Discursos João Paulo II 2000 170

170 Que a alegria do Jubileu vos incentive a viver todos os dias no seguimento de Cristo, segundo o exemplo de Luís Maria Grignion de Montfort. Este último dar-vos-á a audácia para serdes incansáveis missionários do Evangelho no mundo da educação! A Virgem Maria, tão querida ao vosso fundador e à vossa inteira família religiosa, vos ampare todos os dias! Concedo-vos de coração uma afectuosa Bênção Apostólica, que faço extensiva a todos os Irmãos da Instrução Cristã de São Gabriel, aos seus colaboradores leigos, aos jovens que beneficiam da sua ajuda e às suas famílias, assim como aos ex-alunos.



                                                                                 Maio de 2000

JUBILEU DOS TRABALHADORES


DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS TRABALHADORES NO FINAL


DA CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA


Segunda-feira, 1° de Maio de 2000

1. No final deste encontro jubilar, desejaria mais uma vez dirigir a todos vós a minha cordial saudação. Obrigado a quantos organizaram esta importante manifestação neste lugar, que hospedará outros encontros durante o Jubileu, sobretudo por ocasião do Dia Mundial da Juventude.

Dirijo um agradecimento especial ao Senhor Juan Somavia, Director-Geral da Organização Internacional do Trabalho e à Dr.a Paola Bignardi, Presidente Nacional da Acção Católica Italiana, pelas palavras gentis e profundas que me dirigiram em nome de todos. Saúdo as autoridades aqui presentes, entre as quais o Presidente do Conselho dos Ministros italiano, Professor Giuliano Amato.

Através de vós que aqui vos encontrais, desejaria fazer chegar o meu cordial pensamento a todo o mundo do trabalho.

2. A festa do trabalho recorda a laboriosidade dos homens que desejam, seguindo o mandamento do Senhor da vida, ser construtores dum futuro de esperança, de justiça e de solidariedade para a humanidade inteira. Hoje neste caminho de civilização, graças às novas tecnologias e à telemática, surgem inéditas possibilidades de progresso. Contudo não faltam novos problemas, que se vão juntar aos já existentes e que suscitam uma legítima preocupação. Com efeito, persistem e por vezes agravam-se em algumas partes da terra fenómenos como o desemprego, a exploração dos menores, a insuficiência dos salários. É preciso reconhecer que nem sempre a organização do trabalho respeita a dignidade da pessoa humana, nem é devidamente considerada a destinação universal dos recursos.

O empenho por resolver em todas as regiões do mundo estes problemas diz respeito a todos: empresários, homens da economia, artesãos, comerciantes e trabalhadores dependentes. Todos nos devemos empenhar para que o sistema económico, no qual vivemos, não subverta a ordem fundamental da prioridade do trabalho sobre o capital, do bem comum sobre o privado. É necessário como nunca que, como recordou há pouco o Senhor Juan Somavía, se constitua no mundo uma coligação a favor do "trabalho digno".

A globalização hoje é um fenómeno que já se encontra em todos os âmbitos da vida dos homens, mas é um fenómeno que deve ser governado com sabedoria. É necessário globalizar a solidariedade.

3. O Jubileu oferece uma ocasião propícia para abrir os olhos perante as pobrezas e marginalizações, não só das pessoas individualmente mas também dos grupos e dos povos. Na Bula de proclamação do Jubileu eu recordei que "numerosas nações, especialmente as mais pobres, vivem oprimidas por uma dívida que assumiu tais proporções que o seu pagamento se tornou praticamente impossível" (Incarnationis mysterium, 12). Diminuir ou até condenar esta dívida: eis um gesto jubilar que seria como nunca desejável!

Este apelo destina-se às nações ricas e desenvolvidas; destina-se também a quantos detêm grandes capitais, e aos que têm a capacidade de suscitar solidariedade entre os povos.

171 Que ele ressoe neste histórico encontro, que vê unidos num mesmo esforço trabalhadores crentes e organizações de trabalho não confessionais.

Queridos trabalhadores, empresários, cooperadores, homens da economia: uni os vossos braços, as vossas mentes e os vossos corações a fim de contribuir para a construção duma sociedade que respeite o homem e o seu trabalho. O homem vale pelo que é e não pelo que possui. Tudo o que se realiza ao serviço duma justiça maior, duma fraternidade mais ampla e duma ordem mais humana nas relações sociais conta muito mais do que qualquer progresso no âmbito técnico.

Caríssimos Irmãos e Irmãs, o Papa conhece bem os vossos problemas, as vossas preocupações, expectativas e esperanças. Ele aprecia a vossa canseira, a vossa dedicação à família, a vossa consciência profissional. Está próximo de vós no vosso empenho por uma sociedade mais justa e solidária, encoraja-vos e abençoa-vos de coração.

Por fim, quereria agradecer aos organizadores desta bonita celebração. Agradeço à Universidade de Tor Vergata, ao Município de Roma, ao Vicariato de Roma e ao Governo italiano a preparação desta ampla área que, desde já, vejo repleta em Agosto pelos jovens de todo o mundo. Agradeço sobretudo a vós aqui reunidos. Estou grato ao Senhor Presidente e a todas as Autoridades. Tomei conhecimento de que muitos de vós tivestes que chegar a este lugar percorrendo a pé longos lanços de estrada. Sinto muito; esperemos que no futuro também estas dificuldades sejam resolvidas para o bem de todos, sobretudo dos peregrinos. Tenho a certeza de que Roma continuará a ser hospitaleira e acolhedora para todos, especialmente para os peregrinos do Grande Jubileu do ano 2000.

Boa festa, boa festa a todos, bom 1º de Maio a todos os trabalhadores do mundo.

Saudações

Saúdo os peregrinos anglófonos que participaram na celebração do Jubileu dos trabalhadores.

Mediante a intercessão de São José, através de cujas palavras e exemplos Jesus aprendeu o valor do trabalho honesto, oro para que Deus Omnipotente abençoe e torne próspero o trabalho das vossas mãos: que todos vós sirvais a promoção da dignidade humana dos trabalhadores e das suas famílias. Sobre todos vós invoco a graça e a paz de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Saúdo cordialmente os trabalhadores de língua francesa, vindos para celebrar a festa do trabalho. Que o vosso trabalho e as vossas fadigas sejam abençoados! Neste dia a Igreja inteira une-se à vossa oração, prestando honra ao vosso trabalho naquilo que tem de nobre e de meritório. Ela crê que a actividade humana, individual ou colectiva, está inscrita no desígnio de Deus, prolongando a obra do Criador. Em nome de Cristo, trabalhador divino, concedo-vos a Bênção Apostólica.

No dia de São José Trabalhador saúdo-vos a todos, peregrinos de língua espanhola, que estais a participar neste encontro jubilar. Que o vosso trabalho quotidiano, tantas vezes difícil e fadigoso, seja um instrumento de realização pessoal, de participação no projecto de Deus, que criou o homem para que continuasse a sua obra, e caminho de santificação para a vossa vida! Obrigado!

Dirijo cordiais boas-vindas aos peregrinos de língua alemã. Todos os dias cruzais diversas portas nos vossos locais de trabalho: nas fábricas e nos escritórios, nas empresas e nos negócios. A Porta Santa, que neste ano continua aberta, é uma porta particular: ela dá para Cristo, que é a porta da vida.

172 A todos vós desejo a vida em abundância, que Cristo nos trouxe!

Com muito afecto saúdo os trabalhadores que vieram da Polónia para este encontro jubilar em Roma. Dirijo palavras de particular saudação aos membros e às autoridades de "Solidarnosc".

Estou contente por que a vossa participação no hodierno encontro é tão numerosa. Saúdo, além disso, os vossos grupos profissionais, os trabalhadores e os empresários. A vossa presença é-me grata e desejaria dizer-vos que estou de modo particular próximo de vós. Desejo muito que na nossa Pátria todos tenham um trabalho, possam ganhar o pão com o esforço das próprias mãos e tenham dignas condições de emprego. Que o vosso trabalho esteja ao serviço do bem comum, do bem da pessoa e da sociedade. Que ele una e não divida, seja fonte de alegria e de bênção. Levai a minha saudação a todos os trabalhadores que se encontram na Polónia.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS DIRIGENTES DE SINDICATOS


E DE GRANDES EMPRESAS


Terça-feira, 2 de Maio de 2000



Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Tenho o prazer de me encontrar de novo convosco, no dia seguinte ao Jubileu mundial dos trabalhadores, que juntos celebrámos ontem em "Tor Vergata".

Obrigado pela vossa presença! Saúdo-vos a todos cordialmente. Em particular, saúdo D. Fernando Charrier e agradeço-lhe as amáveis expressões que me dirigiu em vosso nome. O Jubileu dos trabalhadores que reuniu em Roma, vindos de todas as partes da terra, representantes e operadores do vasto campo do trabalho, ofereceu-nos a oportunidade de abraçar com o olhar as complexas realidades do mundo do trabalho, tanto na sua dimensão mundial como nos aspectos sectoriais. Demo-nos conta de quanto é ainda grande a necessidade de intervir de modo eficaz, para que o trabalho humano tenha na cultura, na economia e na política o lugar que lhe compete, no pleno respeito pela pessoa do trabalhador e pela sua dignidade, sem nunca as penalizar.

A Igreja segue com atenção estes problemas, sobretudo através da obra do Pontifício Conselho "Justiça e Paz", que está em contacto com os Organismos internacionais dos trabalhadores, dos empresários e do mundo das finanças. Faço votos por que esta frutuosa colaboração continue assim a favorecer uma presença da Igreja sempre mais incisiva no mundo do trabalho.

2. Ao falar convosco, amados Irmãos e Irmãs, quereria pôr em realce um aspecto qualificante do trabalho, que comummente é indicado com o termo de "qualidade total". Trata-se, em síntese, da condição do homem no processo produtivo: só uma sua participação efectiva nesse processo pode fazer da empresa uma verdadeira "comunidade de pessoas" (cf. Centesimus annus CA 35). Eis um desafio que acompanha o avançado progresso das novas tecnologias, às quais se deve o mérito de terem aliviado, pelo menos em parte, a componente de fadiga humana no trabalho. O desafio deve ser acolhido de modo que o "dador de trabalho indirecto", isto é, todas aquelas "forças" que determinam o inteiro sistema socioeconómico ou dele resultante (cf. ibid., n. 17), estejam ao serviço do homem e da sociedade.

Caríssimos empresários, operadores financeiros, sindicalistas dos trabalhadores e vós todos que, com a cooperação e o comércio, vos pondes ao serviço de um desenvolvimento digno do homem, está diante de todos uma tarefa mais árdua do que nunca, mas de grande relevo. Sem dúvida, o resgate do homem diante do trabalho depende, em grande medida, das orientações das finanças e da economia: estas devem captar sempre mais o seu elemento característico, ou seja, o peculiar "serviço" que são chamadas a prestar ao desenvolvimento. O grave fenómeno do desemprego, que investe homens, mulheres e jovens e para o qual se procura de muitos modos encontrar uma solução, alcançaria certamente um êxito positivo se a economia, as finanças e a própria organização nacional e mundial do trabalho jamais perdessem de vista o bem do homem como própria meta final.

3. A tornar ainda mais complexo o mundo do trabalho, intervém hoje a chamada "globalização". É um fenómeno novo que deve ser conhecido e avaliado com uma pesquisa atenta e pontual, pois apresenta-se com uma acentuada característica de "ambivalência". Pode ser um bem para o homem e a sociedade, mas poderia revelar-se também um dano devido às não leves consequências. Tudo depende de algumas opções fundamentais: isto é, se a "globalização" é posta ao serviço do homem, e de cada homem, ou exclusivamente em proveito dum desenvolvimento desvinculado dos princípios da solidariedade, da participação e fora de uma subsidiariedade responsável.

173 A respeito disso, é importante ter presente que quanto mais completo for o mercado, tanto mais deve ser equilibrado por uma cultura global da solidariedade, atenta às necessidades dos mais frágeis. Além disso, devem ser salvaguardadas a democracia, também económica, e ao mesmo tempo uma recta concepção da pessoa e da sociedade.

O homem tem direito a um desenvolvimento que abranja todas as dimensões da sua vida. A economia, ainda que seja globalizada, deve estar sempre integrada no tecido de conjunto das relações sociais, das quais constitui uma componente importante, mas não exclusiva.

Também para a globalização são necessárias uma nova cultura, novas regras e novas instituições a nível mundial. Neste campo, política e economia devem colaborar para determinar projectos a breve, médio e longo prazo, que tenham em vista o perdão ou pelo menos a diminuição da dívida pública dos países pobres do mundo. Neste sentido, empreendeu-se um louvável caminho de co-responsabilidade que deve ser fortalecido e, sim, globalizado para que todos os Países se sintam envolvidos. Um caminho de empenho que, precisamente por isso, exalta a responsabilidade de cada um e de todos.

4. Eis, caríssimos Irmãos e Irmãs, o vasto campo que está diante de vós; eis o contributo que é pedido a cada um de vós e, convosco, às Instituições que representais.

A Igreja aprecia a vossa obra e acompanha-vos no esforço de dar vida, num mundo marcado por complexas relações de interdependência, a relações de colaboração solidária e efectiva.

Asseguro a cada um de vós a minha lembrança na oração e confio todos os vossos propósitos a Maria e José, cooperadores fiéis da obra da salvação, enquanto de coração abençoo todos vós, os vossos colaboradores e as vossas famílias.

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NA AUDIÊNCIA AOS MEMBROS

DA "PAPAL FOUNDATION"


Terça-feira, 2 de Maio de 2000

A religião que tem origem no mistério da Encarnação redentora caracteriza-se pela permanência no coração de Deus, pela participação na Sua própria vida (cf. Tertio millennio adveniente, TMA 8). E o coração de Deus, a vida que Ele nos comunica através da Encarnação, Morte e Ressurreição do seu querido Filho não são senão a amorosa amabilidade e misericórdia do Pai, que deseja congregar todos os seus filhos dispersos, na comunhão do único Corpo de Cristo, que é a Igreja.

O Jubileu do Ano 2000 é o "ano da graça do Senhor", em que toda a Igreja deve procurar dar um testemunho cada vez mais autêntico do amor e da solidariedade cristãos.

É neste contexto que me alegro com a vossa presença aqui, durante o Ano jubilar. Desde o seu início, a Fundação Papal tem contribuído para fazer com que o Sucessor de Pedro possa responder a alguns dos mais urgentes apelos à intervenção caritativa, de forma especial nos países em vias de desenvolvimento. O vosso desejo de compartilhar a minha "solicitude por todas as Igrejas" conforta-me e assiste-me no ministério que o Senhor me confiou. Estou-vos muito grato por isto e quero expressar esta gratidão com a fervorosa oração por vós e pelos vossos entes queridos.

Neste especial ano de graça que inaugura o terceiro milénio cristão, confio os membros da Fundação Papal ao amor da Santíssima Trindade. Imbuídos do esplendor da Ressurreição, os vossos corações se tornem repletos de júbilo sereno, porque "o fulgor do Rei eterno dissipou as trevas do mundo" (cf. Proclamação pascal). Invoco sobre todos vós a intercessão de Maria, Mãe do Redentor, e de bom grado concedo-vos a minha Bênção Apostólica.

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS PARTICIPANTES NO XXIX CAPÍTULO GERAL

DOS MISSIONÁRIOS DE NOSSA SENHORA DA SALETTE


174

Quinta-feira, 4 de Maio de 2000

Estimados Missionários
de Nossa Senhora da Salette

Sinto-me feliz por vos receber, no momento em que celebrais o vosso XXIX Capítulo Geral.

Juntamente com o vosso Superior-Geral e o seu Conselho, a quem saúdo com cordialidade, representais o conjunto dos vossos coirmãos espalhados por numerosos países do mundo. Em nome da Igreja, agradeço-vos imensamente os esforços que tendes despendido nos últimos anos para aumentar o vosso campo de apostolado, sobretudo na Índia e nos países do Leste europeu, tendo em vista também estabelecer-vos proximamente na Indonésia e na Birmânia. O Senhor abençoe de maneira abundante os vossos generosos afãs apostólicos e vos conceda perseverar com a audácia e o entusiasmo das gerações de missionários que vos precederam!

Escolhestes como tema das vossas assembleias capitulares: "Construamos juntos o porvir!

Desejais edificar em conjunto o futuro do vosso Instituto, com a ajuda de Deus, dando um renovado vigor ao carisma saletino que vos congrega, para uma criativa fidelidade à vossa vocação, salientando de modo especial o lugar essencial da missão, da vida comunitária e da interdependência na comunhão.

À luz da mensagem de Nossa Senhora da Salette, atribuís um lugar importante ao ministério da reconciliação. Este ano jubilar constitui uma ocasião privilegiada para voltardes a descobrir a plenitude da misericórdia de Deus, que deseja reconciliar o homem Consigo mesmo e com os seus irmãos. Efectivamente, como "comunidade reconciliada e reconciliadora, a Igreja não pode esquecer que na origem do seu dom e da sua missão de reconciliação se encontra a iniciativa, cheia de amor compassivo e de misericórdia, daquele Deus que é amor e que por amor criou os homens: criou-os com a finalidade de viverem em amizade com Ele e em comunhão entre si" (Reconciliatio et paenitentia RP 10). Neste espírito, formulo votos cordiais por que o vosso Capítulo estimule os membros do Instituto a adquirirem uma renovada consciência da sua participação na missão reconciliadora da Igreja, que está no âmago da sua vocação missionária, auxiliando incessantemente os fiéis a receberem o perdão divino para serem as suas testemunhas em todas as nações.

Como escrevi por ocasião do sesquicentenário da aparição da Virgem, "La Salette é uma mensagem de esperança, pois a nossa esperança é sustentada pela intercessão d'Aquela que é a Mãe dos homens" (Carta a D. Louis Dufaux, Bispo de Grenoble [França], 6 de Maio de 1996, em: ed. port. de L'Osservatore Romano de 15 de Junho de 1996, pág. 3). O anúncio desta esperança esteja sempre no cerne do vosso encontro com os homens e as mulheres de hoje!

Graças a ela, os nossos contemporâneos podem estar persuadidos de que as rupturas não são irremediáveis e que é sempre possível converter-se das próprias infidelidades para construir uma humanidade reconciliada e seguir o Senhor, porque para Deus nada é demasiado distante.

Queridos Missionários de Nossa Senhora da Salette, não tenhais medo de testemunhar que Cristo veio compartilhar a nossa humanidade, para podermos participar na sua divindade. Proclamai com audácia a Palavra de Deus, que é uma força de transformação dos corações, das sociedades e das culturas. Sob o olhar de Maria, presença materna no meio do povo de Deus, exortai incessantemente à conversão, à comunhão e à solidariedade. Não hesiteis em anunciar aos vossos irmãos que Deus caminha com os homens, convida a uma vida nova e os encoraja para os conduzir à verdadeira liberdade. A qualidade da vossa vida espiritual e comunitária constituirá uma expressão particularmente eloquente da autenticidade e da fecundidade do vosso anúncio da mensagem evangélica.

175 Isto exige que o missionário aceite viver em permanente estado de conversão. O missionário genuíno é aquele que aceita empenhar-se decididamente nas sendas da santidade. "Se não é contemplativo, o missionário não pode anunciar Cristo de modo credível. Ele é uma testemunha da experiência de Deus e deve poder dizer como os Apóstolos: "O que nós contemplamos, ou seja o Verbo da vida... nós vo-lo anunciamos" (1Jn 1,1-3)" (Redemptoris missio RMi 91). Após o entusiasmo do primeiro encontro com Cristo ao longo dos caminhos da missão, é necessário sustentar corajosamente os esforços de cada dia mediante uma intensa vida de oração, penitência e dom pessoal. Participando na missão de Cristo através das próprias palavras e do testemunho de toda a sua existência, os missionários hão-de orientar os homens para a abertura à Boa Nova, que eles têm o dever de transmitir a todos (cf. Decreto de aprovação das Constituições, 6 de Junho de 1985). Desta forma, poderão "construir juntos o porvir", viver destemidamente a incógnita do futuro, persuadidos da presença de Cristo que os acompanha em todos os momentos da sua vida nos encontros com os outros homens e povos.

Confio os membros da Congregação dos Missionários de Nossa Senhora da Salette à intercessão da Virgem Maria, Nossa Senhora Reconciliadora, e do íntimo do coração concedo a todos a minha afectuosa Bênção apostólica, que de bom grado faço extensiva aos beneficiários do seu ministério e das pessoas que compartilham a espiritualidade saletina.

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS DIRIGENTES E FUNCIONÁRIOS DA "AGIP"

Quinta-feira, 4 de Maio de 2000



1. É-me grato dirigir uma particular saudação a vós, administradores de postos de distribuição de combustíveis AGIP, vindos a Roma, juntamente com os vossos familiares, por ocasião do Grande Jubileu.

Agradeço ao Senhor Cardeal Virgílio Noé, que se fez intérprete dos vossos sentimentos e introduziu este nosso encontro. O Grupo ENI, do qual a AGIP faz parte, realizou a grande obra de restauração da fachada da Basílica de São Pedro, e é-me grato nesta circunstância renovar a expressão da minha gratidão àqueles que cuidaram deste trabalho muito empenhativo, cujo resultado é objecto de admiração unânime da parte de peregrinos e visitantes.

2. Viestes para realizar a vossa peregrinação jubilar e visitar o Sucessor de Pedro. Enquanto com alegria vos acolho, desejo recordar brevemente o sentido da peregrinação jubilar. Ela exprime e favorece o caminho de conversão, autêntico objectivo do Ano Santo. C onverter-se significa fazer uma mudança de mentalidade: daquela "do mundo" à de Deus, que Cristo nos revelou e comunicou. Cruzar a Porta Santa exprime precisamente a fé em Cristo e a vontade de O seguir, a Ele que com a sua morte e ressurreição nos fez passar do pecado à graça, de um modo de viver dominado por interesses egoístas a outro disposto segundo o Evangelho, isto é, inspirado no amor de Deus e do próximo.

Esta vossa visita coloca-se, por uma feliz coincidência, logo após o Jubileu dos Trabalhadores. É espontâneo, portanto, dirigir também a vós os votos que formulei ao inteiro mundo do trabalho, no dia 1 de Maio passado; a saber, que a vossa actividade profissional, com a parte de fadiga que inevitavelmente acarreta, possa harmonizar-se bem com a vida espiritual e familiar, para corresponder ao desígnio do Criador.

3. Toda a actividade humana, e também o trabalho, deve ser vivida pelo crente em acção de graças a Deus. Esta acção de graças, com uma antiga palavra grega que se tornou sagrada para os cristãos, diz-se "eucaristia". Ao altar da Santa Missa levamos também as alegrias e as fadigas do trabalho quotidiano, para que o sacerdote as ofereça juntamente com o pão e o vinho. Nisto a pessoa humana exprime a sua vocação de imagem de Deus e realiza-a plenamente no Dia do Senhor, quando participa na celebração dominical e se dedica com mais liberdade à família, ao repouso e às relações fraternas. Faço votos por que as legítimas exigências da vossa profissão não vos impeçam de viver deste modo o Domingo como o Dia do Senhor.

Pôr em prática o espírito do Jubileu significa destinar o justo lugar a estes valores fundamentais, que nada tiram à actividade do trabalho, mas a colocam na dimensão que lhes compete, conferindo-lhes o significado mais autêntico.

De coração formulo votos por que a presente peregrinação vos revigore no empenho cristão e, enquanto vos asseguro uma constante lembrança junto do Senhor, concedo a todos vós uma especial Bênção Apostólica.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II

AO REITOR DA UNIVERSIDADE CATÓLICA

DO SAGRADO CORAÇÃO


Ao Ilustríssimo Senhor
176 Professor SÉRGIO ZANINELLI
Reitor Magnífico
da Universidade Católica
do Sagrado Coração

1. No passado dia 13 de Abril tive a alegria de me encontrar com a grande família da Universidade Católica do Sagrado Coração, reunida na Basílica de São Pedro para a celebração jubilar. Foi um momento de alta tensão espiritual, um vibrante testemunho de fé e de comunhão. Agora, a celebração anual do Dia da Universidade Católica oferece-me uma ulterior ocasião de me dirigir a Vossa Excelência, Senhor Reitor, e a toda a comunidade que Vossa Excelência representa.

Faço-o de bom grado, considerando também as significativas celebrações do quadragésimo aniversário da morte do Fundador, Padre Agostino Gemelli, e o já iminente octogésimo aniversário de fundação da própria Universidade: circunstâncias, estas, que oferecem um motivo de especial reflexão aos componentes dessa prestigiosa Instituição, convidando-os a um empenho sempre mais generoso, em sintonia com as expectativas da Igreja e da sociedade. Ao renovar, portanto, os meus sentimentos de estima e afecto aos Professores, aos Estudantes e a quantos, a diversos títulos, estão unidos à Universidade, retomo o meu diálogo sobre a difícil mas exaltante tarefa que lhe é confiada, a de conjugar nos âmbitos próprios da actividade académica a audácia da razão e a "parresia" da fé.

2. "A fé e a razão constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade" (Fides et ratio, Proémio). Diante da crise da razão, característica de grande parte da cultura hodierna, a fé deve assumir a responsabilidade de um suplemento de esforço, fazendo-se como que "samaritana da razão", para que esta se recupere a si mesma plenamente, na própria e originária capacidade metafísica e sapiencial.

Ao pôr-se nesta perspectiva, tem-se imediatamente a percepção de como é precioso o trabalho dos crentes empenhados na investigação, através do cultivo das disciplinas humanísticas e científicas, nas quais se exprime o incoercível anélito do homem ao conhecimento da verdade.

Mediante esta pesquisa, aberta a horizontes sempre novos, o homem está à procura não só de coisas, mas de si mesmo, e em última análise abre-se ao mistério de Deus. O conhecimento sempre mais adequado da realidade resulta em benefício não só da vida social, mas também da própria prática da fé, para que seja mais iluminada e amadurecida. Por isso, na Constituição Apostólica Ex corde Ecclesiae, eu recordava que é próprio da vida da universidade "a ardente procura da verdade e a sua transmissão abnegada aos jovens", ensinando-lhes "a raciocinar com rigor, para agir com rectidão e servir melhor a sociedade humana" (Ed. port. de L'Osservatore Romano de 30 de Setembro de 1990, pág. 7, n. 2).

3. Disto estavam bem conscientes aqueles que tiveram o grande mérito de preparar e concretizar essa Instituição. Penso, antes de tudo, no Venerável Giuseppe Toniolo, ao qual está intitulado a Entidade fundadora da Universidade Católica. Enquanto a Igreja italiana está hoje empenhada no "projecto cultural", convém recordar o empenho por ele prodigalizado com paixão missionária, para assegurar à cultura uma alma cristã. Penso, depois, com particular admiração, no Padre Agostino Gemelli, o fervoroso franciscano que deu vida e orientação segura a essa Instituição, que tanto honra a Itália católica. A recordação do Padre Gemelli, no 40º ano do seu falecimento, não pode deixar de suscitar também uma reflexão sobre a natureza e a missão da Universidade Católica, que se apresta a celebrar os seus oitenta anos de vida. E isto é tanto mais urgente numa situação histórica como a italiana, na qual a reforma, em acto, do inteiro sistema universitário torna necessária uma reflexão das funções e da razão de ser da Universidade como tal.

4. Na realidade, o projecto duma Universidade livre e católica na Itália continua a ser de grande actualidade. Através deste qualificado instrumento os católicos italianos podem, de facto, inserir-se de modo orgânico, com um seu específico contributo, nos vários âmbitos da investigação, mostrando que o argumentar racional não só não se opõe à fé, mas encontra nela uma aliada para o seu autêntico e fecundo exercício. Por outro lado, por uma razão forte e ao mesmo tempo humilde, a própria fé haure vantagem para evitar os riscos sempre latentes da superstição e do magismo, e tornar-se uma fé plenamente correspondente às exigências da Revelação e às instâncias autênticas do humanum. Portanto, é um dever imprescindível da Universidade Católica cultivar a íntima solidariedade que deve estreitar a fé à razão, testemunhando-a não só a respeito dos interrogativos universais do ser humano, mas também diante dos desafios próprios da época postos, no início do milénio, pela sociedade multiétnica, multirreligiosa, multicontextual, com as suas incessantes e frenéticas transformações.

177 5. Neste horizonte compreende-se bem o interesse do tema que foi escolhido para o Dia da Universidade Católica: "Uma cultura de solidariedade para o nosso país".

É um tema que se abre para um cenário complexo, que Professores e Estudantes da Universidade Católica são chamados a "ler" em profundidade, medindo-se certamente com o carácter concreto dos fenómenos sociais, mas ao mesmo tempo procurando ir à raiz dos problemas. Compete-lhes, antes de tudo, recordar que uma cultura de solidariedade, para ser autêntica e profunda, tem necessidade daquela que se poderia qualificar como "solidariedade da cultura", ou seja, de uma perspectiva do saber que, embora consciente das suas limitações, não se contente com fragmentos, mas procure compô-los na direcção duma síntese verdadeira e sapiencial. Nada é tão devastador na cultura contemporânea quanto a difundida convicção de que a possibilidade de alcançar a verdade é uma ilusão da metafísica tradicional. Então, mais do nunca, é necessária uma acção em proveito da cultura, que poderia ser chamada "obra de caridade intelectual", segundo uma significativa expressão de Rosmini.

6. A Universidade Católica, precisamente em virtude da sua inspiração cristã, tem algo de significativo a dizer para responder a este apelo de solidariedade, que lhe vem da cultura do nosso tempo. Em particular, ela é chamada a contribuir para a superação daquela mortificadora distância entre progresso científico e valores do espírito, que impele para uma práxis materialista, cujo ponto de chegada é uma sociedade individualista e competitiva, fonte muitas vezes de injustiças e violências, de marginalizações e discriminações, de conflitos e guerras.

O processo de globalização económica, embora não seja desprovido de aspectos positivos, está a provocar novas fendas no campo da solidariedade, na Europa e no mundo. O valor da solidariedade está em crise, talvez principalmente porque está em crise a experiência, que é a única a poder garanti-la como valor objectivo e universal: aquela comunhão entre pessoas e povos que a consciência crente reconduz ao serem todos filhos do único Pai, o Deus que "é amor" (
1Jn 4,8). Em Cristo, Ele introduziu-nos na "plenitude do tempo" (cf. Gl Ga 4,4), chamando-nos à autêntica liberdade de uma práxis de amor e de solidariedade.

7. Então, emerge a exigência de uma "refundação" cultural, que não pode deixar de interpelar a Universidade Católica na sua investigação racionalmente rigorosa, bem arraigada na fé e aberta ao diálogo com todos os homens de boa vontade. É preciso ter em vista uma cultura que assegure a centralidade da pessoa, os seus direitos inalienáveis, a sacralidade da vida. É necessário promover uma cultura do acolhimento, do respeito, da partilha, recordando que "o homem não se pode encontrar plenamente, a não ser no sincero dom de si mesmo" (Gaudium et spes GS 24), no envolvimento da própria liberdade em favor do bem comum, para além dos interesses individuais ou de grupo e afastado da busca do lucro a qualquer custo. É esta a solidariedade, expressão peculiar daquele fazer-se próximo a que, com linguagem evangélica, chamamos caridade ágape, que deve caracterizar a vida dos discípulos de Cristo.

Assim entendida, a solidariedade torna-se o nome novo dado à paz, o critério de toda a organização civil marcada pela justiça, o fundamento de toda a democracia política que não queira reduzir-se à pura retórica. Assim como outros países, também a Itália é atravessada hoje por tentações de racismo, de introversão e de fechamento egoísta: é preciso procurar as formas histórico-práticas mais idóneas para que a solidariedade não resulte uma enunciação de princípio, mas se torne vida prática.

8. Para tudo isto, não é de pouca monta o empenho de apoio teórico-científico que a Universidade Católica pode oferecer, valorizando a coordenação entre os saberes que a caracteriza precisamente como universidade. Ela deve, portanto, sentir-se empenhada em levar a multiplicidade das ciências a uma síntese sapiencial, que possa deveras ajudar o homem, orientando-o para uma convivência civil, justa e pacífica; uma síntese que ponha remédio à fragmentação radical dos saberes, bem diversa da legítima autonomia metodológica de cada uma das disciplinas. Com efeito, essa fragmentação exprime e ao mesmo tempo agrava aquela desorientação na percepção do sentido da vida, que para muitos dos nossos contemporâneos não raro é a antecâmara do niilismo.

Diante desses desafios a elaboração científica da Universidade Católica, já rica em muitos campos, no futuro saberá alargar sempre mais o horizonte ocupando-se, com organicidade cada vez maior, dos graves problemas contemporâneos salientados na Ex corde Ecclesiae. "A dignidade da vida humana, a promoção da justiça para todos, a qualidade da vida pessoal e familiar, a protecção da natureza, a procura da paz e da estabilidade política, a partilha mais equânime das riquezas do mundo e uma nova ordem económica e política, que sirva melhor a comunidade humana a níveis nacional e internacional" (n. 32).

Nesta série de temas está em jogo uma boa parte do agir solidário dos homens e das mulheres do nosso tempo. É tarefa dos cristãos levar-lhe a luz do Evangelho, como testemunhas d'Aquele que na Encarnação "se uniu de certo modo a todo o homem" (Gaudium et spes GS 22), e com o dom da sua vida mostrou o que significa solidarizar-se com os outros.

9. Portanto, formulo votos por que a Universidade Católica, mantendo-se fiel às grandes orientações cristãs da sua consolidada tradição, incremente o seu serviço na educação para a solidariedade das jovens gerações, esperança do próximo futuro do nosso país. Trata-se duma educação a oferecer através do ensino, mas também criando na vida quotidiana da Universidade um autêntico clima de comunhão, uma vez que a solidariedade se aprende mais por "contacto" do que por "noções", e deve aprofundar-se na esfera do ser, antes do que na do agir.

Persevere a Universidade Católica do Sagrado Coração na sua missão! Renove-se ainda mais no espírito e nas estruturas, retomando o entusiasmo do seu Fundador.

178 Ao confiar no empenho que todo o componente da prestigiosa Instituição quiser pôr neste sentido, invoco sobre projectos e propósitos a protecção materna de Maria, Sedes sapientiae, e envio-lhe, Senhor Reitor, uma especial Bênção Apostólica, assim como ao Corpo académico, aos Estudantes, aos Colaboradores, a toda a grande família de defensores e amigos da Universidade Católica do Sagrado Coração, para que ela permaneça digna de tantas "testemunhas", mestres de ciência e de vida, que honraram a sua história, e possa assim prestar um serviço sempre mais eficaz à cultura, à sociedade, à Igreja de Deus que está na Itália.

Vaticano, 5 de Maio de 2000.


Discursos João Paulo II 2000 170