DIscursos João Paulo II 2004

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR ARMANDO LUNA SILVA


NOVO EMBAIXADOR DA REPÚBLICA DA NICARÁGUA


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Sábado, 13 de Março de 2004




Senhor Embaixador

1. É com grande prazer que o recebo neste solene acto em que Vossa Excelência me apresenta as Cartas Credenciais que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República da Nicarágua junto da Santa Sé, ao mesmo tempo que lhe transmito as minhas cordiais boas-vindas no momento em que dá início à importante missão que o seu governo lhe confiou. Agradeço-lhe as suas atenciosas palavras, assim como a saudação que me transmitiu da parte do Senhor Presidente da República, Eng. Enrique Bolaños, a quem retribuo, renovando-lhe os meus melhores votos pela sua pessoa e pela sua alta responsabilidade.

Senhor Embaixador, peço-lhe que se faça porta-voz do meu afecto e da minha proximidade ao querido povo da Nicarágua, que tive a felicidade de visitar em duas ocasiões. Recordo de modo especial o memorável dia 7 de Fevereiro de 1996, em que os nicaraguenses puderam de facto encontrar-se com o Sucessor do Apóstolo Pedro, para lhe manifestar livremente a sua adesão e o seu carinho.

2. Nas duas visitas que realizei ao seu país, pude comprovar que os nicaraguenses são um povo alegre e dinâmico, com profundas raízes cristãs e desejosos de um porvir sereno, em que todos possam ser beneficiários de um desenvolvimento constante. Todavia, ao longo da história, ele passou por muitas provações. Às calamidades naturais, como terremotos e furacões, acrescentaram-se anos de dificuldades sociais e problemas internos, que levaram muitos dos seus habitantes a viver em situações de dificuldade e pobreza, com os flagelos que isto gera em todos os sectores: entre outros, a desintegração familiar, a falta de acesso à educação e os problemas de subsistência e de cuidado no campo da saúde.

Contudo, Senhor Embaixador, existem motivos para uma abertura à esperança num futuro melhor. Observa-se uma maior solidariedade, não apenas por parte das nações amigas mas, em primeiro lugar, por parte dos próprios cidadãos, conscientes da necessidade de participação. São eles que devem trabalhar com afinco e impulso para melhorar a sua pátria. São bem conhecidos a laboriosidade, o vigor moral e o espírito de sacrifício dos nicaraguenses diante das adversidades.

Eles demonstraram isto muitas vezes. Embora seja verdade que, por vezes, as ajudas externas são necessárias, é necessário ter presente que os próprios nicaraguenses, com as excelentes qualidades que os caracterizam, devem ser os protagonistas e artífices principais da construção quotidiana do país, comprometendo-se com afã e impulso na superação das situações difíceis, muitas vezes agravadas pela pobreza extrema de muitas pessoas, pelo desemprego ou pela falta de uma subsistênca digna.

Na Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 1998, eu dizia: "As situações de pobreza extrema, em qualquer lugar que se manifestem, constituem a primeira injustiça. A sua eliminação deve representar para todos uma prioridade tanto no âmbito nacional como no internacional" (n. 5). A este propósito, desejo animar os esforços empreendidos pelo Governo, para enfrentar este mal que não pode considerar-se endémico, mas como o resultado de uma série de factores que se devem resolver com determinação e entusiasmo, de forma a poder melhorar verdadeiramente a qualidade de vida dos nicaraguenses. Tais esforços, unidos aos da comunidade internacional cuja assistência deve ser bem administrada, com uma gestão transparente, honesta e eficaz são pressupostos imprescindíveis para construir uma sociedade pacífica, justa e solidária, que corresponda autenticamente aos anseios dos nicaraguenses e esteja em sintonia com as suas tradições.

Nesta luta contra a pobreza, é também um facto importante a erradição da corrupção, que impede o justo desenvolvimento social e político de muitos povos.

3. Apraz-me saber que as Autoridades do seu país têm o propósito firme de lançar fundamentos sólidos que hão-de permitir a instauração de uma ordem social mais justa e participativa, revigorando a democracia e as estruturas públicas, e também promovendo um sistema educativo que favoreça o sentido cívico dos cidadãos e o respeito da legalidade. Para construir uma sociedade mais justa e fraterna, serão úteis as orientações da doutrina social católica e os ensinamentos morais da Igreja, valores dignos de ser tomados em consideração pelas pessoas que desempenham as suas actividades ao serviço da nação. Não se pode caminhar rumo a uma paz social verdadeira, sem uma ordem em que as liberdades dos indivíduos sejam cada vez mais sólidas e, ao mesmo tempo, sem estimular também a confiança dos cidadãos nas instituições públicas, em vista de uma colaboração mais activa e de uma participação responsável de todos em benefício do bem comum.

4. Os Bispos, juntamente com o seu presbitério e as diferentes comunidades religiosas presentes na Nicarágua, desempenham a sua missão de evangelização e santificação, que é própria do seu ministério. Neste sentido, as Autoridades do seu país podem continuar a contar com a colaboração leal dos Pastores da Igreja e de todos os fiéis católicos, nos campos específicos da sua actividade, para que seja mais viva em cada um a responsabilidade em vista de tornar mais favoráveis as condições de vida para todos (cf. Gaudium et spes, GS 57), pois o serviço integral ao homem faz também parte da missão eclesial. A Igreja local procura fomentar a reconciliação e favorecer o desenvolvimento de uma sociedade mais democrática, oferecendo a sua colaboração para que os valores como a justiça e a solidariedade, o respeito pelo Direito e o Amor pela verdade estejam sempre presentes na vida dos nicaraguenses.

5. Senhor Embaixador, antes de concluir este acto, desejo formular-lhe os meus melhores votos para que seja muito fecunda a missão a que hoje Vossa Excelência dá início. Peço-lhe que se faça intérprete dos meus sentimentos e esperanças diante do Senhor Presidente e das demais Autoridades da República, enquanto invoco as abundantes Bênçãos do Altíssimo sobre Vossa Excelência, a sua ilustre família e os seus colaboradores, assim como sobre todos os filhos da nobre nação nicaraguense, que confio à constante intercessão maternal da Virgem Maria, tão venerada na sua defesa da Puríssima Conceição.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NA ASSEMBLEIA PLENÁRIA


DO PONTIFÍCIO CONSELHO PARA A CULTURA


Sábado, 13 de Março de 2004




Senhores Cardeais
Queridos Irmãos no Episcopado
e estimados Membros do Pontifício Conselho para a Cultura!

1. É com alegria que vos recebo, no final da vossa Assembleia plenária consagrada à reflexão sobre a fé cristã no alvorecer do novo milénio e o desafio da não-crença e da indiferença religiosa. Agradeço ao Cardeal Poupard as suas palavras. O desafio sobre o qual os vossos trabalhos se debruçaram constitui uma preocupação fundamental da Igreja em todos os continentes.

2. Em relação com as Igrejas locais, vós desenhais uma nova geografia da não-crença e da indiferença religiosa através do mundo, verificando uma ruptura do processo de transmissão da fé e dos valores cristãos. Ao mesmo tempo, verifica-se a busca de sentido dos nossos contemporâneos, cujos fenómenos culturais dão testemunho disso, sobretudo nos novos movimentos religiosos muito presentes na América do Sul, na África e na Ásia: todos os homens desejam compreender o sentido profundo da sua existência, responder às questões fundamentais da origem e do fim da vida, e encaminhar-se rumo ao bem-estar a que aspira. Além das crises de civilização, dos relativismos filosóficos e morais, compete aos pastores e aos fiéis assinalar e tomar em consideração os interrogativos e as aspirações fundamentais dos homens do nosso tempo, para entrar em diálogo com as pessoas e os povos, e para propor, de maneira original e inculturada, a mensagem evangélica e a pessoa de Cristo Redentor. Às expressões culturais e artísticas não faltam riquezas e recursos para transmitir a mensagem cristã. Contudo, é preciso conhecê-las para ser os seus vectores e para as poder ler e compreender.

No momento em que a Europa descobre vínculos fortes, é preciso apoiar o mundo da cultura, das artes e das letras, para que ele contribua para a edificação de uma sociedade que não esteja mais fundada no materialismo, mas sim, em valores morais e espirituais.

3. A difusão das ideologias nos diferentes campos da sociedade interpela os cristãos a um novo despertar no campo intelectual, a fim de propor reflexões vigorosas que façam com que os jovens descubram a verdade acerca do homem e de Deus, convidando-os a penetrar numa inteligência da fé cada vez mais pura. Mediante a formação filosófica e catequética os jovens saberão discernir a verdade. Um procedimento racional sério constitui um baluarte contra tudo o que diz respeito às ideologias; ele faz descobrir o gosto de aprofundar sempre as questões, para que a filosofia e a razão se abram a Cristo; isto verificou-se em todos os períodos da história da Igreja, principalmente durante o período patrístico, no qual a cultura cristã nascente soube entrar em diálogo com as outras culturas, sobretudo com as culturas grega e latina. Uma tal reflexão constituirá também um convite a passar do procedimento racional ao espiritual, para chegar a um encontro pessoal com Cristo e para edificar o ser interior.

4. Por conseguinte, compete-vos discernir as grandes mudanças culturais e os seus aspectos positivos, a fim de ajudar os pastores a dar-lhes respostas apropriadas, para abrir o homem à novidade da Palavra de Cristo. No final do nosso encontro, expresso-vos a minha gratidão pela vossa colaboração e, ao confiar-vos à Virgem Maria, concedo-vos uma afectuosa Bênção Apostólica.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


NA COMEMORAÇÃO DO CENTENÁRIO


DA INAUGURAÇÃO DO MONUMENTO


A CRISTO DOS ANDES




Ao Senhor Cardeal Francisco Javier ERRÁZURIZ OSSA
Arcebispo de Santiago e Presidente da Conferência Episcopal do Chile
e a D. Eduardo Vicente MIRÁS
Arcebispo de Rosário e Presidente da Conferência Episcopal da Argentina

1. Por ocasião da solene comemoração do centenário da inauguração do monumento a Cristo dos Andes, é-me grato transmitir uma carinhosa saudação aos Cardeais e Prelados da Argentina e do Chile, assim como às altas Autoridades e aos demais participantes neste significativo acto, que evoca acontecimentos decisivos na história de ambos os países e manifesta os valores fundamentais e profundas raízes cristãs, sobre os quais se fundamentam a identidade e a convivência dos seus povos, expressando ao mesmo tempo o propósito determinado de confirmar cada dia mais o compromisso de continuar a percorrer sempre o caminho da paz.

2. Com efeito, se a colocação do monumento majestoso nessa época exigiu um recurso notável a meios e a uma colaboração íntima entre numerosas pessoas e instituições, não foram menores os esforços levados a cabo anteriormente, para dar um significado àquele gesto. Nos anos precedentes, concluíram-se vários acordos para resolver através de meios pacíficos as várias contendas entre ambos os povos, até chegar aos quatro tratados de paz definitivos, em 1902.

Obteve-se a melhor das vitórias e demonstrou-se a verdadeira fortaleza do ser humano, assim como a grandeza autêntica das nações. Da ameaça de conflito, passou-se à convivência amistosa entre os países vizinhos e irmãos. O júbilo e a satisfação eram bem justificados, pois foi alcançado o triunfo inestimável da paz.

3. O profundo espírito de fé dos argentinos e dos chilenos reconheceu naqueles acontecimentos um precioso dom de Deus, que "abençoa o seu povo com a paz" (Ps 29 [28], 11), e desejou plasmar a sua gratidão nos píncaros andinos, para que a bênção divina chegasse do alto a todas as terras irmãs e fizesse dos confins um lugar de encontro e nunca de antagonismo.

A partir de então, a figura de Cristo Redentor convida a repetir, com o salmista, a oração incessante de quem depositou toda a sua confiança nele: "Que os montes tragam a paz, e as colinas a justiça" (Ps 72 [71], 3). Com efeito, a paz na terra, "aspiração suprema de toda a humanidade ao longo da história", é uma tarefa permanente, que jamais se pode considerar concluída e que requer sempre a ajuda divina, juntamente com a sensatez e a experiência (cf. Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2003, nn. 1 e 9).

4. No acto de inauguração foram pronunciadas palavras solenes, que permaneceram gravadas nos pés do monumento como uma recordação perene para a posteridade, de um compromisso inquebrantável: "Desmoronarão estas montanhas, antes que se interrompa a paz entre chilenos e argentinos". De que serviria a beleza dos píncaros majestosos e a riqueza dos vales fecundos, se sobre a terra em que o Criador o pôs, o homem não cultivasse também laços de convivência e de paz?

As palavras de então recordam aos cidadãos e às Autoridades contemporâneas a necessidade de dar continuidade aos esforços em vista de consolidar, mediante a promoção incessante de uma cultura de paz e de gestos significativos que façam prevalecer, sobre qualquer outra alternativa, os vínculos de concórdia e de amizade, o caminho do diálogo leal e o respeito pelo direito.

No início do terceiro milénio, em que não faltam novas ameaças à paz, desejo convidar os queridos filhos e filhas da Argentina e do Chile, na comemoração deste centenário, a fim de que voltem o seu olhar para o Redentor, implorando-lhe a luz e a força necessárias para enfrentar com esperança e determinação os desafios do tempo presente. Uno-me espiritualmente ao júbilo da celebração e, sobretudo, à sua oração, para que se aperfeiçoem a convivência fraternal, os âmbitos de colaboração mútua e o compromisso irrenunciável de construir uma sociedade fundamentada, acima de tudo, no reconhecimento da dignidade inalienável da pessoa humana. Assim, garantir-se-á a paz e transmitir-se-á às novas gerações uma herança que lhes há-de permitir construir um futuro melhor, assente sobre bases sólidas e duradouras.

Peço de coração a Cristo Redentor, que continue a acompanhar as nobres nações da Argentina e do Chile com a sua protecção, orientando-as ao longo do caminho da paz e alentando os seus esforços em ordem a alcançar metas cada vez mais elevadas de prosperidade e de vivência dos valores espirituais. Com estes sentimentos, concedo-vos a minha Bênção.

Vaticano, 11 de Fevereiro de 2004.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


NA VIGÍLIA MARIANA EM VISTA DA REALIZAÇÃO


DO SEGUNDO DIA EUROPEU DOS UNIVERSITÁRIOS


13 de Março de 2004






Caríssimos jovens universitários

1. Para mim, é motivo de especial alegria encontrar-me convosco, por ocasião do Segundo Dia Europeu dos Universistários. A cada um de vós, que provindes de diversos Ateneus de Roma e de outras cidades italianas, agradeço a vossa presença rica de entusiasmo. Saúdo o Cardeal Vigário e as Autoridades civis e académicas aqui presentes.

Transmito um "obrigado" sincero a Mons. Leuzzi e a quantos colaboraram na preparação deste acontecimento, ao Coro e à Orquestra interuniversitários que o animaram, ao Centro Televisivo do Vaticano e à Rádio Vaticano, que tornaram possível a difusão em várias nações europeias.

É com imenso afecto que faço a minha saudação extensiva aos jovens ligados connosco via satélite, de Praga (República Checa), Nicósia (Chipre), Gniezno (Polónia), Vilnius (Lituânia), Riga (Letónia), Talim (Estónia), Liubliana (Eslovénia), Budapeste (Hungria), La Valeta (Malta) e Bratislava (Eslováquia). Trata-se dos dez países que entrarão na União Europeia.

2. Esta vigília mariana reveste um forte valor simbólico. Com efeito, também a vós, queridos universitários, é confiado um papel importante na construção da Europa unida, solidamente arraigada nas tradições e nos valores espirituais que a modelaram. A este propósito, a universidade é um dos âmbitos típicos em que, ao longo dos séculos, se forjou aquela cultura que conheceu uma influência cristã caracterizadora. É necessário que este rico património de ideais não se perca.
Maria, que invocámos numerosas vezes como Sedes Sapientiae, proteja cada um de vós, os vossos estudos e o vosso compromisso de formação cultural e espiritual.

3. Vós, caros jovens de Roma, carregando a Cruz ireis daqui a pouco até à igreja de Santa Inês "in Agone", onde renovareis em conjunto a profissão de fé. A esta peregrinação unem-se idealmente os universitários dos outros países, a quem transmito a minha cordial saudação.

Saudações

Saúdo-vos agora a vós, caros jovens universitários de Praga, na República Checa!

Uma saudação a vós, dilectos universitários de Nicósia, em Chipre!

A vós, queridos universitários de Gniezno, na Polónia, dirijo o meu cordial pensamento!

Saúdo-vos a vós, jovens universitários de Vilnius, na Lituânia!

Penso com afecto em vós estimados universitários de Riga, na Letónia!

Torno o meu pensamento a vós, prezados universitários de Talim, na Estónia!

Chegue inclusivamente a vós, amados universitários de Liubliana, na Eslovénia, a minha saudação!

E não me esqueço de vós, caríssimos universitários de Budapeste, na Hungria!

Cumprimento-vos afectuosamente a vós, caros jovens de La Valeta, em Malta!

Termino, saudando- vos a vós, dilectos universitários de Bratislava, na Eslováquia!

A todos vós aqui presentes e a quantos se encontram unidos a nós através da rádio e da televisão, concedo uma especial Bênção que, de bom grado, faço extensiva às vossas Nações e à Europa inteira.



SAUDAÇÃO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS CAPITÃES REGENTES


DA REPÚBLICA DE SÃO MARINHO


Segunda-feira, 15 de Março de 2004




Senhores Capitães Regentes

Estou feliz por vos apresentar as minhas cordiais boas-vindas, nesta circunstância em que a mais alta Magistratura da República do Titã deseja confirmar os vínculos seculares existentes entre os povos por ela representados e o Sucessor de Pedro. Enquanto agradeço as amáveis expressões com que destes voz aos vossos compatriotas, peço-vos que vos façais intérpretes dos meus cordiais sentimentos de proximidade de um povo antigo, que fez da liberdade, da honestidade e da laboriosidade não só um programa de vida, mas o próprio fundamento da própria existência civil.

O monge Marinho, vosso Fundador e, de certa forma, precursor da ideia da Europa dos povos, relegou-vos valores e instituições que, à distância de mais de mil e setecentos anos, ainda hoje manifestam a sua actualidade e vitalidade. Eles resumem-se no lema, que distingue o vosso País: libertas. A antiga República, que hoje e aqui vós representais dignamente, encontra as suas razões fundantes nas raízes cristãs que enobreceram a história da Europa. Estou convicto de que, também no futuro, a vossa República, programando as suas iniciativas, continuará a inspirar-se nestes critérios éticos justos, que fizeram dela um exemplo de administração correcta do bem comum.

Enquanto renovo a expressão do meu afecto, que os vossos povos já conhecem desde o início do meu Pontificado quando, em Agosto de 1982, tive a possibilidade de subir ao Titã, formulo votos a fim de que a Sereníssima República de São Marinho continue a dar testemunho do seu património milenário de valores na assembleia das nações. É com estes pensamentos que vos concedo, a vós, aos vossos entes queridos e aos vossos compatriotas a minha afectuosa Bênção.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À COMUNIDADE DO SEMINÁRIO DIOCESANO


"REDEMPTORIS MATER"


Quinta-feira, 18 de Março de 2004




"Ide pelo mundo inteiro, proclamai o Evangelho a toda a criatura" (Mc 16,15).

1. Caríssimos Superiores e alunos do Seminário diocesano "Redemptoris Mater", sinto-me feliz em vos receber com estas palavras de Jesus ressuscitado, que vós ouvis e meditais na Festa dos Santos Cirilo e Metódio, aniversário da erecção canónica do vosso Seminário.

Saúdo em primeiro lugar o Cardeal Vigário e agradeço-lhe as palavras que me dirigiu. Saúdo com afecto o vosso Reitor, Mons. Claudiano Strazzari, os outros Superiores e formadores, e cada um de vós, caríssimos alunos.

2. Já transcorreram mais de dezasseis anos depois do início do vosso Seminário, que representou uma experiência nova e bastante significativa, em vista da formação de presbíteros para a nova evangelização. Desde então surgiram no mundo outros Seminários "Redemptoris Mater", que se inspiram no vosso modelo e partilham as vossas finalidades.

Particularmente abundantes são os frutos de bem dados ao longo destes anos pelo vosso Seminário. Por eles dou graças ao Senhor. Pelos mesmos frutos desejo, além disso, agradecer o Caminho Neocatecumenal, no qual as vossas vocações nasceram e cresceram. Agradeço também ao Reitor e aos vossos Superiores que, sob a orientação solícita do Cardeal Vigário, presidem com amor e sabedoria à vossa preparação para o sacerdócio.

Além disso, o meu pensamento grato dirige-se aos Fundadores do Caminho, aos quais se deve a feliz intuição de propor a erecção do vosso Seminário e que tanto se prodigalizaram para favorecer no próprio Caminho o nascimento de vocações para o sacerdócio e para a vida consagrada.

Depois, desejo recordar convosco os Bispos, D. Giulio Salimei e D. Maximino Romero, que um como Reitor, e o outro como Padre Espiritual contribuíram em grande medida, com a sua iluminada dedicação e exemplo de vida, para o desenvolvimento inicial e para a feliz configuração do "Redemptoris Mater".

Apraz-me também realçar como já recordou o Cardeal Vigário que nestes dezasseis anos se formaram no vosso Seminário um elevado número de sacerdotes zelosos, oportunamente dedicados em parte ao serviço pastoral na Diocese de Roma e em parte à missão em todas as partes do mundo, como sacerdotes "fidei donum".

3. Para obter estes resultados positivos é fundamental ter sempre claras, no vosso itinerário formativo, a natureza e as características do sacerdócio ministerial, como são ilustradas pelo Concílio Vaticano II e depois pela Exortação apostólica pós-sinodal Pastores dabo vobis.

De facto, o sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial estão ordenados um para o outro e intimamente relacionados, participando ambos, cada um do próprio modo, no único sacerdócio de Cristo. Contudo, diferem essencialmente e não só de grau (cf. Lumen gentium, LG 10). Com efeito, em virtude do sacramento da Ordem os presbíteros são configurados de modo especial a Jesus Cristo como Cabeça e Pastor do seu povo e ao serviço deste povo devem à semelhança de Cristo dispender e oferecer a sua vida. Precisamente porque representam sacramentalmente Jesus Cristo Cabeça e Pastor, estão por conseguinte chamados a presidir, em estreita comunhão com o Bispo, as comunidades que lhe estão confiadas, segundo cada uma das três dimensões profética, sacerdotal e real na qual se desenrola a única missão de Cristo e da Igreja (cf. Pastores dabo vobis PDV 12,16).

Caríssimos seminaristas, atendo-vos a esta sólida doutrina na vossa formação e depois no exercício quotidiano do ministério presbiteral podereis viver jubilosamente a graça do sacerdócio e garantir um serviço autêntico e fecundo à Diocese de Roma e às Igrejas irmãs para as quais sereis enviados.

A oração, o estudo, a vida comunitária, bem harmonizados no projecto formativo e postos em prática com fidelidade e generosidade na existência concreta do vosso Seminário, são os caminhos através dos quais o Senhor modela em vós, dia após dia, a imagem de Cristo Bom Pastor.

4. Sobre estas bases podereis preparar-vos para viver quando fordes sacerdotes, de modo sereno e proveitoso a vossa pertença constitutiva e sem reservas ao presbitério diocesano, que tem no Bispo o seu ponto de referência fundamental, e ao mesmo tempo, o vínculo profundo que vos une à experiência do Caminho Neocatecumenal. Com efeito, como está escrito no art. 18 do Estatuto do Caminho, nos Seminários diocesanos e missionários "Redemptoris Mater", "os candidatos ao sacerdócio encontram na participação no Caminho Neocatecumenal um elemento específico e basilar do caminho formativo e, ao mesmo tempo, são preparados para a genuína escolha presbiteral de serviço a todo o povo de Deus, na comunhão fraterna do presbitério". É preciso também evitar uma falsa alternativa entre o serviço pastoral na Diocese a que pertence e a missão universal, até aos extremos confins da terra, que se radica na própria participação sacramental no sacerdócio de Cristo (cf. Pastores dabo vobis PDV 17-18) para o qual vós estais preparados de maneira particular, através da experiência do Caminho Neocatecumenal.

De facto, compete ao Bispo estabelecer o vosso destino concreto, o qual tem a responsabilidade pelas necessidades da própria Diocese e pelas exigências da missão universal. Recomendando-vos em atitude de obediência confiante e cordial às suas decisões, encontrareis a vossa paz e serenidade interior e podereis em qualquer caso exprimir o vosso carisma missionário, visto que também aqui em Roma a pastoral é, e deverá ser cada vez mais, caracterizada pela prioridade da evangelização.

5. Caríssimos Superiores e alunos do Seminário "Redemptoris Mater" de Roma, considerai sempre com o olhar da fé a vossa vida, a vossa vocação e a vossa missão. No final deste encontro desejo manifestar-vos de novo o afecto e a confiança que sinto por vós e garantir-vos a minha constante oração por cada um de vós, por todo o Seminário, pelas comunidades do Caminho Neocatecumenal e sobretudo pelas vocações para o sacerdócio que se maturam nele.

Com estes sentimentos concedo-vos a todos e quantos vos são queridos a Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO CONGRESSO PROMOVIDO


PELA FIAMC E PELA PONTIFÍCIA ACADEMIA PARA A VIDA


Sábado, 20 de Março de 2004




Ilustres Senhores e Senhoras!

1. Saúdo muito cordialmente todos vós, participantes no Congresso Internacional "Life-Sustaining Treatments and Vegetative State: Scientific Advances and Ethical Dilemmas". Desejo dirigir uma saudação particular a Mons. Elio Sgreccia, Vice-Presidente da Pontifícia Academia para a Vida, e ao Professor Gian Luigi Gigli, Presidente da Federação Internacional das Associações dos Médicos Católicos e generoso defensor do valor fundamental da vida, que se fez amavelmente intérprete dos sentimentos comuns.

Este importante Congresso, organizado ao mesmo tempo pela Pontifícia Academia para a Vida e pela Federação Internacional das Associações dos Médicos Católicos, está a enfrentar um tema de grande importância: a clonagem clínica denominada "estado vegetativo". As consequências científicas, éticas, sociais e pastorais desta condição necessitam de uma profunda reflexão e de um proveitoso diálogo interdisciplinar, como demonstra o denso e pormenorizado programa dos vossos trabalhos.

2. A Igreja encoraja, com profunda estima e sincera esperança, os esforços dos homens de ciência que dedicam quotidianamente, por vezes com grandes sacrifícios, o seu empenho de estudo e de pesquisa ao melhoramento das possibilidades diagnósticas, terapêuticas, prognósticas e reabilitativas em relação a estes doentes confiados totalmente a quem os cura e os assiste. Com efeito, a pessoa em estado vegetativo não dá algum sinal evidente de consciência de si ou de conhecimento do ambiente e parece ser incapaz de interagir com os outros ou de reagir a estímulos adequados.

Os estudiosos sentem que é necessário, antes de mais, chegar a uma diagnose correcta, que normalmente exige uma longa e atenta observação em centros especializados, tendo em consideração também o elevado número de erros diagnósticos referidos na literatura. Depois, muitas destas pessoas, com curas apropriadas ou com programas de reabilitação específicos, são capazes de sair do estado vegetativo. Muitos, pelo contrário, permanecem infelizmente prisioneiros do seu estado durante períodos muito longos e sem precisar dos suportes tecnológicos.

De modo particular, para indicar a condição daqueles cujo "estado vegetativo" se prolonga por mais de um ano, foi cunhado o termo de estado vegetativo permanente. Na realidade, a esta definição não corresponde uma diagnose diferente, mas apenas um cálculo de previsão convencional, relativo ao facto de que a retomada do doente é, falando em termos de estatística, tanto mais difícil quanto mais a condição de estado vegetativo se prolonga no tempo.

Contudo, não devemos esquecer ou subestimar como são bem documentados casos de recuperação pelo menos parcial, até à distância de muitos anos, a ponto de fazer afirmar que a ciência médica, até hoje, ainda não está em condições de predizer com certeza quem, entre os doentes nestas condições, poderá ou não restabelecer-se.

3. Face a um doente em tais condições clínicas, não falta quem chega a pôr em dúvida a permanência da sua própria "qualidade humana", quase como se o adjectivo "vegetal" (cujo uso já se consolidou), simbolicamente descritivo de um estado clínico, pudesse ou tivesse que estar, ao contrário, relacionado com o doente como tal, degradando na realidade o seu valor e a sua dignidade pessoal. Neste sentido, deve ser realçado como a palavra em questão, apesar de estar confinada no âmbito clínico, não é indubitavelmente a mais apropriada, dado que se refere a sujeitos humanos.

Em oposição a semelhantes tendências de pensamento, sinto o dever de reafirmar com vigor que o valor intrínseco e a dignidade pessoal de cada ser humano não se alteram, quaisquer que sejam as circunstâncias concretas da sua vida. Um homem, mesmo se se encontra gravemente doente ou impedido no exercício das suas funções mais nobres, é e será sempre um homem, nunca se tornará um "vegetal" ou um "animal".

Também os nossos irmãos e irmãs que se encontram na condição clínica do "estado vegetativo" conservam completamente íntegra a sua dignidade humana. O olhar amoroso de Deus-Pai continua a velar sobre eles, reconhecendo-os como seus filhos particularmente necessitados de assistência.

4. Os médicos e quantos estão comprometidos no campo da saúde, a sociedade e a Igreja têm, em relação a estas pessoas, deveres morais dos quais não se podem eximir sem faltar às exigências quer da deontologia profissional quer da solidariedade humana e cristã.

Por conseguinte, o doente em estado vegetativo, na expectativa de recuperação ou do fim natural, tem direito a uma assistência hospitalar básica (alimentação, hidratação, higiene, aquecimento, etc.), e à prevenção das complicações relacionadas com o facto de estar de cama. Ele tem direito também a uma específica intervenção de reabilitação e à monitorização dos sinais clínicos de eventual recuperação.

Em particular, gostaria de realçar como a distribuição de água e alimentos, mesmo quando é feita por vias artificiais, representa sempre um meio natural de conservação da vida, não um acto médico. Por conseguinte, o seu uso deve ser considerado, em linha de princípio, ordinário e proporcionado, e como tal moralmente obrigatório, na medida em que, e até quando, ele demonstra alcançar a sua finalidade própria, que, neste caso, consiste em fornecer ao doente alimento e alívio aos sofrimentos.

A obrigação de não deixar faltar "os cuidados normais devidos ao doente em tais casos" (Cong. para a Doutrina da Fé, Iura et bona, pág. IV) compreende, de facto, também o uso da alimentação e da hidratação (cf. Pontifício Conselho "Cor Unum", Dans le cadre, 2.4.4; Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde, Carta aos Operadores no Campo da Saúde, n. 120). A avaliação das probabilidades, fundada sobre as escassas esperanças de recuperação quando o estado vegetativo se prolonga por mais de um ano, não pode justificar eticamente o abandono ou a interrupção das curas mínimas ao doente, compreendidas a alimentação e a hidratação. A morte devido à fome ou à sede, de facto, é o único resultado possível depois da sua suspensão. Neste sentido, ela acaba por se configurar, se é consciente e livremente efectuada, como uma verdadeira e própria eutanásia por omissão.

A respeito disto, recordo quanto escrevi na Encíclica Evangelium vitae, ao esclarecer que "por eutanásia em sentido verdadeiro e próprio deve ser entendida uma acção ou omissão que por sua natureza e nas intenções causa a morte, com a finalidade de eliminar qualquer sofrimento"; uma acção semelhante representa sempre "uma grave violação da Lei de Deus, porque representa a morte deliberada moralmente inaceitável de uma pessoa humana" (n. 65).

De resto, sabe-se que o princípio moral segundo o qual também a simples dúvida de estar na presença de uma pessoa viva já obriga ao seu respeito pleno e à abstenção de qualquer acção que tenha por finalidade antecipar a sua morte.

5. Sobre esta referência geral não podem prevalecer considerações sobre a "qualidade da vida", na realidade ditadas com frequência por pressões de carácter psicológico, social e económico.
Em primeiro lugar, nenhuma avaliação de despesas pode prevalecer sobre o valor do bem fundamental que se procura proteger, a vida humana. Além disso, admitir que se possa decidir sobre a vida do homem com base num reconhecimento exterior da sua qualidade, equivale a reconhecer que a qualquer sujeito podem ser atribuídos níveis crescentes ou decrescentes de qualidade da vida e, por conseguinte, de dignidade humana, introduzindo um princípio discriminatório e eugenético nas relações sociais.

Além disso, não é possível excluir a priori que a subtração da alimentação e da hidratação, segundo quanto é referido por estudos sérios, seja causa de grandes sofrimentos para o sujeito doente, mesmo se nós podemos ver apenas as suas reacções a nível de sistema nervoso autónomo ou de ameaça. Com efeito, as técnicas modernas de neurofisiologia clínica e de diagnose cerebral por imagens parecem indicar a permanência nestes doentes de formas elementares de comunicação e de análise dos estímulos.

6. Contudo, não é suficiente reafirmar o princípio geral segundo o qual o valor da vida de um homem não pode ser submetido a um juízo de qualidade expresso por outros homens; é necessário promover acções positivas para contrastar as pressões para a suspensão da hidratação e da alimentação, como meio para pôr fim à vida destes doentes.

É necessário, antes de mais, apoiar as famílias que tiverem um familiar atingido por esta terrível condição clínica. Elas não podem ser deixadas sozinhas com o seu difícil peso humano, psicológico e económico. Mesmo se a assistência a estes doentes não é em geral particularmente dispendiosa, a sociedade deve empenhar recursos suficientes para a cura deste tipo de fragilidade, através da realização de oportunas iniciativas concretas tais como, por exemplo, a criação de uma rede pormenorizada de unidades com programas específicos de assistência e reabilitação no caso de saída do estado comatoso; o apoio económico e a assistência a domicílio às famílias, quando o doente for transferido para casa no fim dos programas de reabilitação intensiva; a criação de estruturas de acolhimento para os casos em que a família não esteja em condições de enfrentar o problema ou para oferecer períodos de "pausa" assistencial às famílias que correm o risco de desgaste psicológico e moral.

A assistência apropriada a estes doentes e às suas famílias deveria, além disso, prever a presença e o testemunho do médico e da equipe de assistência, aos quais é pedido que façam compreender aos familiares que lhes estão próximos e que lutam com eles; também a participação do voluntariado representa um apoio fundamental para fazer sair a família do isolamento e ajudá-la a sentir-se parte preciosa e não abandonada pelo sistema social.

Nestas situações, depois, assume particular importância a assistência espiritual e a ajuda pastoral, como auxílio para recuperar o significado mais profundo de uma condição aparentemente desesperada.

7. Ilustres Senhores e Senhoras, para concluir, exorto-vos, como pessoas de ciência, responsáveis pela dignidade da profissão médica, a conservar ciosamente o princípio segundo o qual a verdadeira tarefa de medicina é "curar se for possível, cuidar sempre" (to cure if possible, always to care).

Em sinal e apoio a esta vossa autêntica missão humanitária de conforto e de assistência aos irmãos que sofrem, recordo-vos as palavras de Jesus: "Em verdade vos digo: sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes" (Mt 25,40).

Nesta luz, invoco sobre vós a assistência daquele que uma sugestiva fórmula patrística qualifica como Christus medicus e, ao confiar o vosso trabalho à protecção de Maria, Conforto dos aflitos e dos moribundos, concedo a todos com afecto uma especial Bênção Apostólica.




DIscursos João Paulo II 2004