AUDIÊNCIAS 2000 - AUDIÊNCIA



AUDIÊNCIA

Quarta-feira 20 de Setembro de 2000




Caríssimos Irmãos e Irmãs:

1. Iniciámos este nosso encontro sob o sinal trinitário, delineado de modo incisivo e luminoso pelas palavras do apóstolo Paulo na Carta aos Gálatas (cf. 4, 4-7). O Pai, ao infundir no coração dos cristãos o Espírito Santo, realiza e revela a adopção filial que Cristo nos obteve. Com efeito, o Espírito "atesta em união com o nosso espírito que somos filhos de Deus" (Rm 8,16). Ao olharmos para esta verdade, como para a estrela polar da fé cristã, meditaremos sobre alguns aspectos existenciais da nossa comunhão com o Pai mediante o Filho e no Espírito.

2. O modo tipicamente cristão de considerar Deus passa sempre através de Cristo. É Ele o Caminho, e ninguém vai ao Pai senão por meio d'Ele (cf. Jo Jn 14,6). Ao apóstolo Filipe que Lhe implora: "Mostra-nos o Pai e isso nos basta", Jesus declara: "Quem Me vê, vê o Pai" (Jn 14,8-9). Cristo, o Filho predilecto (cf. Mt Mt 3,17 Mt 17,5), é por excelência o revelador do Pai. O verdadeiro rosto de Deus é-nos revelado só por Aquele que "está no seio do Pai". A expressão original grega do Evangelho de João (cf. 1, 18) indica uma relação íntima e dinâmica de essência, de amor, de vida do Filho com o Pai. Esta relação do Verbo eterno, envolve a natureza humana que Ele assumiu na encarnação. Por isto, na óptica cristã a experiência de Deus jamais se pode reduzir a um genérico "sentido do divino", nem se pode considerar superável a mediação da humanidade de Cristo, como bem demonstraram os maiores místicos, tais como São Bernardo, São Francisco de Assis, Santa Catarina de Sena, Santa Teresa de Ávila, e tantos enamorados de Cristo do nosso tempo, de Carlos de Foucauld a Santa Teresa Benedita da Cruz (Edith Stein).

3. Vários aspectos do testemunho de Jesus a respeito do Pai reflectem-se em toda a experiência cristã autêntica. Ele testemunhou, antes de tudo, que o Pai está na origem do seu ensinamento: "A Minha doutrina não Me pertence, é d'Aquele que Me enviou" (Jn 7,16). Tudo o que Ele fez conhecer é exactamente aquilo que "ouviu" do Pai (cf. ibid., 8, 26; 15, 15; 17, 8.14). A experiência cristã de Deus não pode, portanto, desenvolver-se senão em total coerência com o Evangelho.

Cristo testemunhou de maneira eficaz também o amor do Pai. Na estupenda parábola do filho pródigo, Jesus apresenta o Pai sempre à espera do homem pecador, que volta para os seus braços. No Evangelho de João, Ele insiste sobre o Pai que ama os homens: "Deus amou de tal modo o mundo que lhe deu o Seu Filho único" (Jn 3,16). E ainda: "Se alguém Me ama, guardará a Minha palavra; Meu Pai amá-lo-á e viremos a ele e faremos nele morada" (Jn 14,23). Quem faz verdadeiramente a experiência do amor de Deus, não pode deixar de repetir, com comoção sempre nova, a exclamação da Primeira Carta de João: "Vede com que amor nos amou o Pai, ao querer que fôssemos chamados filhos de Deus. E, de facto, somo-lo!" (1Jn 3,1). Nesta luz, podemos dirigir-nos a Deus com a invocação terna, espontânea, íntima: Abbá, Pai. Ela aflora constantemente nos lábios do fiel que se sente filho, como nos recorda São Paulo no texto que abriu o nosso encontro (cf. Gl Ga 4,4-7).

4. Cristo dá-nos a própria vida de Deus, uma vida que supera o tempo e nos introduz no mistério do Pai, na sua alegria e luz infinita. Testemunha-o o evangelista João ao transmitir as sublimes palavras de Cristo: "Assim como o Pai tem a vida em Si mesmo, assim também concedeu ao Filho ter a vida em Si mesmo" (Jn 5,26). "E a vontade do Pai é esta: que todo aquele que vê o Filho e acredita n'Ele tenha a vida eterna; e Eu ressuscitá-lo-ei no último dia... Assim como o Pai, que vive, Me enviou, e Eu vivo pelo Pai, assim também o que Me come viverá por Mim" (Jn 6,40 Jn 6,57).


Esta participação na vida de Cristo, que faz com que sejamos "filhos no Filho", tornou-se possível pelo dom do Espírito. De facto, o Apóstolo apresenta-nos o nosso ser filhos de Deus em íntima conexão com o Espírito Santo: "Todos aqueles que são movidos pelo Espírito de Deus, são filhos de Deus" (Rm 8,14). O Espírito põe-nos em relação com Cristo e com o Pai. "E neste Espírito, que é o Dom eterno, Deus uno e trino abre-se ao homem, ao espírito humano. O sopro recôndito do Espírito divino faz com que o espírito humano, por sua vez se abra, diante de Deus que se abre para ele, com desígnio salvífico e santificante (...). Na comunhão de graça com a Santíssima Trindade dilata-se "o espaço vital" do homem, elevado ao nível sobrenatural da vida divina. O homem vive em Deus e de Deus, vive "segundo o Espírito" e "ocupa-se das coisas do Espírito"" (Dominum et vivificantem, DEV 58).

5. Ao cristão iluminado pela graça do Espírito, Deus apresenta-se verdadeiramente no seu rosto paterno. Pode dirigir-se a Ele com a confiança que Santa Teresa de Lisieux testemunha neste intenso trecho autobiográfico: "O passarinho desejaria voar em direcção ao sol que encanta os seus olhos. Quereria imitar as águias, suas irmãs, que vê subir ao alto até ao fogo divino da Trindade (...). Mas, ao contrário, tudo aquilo que pode fazer é levantar as suas pequenas asas; pairar em voo, porém, não cabe às suas pequenas possibilidades (...). Então, com audaz abandono, permanece a fixar o seu sol divino; nada poderá incutir-lhe medo, nem o vento nem a chuva" (Manuscrits autobiographiques, Paris 1957, pág. 231).

Saudações

Saúdo agora os peregrinos e visitantes de língua portuguesa. Em particular, desejo saudar o grupo de Lisboa e os peregrinos portugueses emigrantes na Suíça, bem como os visitantes brasileiros do Rio de Janeiro. Sede bem-vindos! Para todos invoco abundantes dons do Alto que sirvam de estímulo para a sua vida cristã, em penhor da qual concedo a minha Bênção Apostólica.

Acolho cordialmente as pessoas de língua francesa presentes esta manhã. Saúdo de maneira particular os peregrinos das dioceses de Lila, Arrás e Agen, acompanhados dos seus Bispos; os membros do Instituto Superior das Ciências Económicas e Sociais do Instituto Católico de Paris, assim como os peregrinos de Paray-le-Monial e da Ilha Maurício. Que a vossa peregrinação jubilar vos ajude a tornar sempre mais íntimo o vosso encontro com Cristo, para O testemunhardes com generosidade entre os vossos irmãos. A todos, com afecto dou a Bênção Apostólica.

É-me grato apresentar uma especial saudação à peregrinação jubilar de Melaka-Johor, na Malásia, guiada por D. James Chan. Saúdo também a União dos ex-alunos do Pontifício Colégio Irlandês, guiada pelo Arcebispo D. Seán Brady. Com muito afecto dou as boas-vindas aos grupos ecuménicos, em especial aos visitantes luteranos da Suécia e ao grupo organizado pelo Centro anglicano de Roma. Sobre todos os peregrinos e visitantes de língua inglesa, de modo especial aos da Irlanda, Escócia, Wales, Suécia, Japão, Malásia, Austrália e Estados Unidos da América, invoco a alegria e a paz de Cristo Salvador.

Desejo saudar os fiéis de língua espanhola, em particular as Operárias da Cruz, os peregrinos venezuelanos acompanhados por D. Ignácio Velasco e os trabalhadores chilenos da Companhia Siderúrgica de Huachipato. Sáudo de igual modo os grupos paroquiais vindos de Espanha, Panamá, Porto Rico, Bolívia, Chile, Argentina e de outros países latino-americanos. Que o sentir-vos filhos adoptivos do Pai vos ajude a amar sempre os demais com o mesmo amor de Deus.
Muito obrigado!

Tenho a alegria de acolher algumas peregrinações diocesanas da Itália: de Livorno, com D. Alberto Ablondi e D. Vincenzo Sávio; de São Miniato, com D. Edoardo Ricci; e de Alife-Caiazzo, com D. Pietro Farina. Caríssimos Irmãos e Irmãs, agradeço a vossa presença e convido-vos a corresponder com generosidade à graça de Cristo Salvador, que renova os corações, as famílias, a sociedade. Sede pedras vivas da comunidade eclesial e, em todos os ambientes, testemunhas da caridade de Cristo.

Dirijo uma cordial saudação aos Clérigos Marianos provenientes de diversos países da Europa oriental, com as Religiosas e os Cooperadores leigos; assim como aos Seminaristas do Colégio urbano "De Propaganda Fide" e à comunidade do Seminário Arquiepiscopal "Pio XI", de Régio da Calábria.

Saúdo, além disso, o numeroso grupo dos fiéis do Santuário Maria Santíssima da Neve do Monte Sirino, em Lagonegro, acompanhados de D. Rocco Talucci. Caríssimos, quisestes trazer à Praça de São Pedro a estátua de Nossa Senhora, a vós tão querida. Agradeço-vos isto e de bom grado a coroo, exortando-vos a que sejais vós mesmos a coroa de Maria, com a vossa vida santa e generosa.

Saúdo depois os Oficiais da Marinha Militar, os numerosos familiares de Soldados mortos e dispersos na guerra, os Congressistas da Sociedade Farmacêutica do Mediterrâneo, os participantes na manifestação "Lagune d'Italia" e os Dirigentes da Casa Editora Le Monnier.
Dirijo votos especiais ao atleta dos "Fachos dourados", que em trinta horas fará de biciclieta o trajecto Roma-Pádua, em apoio à iniciativa "Trinta horas pela vida", em favor dos doentes de leucemia.

Dirijo-me, enfim, aos Doentes hoje presentes, aos jovens Casais e aos Jovens, entre os quais saúdo em particular os estudantes vencedores do concurso do Movimento pela Vida.
Celebra-se nestes dias, em Roma, o Congresso Mariológico-Mariano. Convido-vos, caros jovens, a imitar o generoso "sim" de Maria; a vós, queridos doentes, a senti-la presente na provação; e a vós, prezados jovens esposos, a acolhê-la espiritualmente no vosso lar.




AUDIÊNCIA

Quarta-feira 27 de Setembro de 2000




Caríssimos Irmãos e Irmãs:

1. Segundo as orientações definidas em Tertio millenio adveniente, este ano jubilar, na solene celebração da Encarnação, deve ser um ano "intensamente eucarístico" (TMA 55). Por isso, depois de ter fixado o olhar sobre a glória da Trindade, que resplandece no caminho do homem, iniciamos uma catequese sobre a grande e, ao mesmo tempo, humilde celebração da glória divina que é a Eucaristia. Grande porque é a expressão principal da presença de Cristo no meio de nós, "todos os dias e até ao fim dos tempos" (Mt 28,20); humilde, porque está ligada aos sinais simples e quotidianos do pão e do vinho, alimento e bebida usados na terra de Jesus e em muitas outras regiões. Neste carácter quotidiano dos alimentos, a Eucaristia introduz não só a promessa, mas o "penhor" da futura glória: "futurae gloriae nobis pignus datur" (São Tomás de Aquino. Officium de festo corporis Christi). Para atingir a grandeza do mistério eucarístico, queremos considerar hoje o tema da glória divina e da acção de Deus no mundo, ora manifestada nos grandes acontecimentos da revelação, ora escondida sob humildes sinais, que só a visão da fé pode perceber.

2. No Antigo Testamento, com a palavra hebraica Kabód indica-se a revelação da glória divina e a presença de Deus na história e na criação. A glória do Senhor refulge sobre o cimo do Sinai, aquando da revelação da Palavra divina (cf. Êx Ex 24,16). Está presente sobre a tenda santa e na liturgia do povo de Deus peregrino no deserto (cf . Lv Lv 9,23). Domina no templo, a morada como diz o Salmista "onde habita a tua glória" (Ps 26,8). Envolve como um manto de luz (cf. Is Is 60,1) todo o povo eleito: o próprio Paulo é conhecedor de que "os Israelitas possuem a adopção de filhos, a glória, a aliança..." (Rm 9,4).

3. Esta glória divina que se manifesta de modo especial a Israel está presente em todo o universo, como o profeta Isaías ouviu proclamar aos serafins no momento da sua vocação: "Santo, santo, santo é o Senhor dos exércitos! Toda a terra está cheia da sua glória" (Is 6,3). Antes, o Senhor revela a todos os povos a sua glória, como se lê no Saltério: "Todos os povos contemplam a sua glória" (Ps 97,6). O acender da luz da glória é, portanto, universal, pelo que toda a humaniddae pode descobrir a presença divina no cosmos.

Acima de tudo, em Cristo se realiza esta revelação porque ele é "irradiação da glória" divina (He 1,3). Antes de mais, é isso mesmo através das suas obras, como testemunha o evangelista João, perante o sinal de Caná: Cristo "manifestou a sua glória e os seus discípulos acreditaram nele" (Jn 2,11). Ele irradia a glória divina também através da sua palavra, que é palavra divina: "Eu dei-lhes a tua palavra", diz Jesus ao Pai; "a glória que tu me deste, eu lha dei a eles" (Jn 17,14 Jn 17,22). Mais radicalmente, Cristo manifesta a glória divina através da sua humanidade, assumida na encarnação: "o Verbo fez-se carne e habitou entre nós; e nós vimos a sua glória, glória como do unigénito do Pai, cheio de graça e de verdade" (Jn 1,14).

4. A revelação terrena da glória divina atinge o seu ponto culminante na Páscoa que, sobretudo nos escritos joaninos e paulinos, é descrita como uma glorificação de Cristo à direita do Pai (cf. Jo Jn 12,23 Jn 13,31 Jn 17,1 Ph 2,6-11 Col 3,1 1Tm 3,16). Ora, o mistério pascal, expressão da "perfeita glorificação de Deus" (SC 7), perpetua-se no sacrifício eucarístico, memorial da morte e da ressurreição confiado por Cristo à Igreja, sua esposa amada (cf. SC SC 47). Com o mandamento "Fazei isto em memória de Mim" (Lc 22,19), Jesus assegura a presença da glória pascal através de todas as celebrações eucarísticas que marcarão o decurso da história humana. "Através da santa Eucaristia, o acontecimento da Páscoa de Cristo espalha-se a toda a Igreja (...). Com a comunhão do corpo e do sangue de Cristo, os fiéis crescem na misteriosa divinização que, graças ao Espírito Santo, os faz habitar no Filho como filhos do Pai (João Paulo II e Moran Mar Ignatius Zakka I Iwas, Declaração Comum 23.6.1984, n. 6: EV 9,74).

5. Não há dúvida de que temos a mais alta celebração da glória divina na liturgia. "Dado que a morte de Cristo na Cruz e a sua Ressurreição constituem o conteúdo da vida quotidiana da Igreja e o penhor da sua Páscoa eterna, a Liturgia tem como função primária reconduzir-nos a trilhar infatigavelmente o canminho pascal aberto por Cristo, no qual se aceita morrer para entrar na vida" (Carta Apostólica Vicesimus quintus annus, 6). Ora, este dever exercita-se, antes de tudo, por meio da celebração eucarística, que torna presente a Páscoa de Cristo e comunica o seu dinamismo aos fiéis. Assim, o culto cristão é a expressão mais viva do encontro entre a glória divina e a glorificação que sai dos lábios e do coração do homem. À "glória do Senhor que enche a morada" do templo com a sua presença luminosa (cf. Êx Ex 40,34) deve corresponder o nosso "glorificar o Senhor com espírito generoso" (Si 35,7).

6. Como nos recorda S. Paulo, devemos também glorificar a Deus no nosso corpo, quer dizer, em todo o nosso ser, porque o nosso corpo é templo do Espírito que está em nós (cf. 1Co 6,19 1Co 6,20). A esta luz, pode também falar-se de uma celebração cósmica da glória divina. O mundo criado, "tantas vezes desfigurado pelo egoísmo e pela cobiça", tem em si uma potencialidade eucarística": "ele está destinado a ser assumido na Eucaristia do Senhor, na sua Páscoa presente no sacrifício do altar" (Orientale lumen 11). Ao elevar da glória do Senhor, que está "acima do céu" (Ps 113,4) e se irradia sobre o Universo, responderá então, como contraponto de harmonia, o coro de louvores da criação de forma a que "em tudo Deus seja glorificado por meio de Jesus Cristo, ao Qual pertencem a glória e o poder para sempre. Amen!" (1P 4,11).



Saudações

Caríssimos Irmãos e Irmãs

Saúdo cordialmente os peregrinos de língua portuguesa aqui presentes. A todos desejo felicidades, com abundantes favores e graças celestes. Em particular, os peregrinos e visitantes vindos do Brasil; desejo que desta visita a Roma e deste encontro leveis revigorada a fé no Espírito Santo que dá a vida, presente e actuante na Eucaristia, na Igreja e nos corações em graça de Deus. Com a minha Bênção apostólica.

Recebo com cordialidade as pessoas de língua francesa, aqui presentes hoje de manhã. Saúdo particularmente os peregrinos das Dioceses de Blois e de Tolosa, acompanhados pelos seus Bispos; a comunidade do seminário universitário Pio XI de Tolosa, um grupo do seminário de Metz, guiado pelo seu Bispo. A vossa peregrinação nas pegadas dos Apóstolos Pedro e Paulo vos estimule na fé e testemunho junto dos vossos irmãos! A cada um concedo de todo o coração a Bênção apostólica.

Dou calorosas boas-vindas aos peregrinos jubilares das Dioceses de Sioux Falls, guiados por D. Robert Carlson; de Providência, por D. Louis Gelineau; de Trenton, por D. John Smith; e de Portlândia, por D. Joseph Gerry e por D. Michael Cote. Sobre todos os peregrinos e visitantes de língua inglesa, especialmente da Inglaterra, Irlanda, Escócia, Noruega, Dinamarca, Filipinas e Estados Unidos da América, invoco a alegria e a paz de nosso Senhor Jesus Cristo.

Caríssimos peregrinos holandeses e belgas!

Faço votos por que a vossa peregrinação aos túmulos dos Apóstolos cumule a vossa vida com a riqueza da graça do Senhor. De coração concedo-vos a Bênção apostólica.
Louvado seja Jesus Cristo!


Dou as boas-vindas aos peregrinos de expressão espanhola.

Em especial aos oriundos da Arquidiocese de Madrid, com o Cardeal António Maria Rouco Varela, e da Diocese de Tarazona, com D. Carmelo Borobia. A peregrinação a Roma neste Jubileu há-de introduzir-vos em um novo período de graça e de missão: revitalizai as vossas comunidades, situando a Eucaristia no centro e entregando-vos dia a dia aos irmãos. Saúdo também os sacerdotes do Colégio Mexicano e do Movimento "Schoenstatt", o grupo "Anjos de Maria", a Cooperativa "Virgem das Angústias" e os demais grupos provenientes da Espanha, México, República Dominicana, Venezuela, El Salvador e Argentina. Faço votos por que experimenteis a glória de Deus e O glorifiqueis com a vossa vida.

As minhas cordiais boas-vindas aos irmãos e irmãs da Lituânia!

Caríssimos, ao buscardes o Senhor com todo o vosso coração e com todas as vossas forças, sede portadores de esperança uns para com os outros. Permanecei no coração de Cristo e da Igreja, enquanto vos acompanho com a oração e vos concedo a minha Bênção.
Louvado seja Jesus Cristo!

Enfim, dirijo um pensamento especial aos jovens, aos enfermos e aos novos casais. O exemplo de caridade de São Vicente de Paulo, que hoje comemoramos na liturgia, vos leve, prezados jovens, a realizar os projectos do vosso futuro em um jubiloso e abnegado serviço ao próximo. Vos auxilie, dilectos doentes, a enfrentar o sofrimento como especial vocação de amor, para encontrardes nela a paz e o conforto de Cristo. E por fim vos estimule, queridos novos casais, a construir uma família cada vez mais aberta aos pobres e também ao dom da vida.



                                                                         Outubro de 2000

AUDIÊNCIA

Quarta-feira 4 de Outubro de 2000




Caríssimos irmãos e irmãs:

1. Entre os múltiplos aspectos da Eucaristia ressalta o do "memorial", que está relacionado com um tema bíblico de primeira importância. Lemos, por exemplo, no livro do Êxodo: "Deus recordou-se da Sua aliança com Abraão e Jacob" (2, 24). No Deuteronómio, ao invés, diz-se: "Lembra-te do Senhor, teu Deus" (8, 18). "Recorda-te daquilo que o Senhor, teu Deus, fez..." (7, 18). Na Bíblia, a recordação de Deus e a lembrança do homem entrelaçam-se e constituem uma componente fundamental na vida do povo de Deus. Porém, não se trata da mera comemoração de um passado já extinto, mas sim de um zikkarôn, isto é, de um "memorial". "Não é somente a lembrança dos acontecimentos do passado, mas a proclamação das maravilhas que Deus fez por amor dos homens. Na celebração litúrgica destes acontecimentos, eles tornam-se de certo modo presentes e actuais" (Catecismo da Igreja Católica, CEC 1363). O memorial lembra um laço de aliança que jamais cessa: "O Senhor se lembre de nós e nos abençoe" (Ps 115,12).

Por conseguinte, a fé bíblica implica a recordação eficaz das maravilhosas obras da salvação. Elas são professadas no "Grande Hallel", o Salmo 136, que depois de ter proclamado a criação e a salvação oferecida a Israel no Êxodo conclui: "Ele lembrou-se de nós na nossa humilhação, porque o seu amor é para sempre (...) Ele livrou-nos (...) dá o pão a todo o ser vivo, porque o seu amor é para sempre" (Ps 136,23-25). Encontraremos palavras semelhantes no Evangelho, nos lábios de Maria e de Zacarias: "Ele socorre Israel, Seu servo, lembrando-Se da Sua misericórdia (...) e recordando-Se da Sua santa aliança" (Lc 1,54 Lc 1,72).

2. No Antigo Testamento, o "memorial" por excelência das obras de Deus na história era a liturgia pascal do Êxodo: cada vez que o povo de Israel celebrava a Páscoa, Deus oferecia-lhe, de modo eficaz, o dom da liberdade e da salvação. Portanto, no rito pascal cruzavam-se as duas recordações, a divina e a humana, isto é, a graça salvífica e a fé reconhecida: "Este dia será para vós um memorial; celebrai-o como festa do Senhor (...) Isto servirá como sinal no braço e faixa na fronte, para que tenhas na tua boca a lei do Senhor que te tirou do Egipto com mão forte" (Êx 12, 14; 13, 9). Em virtude deste acontecimento, como afirmava um filósofo judeu, Israel será sempre "uma comunidade assente na recordação" (M. Buber).

3. O laço entre a recordação de Deus e a lembrança do homem está também no centro da Eucaristia, que é o "memorial" por excelência da Páscoa cristã. A "anamnese", isto é, o acto de recordar, é efectivamente o coração da Celebração; o sacrifício de Cristo, acontecimento único, realizado ef'hapax, isto é, "de uma vez para sempre" (He 7,27 He 9,12 He 9,26 He 10,12), difunde a sua presença salvífica no tempo e no espaço da história humana. Isto é expresso no imperativo final que Lucas e Paulo relatam na narração da Última Ceia: "Isto é o Meu corpo que será entregue por vós; fazei isto em memória de Mim... Este cálice é a Nova Aliança no Meu sangue; todas as vezes que beberdes dele, fazei-o em memória de Mim" (1Co 11,24-25 cf. Lc Lc 22,19). O passado do "corpo dado por nós" na cruz apresenta-se vivo ainda hoje e, como declara Paulo, abre-se ao futuro da redenção final: "Todas as vezes que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, anunciais a morte do Senhor, até que Ele venha" (1Co 11,26). A Eucaristia é, pois, memorial da morte de Cristo, mas também presença do seu sacrifício e antecipação da sua vinda gloriosa. É o sacramento da contínua proximidade salvadora do Senhor ressuscitado na história.

Assim, compreende-se a exortação de Paulo a Timóteo: "Lembra-te de que Jesus Cristo, descendente de David, ressuscitou dos mortos" (2Tm 2,8). Esta recordação vive e actua de maneira especial na Eucaristia.

4. O evangelista João explica-nos o sentido profundo da "recordação" das palavras e dos acontecimentos de Cristo. Perante o gesto de Jesus que purifica o templo dos mercadores e anuncia que este será destruído e de novo levantado em três dias, ele faz notar: "Quando Ele ressuscitou, os discípulos lembraram-se do que Jesus tinha dito e acreditaram na Escritura e na palavra de Jesus" (Jn 2,22). Esta memória que gera e alimenta a fé é obra do Espírito Santo "que o Pai enviará em nome" de Cristo: "Ele ensinar-vos-á todas as coisas e vos fará recordar tudo o que Eu vos disse" (Jn 14,26). É, portanto, uma recordação eficaz: a interior, que conduz à compreensão da Palavra de Deus, e a sacramental que se realiza na Eucaristia. São as duas realidades da salvação, que Lucas uniu na esplêndida narração dos discípulos de Emaús, feita claramente pela explicação das Escrituras e do "partir o pão" (cf. Lc Lc 24,13-35).

5. Portanto, "recordar" é "trazer de novo ao coração" com a memória e o afecto, mas também celebrar uma presença. "A Eucaristia, verdadeiro memorial do mistério pascal de Cristo, é capaz de manter viva em nós a memória do seu amor. Por isso, ela é o segredo da vigilância da Igreja: diversamente, sem a eficácia desta lembrança contínua e dulcíssima, e sem a força penetrante deste olhar do seu Esposo fixo sobre ela, ser-lhe-ia muito fácil cair no esquecimento, na insensibilidade e na infidelidade" (Carta Apostólica Patres Ecclesiae, III: Ench. Vat., 7, 33). Esta exortação à vigilância torna as nossas liturgias eucarísticas abertas à vinda do Senhor na plenitude, à manifestação da Jerusalém celeste. Na Eucaristia, o cristão alimenta a esperança do encontro definitivo com o seu Senhor.

Apelo do Papa em favor da África

Já há várias semanas chegam notícias preocupantes de ataques sangrentos na Guiné, contra a população local e contra os refugiados da Libéria e de Serra Leoa. Em nome de Deus, peço que se desista de tanta violência e se respeitem os direitos de todos, em particular dos refugiados, que já vivem em condições precárias.

Depois, dirijo um premente apelo a fim de que sejam libertados os dois Sacerdotes Xaverianos, Pe. Franco Manganello e Pe. Víctor Mosele, raptados na Missão de Pamalap, na região de Forecariah, no dia 6 de Setembro passado.

Por fim, exprimo a minha tristeza e oração por dois agentes do Evangelho, brutalmente assassinados nos últimos dias: Pe. Raffaele de Bari, Comboniano, em Uganda, e o Sr. António Bargiggia, Missionário Leigo dos Irmãos dos Pobres, no Burundi. O Senhor receba na sua paz estes seus servidores fiéis, que morreram no cumprimento do "maior mandamento": o do amor.

Saudações

Caríssimos Irmãos e Irmãs!

Saúdo cordialmente quantos me escutam de língua portuguesa, de modo especial os grupos de portugueses de Alcobaça, Ladoeiro, Estarreja, Turquel, Abrantes e Lisboa, e os peregrinos do Brasil de São Paulo e de Penedo. Sedebem-vindos! E que leveis de Roma a mais viva certeza que é apelo: Jesus Cristo Caminho, Verdade e Vida o Redentor dos homens, é o nosso único Salvador que, por nós e para a nossa salvação, morreu na cruz para merecermos a esperança da feliz ressurreição.
Que vos iluminem os testemunhos de São Pedro e São Paulo e vos assista a graça de Deus, que imploro para vós e vossas famílias, com a Bênção Apostólica.

É com grande alegria que acolho a peregrinação jubilar proveniente da Ucrânia, composta de seis Bispos, numerosos Sacerdotes, Religiosas de várias Congregações e cerca de 400 fiéis. Caríssimos, a visita aos túmulos dos Apóstolos e dos Mártires revigore em cada um de vós a fé, a esperança e o amor, contribuindo para renovar a união fraterna e o testemunho evangélico nas vossas comunidades.
A vós e aos vossos entes queridos concedo de coração a minha Bênção Apostólica.

Saúdo com afecto as duas peregrinações diocesanas italianas, provenientes hoje de Tricárico, com D. Salvatore Ligório, e de Noto, com D. Giuseppe Malandrino. Caríssimos Irmãos e Irmãs, ao agradecer-vos a presença, faço votos por que deste itinerário jubilar possais tirar abundantes frutos para a vida tanto pessoal como comunitária.

Além disso, dirijo uma cordial saudação a D. Rino Fisichella e aos sacerdotes que concluem o primeiro Curso de Exercícios espirituais sobre a Misericórdia Divina. Caríssimos, o vosso ministério seja um testemunho fiel e generoso do amor misericordioso de Cristo Bom Pastor.
É-me grato acolher o novo grupo de Sacerdotes do Colégio São Paulo Apóstolo, provenientes de cinquenta países, e desejo-lhes um sereno e profícuo empenho de estudo.

Por ocasião da Jornada Mundial da Diabete, dirijo um particular encorajamento às muitas pessoas que enfrentam quotidianamente esta doença.

Saúdo, além disso, o numeroso grupo do Decanato de Lecco, na Arquidiocese de Milão; os fiéis das Paróquias dedicadas a Santa Cristina Mártir; a Família de Legnano, que recorda os 50 anos de actividade; a delegação hípica internacional que, por ocasião do Ano Santo, promoveu uma especial manifestação no Hipódromo romano de Tor di Valle; o Círculo Feminino de Amizade Europeia e a Associação dos trabalhadores "pendolari" do Lácio.

Enfim, dirijo-me aos Jovens, aos Doentes e aos novos Casais.

Caríssimos, celebramos hoje a festa de São Francisco de Assis. Para vós, jovens, ele seja modelo de vida evangélica; para vós, doentes, exemplo de amor à Cruz de Cristo; para vós, jovens casais, convite a ter sempre confiança na Providência divina.






AUDIÊNCIA

Quarta-feira 11 de Outubro de 2000

A Eucaristia é "sacrificium laudis"




Queridos Irmãos e Irmãs,

1. "Por Cristo, com Cristo e em Cristo, a Vós, Deus Pai omnipotente, na unidade do Espírito Santo, toda a honra e toda a glória". Esta proclamação de louvor trinitário conclui em toda a celebração eucarística a oração do Cânon. Com efeito, a Eucaristia é o perfeito "sacrifício de louvor", a glorificação mais excelsa que da terra sobe ao céu, "fonte e centro de toda a vida cristã, na qual (os filhos de Deus) oferecem (ao Pai) a vítima divina e a si mesmos juntamente com ela" (LG 11). No Novo Testamento, a Carta aos Hebreus ensina-nos que a liturgia cristã é oferecida por um "Sumo Sacerdote, santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores e elevado acima dos Céus", que se realizou de uma vez para sempre um único sacrifício, "oferecendo-Se a Si mesmo" (cf. Hb He 7,26-27). "Por meio d'Ele diz a Carta oferecemos, sem cessar, a Deus um sacrifício de louvor" (ibid., 13, 15). Queremos hoje evocar brevemente os dois temas do sacrifício e do louvor que se encontram na Eucaristia, sacrificium laudis.

2. Na Eucaristia actualiza-se, antes de mais, o sacrifício de Cristo. Jesus está realmente presente sob as espécies do pão e do vinho, como Ele mesmo nos assegura: "Isto é o Meu corpo... Este é o Meu sangue" (Mt 26,26 Mt 26,28). Mas o Cristo presente na Eucaristia é o Cristo já glorificado, que na Sexta-Feira Santa Se ofereceu a Si mesmo na cruz. É o que sublinham as palavras por Ele pronunciadas sobre o cálice do vinho: "Este é o Meu sangue, sangue da Aliança, que vai ser derramado por muitos" (Mt 26,28 cf. Mc Mc 14,24 Lc 22,20). Se estas palavras forem examinadas à luz da sua filigrana bíblica, afloram duas referências significativas. A primeira é constituída pela locução "sangue derramado" que, como afirma a linguagem bíblica (cf. Gn Gn 9,6), é sinónimo de morte violenta. A segunda consiste na explicação "por muitos", referente aos destinatários deste sangue derramado. A alusão aqui remete-nos para um texto fundamental com vista na releitura cristã das Escrituras, o quarto cântico de Isaías: com o seu sacrifício, "ao entregar a sua vida à morte", o Servo do Senhor "tomava sobre si os pecados de muitos" (53, 12; cf. Hb He 9,28 1P 2,24).

3. A mesma dimensão sacrifical e redentora da Eucaristia é expressa na Última Ceia pelas palavras de Jesus sobre o pão, tal como são referidas pela tradição de Lucas e de Paulo: "Isto é o Meu corpo, que vai ser entregue por vós" (Lc 22,19 cf. 1Co 11,24). Também neste caso se verifica uma chamada à doação sacrifical do Servo do Senhor, segundo a passagem de Isaías (53, 12), já evocada: "Ele próprio entregou a sua vida à morte... tomou sobre si os pecados de muitos e intercedeu pelos culpados". "A Eucaristia é, acima de tudo, um Sacrifício: sacrifício da Redenção e, ao mesmo tempo, da nova Aliança, como nós acreditamos e as Igrejas do Oriente professam claramente: o sacrifício hodierno afirmou, há alguns séculos a Igreja grega (no Sínodo Constantinopolitano de 1156-57, contra Sotérico) é como aquele que um dia ofereceu o Unigénito Verbo Encarnado [de Deus]; e é (hoje como então) por Ele oferecido, sendo o mesmo e único Sacrifício" (Carta Apostólica Dominicae cenae, 9).

4. A Eucaristia, como sacrifício da nova Aliança, põe-se como desenvolvimento e cumprimento da aliança celebrada no Sinai, quando Moisés derramou metade do sangue das vítimas sacrificais sobre o altar, símbolo de Deus, e metade sobre a assembleia dos filhos de Israel (cf. Êx Ex 24,5-8). Este "sangue da aliança" unia intimamente Deus e o homem num vínculo de solidariedade. Com a Eucaristia a intimidade torna-se total, o abraço entre Deus e o homem atinge o seu ápice. É a realização completa daquela "nova aliança" que Jeremias tinha predito (cf. 31, 31-34): um pacto no espírito e no coração, que a Carta aos Hebreus exalta precisamente partindo do oráculo do profeta, unindo-o ao sacrifício único e definitivo de Cristo (cf. Hb He 10,14-17).

5. A esta altura, podemos ilustrar a outra afirmação: a Eucaristia é um sacrifício de louvor. Essencialmente orientado para a comunhão plena entre Deus e o homem, "o sacrifício eucarístico é a fonte e o centro de todo o culto da Igreja e de toda a vida cristã. Neste sacrifício de acção de graças, de propiciação, impetração e louvor os fiéis participam com maior plenitude, quando não só oferecem ao Pai com todo o coração, em união com o sacerdote, a vítima sagrada e, nela, a si mesmos, mas recebem também a própria vítima no sacramento" (Sagrada Congregação para os Ritos, Eucharisticum mysterium, 3 e).

Como diz o próprio termo na sua génesis grega, a Eucaristia é "agradecimento"; nela o Filho de Deus une a Si a humanidade remida num cântico de acção de graças e de louvor. Recordamos que a palavra hebraica todah, traduzida como "louvor", significa também "agradecimento". O sacrifício de louvor era um sacrifício de acção de graças (cf. Sl Ps 50 [49], 14.23). Na Última Ceia, para instituir a Eucaristia, Jesus deu graças a seu Pai (cf. Mt paralelos); esta é a origem do nome deste sacramento.

6. "No Sacrifício eucarístico, toda a Criação amada por Deus é apresentada ao Pai, através da Morte e Ressurreição de Cristo" (Catecismo da Igreja Católica, CEC 1359). Unindo-se ao sacrifício de Cristo, a Igreja na Eucaristia dá voz ao louvor da inteira criação. A isto deve corresponder o empenho de cada um dos fiéis em oferecer a sua existência, o seu "corpo" como diz Paulo em "sacrifício vivo, santo e agradável a Deus" (Rm 12,1), numa comunhão plena com Cristo crucificado e ressuscitado por todos, e o discípulo é chamado a doar-se inteiramente a Ele.


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