Discursos João Paulo II 2000 18

DISCURSO DE JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES


NA ASSEMBLEIA PLENÁRIA DA


CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ


Sexta-feira, 28 de Janeiro de 2000

Senhores Cardeais
Venerados Irmãos no Episcopado
e no Sacerdócio
19 Caríssimos fiéis colaboradores

1. É-me deveras grato encontrar-vos no termo da vossa Assembleia plenária. Desejo exprimir-vos o meu reconhecimento e apreço pelo trabalho quotidiano que o vosso Dicastério realiza ao serviço da Igreja para o bem das almas, em sintonia com o Sucessor de Pedro, primeiro guardião e paladino do sagrado depósito da fé.

Estou grato ao Senhor Cardeal Joseph Ratzinger pelos sentimentos que, em nome de todos, me manifestou no seu discurso e pela sua exposição dos temas que foram objecto de atenta reflexão durante a vossa Assembleia, consagrada em particular ao aprofundamento da problemática da unicidade de Cristo e à revisão das normas dos chamados "delicta graviora".

2. Agora, gostaria de abordar brevemente os principais assuntos debatidos durante esta vossa Assembleia. O vosso Dicastério considerou oportuno e imperioso começar um estudo acerca dos temas da unicidade e da universalidade salvífica de Cristo e da Igreja. A confirmação da doutrina do Magistério em relação a tais temas é proposta em vista de fazer o mundo ver "a luz do Evangelho da glória de Cristo" (
2Co 4,4) e de confutar erros e graves ambiguidades que se configuraram e se estão a difundir em vários âmbitos.

Com efeito, nestes últimos anos, em ambientes teológicos e eclesiais emergiu uma mentalidade destinada não só a tornar relativas a revelação de Cristo e a sua mediação única e universal em vista da salvação, mas também a redimensionar a necessidade da Igreja de Cristo como sacramento universal da salvação.

Para pôr remédio a esta mentalidade relativista, é preciso reiterar sobretudo o carácter definitivo e íntegro da revelação de Cristo. Fiel à palavra de Deus, o Concílio Vaticano II ensina que "a verdade profunda, tanto a respeito de Deus como da salvação dos homens, se nos manifesta por esta revelação na pessoa de Cristo, que é o mediador e simultaneamente a plenitude de toda a revelação" (Constituição dogmática Dei Verbum DV 2).

Por isso, na Carta Encíclica Redemptoris missio repropus à Igreja a tarefa de proclamar o Evangelho como plenitude da verdade: "Nesta palavra definitiva da sua revelação, Deus deu-se a conhecer do modo mais pleno: Ele disse à humanidade quem é. E esta auto-revelação definitiva de Deus é o motivo fundamental pelo qual a Igreja é missionária por sua natureza. Não pode deixar de proclamar o Evangelho, ou seja, a plenitude da verdade que Deus nos deu a conhecer de si mesmo" (n. 5).

3. Por conseguinte, é contrária à fé da Igreja a tese acerca do carácter limitado da revelação de Cristo, que encontraria um seu complemento nas outras religiões. O motivo essencial desta asserção quer fundamentar-se no facto de que a verdade sobre Deus não poderia ser compreendida e manifestada na sua globalidade e integridade por qualquer religião histórica, portanto nem pelo cristianismo e nem sequer por Jesus Cristo. Porém, esta posição contradiz as afirmações de fé segundo as quais em Jesus Cristo se verifica a plena e completa revelação do mistério salvífico de Deus, enquanto a compreensão do mistério infinito deve ser sempre avaliado e aprofundado à luz do Espírito de verdade que nos orienta no tempo da Igreja "para toda a verdade" (Jn 16,13).

Embora sejam limitadas como realidades humanas, as palavras, as obras e o inteiro evento histórico de Jesus têm contudo como fonte a Pessoa divina do Verbo encarnado e por isso contêm em si o carácter definitivo e completo da revelação das suas vias salvíficas e do mesmo mistério divino. A verdade sobre Deus não é abolida nem reduzida, porque é pronunciada em linguagem humana. Ao contrário, ela permanece única, plena e completa porque quem fala e age é o Filho de Deus encarnado.

4. Em conexão com a unidade da mediação salvífica de Cristo coloca-se a unicidade da Igreja por Ele fundada. Com efeito, o Senhor Jesus constitui a sua Igreja como realidade salvífica: como seu Corpo, mediante o qual Ele mesmo actua na história da salvação. Assim como há um só Cristo, também existe o seu único Corpo: "Igreja una, católica e apostólica" (cf. Símbolo de fé, DS 48). A este respeito, o Concílio Vaticano II afirma: "O santo Concílio... assente na Sagrada Escritura e na Tradição, ensina que esta Igreja peregrina na terra é necessária para a salvação" (Constituição dogmática Lumen gentium LG 14).

Efectivamente, é erróneo considerar a Igreja como um caminho de salvação ao lado daqueles constituídos por outras religiões, que seriam complementares à Igreja e convergentes com esta, rumo ao Reino de Deus escatológico. Portanto, deve-se excluir uma certa mentalidade de indiferentismo "caracterizada por um relativismo religioso, que considera que uma religião vale outra" (cf. Carta Encíclica, Redemptoris missi, 36).

20 É verdade que os não-cristãos recordou o Concílio vaticano II podem "alcançar" a vida eterna "sob a acção da graça", se "buscarem a Deus na sinceridade do coração" (Lumen gentium LG 16). Todavia, na sua busca sincera da verdade de Deus eles são de facto "ordenados" para Cristo e o seu Corpo, que é a Igreja (cf. ibid.). De qualquer forma, encontram-se numa situação deficitária, se se comparar esta com aquela das pessoas que na Igreja têm a plenitude dos meios salvíficos. Portanto é compreensível que, seguindo o mandato do Senhor (cf. Mt Mt 28,19-20) e como exigência do amor por todos os homens, a Igreja "anuncia e tem o dever de anunciar constantemente a Cristo, que é "o Caminho, a Verdade e a Vida" (Jn 14,6), no qual os homens encontram a plenitude da vida religiosa e no qual Deus reconciliou todas as coisas consigo (cf. 2Co 5,18-19)" (Declaração Nostra aetate NAE 2).

5. Na Carta Encíclica Ut unum sint, confirmei solenemente o compromisso da Igreja católica no "restabelecimento da unidade", na linha da grande causa do ecumenismo que o Concílio Vaticano II teve muito a peito. Juntamente com o Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, contribuístes para a consecução do acordo acerca de verdades fundamentais da doutrina sobre a justificação, assinado no dia 31 do passado mês de Outubro em Ausburgo. Embora não faltem dificuldades, com confiança na assistência da graça divina progredimos ao longo deste caminho. Porém, o nosso ardente desejo de um dia chegarmos à plena comunhão com as outras Igrejas e Comunidades eclesiais não deve obscurecer a verdade de que a Igreja de Cristo não é uma utopia a recompor a partir dos fragmentos actualmente existentes, com as nossas forças humanas. O Decreto Unitatis redintegratio falou explicitamente da unidade "que acreditamos subsistir sem a possibilidade de se ter perdido na Igreja católica, e que esperamos crescerá cada vez mais, até ao fim dos séculos" (n. 4).

Caríssimos Irmãos, no serviço que a vossa Congregação oferece ao Sucessor de Pedro e ao Magistério da Igreja, contribuís para fazer com que a revelação de Cristo continue a ser na história "a verdadeira estrela de orientação" da inteira humanidade (Fides et ratio FR 15).

Enquanto me congratulo convosco por este importante e precioso ministério, exprimo-vos o meu encorajamento a prosseguirdes com um novo impulso no serviço à verdade salvífica: Christus heri, hodie et semper!

Com estes sentimentos, concedo de coração a todos vós, em penhor de afecto e gratidão, uma especial Bênção apostólica.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO CAPÍTULO GERAL


DACONGREGAÇÃO DOS SERVOS DA CARIDADE


(OBRA DE DOM GUANELLA)


Sábado, 29 de Janeiro de 2000

Caríssimos Religiosos guanelianos
Irmãos e Irmãs no Senhor

1. Dirijo a minha cordial saudação a todos vós, que estais a celebrar nestes dias o Capítulo Geral da Congregação dos Servos da Caridade. Dirijo um particular pensamento de felicitações e de bons votos ao Rev.do Pe. Nino Minetti, que confirmastes no cargo de Superior-Geral. Estes votos tornam-se extensivos a D. Protógenes José Luft, presente neste encontro capitular, que nestes dias nomeei Bispo Coadjutor de Barra do Garças, no Brasil. O Senhor os assista nas respectivas tarefas, para que saibam corresponder aos desígnios que Ele fez para a Congregação e a Igreja no início de um novo milénio. A minha saudação quer alcançar, através de vós aqui presentes, todos os Membros da Obra de Dom Guanella que se encontram na Europa, na África, na Ásia e nas Américas.

Durante os trabalhos do Capítulo, detivestes-vos a reflectir e a rezar sobre um tema estimulante que formulastes: "Identidade carismática e testemunho profético dos Servos da Caridade na Igreja e no mundo do terceiro milénio cristão". De facto, esta é uma ocasião oportuna como nunca para redescobrir a riqueza e a vitalidade do carisma confiado pelo Senhor ao vosso Fundador, o Beato Luís Guanella, no mundo de hoje.

2. O regresso às fontes genuínas da espiritualidade e do testemunho evangélico da Congregação ajudar-vos-á a realizar um aprofundado discernimento para compreender quais são a vontade de Deus e os apelos do Espírito nesta histórica passagem para o terceiro milénio cristão. Este empenho alimentará em todos um renovado impulso para se tornar epifania crível do amor e da ternura de Deus perante as expectativas dos pobres e as necessidades das pessoas que vivem à margem da sociedade.

21 O testemunho da caridade é a grande profecia do tempo actual. Neste Jubileu do ano 2000, no qual a "Porta Santa" é simbolicamente mais ampla para manifestar a grandeza do amor misericordioso de Deus, deve alargar-se a toda a Igreja também a tenda da caridade, a fim de poder receber as multidões de pobres presentes na actual sociedade. Este é um desafio inicial que se apresenta à Família religiosa guaneliana.

Sei que estais a cultivar o desejo de expandir a vossa presença e o vosso testemunho de caridade também nas nações da África e do Extremo Oriente, através de itinerários concretos de apoio a pessoas em dificuldade ou marginalizadas. Encorajo-vos a prosseguir por este caminho, valorizando a vossa experiência pedagógica e pondo à disposição de quantos se encontram em necessidade os vossos recursos espirituais e a vossa competência.

3. Este empenho fundamental, que visa sobretudo responder às necessidades imediatas e concretas dos pobres, deve contudo ser seguido de um anúncio profético que alcance as próprias estruturas da sociedade, que estão na base de tantas injustiças e opressões em relação às camadas mais débeis. Eis o segundo e mais empenhativo desafio para os que escolheram seguir Cristo, bom Samaritano, que se inclina sobre as chagas físicas e espirituais do homem. Trata-se de incidir, com a força do Evangelho, sobre os processos culturais e sociais, a fim de tornar o ânimo humano capaz de mudar os seus critérios de juízo e os modelos de vida que estão em contraste com os desígnios de Deus.

Perante tais desafios empenhativos, o luminoso exemplo do Beato Luís Guanella levar-vos-á a escolher como critério fundamental do vosso ser e do vosso agir o mandamento do amor, transformado em opções concretas de serviço e de promoção dos mais pobres. Isto far-vos-á estar presentes nas fronteiras da caridade, com plena confiança na Providência.

Assim como no passado, a vossa Família religiosa pode contar com o contributo efectivo de numerosos colaboradores e colaboradoras leigos. Fascinados pelo carisma guaneliano, eles partilham generosamente a vossa missão de "bons samaritanos" ao lado dos marginalizados, vivendo assim a fundamental vocação evangélica à caridade.

A presença na Assembleia capitular de uma representação de Irmãs guanelianas e de um grupo de leigos é, neste sentido, significativa como nunca. Ela ajudar-vos-á a aprofundar a unidade e a consolidar a colaboração entre os filhos espirituais de Dom Guanella, para tornar mais eficaz o seu testemunho de caridade e o empenho por um mundo mais justo e fraterno.

4. No espírito do Beato Fundador, perante um mundo muitas vezes atingido por tensões e individualismos, sois cada vez mais sinal visível de diálogo e comunhão fraterna, e testemunhas críveis de reconciliação e paz.

Sabei principalmente redescobrir todos os dias as profundas raízes espirituais da vida comunitária e do serviço de caridade, a fim de continuardes a ver no irmão, sobretudo no que se encontra só e em dificuldade, um autêntico dom da Providência. Na vossa actividade quotidiana, como nas relações recíprocas, esteja sempre vivo o ideal da unidade, indicado por Jesus no "testamento" deixado aos discípulos durante a Última Ceia: Pai, que eles sejam uma coisa só, para que o mundo creia (cf. Jo
Jn 17,21).

Ao desejar que as indicações que surgiram do Capítulo Geral, que estais a celebrar no contexto do Grande Jubileu do Ano 2000, dêem ao vosso Instituto um renovado impulso e vitalidade no empenho espiritual, na vida de fraternidade e no serviço aos pobres e aos marginalizados, invoco a celeste protecção de Nossa Senhora e do Beato Luís Guanella, e abençoo-vos de coração, juntamente com todas as comunidades guanelianas espalhadas pelo mundo.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


NA INAUGURAÇÃO DO NOVO


ESTACIONAMENTO NO JANÍCULO


Segunda-feira, 31 de Janeiro de 2000

Senhores Cardeais
22 Venerados Irmãos no Episcopado
e no Sacerdócio
Estimados Irmãos e Irmãs

1. Sinto-me feliz por inaugurar o novo estacionamento no Janículo, fruto do empenho conjunto da Santa Sé e das Autoridades italianas.

Dirijo a minha cordial saudação ao Senhor Cardeal Jozef Tomko, Prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos, e agradeço-lhe as palavras com que se fez intérprete dos comuns sentimentos e ilustrou, ao mesmo tempo, as finalidades e o funcionamento desta importante obra.

Juntamente com ele saúdo as Autoridades religiosas, civis e militares presentes, dirigindo um pensamento especial ao Prefeito, aos Subsecretários Minniti e Bargone e aos Embaixadores acreditados junto da Santa Sé.

Além disso, desejo exprimir o meu regozijo aos responsáveis das Empresas empreiteiras e a todos os que trabalharam com perícia e empenho na realização desta importante estrutura.

Por fim, dirijo uma afectuosa saudação aos Superiores e estudantes do Colégio Urbano da "Propaganda Fide", bem como aos Professores e aos estudantes da Pontifícia Universidade Urbaniana.

2. O estacionamento no Janículo foi construído num espaço que pertencia à Congregação para a Evangelização dos Povos com a intenção de facilitar o acesso dos peregrinos ao Vaticano, sobretudo durante este ano jubilar, mas também para facilitar a circulação num ponto nevrálgico da Cidade. Portanto, a validade deste importante complexo multifuncional prolonga-se para além do ano 2000. Também depois dele, constituirá para Roma, e sobretudo para as redondezas de São Pedro, uma importante infra-estrutura urbana, destinada a melhorar a situação do trânsito e a qualidade de vida dos habitantes deste bairro.

Por conseguinte, exprimo profundo prazer por uma obra que oferece grandes vantagens urbanas sem danificar o panorama tão conhecido da colina do Janículo, e uno-me de bom grado a todos vós na acção de graças ao Senhor. A Ele confio todos os que contribuíram para a realizar e os que dela beneficiarão.

Sobre todos e cada um, por intercessão de Maria Salus Populi Romani, desçam abundantes favores celestes, dos quais quer ser penhor a Bênção Apostólica que vos concedo com afecto.

Obrigado!





CARTA DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DOS 1200 ANOS DA


CATEDRAL DE AACHEN (ALEMANHA)


Ao meu venerado
23 Irmão no Episcopado

HEINRICH MUSSINGHOFF

Bispo de Aachen

1. "Exultei quando me disseram: 'Iremos à casa do Senhor'" (Ps 122,1).

A jubilosa exclamação do Salmista encontra em Aachen um eco vivo desde há 1200 anos, ou seja, desde que Carlos Magno completou a Capela do seu Palácio e a dedicou a Maria, Auxiliadora dos cristãos. No decurso da história inúmeros peregrinos, adultos e crianças, vieram a essa Catedral dedicada a Nossa Senhora para se deter diante da imagem milagrosa e invocar a protecção materna da Virgem sobre a Igreja e o mundo.

2. Não me é possível estar pessoalmente presente na celebração dos 1200 anos da Catedral de Aachen, mas quis mandar-vos um Enviado Especial na pessoa de Sua Eminência o Cardeal Darío Castrillón Hoyos, que será o meu porta-voz nesta ocasião festiva como meu representante pessoal.

Desse modo, manifesta-se a comunidade católica que encontra o próprio centro na Igreja de Roma e, como uma rede, abraça a terra inteira. Carlos Magno, edificador dessa Casa de Deus, já estava consciente da necessidade destes estreitos vínculos com o Sucessor de Pedro. Com a sua coroação como Imperador, na noite de Natal do ano 800, feita pelo Papa Leão III, essa consciência atingiu um ápice significativo, depois de Carlos Magno ter dado vida, alguns anos antes, à "Schola Francorum" à sombra da Basílica de São Pedro. Devia ser uma casa para acolher os peregrinos que vinham à Cidade Eterna, para visitar os túmulos dos Príncipes dos Apóstolos, depois de terem cruzado os Alpes.

3. Além destes laços com Roma, a Catedral de Aachen possui outro vínculo. Conserva preciosidades, que nos levam com o coração e a mente não só à Cidade Eterna, mas também à Cidade Santa. Jerusalém deu a Carlos Magno quatro relíquias de tecido, que recordam, de modo sensível e repleto de profunda reverência, significativos acontecimentos da história da salvação e, ao mesmo tempo, podem ser consideradas como vestes de peregrino para o povo de Deus a caminho no decurso do tempo.

Quem olha as faixas que envolveram Jesus, recorda-se de que a comunidade de fé deve ser comunidade de vida com Jesus. Com efeito, também Cristo começou a sua vida tal como faz todo o cristão: como recém-nascido. Assim como Jesus cresceu em sabedoria, idade e graça diante de Deus e dos homens (cf. Lc Lc 2,52), assim também nos é pedido que nos preocupemos do crescimento e da maturidade da nossa fé. Na manjedoura, Jesus não era apenas um recém-nascido, mas o Filho de Deus. Deste modo, as faixas que O envolveram são um convite a honrá-l'O com a nossa vida e a levar outras pessoas pelo caminho da adoração. Venite adoremus! Vinde, adoremos o Rei, o Senhor!

O trono do Rei é a cruz. Do ponto de vista da história da salvação, refere-se a isto a relíquia mais preciosa, que se venera na Catedral de Aachen: o pano que envolvia os flancos de Jesus. Ao Rei, na cruz, não foi deixado senão isto, de maneira que pudesse oferecer-Se totalmente por Deus e pelos homens. Assim como Ele se entregou ao Pai e ao mesmo tempo confiou a sua obra a Maria e a João, de igual modo a Igreja, na sua peregrinação ao longo do tempo, tem a missão de proceder rumo a Deus sem hesitações e de Lhe apresentar "as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje" (Gaudium et spes GS 1).

Isto atesta que a ortodoxia do ensino se deve reflectir na coerência da vida. Neste contexto, recordamos o pano da decapitação de João Baptista. Os cristãos da sociedade moderna, professando a fé, em geral, não arriscam a vida. Contudo, o testemunho tem o preço de alguma noite sem dormir e de inúmeras gotas de suor num ambiente social, no qual Cristo se tornou muitas vezes um estranho. Precisamente numa época em que com muita frequência Deus é posto de lado, são necessárias força e coragem, para nos fazermos garantes da inalienável dignidade de todos os homens por amor a Deus, que enviou o próprio Filho "para que tenham vida e a tenham em abundância" (Jn 10,10).

A palavra vida faz-nos pensar em Maria, que foi escolhida para trazer Cristo, a Vida do mundo. A quarta relíquia de tecido na Catedral de Aachen recorda aquela túnica que envolvia a Mãe de Deus na noite santa. Assim como Maria trouxe o Filho no seu seio, de igual modo a Igreja, sua imagem, traz Cristo na veste de peregrino durante os séculos. Aquilo pelo qual viveu Maria deve ser a causa da Igreja no decurso da história: o "mistério da fé" em Jesus Cristo, o "Salvador dos homens" ontem, hoje e sempre. É uma grande honra e uma nobre tarefa da Igreja poder viver com um mistério que Deus mesmo lhe confiou. A Igreja, enquanto guardiã do mistério divino, é convidada a revelar o mistério da salvação "até aos confins do mundo" (Ac 1,8).

24 4. Este mandato evangelizador da Igreja é a sua missão em todos os tempos, mas em particular no Ano Santo 2000, que festejamos como grande Jubileu da Encarnação de Deus. Agradeçamos ao Dador de todas as coisas, pois não só não nos detemos 2000 anos após Cristo, mas pudemos proceder durante 2000 anos com Cristo. Também no novo século o cristianismo tem um futuro luminoso. Isto já fora recordado pelo venerado e precocemente falecido Bispo Klaus Hemmerle, quando poucos meses antes de morrer fez um balanço, com uma espécie de "previsão": "Não somos só administradores de um passado tão precioso e santo, mas precursores de um futuro, que não podemos construir nós, mas que há-de vir porque Ele vem" (Homilia do dia 7 de Novembro de 1993, por ocasião do 18° aniversário da sua ordenação episcopal).

Os meus votos são por que o aniversário dos 1200 anos da Catedral de Aachen recorde a todos os cristãos que eles estão empenhados, como pedras vivas, no edifício de Deus (cf.
1P 2,5). A peregrinação aos santuários, que coincide com o ano jubilar, seja para a Igreja de Aachen um impulso a considerar-se de maneira mais profunda povo peregrinante de Deus e a pôr-se a caminho, com coração alegre e corajoso! Nas veredas rumo ao Senhor, Maria, Mãe de Deus e Mãe da Igreja, seja uma fiel guia! Uno-me espiritualmente a todos vós, que vos reunis à volta do Bispo para celebrar o Jubileu da Catedral de Aachen, e concedo-vos de coração a Bênção Apostólica.

Vaticano, 25 de Janeiro de 2000.

JOÃO PAULO II






DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DA INAUGURAÇÃO


DO NOVO INGRESSO


DOS MUSEUS DO VATICANO


Segunda-feira, 7 de Fevereiro de 2000

Senhores Cardeais
Venerados Irmãos no Episcopado
e no Sacerdócio
Ilustres Senhores e Senhoras!

1. A inauguração do novo ingresso dos Museus do Vaticano é para mim motivo de particular alegria. Este evento, na primeira fase do Grande Jubileu, dá-lhe um significado de singular valor simbólico. Depois de ter aberto as Portas Santas das Basílicas romanas, acesso à graça do Redentor, hoje inauguro o ingresso que introduz naquele templo da arte e da cultura que são os Museus.

É grande a satisfação pela conclusão de uma obra que exigiu muito empenho. Agradeço ao Senhor Cardeal Edmund Casimir Szoka, os sentimentos manifestados também em vosso nome e a interessante apresentação que nos fez dos trabalhos realizados e dos resultados alcançados: a ele e à Direcção dos Serviços Técnicos exprimo o mais vivo apreço, estendendo-o aos consultores e aos empregados e recordando com gratidão o Cardeal Castillo Lara, hoje presente connosco, ao qual se deve o mérito de ter iniciado o empreendimento.

Dirijo também um sentido encorajamento, na pessoa do Director-Geral Regente, Doutor Francesco Buranelli, aos Dirigentes e a todo o pessoal dos Museus do Vaticano. A eles, de facto, compete agora administrar do melhor modo esta imponente estrutura, a fim de que atinja os objectivos para os quais foi concebida e realizada.

25 2. Quando, no final do século XVIII, os Papas Clemente XIV e Pio VI fundaram os Museus do Vaticano no sentido moderno do termo, os visitantes eram uma elite muito restrita. Hoje, eles são milhares por dia, das diversas camadas sociais e culturais e provêm de todas as partes do mundo. Na verdade, pode-se dizer que os Museus constituem, no plano cultural, uma das mais significativas portas da Santa Sé abertas para o mundo.

Daqui o valor não só funcional, mas simbólico de um ingresso mais "capaz", isto é, mais acolhedor, para exprimir a renovada vontade da Igreja de dialogar com a humanidade no sinal da arte e da cultura, pondo à disposição de todos o património que lhe foi confiado pela história.

3. Saúdo cordialmente Giuliano Vangi, autor da escultura colocada neste novo ingresso, e agradeço-lhe porque a sua obra não é somente de celebração, mas um convite à reflexão sobre o mistério petrino, ao qual a Providência me chamou. Desde o primeiro dia do meu pontificado, senti profundamente a missão de ajudar o homem a "cruzar o limiar": a sair da constrição do materialismo rumo à liberdade da fé, a liberdade de ser ele mesmo seguindo Cristo Redentor, supremo defensor da sua dignidade e dos seus direitos. Este serviço ao homem conhece dois momentos, que estão representados nos dois lados do bloco de mármore: o momento da acção e, não menos importante, o da oração. Com efeito, diante dos sofrimentos humanos, a Igreja encontra em Deus a força para impelir o homem para um futuro de esperança e de liberdade.

Congratulo-me, além disso, com o escultor Cecco Bonanotte, autor do portal do novo ingresso. O tema da criação, por ele evocado de maneira simbólica, harmoniza-se bem com o da arte, e parece convidar o visitante a reconhecer com admiração o mistério do Espírito criador no universo, nos seres vivos e sobretudo na pessoa humana.

4. A colaboração entre a Igreja e os artistas foi sempre "fonte de mútuo enriquecimento espiritual", da qual "tirou vantagem a compreensão do homem, da sua imagem autêntica, da sua verdade" (Carta aos Artistas, 13).

É com esta convicção que inauguro o novo ingresso dos Museus do Vaticano, enquanto agradeço mais uma vez a todos vós e vos abençoo de coração, juntamente com todos os que trabalharam para realizar esta obra deveras monumental.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À COMUNIDADE MARONITA POR OCASIÃO


DA PEREGRINAÇÃO JUBILAR


Quinta-feira, 10 de Fevereiro de 2000

Beatitude
Amados Irmãos no Episcopado
Queridos Irmãos e Irmãs
da Igreja Maronita!

26 1. Apresento-vos as boas-vindas à casa do Sucessor de Pedro e à Cidade Eterna, que conserva os túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo, e de muitos outros santos mártires e confessores.

Viestes do Líbano, de outros países do Médio Oriente e da diáspora, para celebrar nestes dias o grande Jubileu, com Sua Beatitude o Cardeal Nasrallah Pierre Sfeir, Patriarca de Antioquia, "Pai e Cabeça" (cf. C.C.I.O.,cân. 55) da Igreja Maronita. A vossa peregrinação a Roma inaugura a visita das Igrejas católicas orientais. De facto, no decurso dos próximos meses, chegarão a Roma os Patriarcas, os Bispos e os fiéis das outras tradições orientais.

2. Ao quererdes dar uma nova prova da vossa adesão indefectível e plurissecular à Sé apostólica romana, viestes a Roma para a festa de São Maron, pedra miliária da vossa Igreja, cuja memória é celebrada, segundo o vosso calendário litúrgico, no dia 9 de Fevereiro. Nesse dia, participastes na Basílica de Santa Maria Maior numa solene celebração eucarística, presidida pelo vosso amado Patriarca. A celebração de ontem, e também a audiência de hoje, fortalecem o vínculo estreito que existe entre a Sé de Roma e a de Antioquia, cidade muito antiga onde "pela primeira vez os discípulos foram tratados pelo nome de cristãos" (
Ac 11,26) e onde o próprio São Pedro viveu. Atraídos por um "imperativo interior" que provém da vossa fé, viestes para "vos avistar com Pedro" (Ga 1,18), para viver com ele a comunhão eclesial. A vossa plena comunhão com a Igreja de Roma é, de facto, uma manifestação tangível da consciência que tendes da unidade: "A unidade é uma característica primordial da Igreja e é exigida por sua natureza profunda" (Exort. Apost. pós-sinodal Uma experiência nova para o Líbano, 84; cf. Orientale lumen, 19). Esta unidade eclesial, que experimentais com vigor nestes dias, ajudar-vos-á por sua vez a empenhar-vos cada vez mais na evangelização do mundo, sendo também a tradição maronita "uma ocasião privilegiada para reavivar o dinamismo e o impulso missionário nos quais cada fiel deve participar" (Exort. Apost. pós-sinodal Uma experiência nova para o Líbano, 84).

3. Consciente e ufana da importância da unidade com Roma, a vossa Igreja, filha espiritual de São Maron, viu florescer numerosos Santos e Santas ao longo dos séculos. No dia 9 de Outubro de 1977, o Papa Paulo VI, meu Predecessor, canonizou Charbel Maklouf, monge eremita e sacerdote da Ordem libanesa maronita, e eu mesmo tive a alegria de proceder a 17 de Novembro de 1985 à beatificação de Rafqa (Rebeca), monja maronita da Ordem libanesa maronita e, no dia 10 de Maio de 1998, à de Nimatullah Al-Hardini, monge e sacerdote da mesma Ordem e pai espiritual de São Charbel.

4. A beatificação de Nimatullah Al-Hardini teve lugar exactamente um ano após a minha peregrinação de 1997 à terra libanesa. Eis por que me é grato evocar aqui as horas que passei no Líbano, onde a Igreja Maronita tem as suas raízes e o seu centro efectivo.

A esperança nova para o Líbano, expressa na Exortação pós-sinodal, documento que foi emanado depois dos trabalhos da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para o Líbano, foi "o meu brado de ressurreição e de paz", mediante o qual "apresentei de novo a terra bíblica dos cedros à consciência do mundo" (L'Osservatore Romano, ed. quot. de 12/13 de Maio de 1997, pág. 1). Encorajo todos os Pastores e fiéis das comunidades católicas do Líbano a acolherem e a assimilarem cada vez mais as propostas e as sugestões desta Exortação. Sinto-me feliz ao saber que já há os primeiros sinais animadores duma aplicação concreta, como resulta também dos trabalhos da última Assembleia dos Patriarcas e dos Bispos Católicos do Líbano (A.P.E.C.L.), que se realizou em Novembro passado em Bkerké.

5. Tenho também o prazer de anunciar que, ontem, após um longo período de não-funcionamento devido à segunda guerra mundial, depois da situação difícil no Líbano, o Pontifício Colégio Maronita reabriu oficialmente as suas portas, graças sobretudo aos esforços incansáveis de Sua Excelência D. Emile Eid, Procurador patriarcal em Roma. Este Instituto, querido pelo Papa Gregório XIII, remonta ao século XVI. Ele acolheu inúmeros e ilustres alunos, dos quais os mais famosos foram o futuro Patriarca maronita Stéphane Douaihi e o grande sábio Joseph S. Assemani, Primeiro Guardião da Biblioteca do Vaticano, célebre orientalista e canonista que teve, entre outros, um papel importante no Sínodo libanês maronita de 1736.

Formulo votos por que os jovens maronitas que viverem neste Colégio histórico contribuam de maneira eficaz, como os seus predecessores, para a vida eclesial maronita, na fidelidade ao espírito da Igreja universal.

6. E quanto à querida terra do Líbano, para a qual se volta com nostalgia o coração dos crentes, desejo-lhe que continue a permanecer fiel à sua vocação de "Mensagem": um lugar onde os cristãos possam viver em paz e fraternidade com os adeptos de outras crenças, e onde sejam capazes de promover um semelhante espírito de convivência (cf. Exort. Apost. pós-sinodal Uma esperança nova para o Líbano, 92). Quero também dizer-vos hoje, com a força do amor: "O Papa está sempre junto de todos vós". Estou ao vosso lado como pai e irmão, neste período em que às vezes a intolerância leva a reavivar os fantasmas do ódio, que desejaríamos ver desaparecer para sempre.

Pela intercessão da Mãe de Deus, dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, de São Maron, de São Charbel, da Beata Rafqa, do Beato Nimatullah Al-Hardini e de todos os Santos da vossa terra, peço ao Senhor que este seja o primeiro fruto do grande Jubileu que celebrais em Roma. Concedo-vos de todo o coração a Bênção Apostólica.





JUBILEU DOS DOENTES


SAUDAÇÃO DO PAPA JOÃO PAULO II


NO FINAL DA PROCISSÃO MARIANA


POR OCASIÃO DO JUBILEU DOS DOENTES


Sexta-feira, 11 de Fevereiro de 2000


Discursos João Paulo II 2000 18