AUDIÊNCIAS 2003

PAPA JOÃO PAULO II


AUDIÊNCIA


Quarta-Feira 13 de agosto de 2003

Acção de graças pela libertação do povo


1. A Liturgia das Laudes inclui entre os seus Cânticos o fragmento de um hino, colocado como selo da história narrada pelo Livro bíblico de Tobias: escutámo-lo há pouco. O hino, bastante amplo e solene, é uma expressão típica da oração e da espiritualidade judaica, que se inspira noutros textos já presentes na Bíblia.

O Cântico desenvolve-se através de uma dupla invocação. Sobressai em primeiro lugar um convite reiterado a louvar Deus (cf. vv. 3.4.7) pela purificação que ele está a realizar com o exílio. Os "filhos de Israel são exortados a aceitar esta purificação com uma conversão sincera (cf. vv. 6.8). Se a conversão florescer nos corações, o Senhor fará surgir no horizonte o alvorecer da libertação. É precisamente neste clima espiritual que se situa o início do Cântico que a Liturgia tirou do hino mais amplo do capítulo 13 de Tobias.

2. A segunda parte do texto, entoada pelo idoso Tobite, protagonista de todo o Livro com o filho Tobias, é uma verdadeira e própria celebração de Sião. Ela reflecte a nostalgia apaixonada e o amor ardente que o hebreu da Diáspora sente em relação à cidade santa (cf. vv. 9-18). Este aspecto brilha no âmbito do trecho que foi escolhido como oração matutina da Liturgia das Laudes.Detenhamo-nos nestes temas, ou seja, na purificação do pecado através da prova e da expectativa do encontro com o Senhor, à luz de Sião e do seu templo santo.

3. Tobite dirige um apelo caloroso aos pecadores para que se convertam e pratiquem a justiça: este é o caminho que se deve empreender para reencontrar o amor divino que dá serenidade e esperança (cf. v. 8).

A própria história de Jerusalém é uma parábola que ensina a todos que opção fazer. Deus castigou a cidade porque não podia permanecer indiferente perante o mal perpetrado pelos seus filhos. Mas agora, vendo que muitos se converteram e se transformaram em filhos justos e fiéis, ele manifestará de novo o seu amor misericordioso (cf. v. 10).

Ao longo de todo o Cântico do capítulo 13 de Tobias repete-se com frequência esta convicção: o Senhor "castiga e compadece-Se... castiga por causa das nossas iniquidades mas, a seguir, compadece-Se de nós... Ele castigou-te por causa das tuas obras... os filhos dos justos serão congregados e louvarão o Senhor" (vv. 2.5.11.15). Deus recorre ao castigo e outras admoestações como meio para congregar na recta via os pecadores surdos. A última palavra do Deus justo é, contudo, a do amor e do perdão; o seu desejo profundo é poder abraçar de novo os filhos rebeldes que voltam para Ele com o coração arrependido.

4. Em relação ao povo eleito, a misericórdia divina manifestar-se-á com a reconstrução do Templo de Jerusalém, realizada pelo próprio Deus: "Porque o teu tabernáculo será reconstruído com júbilo" (v. 11). Desta forma, começa o segundo tema, o de Sião, como lugar espiritual para o qual deve convergir não só a volta dos hebreus mas também a peregrinação dos povos que procuram Deus. Desta forma, abre-se um horizonte universalista: reconstruído, o templo de Jerusalém, sinal da palavra e da presença divina, resplandecerá com uma luz planetária que abrirá as trevas, para que possam pôr-se a caminho "numerosos povos, até às extremidades da terra" (cf. v. 13), trazendo oferendas e cantando a sua alegria por participar na salvação que o Senhor concede a Israel.

Por conseguinte, os Israelenses e todos os povos estão a caminho juntos, rumo a uma única meta de fé e de verdade. O cantor deste hino faz descer sobre eles uma bem-aventurança repetida, dizendo a Jerusalém: "Ditosos aqueles que te amam, e ditosos os que se alegram pela tua prosperidade!" (v. 16). A felicidade é autêntica quando se encontra a luz que resplandece no céu de todos os que procuram o Senhor com o coração purificado e com o anseio da verdade.

5. É a esta Jerusalém, livre e gloriosa, sinal da Igreja na meta derradeira da sua esperança, prefigurada pela Páscoa de Cristo, que Santo Agostinho se dirige com fervor no Livro das Confissões.

Referindo-se à oração que ele deseja realizar no seu "quarto secreto", descreve-nos aquelas "canções de amor entre os gemidos, os inarráveis gemidos que durante a minha peregrinação suscita a recordação no coração orientado para o alto em direcção a ela, Jerusalém a minha pátria, Jerusalém a minha mãe, e para Ti, o seu soberano, o seu iluminador, o seu pai, tutor e esposo, as suas castas e grandes delícias, a sua sólida alegria e todos os seus bens inefáveis". E conclui com uma promessa: "Não me afastarei de ti, enquanto na paz daquela mãe caríssima, onde se encontram as primícias do meu espírito, de onde me vêm estas certezas, Tu não tiveres reunido tudo o que eu sou a partir desta dispersão desvirtuada, para o conformar definitivamente na eternidade, ó meu Deus, minha misericórdia" (Confissões, 12, 16, 23, Roma 1965, págs. 424-425).

Na perspectiva da Solenidade da Assunção da Santíssima Virgem Maria, convido também aos peregrinos de língua portuguesa aqui presentes, nomeadamente a Comitiva do Sport Lisboa e Benfica, a percorrer o próprio itinerário de vida cristã, na escuta da Palavra de Deus e sob a protecção e o exemplo da nossa Mãe do Céu. Que o Senhor vos abençoe.

Dirijo uma cordial saudação aos fiéis provenientes da Roménia, assegurando a cada um a minha lembrança na oração. Abençoo-vos a todos, bem como os vossos entes queridos, do íntimo do coração.
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Saúdo cordialmente os peregrinos de língua francesa. Oxalá este período de férias vos ajude a encontrar Deus na beleza da sua criação e na renovada atenção ao próximo. O Senhor vos abençoe!
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Dirijo uma saudação cordial aos peregrinos da Eslováquia.
Caríssimos, agradeço-vos este encontro e, enquanto invoco sobre vós a contínua assistência divina, é de bom grado que vos concedo a Bênção apostólica.
Dou as minhas boas-vindas a todos os peregrinos e visitantes de expressão inglesa, presentes na Audiência do dia de hoje, especialmente aos que vieram de Malta, do Japão, do Sri Lanka e dos Estados Unidos da América. Invoco cordialmenmte sobre todos vós a alegria e a paz de nosso Senhor Jesus Cristo!
Saúdo com afecto os peregrinos de língua espanhola. De modo especial, o Grupo de Oficiais da Academia Politécnica do Exército do Chile. Faço votos por que esta alegre peregrinação a Roma vos anime, bem como aos demais, a confirmar a fé.
Boas férias a todos! Muito obrigado pela vossa atenção!
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Dou as cordiais boas-vindas aos peregrinos e aos fiéis provenientes das terras de expressão alemã. Percorrei o caminho do amor e da justiça, e a bondade de Deus vos acompanhe! Desejo boas férias a todos!
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Dirijo uma cordial saudação aos peregrinos de língua italiana, em particular às Carmelitas Missionárias de Santa Teresa do Menino Jesus e às Filhas de Nossa Senhora do Divino Amor que, nestes dias, estão a celebrar os seus Capítulos gerais, às Religiosas da Reparação e aos fiéis oriundos de Recanati.

A vós, caros jovens, prezados doentes e estimados recém-casados, faço votos por que imiteis o exemplo heróico de São Maximiliano Maria Kolbe, cuja memória celebraremos amanhã: como ele, esforçai-vos também vós por viver a vocação cristã de modo autêntico e coerente.



PAPA JOÃO PAULO II


AUDIÊNCIA


Quarta-Feira 20 de agosto de 2003



A Jerusalém reconstruída


1. O Salmo que agora foi proposto à nossa meditação constitui a segunda parte do precedente Salmo 146. As antigas traduções grega e latina, seguidas pela Liturgia, consideraram-no, ao contrário, como um cântico separado, porque o seu começo se distingue totalmente da parte anterior. Este começo tornou-se célebre também porque com frequência é usado na música latina: Lauda, Jerusalem, Dominum. Estas palavras iniciais constituem o típico convite dos hinos sálmicos para celebrar e louvar o Senhor: agora Jerusalém, personificação do povo, é interpelada para que exalte e glorifique o seu Deus (cf. 147, 12).

Imediatamente se menciona o motivo pelo qual a comunidade orante deve elevar ao Senhor o seu louvor. Este é de índole histórica: foi Ele, o Libertador de Israel do exílio na Babilónia, que deu segurança ao seu povo, fortificando "os ferrolhos das portas" da cidade (cf. v. 13).

Quando Jerusalém tinha sucumbido sob o assalto do exército do rei Nabucodonosor, em 586 a.C., o livro das Lamentações apresentou o próprio Senhor como juiz do pecado de Israel, enquanto demolia "os muros da filha de Sião... Jazem sob os escombros as suas portas; quebrou-as, partindo as trancas" (Lm 2,8 Lm 2,9). Agora, ao contrário, o Senhor volta a ser o construtor da cidade santa; no templo reconstruído Ele abençoa de novo os seus filhos. Desta forma, é mencionada a obra realizada por Neemias (cf. Ne Ne 3,1-38), que tinha restabelecido os muros de Jerusalém, para que voltasse a ser um oásis de serenidade e de paz.

2. A paz, salum, de facto é imediatamente evocada, também porque está contida de modo simbólico no próprio nome Jerusalém. Já o profeta Isaias prometia à cidade: "porei por teu governador a paz, por teu magistrado a justiça" (60, 17).

Mas, além de fazer reconstruir os muros da cidade, de a abençoar e de a pacificar na segurança, Deus oferece a Israel outros dons fundamentais: é o que se descreve no fim do Salmo. De facto, ali sao recordados os dons da Revelaçao, da Lei e das prescrições divinas: "Ele revela os Seus planos a Jacob, os Seus preceitos e leis a Israel" (Ps 147,19).

Celebra-se, assim, a eleiçao de Israel e a sua missao ùnica entre os povos: proclamar ao mundo a Palavra de Deus. É uma missao profética e sacerdotal, porque "qual é o grande povo, que possui mandamentos e preceitos tao justos como esta Lei que hoje vos apresento?" (Dt 4,8). Através de Israel e, por conseguinte, também através da comunidade crista, ou seja, da Igreja, a Palavra de Deus pode ressoar no mundo e tornar-se norma e luz de vida para todos os povos (cf. Sl Ps 147,20).

3. Até agora descrevemos a primeira razao do louvor que devemos elevar ao Senhor: é uma motivaçao histórica, isto é, relacionada à acçao libertadora e reveladora a respeito do seu povo.

Mas existe outra fonte de exultaçao e de louvor: ela é de indole cósmica, ou seja, relacionada à acçao criadora de Deus. A Palavra divina irrompe para dar vida ao ser. Semelhante a um mensageiro, ela corre pelos espaços imensos da terra (cf. Sl Ps 147,15). E imediatamente se dá um florescimento de maravilhas.

Eis que chega o Inverno que é descrito nos seus fenómenos atmosféricos com uma tonalidade poética: a neve é semelhante à la devido ao seu candor, a geada com os seus pingos subtis é como a poeira do deserto (cf. v. 16), o granizo assemelha-se às migalhas de pao que caem no chao, o gelo coalha a terra e impede a vegetaçao (cf. v. 17). É um quadro invernal que convida a descobrir as maravilhas da criaçao e que será retomado numa página muito pitoresca também por um livro biblico, o de Sirácide (cf. 43, 18-20).

4. Mas eis que, sempre pela acçao da Palavra divina, volta a Primavera: o gelo derrete-se, o vento quente sopra e faz fluir a água (cf. Sl Ps 147,18), repetindo assim o ciclo perene e, por conseguinte, a própria possibilidade de vida para homens e mulheres.

Naturalmente nao faltaram leituras metafóricas destes dons divinos. O "grao de mostarda" fez pensar no grande dom do pao eucaristico. Aliás, o importante escritor cristao do terceiro século, Origenes, identificou aquela mostarda como o sinal do próprio Cristo e, em particular, da Sagrada Escritura.

Eis o seu comentário: "Nosso Senhor é o grao de mostarda que cai na terra, e que se multiplica para nós. Mas este grao de mostarda é superlativamente abundante... A palavra de Deus é superlativamente abundante, contém em si todas as delicias. Tudo o que desejas, provém da Palavra de Deus, da mesma forma que os Judeus narram: quando comiam o maná, ele, na sua boca, adquiria o gosto daquilo que cada um desejava... Assim, também na carne de Cristo, que é a palavra do ensinamento, ou seja, a compreensao das Sagradas Escrituras, quanto maior for o desejo que dela tivermos, tanto maior será o alimento que dela receberemos. Se és santo, encontras refrigério; se és pecador, encontras o tormento" (Origenes Jerónimo, 74 homilias sobre o livro dos Salmos, Milao 1993, págs. 543-544).

5. Por conseguinte, o Senhor age com a sua Palavra nao só na criaçao, mas também na história. Ele revela-se com uma linguagem muda (cf. Sl Ps 18,2-7), mas exprime-se de modo explicito através da Biblia e da sua comunicaçao pessoal nos profetas e em plenitude no Filho (cf. Hb He 1,1-2). Sao dois dons diferentes, mas convergentes, do seu amor.

Por isso, o nosso louvor deve elevar-se ao céu todos os dias. É a nossa acçao de graças, que floresce no alvorecer na oraçao das Laudes para bendizer o Senhor da vida e da liberdade, da existencia e da fé, da criaçao e da redençao.

Uma saudação afectuosa aos peregrinos de língua portuguesa aqui presentes, nomeadamente ao Grupo «Rumo a Cristo» da Paróquia de S. Lourenço de Ermesinde, o grupo folclórico da Senhora do Monte, de Pedroso; as Paróquias de Beiriz e da Matriz da Póvoa do Varzim e os numerosos visitantes de Viseu, de S. Vicente. Que a bênção de Deus vos aumente a paz e a caridade em vossas famílias e comunidades.
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Saúdo com afecto os peregrinos de língua espanhola, em especial os grupos paroquiais de Alicante e os peregrinos de Ávila e Torrevieja. Que em cada dia saibamos agradecer ao Senhor o grande dom da sua Palavra e do seu Amor.
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Dou as cordiais saudações de boas-vindas aos peregrinos provenientes da Polónia. Saúdo de maneira especial a delegação do Clube dos "Intelectuais Católicos" de Lubaczow e as autoridades locais das cidades e das municipalidades da região de Lubaczow. Muito obrigado pelo dom da união espiritual e pela vossa benevolência. Na Catequese de hoje reflectimos sobre o Salmo 147. O salmista, através da beleza das criaturas, alcança a contemplação da sabedoria, da bondade e da omnipotência de Deus. Em seguida, indica-nos Deus que age na História como Senhor dos tempos e Doador da paz. A admiração da criação e a percepção da presença de Deus nos acontecimentos conduzem ao encontro com o Verbo eterno, que em Cristo se tornou a última e plena revelação do desígnio salvífico do Criador.
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Saúdo cordialmente os peregrinos eslovacos de Mútne, como também o coro Melódia. Caros peregrinos, na próxima sexta-feira recordaremos Santa Maria Rainha. Como nos recomenda São Bernardo, voltemo-nos para Ela com confiança, em todas as nossas necessidades. Abençoo-vos com afecto.
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Saúdo cordialmente os peregrinos croatas aqui presentes. Caríssimos, ao confiar cada um de vós e as vossas famílias à intercessão da Bem-Aventurada Virgem Maria, invoco sobre todos a Bênção de Deus.
Louvados sejam Jesus e Maria.
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Saúdo os peregrinos de língua italiana, em particular as Irmãs Franciscanas da Caridade, que acabam de celebrar o seu Capítulo Geral. Caríssimas Irmãs, abençoo-vos de coração, a vós e ao vosso Instituto, a fim de que, fiéis ao carisma do Fundador, possais corresponder com renovado fervor à chamada divina.

Além disso, com afecto saúdo os jovens, os doentes e os novos casais. Lembrando a admirável figura de São Bernardo, abade e doutor da Igreja, cuja memória hoje celebramos, faço votos por que cada um progrida cada vez mais no amor a Deus, que dá plenitude de significado à juventude, ao sofrimento e à vida familiar.
Apelo do Papa, depois das notícias que chegaram de Bagdad e Jerusalém


"As trágicas notícias que nos chegam nestas horas de Bagdad e de Jerusalém não podem deixar de gerar profunda tristeza e unânime reprovação no nosso coração. Enquanto confiamos à misericórdia divina as pessoas que perderam a vida e imploramos o alívio para quem chora, rezemos ao Deus da paz para que a sabedoria prevaleça nos corações e os responsáveis dos governos saibam interromper esta funesta espiral de ódio e de violência".



PAPA JOÃO PAULO II

AUDIÊNCIA

Quarta-Feira 27 de agosto de 2003

Com o seu rosto sorridente e o olhar confiante

conquistou os fiéis de todo o mundo


1. No fim da tarde de sábado, 26 de Agosto de 1978, foi eleito Pontífice o meu venerado predecessor João Paulo I. Completaram-se ontem vinte e cinco anos depois daquele acontecimento.

Volto hoje àqueles momentos, que tive a alegria de viver com profunda comoção. Recordo como as suas palavras tocaram profundamente o coração do povo que enchia a Praça de São Pedro.

Desde a sua primeira aparição na varanda central da Basílica Vaticana, estabeleceu-se com os presentes uma corrente de simpatia espontânea. O seu rosto sorridente, o seu olhar confiante e aberto conquistaram o coração dos romanos e dos fiéis de todo o mundo.

Provinha da ilustre comunidade eclesial de Veneza, que já tinha dado à Igreja, no século XX, dois grandes Pontífices: São Pio X, do qual precisamente este ano comemoramos o centenário da eleição a Papa, e o Beato João XXIII, do qual recordámos em Junho o quadragésimo aniversário da morte.

2. "Abandonemo-nos confiantes à ajuda do Senhor", disse o novo Papa na sua primeira radiomensagem. Ele foi, em primeiro lugar, um mestre de fé límpida, sem ceder a modas transitórias e mundanas. Procurava adaptar os seus ensinamentos à sensibilidade do povo, mas conservava sempre, a clareza da doutrina e a coerência da sua aplicação à vida.

Mas qual era o segredo do seu fascínio, a não ser um contacto ininterrupto com o Senhor? "Tu o sabes. Contigo esforço-me por manter um diálogo contínuo", anotara num dos seus escritos a Jesus em forma de carta. "O mais importante é imitar e amar Cristo": eis a verdade que, transposta para a vida vivida, faz com que "cristianismo e alegria se conjuguem bem".

3. No dia seguinte à sua eleição, no Angelus de domingo 27 de Agosto, depois de ter recordado os seus predecessores, o novo Papa disse: "Eu não possuo nem a sapientia cordis do Papa João, nem a preparação e a cultura do Papa Paulo, mas estou no lugar deles. Devo esforçar-me por servir a Igreja".

Estava muito ligado com os dois Papas que o tinham precedido. Diante deles fazia-se pequenino, manifestando aquela humildade que para ele constituiu sempre a primeira regra de vida. Humildade e optimismo foram as características da sua existência. Precisamente graças a estes dotes ele deixou, durante a sua fugaz passagem entre nós, uma mensagem de esperança que encontrou acolhimento em tantos corações. "Ser optimistas apesar de tudo gostava de repetir a confiança em Deus deve ser o fulcro dos nossos pensamentos e das nossas acções". E observava com um realismo animado pela fé: "As principais personagens da nossa vida são duas: Deus e cada um de nós".

4. As suas palavras e a sua pessoa tinham penetrado no coração de todos, e por isso foi perturbadora a notícia da sua morte inesperada, que aconteceu na noite de 28 de Setembro de 1978. Apagou-se o sorriso de um Pastor próximo do povo que, com serenidade e equilíbrio, sabia dialogar com a cultura e com o mundo.

Os poucos discursos e escritos que nos deixou como Papa, enriquecem a grande recolha dos seus textos, que vinte e cinco anos depois da sua morte conservam uma actualidade surpreendente. Certa vez dissera: "O progresso com homens que se amem, considerando-se irmãos e filhos do único Pai e Deus, pode ser uma coisa maravilhosa. O progresso com homens que não reconhecem em Deus um único Pai, torna-se um perigo contínuo". Quanta variedade nestas suas palavras, úteis também para os homens do nosso tempo!

5. Que a humanidade saiba acolher uma admoestação tão sábia e apagar os numerosos focos de ódio e de violência presentes em tantas partes da terra, para construir na concórdia um mundo mais justo e solidário!

Por intercessão de Maria, da qual João Paulo I se professou sempre filho terno e devoto, peçamos ao Senhor para que acolha no seu reino de paz e de alegria este seu Servo fiel. Rezemos também para que os seus ensinamentos, que tocam as situações quotidianas concretas, sejam luz para os crentes e para cada pessoa de boa vontade.
***


Amados grupos de Odivelas, Milheirós de Poiares e Vila Longa e demais peregrinos de língua portuguesa, a todos saúdo agradecido pela vossa visita de hoje e pela vossa oração diária pelo Sucessor de Pedro. Possam irradiar a santidade de Cristo pelos caminhos da vida, nomeadamente no seio da vossa família e comunidade cristã, que de coração abençoo.

Saúdo cordialmente os peregrinos da Espanha e da América Latina, especialmente os do México, os grupos paroquiais espanhóis e a Irmandade de Lucena. Que o Senhor, pela maternal intercessão de Maria, a quem João Paulo I professou sempre filial devoção, nos conceda a graça de aprender os seus ensinamentos para apagar o ódio presente em muitos lugares da terra e construir um mundo mais justo e solidário.

Dirijo uma cordial saudação de boas-vindas aos peregrinos da Polónia e do mundo. Em especial, gostaria de saudar as famílias polacas emigradas, aqui reunidas com o Bispo D. Ryszard Karpinski. Deus vos abençoe, a vós e a todas as famílias polacas no mundo.

Além disso, saúdo os representantes da Milícia da Imaculada. É-me grato saber que, depois de oitenta e cinco anos de fundaçao, a vossa Sociedade ainda está a desenvolver-se, e que o cuidado pela salvaçao das almas, tao ardente no coraçao de Sao Maximiliano, continua a animar as vossas obras.

A Catequese de hoje foi dedicada r figura do Papa Joao Paulo I. De facto, ontem completaram-se 25 anos depois da sua eleiçao r Cátedra de Pedro. Também eu participei naquele conclave. Recordo o entao eleito Papa como mestre de fé simples e plena de dedicaçao, vivida segundo a regra: "O importante é imitar e amar Cristo". Seja esta a regra de vida de todos nós.

Saúdo-vos cordialmente, queridos peregrinos húngaros.
Nos próximos dias, terá início o novo ano lectivo. Que ele seja para a juventude uma ocasiao para se familiarizarem tanto com os tesouros intelectuais como com os espirituais. Ao formular-vos estes bons votos, concedo-vos de coraçao a Bençao Apostólica.

É com afecto que saúdo os grupos de peregrinos croatas, provenientes de Zagrábia, Velika e outras localidades.

Caríssimos, enquanto faço votos a fim de que esta peregrinaçao se torne para vós um novo impulso para um maior crescimento na fé e na esperança, concedo-vos a todos a Bençao Apostólica.
Dirijo-me agora aos peregrinos de língua italiana; especialmente a vós, queridas Delegadas aos Capítulos Gerais das Congregaçoes das Irmas Ursulinas de Maria Imaculada, de Placencia, e das Irmas Oblatas do Menino Jesus. Faço votos para que os trabalhos capitulares sejam para os vossos Institutos uma ocasiao de renovaçao espiritual e de relançamento missionário.

Dirijo-me com afecto a vós, queridos peregrinos da comunidade de Santo Arcanjo que, guiados pelo vosso Pastor diocesano, D. Francesco Nolé, pelo Presidente da Câmara Municipal e demais autoridades civis, trouxestes, para eu benzer, as renovadas coroas do Menino Jesus e de Nossa Senhora, venerada na vossa Diocese de Tursi-Lagonegro com o título de Santa Maria de Orsoleo.
Depois, recebo-vos com alegria a vós, queridos participantes no encontro nacional de estudo e de actualizaçao sobre a deficiencia auditiva, organizado pela Associaçao Italiana dos Educadores dos Surdos, por ocasiao do Ano Europeu dos Portadores de Deficiencia.

Por fim, como de costume, é a vós, queridos jovens, doentes e novos casais, que dirijo o meu pensamento. O exemplo de Santa Mónica, que recordamos hoje, e do seu filho Santo Agostinho, que celebraremos amanha, vos ajudem a olhar com indómita confiança para Cristo, luz na dificuldade, apoio nas provaçoes e guia em todos os momentos da vida. A todos a minha Bençao.









PAPA JOÃO PAULO II


AUDIÊNCIA


Quarta-Feira 3 de setembro de 2003

Louvor ao Senhor Criador





1. O cântico que acaba de nos ser proposto é o cântico de um homem fiel a Deus. Trata-se do Salmo 91 que, como sugere o título da composição, era usado pela tradição judaica "para o dia do sábado" (v. 1). O hino abre com um amplo apelo a celebrar e a louvar o Senhor com o canto e a música (cfr. vv. 2-4). É um movimento de oração que parece nunca ser interrompido, porque o amor divino deve ser exaltado de manhã, quando se começa o dia, mas deve ser também proclamado durante o dia e no decurso das horas nocturnas (cfr. v. 3). Até a referência aos instrumentos musicais, que o salmista faz no convite da introdução, levou Santo Agostinho a esta meditação no interior da sua Exposição sobre o Salmo 91: "Que significa, irmãos, aclamar com o saltério? O saltério é um instrumento musical dotado de cordas. O nosso saltério é o nosso trabalho. Todo aquele que, com as mãos, realiza obras boas, aclama a Deus com o saltério. Todo aquele que proclama Deus com a boca, canta a Deus. Canta com a boca! Salmodia com as obras!... Mas, então, quem são aqueles que cantam? Aqueles que realizam o bem com alegria. O canto, de facto, é sinal de alegria. Que diz o Apóstolo? "Deus ama o que dá com alegria (2Co 9,7). Qualquer coisa que tu faças, fá-la com alegria. Então, faz o bem e fá-lo bem. Se, ao contrário, trabalhas com tristeza, mesmo que por teu intermédio se faça o bem, não és tu a fazê-lo: diriges o saltério, não cantas". (Esposizioni sui Salmi, III, Roma,1976, PP 192-195).

2. Através das palavras de Santo Agostinho podemos entrar no coração da nossa reflexão e enfrentar o tema fundamental do Salmo: o do bem e do mal. Um e outro são avaliados por Deus justo e santo, "o eternamente excelso"(v.9), Aquele que é eterno e infinito, a que não foge nenhuma das acções do homem.

Confrontam-se, assim, de modo renovado, dois comportamentos opostos. A conduta do fiel é dedicada a celebrar as obras divinas, a penetrar na profundidade dos pensamentos do Senhor e, por este caminho, a sua vida irradia luz e alegria (cfr. vv. 5-6). Pelo contrário, o homem perverso é descrito na sua insensatez, incapaz como é de compreender o secreto sentido das vicissitudes humanas. A sorte momentânea torna-o arrogante, mas na realidade, ele é intimamente frágil e está votado, depois de um sucesso efémero, à queda e à ruína (cfr. vv. 7-8), O Salmista, seguindo um modelo interpretativo caro ao Antigo Testamento, o da retribuição, está convencido de que Deus recompensará os justos já neste mundo, dando-lhes uma velhice feliz (cfr. v. 15) e depressa castigará os maus.

Na realidade, como afirmará Job e Jesus ensinará, a história não é interpretável tão linearmente. A visão do salmista torna-se, por isso, uma súplica ao Deus justo e "excelso" (cfr. v. 9), para que entre na série dos acontecimentos humanos para os julgar, fazendo resplandecer o bem.

3. O contraste entre o justo e o ímpio é, depois, retomado pelo orante. Por um lado, eis os "inimigos" do Senhor, os "malfeitores", mais uma vez votados à dispersão e à derrota. (cfr. v. 10). Por outro, os fiéis aparecem em todo o seu esplendor, incarnados pelo Salmista que se descreve a si mesmo com imagens pitorescas, extraídas da simbologia oriental.

O justo tem a força irresistível de um búfalo e está pronto para desafiar qualquer adversidade; a sua fronte gloriosa está consagrada com o óleo da protecção divina, que se torna semelhante a um escudo, que defende o eleito tornando-o seguro. (cfr. v. 11). Do alto do seu poder e da sua segurança, o orante vê os iníquos a precipitarem-se no abismo da sua ruína (cfr. v. 12).
O Salmo 91 inspira, pois, felicidade, confiança e optimismo: dons que devemos pedir a Deus também no nosso tempo, em que se insinua facilmente a tentação da desconfiança e até do desespero.
4. O nosso hino, na esteira da profunda serenidade que o invade, lança no final um olhar sobre os dias da velhice dos justos e prevê-os igualmente serenos. Mesmo quando estes dias chegarem, o espírito do orante estará ainda vivaz, alegre e operoso (cfr. v. 15). Ele sente-se semelhante às palmeiras e aos cedros, que estão plantados nos átrios do templo de Sião (cfr. vv. 13-14).

As raízes do justo fundamentam-se no próprio Deus de quem recebe a linfa da graça divina. A vida do Senhor alimenta-o e transforma-o, tornando-o florido e viçoso, isto é, em posição de dar aos outros e de testemunhar a própria fé. As últimas palavras do Salmista, nesta descrição de uma existência justa e operosa e de uma velhice intensa e activa, estão, de facto, ligadas ao anúncio da perene fidelidade do Senhor (cfr. v. 16). Poderemos, por isso, concluir agora com a proclamação do canto que sobe ao Deus glorioso no último Livro da Bíblia, o Apocalipse: um livro de luta terrível entre o bem e o mal, mas também de esperança na vitória final de Cristo: "grandes e maravilhosas são as Tuas obras, Senhor Deus, Todo-Poderoso! Justos e verdadeiros são os Teus caminhos, ó Rei das nações... Porque só Tu és santo e todas as nações virão prostrar-se diante de Ti, pois os Teus juízos foram manifestados. Justo és Tu, Ó Senhor, que és e que eras, e és Santo, por assim teres feito justiça. Sim, Senhor, Deus Todo-Poderoso, os Teus juízos são verdadeiros e justos" (15, 3-4; 16, 5. 7).



Saudações

Queridos Irmãos e Irmãs

Amados peregrinos vindos do Brasil e de outros países de língua portuguesa, dou-vos as boas-vindas e faço votos de que esta vossa peregrinação e encontro com o Sucessor de Pedro vos sirva de estímulo para um testemunho cristão sempre mais generoso e fecundo na vossa Pátria. Sei que Deus não vos faltará com a luz consoladora da sua presença.

Saúdo cordialmente os peregrinos da Espanha e da América Latina, em especial uma Associação de Empregados de León, os paroquianos de São Lázaro de Zamora e o Colégio Francês de Santiago do Chile. Demos sempre graças ao Senhor pelos seus dons, sobretudo pela sua grande misericórdia.

Saúdo com afecto os meus compatriotas. "É bom louvar o Senhor e cantar salmos ao Vosso nome, ó Altíssimo" (Ps 91,2) é com estas palavras que se inicia o Salmo 91, sobre o qual reflectimos na Catequese de hoje. Este Salmo constitui um convite à oração de louvor. É o género de oração, em que o homem que experimentou o amor de Deus deseja responder com todo o coração. É como um êxtase espiritual que nasce do enlevo diante do amor infinito do Criador pela criatura.

Aprendamos continuamente esta oração, a fim de termos a alegria de que o Salmista escreve: "Porque Vós me alegrais, Senhor, com as vossas obras, exulto com as obras das vossas mãos" (Ps 91,5). Louvado seja Jesus Cristo!

Dou as minhas calorosas boas-vindas a todos os peregrinos e visitantes de língua inglesa, presentes na Audiência de hoje, especialmente aos que vieram da Índia, do Japão e dos Estados Unidos da América. Sobre todos vós, invoco cordialmente a alegria e a paz em nosso Senhor Jesus Cristo.

Uma cordial saudação de boas-vindas aos peregrinos provenientes de Praga e arredores.
Possa esta peregrinação a Roma revigorar a vossa fé e fazer crescer em vós o desejo de perfeição espiritual. Com estes votos, abençoo-vos a todos de bom grado. Louvado seja Jesus Cristo!

Dirijo uma cordial saudação aos peregrinos de língua italiana. Em especial, saúdo as Filhas de Maria Auxiliadora, as Irmãs de Santa Ana, os numerosos participantes no encontro promovido pelas Associações Cristãs dos Trabalhadores e o numeroso grupo de Escuteiros de Battipaglia.

Por fim, saúdo os jovens, os doentes e os novos casais. Caros jovens, retomando as habituais actividades diárias depois do período de férias, sede testemunhas de esperança e de paz em todas as circunstâncias. Vós, queridos doentes, buscai conforto no Senhor sofredor, que continua a sua obra de redenção na vida de cada homem. E vós, queridos novos casais, tornai o vosso amor ao próximo cada vez mais verdadeiro e solidário.

Agora gostaria de recordar, juntamente convosco, o nosso caro irmão Costantino Marchionni, que faleceu na segunda-feira passada, durante o trabalho na Praça de São Pedro. Elevemos ao Senhor a nossa oração por ele e por quantos o choram, assim como por todas as vítimas de acidentes de trabalho. Requiem aeternam dona eis, Domine!




AUDIÊNCIAS 2003