta: "Hoje todo o universo, céu, terra e abismo, está repleto de luz e toda a criação já canta a ressurreição de Cristo, nossa força e nossa alegria". Por fim, outra (a quarta) conclui: "Cristo, nossa Páscoa, levantou-se do túmulo como um sol de justiça irradiando sobre todos nós o esplendor da sua caridade".

A liturgia romana não é explícita como a oriental, ao comparar Cristo com o sol. Mas descreve as repercussões cósmicas da sua ressurreição, quando abre o seu cântico de Louvor na manhã de Páscoa com o famoso hino: "Aurora lucis rutilat, caelum resultat laudibus, mundos exultans iubilat, gemens infernus ululat" "A aurora resplandece de luz, o céu exulta de cânticos, o mundo rejubila dançando, o inferno geme com gritos".

6. Contudo, a interpretação cristã do Salmo não elimina a sua mensagem de base, que é um convite a descobrir a palavra divina que se encontra na criação. Sem dúvida, como será dito na segunda parte do Salmo, há outra Palavra, mais nobre, mais preciosa do que a própria luz, a da Revelação bíblica.

Contudo, para todos os que estão atentos na escuta e não têm os olhos velados, a criação constitui como que uma primeira revelação, que tem uma linguagem própria e eloquente: ela é quase outro livro sagrado, cujas letras são representadas pela multidão de criaturas presentes no universo. São João Crisóstomo afirma: "O silêncio dos céus é uma voz mais sonora do que a de uma trombeta: esta voz brada aos nossos olhos e não aos nossos ouvidos a grandeza de quem os fez" (). E Santo Atanásio: "O firmamento, através da sua magnificência, da sua beleza, da sua ordem, é um pregador prestigioso do seu artífice, cuja eloquência enche o universo" ().

Saudações

Amados Irmãos e Irmãs!

Ao saudar os peregrinos de língua portuguesa, que porventura aqui se encontrem, convido a unirem-se todos em oração a favor da paz. Peçam a Maria Santíssima, Rainha da Paz, que seja portadora deste bem para as vossas famílias e comunidades. Como penhor de abundantes dons divinos, concedo de bom grado a minha Bênção apostólica.

É com alegria que recebo os peregrinos de língua francesa. A vossa peregrinação aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo fortaleça a vossa fé e vos convide a dar graças a Deus pela sua presença activa na criação. Concedo a todos, de bom grado, a Bênção apostólica.

Dirijo deferentes palavras de saudação aos sacerdotes e religiosos provenientes de várias partes do Vietname, que participam num programa espiritual, e aos sacerdotes doutorados do Seminário Kenrick em São Luís, que celebram o vigésimo quinto aniversário de ordenação: a luz do Salvador ressuscitado vos continue a guiar e a fortalecer, a fim de que possais dar sempre testemunho eficaz da sua graça e amor. Sobre todos os peregrinos de língua inglesa, sobretudo os que provêm da Dinamarca, do Japão e dos Estados Unidos da América, invoco a graça e a paz de nosso Senhor Jesus Cristo.

Saúdo com afecto os visitantes de língua espanhola, em particular os fiéis das paróquias da Arquidiocese de Valença e da escola italiana "Vittorio Montiglio" de Santiago do Chile, assim como os restantes peregrinos da América Latina. Oxalá saibamos descobrir sempre a linguagem eloquente da criação como uma presença amorosa de Deus em nós. Muito obrigado.
É com alegria que saúdo os peregrinos lituanos!

De modo particular, saúdo os dirigentes e as coristas do coro "Giesme" da Escola de Mùsica Sacra de Caunas. Exorto-vos a haurir da oraçao de hoje novas forças espirituais para viver com generosidade juvenil o dom da fé que recebestes. Rezo por vós com afecto e invoco sobre todos a Bençao do Senhor
Louvado seja Jesus Cristo!

Por fim, dirijo-me aos jovens, aos doentes e aos novos casais.

Celebra-se amanha a memória litúrgica de São João Bosco, sacerdote e educador.

Queridos jovens, olhai para ele como para um autêntico mestre de vida. Vós, queridos doentes, aprendei da sua experiencia espiritual a confiar em Cristo em todas as circunstâncias. E vós, carissimos novos casais, recorrei à sua intercessão para assumirdes com empenho generoso a vossa missão de esposos.



                                                                       Fevereiro de 2002

JOÃO PAULO II


AUDIÊNCIA


Quarta-feira 6 de fevereiro de 2002

Desejo do Templo de Deus




Queridos irmãos e irmãs,

1. Numa Audiência geral de há algum tempo, ao comentar o Salmo que antecede o que acabamos de cantar, dissemos que ele se ligava intimamente com o Salmo seguinte. De facto, os Salmos 41 e 42 constituem um único cântico, dividido em três partes pela própria antífona: "Porque estás abatida, ó minha alma, e te perturbas dentro de mim? Confia no Senhor, que ainda o hei-de louvar. Ele é a alegria do meu rosto. Ele é o meu Deus" (Ps 41,6 Ps 41,12 Ps 42,5).

Estas palavras, semelhantes a um solilóquio, exprimem os sentimentos profundos do Salmista. Ele está longe de Sião, ponto de referência da sua existência porque é sede privilegiada da presença divina e do culto dos fiéis. Por isso, sente uma solidão feita de incompreensão e até de agressividade por parte dos incrédulos, agravada pelo isolamento e pelo silêncio por parte de Deus. Mas o Salmista reage contra a tristeza com um convite à confiança, que ele dirige a si mesmo, e com uma bonita afirmação de esperança: ele espera poder louvar ainda a Deus, "salvação do seu rosto".

No Salmo 42, em vez de falar só a si próprio como no Salmo anterior, o Salmista dirige-se a Deus e suplica-Lhe que o defenda dos adversários. Repetindo quase literalmente uma invocação anunciada no outro Salmo (cf. 41, 10), o orante dirige desta vez efectivamente a Deus o brado de desconforto: "Por que é que então me repelis? Por que ando eu triste sob a pressão do meu inimigo?" (Ps 42,2).

2. Contudo ele já sente o intervalo obscuro da distância que está para terminar e exprime a certeza da volta a Sião para encontrar a casa divina. A cidade santa já não é a pátria perdida, como acontecia na lamentação do Salmo anterior (cf. Sl Ps 41,3-4), mas tornou-se a meta jubilosa, rumo à qual se está a caminho. A orientação da vinda para Sião será a "verdade" de Deus e a sua "luz" (cf. Sl Ps 42,3). O próprio Senhor será o fim último da viagem. Ele é invocado como juiz e defensor (cf. vv. 1-2). Três verbos realçam a sua implorada intervenção: "fazei-me justiça", "defendei a minha causa", "livrai-me" (v. 1). São como que três estrelas de esperança, que se acendem no céu tenebroso da prova e marcam a aurora iminente da salvação.

É significativa a leitura que Santo Ambrósio faz desta experiência do Salmista, aplicando-a a Jesus que reza no Getsémani: "Não quero que te admires se o profeta diz que a sua alma estava abatida, visto que o próprio Senhor Jesus disse: agora a minha alma está abatida. De facto, quem assumiu as nossas debilidades, assumiu também a nossa sensibilidade, o que fez com que ficasse entristecido até à morte, mas não pela morte. Não teria podido causar melancolia uma morte voluntária, da qual dependia a felicidade de todos os homens... Portanto estava triste até à morte, na esperança de que a graça fosse realizada. Demonstra isto o seu próprio testemunho, quando diz da sua morte: há um baptismo com o qual devo ser baptizado: e como me sinto angustiado enquanto não for realizado! (As Job e de David, VII, 28, Roma 1980, pág. 233).

3. Agora, na continuação do Salmo 42, diante dos olhos do Salmista está para se abrir a solução tão desejada: o regresso à fonte da vida e da comunhão com Deus. A "verdade", ou seja a fidelidade amorosa do Senhor, e a "luz", isto é, a revelação da sua benevolência, são descritas como mensageiras que o próprio Deus enviará do céu a fim de tomar pela mão o fiel e conduzi-lo à meta desejada (cf. Sl Ps 42,3).

É muito eloquente a sequência das etapas de aproximação de Sião e do seu centro espiritual. Primeiro aparece "o monte santo", a colina na qual se eleva o templo e a fortaleza de David. Depois, vêm "as habitações", ou seja, o santuário de Sião com todos os seus espaços e edifícios que o compõem. Segue-se, depois, "o altar de Deus", a sede dos sacrifícios e do culto oficial de todo o povo. A meta última e decisiva é o Deus da alegria, é o abraço, a intimidade reencontrada com Ele, que antes estava longe e silencioso.

4. A este ponto, tudo é cântico, júbilo, festa (cf. v. 4). No original hebraico fala-se do "Deus que é alegria do meu júbilo". Trata-se de uma maneira de dizer para exprimir o superlativo: o Salmista quer realçar que o Senhor é a raiz de qualquer felicidade, é a alegria suprema, é a plenitude da paz.
A tradução grega dos Setenta parece ter recorrido a uma palavra aramaica equivalente que indica a juventude e traduziu "ao Deus que alegra a minha juventude", introduzindo, desta forma, a idea do vigor e da intensidade da alegria dada pelo Senhor. O saltério latino da Vulgata, que é uma tradução feita com base no grego, diz assim: "ad Deum qui laetificat juventutem meam". Desta forma, o Salmo era recitado aos pés do altar, na anterior liturgia eucarística, como invocação introdutória ao encontro com o Senhor.

5. A lamentação inicial da antífona dos Salmos 41-42 ressoa pela última vez no final (cf. Sl Ps 42,5). O orante ainda não alcançou o templo de Deus, ainda está envolvido pela obscuridade da provação; mas já brilha aos seus olhos a luz do encontro futuro e os seus lábios já conhecem a tonalidade do cântico de alegria. O apelo é, a este ponto, mais marcado pela esperança. De facto, observa Santo Agostinho comentando o nosso Salmo: "Espera em Deus, responderá à sua alma aquele que por ela está perturbado... Entretanto vive na esperança. A esperança que se vê não é esperança; mas se esperamos no que não vemos é pela paciência que nós a aguardamos (cf. Rm Rm 8,24-25)" (Exposição sobre os Salmos I, Roma 1982, pág. 1019).

Então, o Salmo torna-se a oração de quem é peregrino na terra e ainda está em contacto com o mal e com o sofrimento, mas tem a certeza de que o ponto de chegada da história não é um abismo de morte, mas o encontro salvífico com Deus. Esta certeza é ainda mais forte para os cristãos, aos quais a Carta aos Hebreus proclama: "Vós, porém, aproximastes-vos do monte de Sião, da cidade do Deus vivo, da Jerusalém celeste, das miríades de anjos, da assembleia dos primogénitos que estão inscritos nos Céus, do juiz que é o Deus de todos, dos espíritos dos justos que atingiram a perfeição, de Jesus, o mediador da Nova Aliança, e de um sangue de aspersão que fala melhor do que o de Abel" (He 12,22-24).

Saudações

Queridos Irmãos e Irmãs

Amados peregrinos de língua portuguesa, detende os vossos passos e saboreai a fidelidade amorosa do Senhor e a revelação da sua benevolência, a luz e a verdade divinas. Que elas vos tomem pela mão, como dois guias celestiais, e vos conduzam seguros para a meta desejada; para Deus, que é a raiz de toda a felicidade, a alegria suprema e a plenitude da paz. Como antecipação de tais bens, dou-vos a minha Bênção.

Apresento as boas-vindas aos peregrinos e visitantes de expressão inglesa, presentes na Audiência de hoje, de maneira especial aos membros do Apostolado para os fiéis vietnamitas que vivem na Diáspora. Além disso, dirijo as minhas calorosas saudações aos peregrinos provenientes da Diocese de Charleston. Estou grato ao Coro da igreja de São João Baptista, pelos seus cânticos de louvor a Deus. Sobre todos vós e as vossas famílias, invoco com cordialidade a graça e a paz de nosso Senhor Jesus Cristo.

É com alegria que recebo os peregrinos de língua francesa, em particular os jovens vindos de várias dioceses da França. Oxalá a vossa permanência aqui confirme a vossa fé e faça de vós testemunhas do Senhor ressuscitado! Com a minha Bênção apostólica.

Saúdo cordialmente os peregrinos e visitantes oriundos das terras de língua alemã. Oxalá a vossa experiência do Deus da Justiça que nos salva, torne firmes os vossos passos rumo à meta da vossa vida. Concedo-vos a vós, aos vossos entes queridos e a todos os que nos acompanham através da Rádio Vaticano e da televisão, a minha cordial Bênção apostólica.

Saúdo com afecto os peregrinos de língua espanhola, presentes nesta Audiência. De modo particular, as autoridades académicas da Universidade Católica de Múrcia, com D. Manuel Ureña, Bispo de Cartagena e D. Javier Azagra, Bispo emérito; os Representantes do Conselho Regulador do "Jamón de Teruel", acompanhados pelo Mons. António Algora, os Sacerdotes de Jaém e Múrcia e o Grupo de "Amigos de Madre Esperanza", de Santomera. Além disso, saúdo o Grupo de "Dansaires del Penedés" e os alunos da Escola de Santo António, de Terrassa, assim como o Grupo de Esgrima do Jockey Cube da Argentina.

Agora, dirijo uma saudação cordial aos peregrinos de língua italiana. Em particular, saúdo os jovens da Acção Católica da Diocese de São Bento do Tronto-Ripatransone-Montalto, acompanhados pelo seu Bispo, D. Gervásio Gestori, juntamente com os presbíteros, os educadores e os pais. Caríssimos, agradeço-vos a vossa presença tão numerosa e encorajo-vos a seguir Jesus e o seu Evangelho com fidelidade generosa, tanto na escola como em todos os outros ambientes.

Em seguida, desejo dirigir o meu pensamento para os outros jovens, os doentes e também os novos casais. Hoje celebramos a memória litúrgica de São Paulo Miki e companheiros, mártires japoneses.

A coragem destas fiéis testemunhas de Cristo vos ajude, queridos jovens, a abrir o coração ao heroísmo da santidade. Vos sustente a vós, estimados enfermos, para oferecerdes o dom precioso da oração e do sofrimento por toda a Igreja. E vos conceda a vós, dilectos novos casais, a força de fazer das vossas famílias um lugar de existências caracterizadas pelos valores cristãos.

Concedo-vos a todos a minha Bênção apostólica.



JOÃO PAULO II


AUDIÊNCIA


Quarta-Feira de Cinzas

Quarta-feira 13 de fevereiro de 2002




1. A Audiência geral de hoje, Quarta-Feira de Cinzas, caracteriza-se por um particular espírito de oração, reflexão e penitência. Juntamente com toda a Igreja, iniciamos um caminho de quarenta dias como preparação para a Páscoa com o austero sinal da imposição das cinzas, acompanhado da exortação de Cristo: "Convertei-vos e acreditai no Evangelho" (cf. Mc Mc 1,15). A todo o ser humano é lembrada a sua condição de pecador, juntamente com a necessidade de penitência e de conversão.

A fé cristã recorda-nos que este premente convite a rejeitar o mal e a fazer o bem é um dom de Deus, do qual provém toda a realidade boa para a vida do homem. Tudo tem origem na gratuita iniciativa de Deus, que nos criou para a felicidade e orienta todas as coisas para o verdadeiro bem. Ele antecipa com a sua graça o nosso próprio desejo de conversão e acompanha os nossos esforços para a plena adesão à sua vontade salvífica.

2. Na Mensagem para a Quaresma deste ano, publicada há poucos dias, quis indicar a toda a catolicidade o tema da gratuidade da iniciativa de Deus na nossa vida, elemento essencial que atravessa toda a revelação bíblica. A Quaresma é uma "ocasião providencial de conversão", precisamente porque "nos ajuda a contemplar este supremo mistério de amor", à luz do qual Jesus nos admoesta: "Recebestes de graça, dai de graça" (Mt 10,8). O itinerário quaresmal mostra-se assim na sua realidade mais profunda, como "um retorno às raízes da fé, porque, meditando sobre o dom incomensurável de graça que é a Redenção, não podemos deixar de constatar que tudo nos foi dado por iniciativa amorosa de Deus" (Mensagem para a Quaresma, 12).

O apóstolo Paulo exprime com palavras incisivas e actuais a gratuidade da graça de Deus, que nos reconciliou consigo por amor. Efectivamente, recorda que "dificilmente alguém morrerá por um justo; por um homem bom, talvez alguém se resolva a morrer. Deus, porém, demonstra o seu amor para connosco, pelo facto de Cristo haver morrido por nós, quando ainda éramos pecadores" (Rm 5,7-8). Aquele Deus que nos criou no seu imenso amor e que, igualmente por amor, nos destinou à plena comunhão consigo, espera de nós uma resposta igualmente generosa, livre e consciente.

3. O caminho de conversão, que hoje começamos com confiança, entra plenamente neste contexto original de amor e de gratuidade. A esmola e os gestos de caridade que somos convidados a fazer particularmente neste tempo penitencial, não constituem, porventura, uma resposta à gratuidade da graça divina? Se recebemos gratuitamente, é gratuitamente que devemos dar (cf. Mt Mt 10,8).

A sociedade actual tem uma profunda necessidade de redescobrir o valor da gratuidade, especialmente porque no nosso mundo parece triunfar, muitas vezes, uma lógica marcada exclusivamente pela procura do lucro e do ganho a todo o custo. Frente à propagada sensação de que toda a opção e gesto sejam dominados pela lógica da compra e venda do mercado e que triunfe a lei do maior lucro possível, a fé cristã volta a propor o ideal da gratuidade, fundado sobre a liberdade consciente das pessoas, animadas por um amor autêntico.

Confiamos estes quarenta dias de oração intensa e de penitência à Virgem Maria, a "Mãe do Amor formoso". Seja Ela a acompanhar-nos e a conduzir-nos a celebrar dignamente o grande mistério da Páscoa de Cristo, revelação suprema do amor gratuito e misericordioso do Pai celeste.
Boa Quaresma para todos!

Saudações

Saúdo os peregrinos brasileiros e portugueses que aqui se encontrem. Desejando a quantos me ouvis uma vivência sempre mais plena no espírito desta caridade que nos une, invoco sobre todos a Bênção de Deus Nosso Senhor.

Saúdo com alegria todos os peregrinos de língua francesa, em particular os catequistas da Diocese de Luçon e o seu Bispo, D. Michel Santier, os jovens do grupo "Culture et Partage" de Caen, e o grupo da Escola da Fé, de Friburgo. A todos, concedo de bom grado a Bênção apostólica. Obrigado! Boa Quaresma!

Dirijo uma saudação de boas-vindas aos peregrinos de língua inglesa hoje aqui presentes, especialmente os que vêm da Inglaterra e dos E.U.A. Que estes dias da Quaresma sejam um tempo de renovação e de bênção para todos vós!

É com este pensamento que saúdo os peregrinos e os visitantes que vieram a Roma das terras de língua alemã. Que esta Quaresma sirva para todos nós como fecunda preparação para a Páscoa! A vós, aos vossos queridos em casa, e a todos os que nos seguem pela Rádio Vaticano e pela Televisão concedo de coração a Bênção apostólica.

Saúdo todos os peregrinos de língua espanhola, em especial o grupo da Escola de Evangelização, da Costa Rica. Que a Virgem Maria, Mãe do Amor Formoso, vos acompanhe e oriente para celebrar dignamente o grande mistério da Páscoa de Cristo, suprema revelação do amor misericordioso e gratuito do Pai celeste. Boa Quaresma para todos!

Saúdo agora todos os peregrinos holandeses e belgas. Desejo que a vossa peregrinação aos túmulos dos Apóstolos vos renove interiormente, em particular durante o período da Quaresma, que começa hoje, Quarta-Feira de Cinzas. De coração vos concedo a Bênção apostólica.

Saúdo de todo o coração os peregrinos eslovacos provenientes de Pata. Irmãos e Irmãs, a Quaresma que começamos vos conduza a uma maior proximidade de Jesus Cristo e à sua fiel imitação. Ajude-vos neste compromisso a intercessão dos vossos santos Patronos, Cirilo e Metódio, cuja festa celebramos amanhã. De boa vontade vos abençoo, bem como aos que vos são queridos.
Seja louvado Jesus Cristo!

Dirijo um particular pensamento aos peregrinos de língua italiana. Em particular, saúdo os representantes da Federação Nacional dos Reformados da CISL. Caríssimos, agradeço-vos o dom generoso destinado às iniciativas de caridade da Santa Sé em favor dos mais necessitados e encorajo-vos a continuar nas vossas actividades sociais em favor da promoção das pessoas idosas.

Saúdo-vos, ainda, queridos alunos da Escola elementar "A Arca" de Legnano e do Grupo coral "Esperia", de Campobasso, com D. Armando Dini. Obrigado pela vossa participação neste encontro. Sede em toda a parte testemunhas de Cristo e do seu Evangelho.

Dirijo, por fim, uma saudação afectuosa aos jovens, aos doentes e aos novos casais. Queridos irmãos e irmãs, o tempo quaresmal, que iniciamos precisamente hoje, conduza cada um de vós a uma crescente proximidade de Cristo. Traduzi na vossa existência, segundo as diversas situações em que vos encontrardes, os mesmos sentimentos do nosso Salvador, que deu a sua vida por nós na Cruz. Encontrareis conforto e apoio no mistério do seu sacrifício oferecido pela salvação de toda a humanidade.

A todos a minha Bênção!



JOÃO PAULO II


AUDIÊNCIA


Quarta-feira 27 de fevereiro de 2002

As angústias de um moribundo a alegria de um restabelecido




Queridos irmãos e irmãs,

1. A Liturgia das Horas, nos vários Cânticos que são postos em paralelo com os Salmos, apresenta-nos também um hino de agradecimento que tem este título: "Cântico de Ezequias, rei de Judá, quando adoeceu e foi curado da sua enfermidade" (Is 38,9). Ele está inserido numa parte do livro do profeta Isaías com a característica histórico-narrativa (cf. Is Is 36-39), cujos dados realçam com algumas variantes os que são oferecidos pelo Segundo Livro dos Reis (cf. cap. 18-20).
Nós, agora, na esteira da Liturgia das Laudes, ouvimos e transformamos em oração, duas grandes estrofes daquele Cântico que descrevem os dois movimentos típicos das orações de agradecimento: por um lado, é recordado o pesadelo do sofrimento do qual o Senhor libertou o seu fiel e, por outro, canta-se com alegria a gratidão pela vida e pela salvação reconquistada.

O rei Ezequias, um soberano justo e amigo do profeta Isaías, tinha sido atingido por uma grave doença, que o profeta Isaías declarara mortal (cf. Is Is 38,1). "Ezequias voltou o seu rosto para a parede e fez ao Senhor esta oração: "Senhor, lembrai-vos de que tenho andado fielmente diante de vós, de todo o coração, segundo a vossa vontade". E começou a derramar lágrimas abundantes. Então a palavra do Senhor foi dirigida a Isaías, nestes termos: "Vai e diz a Ezequias: Eis o que diz o Senhor, o Deus de teu pai David: Ouvi a tua oração e vi as tuas lágrimas; vou acrescentar à tua vida mais quinze anos"" (Is 38,2-5).

2. Neste ponto brota do coração do Rei o cântico de reconhecimento. Como se disse, ele volta-se antes de tudo para o passado. Segundo a antiga concepção de Israel, a morte introduzia num horizonte subterrâneo, chamado em hebraico sheol, onde a luz se apagava, a existência se atenuava e se fazia quase espectral, o tempo parava, deixava de haver esperança e, sobretudo, deixava de se ter a possibilidade de invocar e encontrar Deus no culto.

Por isso, Ezequias recorda em primeiro lugar as palavra cheias de amargura pronunciadas quando a sua vida estava deslizando em direcção aos confins da morte: "Não verei mais o Senhor na terra dos viventes" (v. 11). Também o Salmista rezava assim no dia da doença: "Quando chegar a morte, ninguém se lembra de Vós; na mansão dos mortos quem vos louvará?" (Ps 6,6). Ao contrário, libertado do perigo da morte, Ezequias pode recordar com vigor e com alegria: "Os vivos são os que vos louvam como eu vos louvo agora" (Is 38,19).

3. O Cântico de Ezequias adquire, precisamente sobre este tema uma nova tonalidade, se for lido à luz da Páscoa. Já no Antigo Testamento se abriam grandes clareiras de luz nos Salmos, quando o orante proclamava a sua certeza de que "Vós não me entregareis à mansão dos mortos, nem deixareis que o Vosso amigo veja o sepulcro. Ensinar-me-eis o caminho da vida; na vossa presença (gozamos) a plenitude da alegria, na Vossa direita (encontraremos) as delícias eternas" (Ps 15,10-11 cf. Sl ). O autor do Livro da Sabedoria, por seu lado, jamais hesitará em afirmar que a esperança dos justos está "cheia de imortalidade" (Sg 3,4), porque ele está convencido de que a experiência de comunhão com Deus vivida durante a existência terrena não será infringida. Nós permaneceremos sempre, para além da morte, apoiados e protegidos pelo Deus eterno e infinito, porque "as almas dos justos estão na mão de Deus e nenhum tormento os tocará" (Sg 3,1).

Sobretudo com a morte e a ressurreição do Filho de Deus, Jesus Cristo, uma semente de eternidade é lançada à terra e feita germinar na nossa caducidade mortal, e por isso podemos repetir as palavras do Apóstolo, baseadas no Antigo Testamento: "Quando este corpo corruptível se revestir de imortalidade, então cumprir-se-á o que está escrito: "A morte foi tragada pela vitória. Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?"" (1Co 15,54-55 cf. Is Is 25,8 Os 13,14).

4. Mas o cântico do rei Ezequias convida-nos também a reflectir sobre a nossa fragilidade de criaturas. As imagens são sugestivas. A vida humana é descrita com o símbolo nómada da tenda: nós somos sempre peregrinos e hóspedes na terra. Recorre-se também à imagem da tela, que é tecida e que pode permanecer incompleta quando se corta o fio e o trabalho é interrompido (cf. Is Is 38,12). Também o Salmista tem a mesma sensação: "Eis que fizestes os meus dias de uns tantos palmos, a minha existência, perante ti, é como um nada; cada um não é mais do que um sopro. Cada homem passa como uma simples sombra: é em vão que se agita" (Ps 38,6-7). É necessário reencontrar a consciência dos nossos limites, saber que "a soma da nossa vida como declara ainda o Salmista é de setenta anos, os mais fortes chegam aos oitenta; mas a sua grandeza não passa de atribulação e miséria, porque eles passam depressa e nós desaparecemos" (Ps 89,10).

5. No dia da doença e do sofrimento é, contudo, justo elevar a Deus a própria lamentação, como nos ensina Ezequias que, usando imagens poéticas, descreve o seu pranto como o piar da andorinha e o gemer de uma pomba (cf. Is Is 38,14). E, mesmo se não hesita em confessar que sente Deus como um adversário, como um leão que quebra os ossos (cf v. 13), não deixa de o invocar: "Senhor, estou em agonia, confortai-me!" (v. 14).

O Senhor não permanece indiferente às lágrimas do sofredor e, mesmo por caminhos que nem sempre coincidem com os das nossas expectativas, responde, conforta e salva. É como confessa Ezequias no final, convidando todos a ter esperança, a rezar, a ter confiança, na certeza de que Deus não abandona as suas criaturas: "Senhor, salvai-me e soaremos as nossas harpas no templo do Senhor, todos os dias da nossa vida" (v. 20).

6. A tradição latina medieval conserva deste Cântico do rei Ezequias um comentário espiritual de Bernardo de Claraval, um dos místicos mais representativos do monaquismo ocidental. Trata-se do terceiro dos Sermões vários, em que Bernardo, aplicando à vida de cada um o drama vivido pelo soberano de Judá e, interiorizando o seu conteúdo, escreve entre outras coisas: "Louvarei ao Senhor em todos os tempos, isto é, de manhã até à noite, como aprendi a fazer, e não como os que te louvam quando tu lhes fazes o bem, nem como os que crêem durante um certo tempo, mas no momento da tentação cedem; e como os santos, direi: Se recebemos o bem da mão de Deus, porque não devemos aceitar também o mal?... Assim estes dois momentos do dia serão um tempo de serviço a Deus, porque à noite permanecerá o pranto, e de manhã o eco da alegria. Mergulharei no sofrimento à noite a fim de poder gozar, depois, a alegria da manhã" (Scriptorium Claravallense, Sermo III, n. 6, Milão 2000, págs. 59-60).

Por conseguinte, a súplica do rei é lida por São Bernardo como uma representação do cântico orante do cristão, que deve ressoar, com a mesma constância e serenidade, tanto nas trevas da noite e da provação como na luz do dia e da alegria.

Saudações

Amados peregrinos de língua portuguesa, bem hajam pela vossa presença e testemunho de amor à Igreja que esta romagem exprime. Deus acolha favoravelmente as vossas preces de peregrinos a caminho do Além, fazendo germinar e crescer, na fraqueza mortal da vossa vida, aquela semente de eternidade que nos trouxe o Filho de Deus com a sua morte e ressurreição. Sobre vós e os vossos, desça a minha Bênção.

Dirijo a minha cordial saudação aos peregrinos de língua francesa, em particular aos sacerdotes de Montréal, que vieram procurar novas forças junto do túmulo dos Apóstolos Pedro e Paulo. Que este tempo de Quaresma vos faça progredir no caminho da santidade, na escuta da palavra de Deus e na prática quotidiana da caridade! A todos, concedo de bom grado a Bênção Apostólica.

Alegro-me por dar as boas-vindas aos visitantes de expressão inglesa, aqui presentes. Exprimo o meu encorajamento ao grupo de sacerdotes e religiosos que estão a fazer cursos de formação permanente. Para todos vós, especialmente os peregrinos da Dinamarca, Noruega, Etiópia, Eritreia, Koweit, Japão e Estados Unidos da América, invoco a graça e a paz de nosso Senhor Jesus Cristo.

Saúdo cordialmente os peregrinos da Eslováquia: de Galanta e de Smolenice e os membros da Associação "Cadeiras activas de rodas" com os acompanhantes. Irmãos e Irmãs, a Quaresma convida-nos à conversão por meio da oração, do exercício das obras de misericórdia e da escuta da Palavra de Deus.

Desejando-vos um fecundo caminho quaresmal, concedo-vos de bom grado a minha Bênção Apostólica.
Seja louvado Jesus Cristo!

Saúdo cordialmente os peregrinos de língua italiana, em particular os alunos da Escola da Polícia de Roma e o grupo UNITALSI da diocese de Porto Santa Rufina, agradecendo-lhes a sua participação neste encontro.

Saúdo-vos, depois, a vós, queridas crianças e a quantos participastes no concurso sobre o tema da paz promovido pela Junta Regional Toscana, e faço votos para que esta louvável iniciativa, que envolveu as escolas de 63 Países do mundo, faça crescer em cada um generosos propósitos de amizadee e solidariedade.

Saúdo, por fim, os jovens, os doentes e os novos casais. Caríssimos, continuando no itinerário quaresmal, a Igreja convida-nos a seguir docilmente a acção do Espírito Santo que nos conduz pelo caminho de Cristo para Jerusalém, onde se realizará a sua missão redentora. Sabei deixar-vos formar, em cada dia, pela sua graça, a fim de que, seja no estudo, seja na doença ou na vida de família, possais experimentar a riqueza espiritual do caminho de conversão e de penitência que estamos a viver neste tempo sagrado.



                                                                           Março de 2002


AUDIÊNCIAS 2002