Discursos João Paulo II 2000 187

187 3. Mesmo a legítima procura de meios técnicos sempre mais eficazes e adequados às condições da corrida, deve ser sempre posta ao serviço da pessoa do atleta e não vice-versa, evitando riscos inúteis ou prejudiciais para os desportistas ou para os espectadores.

A actividade desportista, quando é vivida e interpretada de modo correcto, constitui uma singular expressão das melhores energias interiores do homem e da sua capacidade de superar as dificuldades, de se propor metas a conquistar mediante o sacrifício, a generosidade e a constância em enfrentar as fadigas da competição.

Em tudo isto servem de exemplo as nobres figuras de atletas que tornaram grande o desporto do ciclismo na Itália e no mundo. Neste momento o pensamento dirige-se espontaneamente a Gino Nartali, recentemente falecido, grande figura de desportista, de cidadão exemplar e de crente convicto. O seu exemplo permanece para todos um ponto de referência de como se pode praticar o desporto com grande dimensão humana e espiritual, fazendo-o uma luminosa expressão dos mais altos valores da existência e da convivência social.

4. Caros amigos, a todos vós que vos preparais para iniciar a Volta à Itália, faço votos por que vivais este importante evento desportivo animados por autêntico "desportismo", isto é, por uma grande paixão agonística, mas também por um forte espírito de solidariedade e de partilha.

Guie-vos e assista-vos a celeste protecção de Maria, a quem é dedicada de modo particular o mês de Maio, e que invocais como a vossa especial padroeira com o bonito título de Nossa Senhora do Ghisallo. Acompanhe-vos também a minha bênção, que com afecto vos concedo, a vós aqui presentes, aos organizadores, a quantos participarem na manifestação ciclística, assim como a toda a grande família desportiva da Volta à Itália.



JOÃO PAULO II





NA CERIMÓNIA DE BOAS-VINDAS


AO AEROPORTO


12 de maio de 2000



Senhor Presidente da República,
Senhor Primeiro Ministro,
Venerando Senhor Patriarca de Lisboa,
Amados Irmãos no Episcopado,
Distintas Autoridades,
188 Minhas Senhoras e meus Senhores!

Deus concedeu-me voltar a Portugal, pelo que Lhe dou graças e O bendigo. A vós que vos reunistes aqui para me receber e a todos os filhos e filhas desta nobre Nação, transmito as minhas cordiais saudações de solidariedade e de paz. A minha saudação primeira e atenciosa é para Vossa Excelência, Senhor Presidente, que quis honrar a minha chegada com a sua presença: muito obrigado!

Quero desde já agradecer toda a compreensão e disponibilidade com que as Autoridades do Estado tornaram possível esta breve visita que se resume praticamente a uma cerimónia litúrgica no Santuário de Fátima. De facto, acolhendo o apelo insistente dos Senhores Bispos de Portugal, aceitei deslocar-me à Cova da Iria para celebrar, juntamente com a Comunidade católica, a beatificação dos pastorinhos Francisco e Jacinta Marto na própria terra que lhes deu o berço e, agora, o altar. Sei que a Pátria canta os seus heróis e gloria-se dos seus Santos; o Papa associa-se de bom grado à alegria de Portugal.

Ao início da minha visita, exprimo a minha profunda estima e afecto a todos os portugueses, a quem desejo um futuro de paz, bem-estar e prosperidade, prosseguindo na senda das suas tradições e valores pátrios mais genuínos, que assentam no cristianismo. Que Deus vele sobre todos os filhos e filhas desta Terra de Santa Maria. Deus abençoe Portugal!



JOÃO PAULO II




SAUDAÇÃO DO SANTO PADRE


AOS ENFERMOS


: 13 de Maio de 2000
: Amados peregrinos de Fátima!

Quero agora dirigir uma saudação particular aos enfermos aqui presentes em grande número, mas extensiva a quantos, em suas casas ou nos hospitais, estão unidos espiritualmente connosco:

O Papa saúda-vos com grande afecto, queridos doentes, assegurando uma especial lembrança na oração por vós e pelas pessoas que cuidam de vós; coloco os anseios de cada um no Altar onde Jesus continuamente intercede e Se sacrifica pela humanidade.

Vim aqui hoje como testemunha de Jesus ressuscitado. Ele sabe o que é sofrer, e viveu as angústias da morte; mas, com a sua morte, matou a morte, sendo o primeiro homem, em absoluto, que Se libertou definitivamente das cadeias dela. Ele percorreu todo o itinerário do homem até à pátria do Céu, onde preparou um trono de glória para cada um de nós.

Querido irmão doente!

Se alguém ou alguma coisa te faz pensar que chegaste ao fim da estrada, não acredites! Se tens conhecimento do Amor eterno que te criou, sabes também que, dentro de ti, há uma alma imortal. Existem várias estações na vida; se porventura sentires chegar o inverno, quero que saibas que não pode ser a última estação, porque a última será primavera: a primavera da ressurreição. A totalidade da tua vida estende--se infinitamente para além das suas fronteiras terrenas: prevê o Céu.

Queridos doentes!

189 Eu sei que «os sofrimentos do tempo presente nada são em comparação com a glória que se há-de revelar em vós» (Rm 8,18). Coragem! Neste Ano Santo, a graça do Pai derrama-se com maior abundância sobre quem a acolher com a alma simples e confiante das crianças; isto mesmo no-lo recordou Jesus, no texto evangélico agora proclamado. Sendo assim, procurai ser contados também vós, queridos doentes, no número destes «pequeninos», para que Jesus possa comprazer-Se convosco. Daqui a pouco, Ele vai aproximar-se de vós para vos abençoar pessoalmente, no Santíssimo Sacramento; vai ao vosso encontro com a promessa: «Eu renovo todas as coisas!» (Ap 21,5). Tende confiança! Abandonai-vos na sua mão providente, como o fizeram os pastorinhos Francisco e Jacinta. Estes dizem-vos que não estais sozinhos. O Pai celeste ama-vos.

DISCURSO AOS REPRESENTANTES DA

FEDERAÇÃO ITALIANA DOS DESPORTOS SILENCIOSOS

Segunda-feira, 15 de Maio de 2000

1. Apresento de bom grado as minhas cordiais boas-vindas a todos vós, atletas surdos, acompanhantes, intérpretes por gestos e membros do Comité organizador da próxima edição dos Jogos Mundiais Silenciosos, que se realizará em Roma em 2001. Bem-vindos, e obrigado pela vossa grata visita. Agradeço, de modo particular, ao Presidente, Professor Mário Carulli, as amáveis palavras que quis dirigir-me em vosso nome, delineando ao mesmo tempo as perspectivas da vossa Federação.

Exprimo de bom grado o meu aplauso pela obra que a vossa Federação realiza e pelos ideais que vos guiam. São ideais de solidariedade e de atenção ao homem, que vos impelem a pôr-vos, através da actividade desportiva, ao lado de tantos irmãos menos afortunados para favorecer a sua plena integração nos vários âmbitos da vida social. Trata-se de um empenho de alto significado, que encorajo de coração.

2. Quisestes intitular a importante manifestação desportiva internacional do próximo ano ao "silêncio". O "silêncio", que assinala a vossa existência, jovens atletas surdos, ainda que faça surgir inegáveis dificuldades de relação com a realidade circunstante, não deve representar para ninguém fechamento ou isolamento. Ao contrário, ao terdes em conta os valores interiores e as capacidades de que sois portadores, fazei frutificar toda a vossa energia a fim de oferecer um precioso contributo, diferente com certeza mas não menos significativo, ao respeito e à integração social de toda a pessoa.

A vossa Associação reúne atletas surdos de cerca de oitenta Países dos cinco continentes. É sem dúvida uma preciosa oportunidade estar juntos para se conhecer melhor e sustentar-se reciprocamente. Juntos, vós podeis oferecer um testemunho de esperança a quantos se encontram nas vossas mesmas condições. Com a vossa corajosa audácia humana e desportiva, podeis demonstrar que é possível vencer também dificuldades aparentemente insuperáveis. Como não reconhecer que a atenção, a quantos se encontram em condições de menor eficiência física e pessoal, ajuda a própria sociedade a estruturar no seu interior relações mais respeitosas entre todos os seus membros?

Possa o vosso trabalho alcançar os objectivos a que se propõe, isto é, os de uma mais ampla atenção aos problemas de quantos apresentam dificuldade de comunicação e de integração em sentido amplo.

Desta atitude brota um estilo de relações humanas, favoráveis à mútua cooperação entre pessoas e povos diferentes. Deste modo, promove-se também a tão almejada civilização do acolhimento e do amor, a única capaz de anular entre os homens toda a mortificante marginalização.

3. Estamos a viver o Ano Jubilar, durante o qual os cristãos, em virtude da sua fé, se sentem particularmente solicitados a defender e promover o respeito por toda a pessoa, em cujo rosto se reflecte a imagem de Cristo. Eles compreendem ainda melhor quanto as atenções dadas a quem está sujeito a deficiências físicas, estão ligadas de modo indissolúvel àquele testemunho de salvação e de redenção do homem, no qual todo o discípulo de Cristo se deve sentir envolvido.

Cristo, que por amor deu a sua vida por nós, ofereceu-nos o exemplo de como nos devemos relacionar com os nossos irmãos. Ele abençoa os vossos esforços e torna-os fecundos de bem, concedendo-vos abundância de graças, de paz e de consolação.

Com estes sentimentos, enquanto formulo cordiais votos para uma eficaz celebração do ano Jubilar e para um frutuoso prosseguimento da vossa apreciável actividade, sobretudo em vista da próxima edição dos Jogos Mundiais Silenciosos, renovo a todos vós a expressão da minha estima e solidariedade, e é-me grato conceder-vos uma especial Bênção, que faço extensiva aos vossos familiares e a quantos prestam à vossa Federação o contributo da sua competência e dedicação.

MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS PROFESSORES DO INSTITUTO DE FORMAÇÃO

DOS EDUCADORES DO CLERO (IFEC) DE PARIS


190

Segunda-feira, 15 de Maio de 2000

Amados Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
Prezados Amigos

Tenho a alegria de vos receber, a vós grupo de animadores, sacerdotes, religiosos e religiosas que participais no ano de formação no Instituto de Formação dos Educadores do Clero, por ocasião do trigésimo aniversário da sua fundação logo após o Concílio Vaticano II. O nosso encontro permite-me louvar a atenção que a Conferência dos Bispos da França dedica à formação dos futuros sacerdotes, e agradecer a todos aqueles que se consagraram à formação do clero, em particular à Companhia de São Sulpício os esforços corajosos que envidam neste âmbito, desde o início do IFEC, numa vigilância incessantemente renovada quanto às necessidades das Dioceses.

Os meus agradecimentos dirigem-se a todos os que contribuíram para o desenvolvimento deste Instituto, em particular ao Padre Constant Bouchaud, co-fundador do Instituto, e ao Padre Raymond Deville, ambos membros da Companhia de São Sulpício, assim como ao Pe. Pierre Fichelle, da Diocese de Lila, ex-Superior do Seminário de Merville, também ele co-fundador. Eles souberam desenvolver as intuições conciliares no âmbito da formação sacerdotal, para enfrentar as dificuldades das décadas passadas e preparar guias capazes de ajudar os jovens seminaristas e de assistir os Bispos na conduta das questões diocesanas. Alegro-me com a abertura do IFEC aos sacerdotes de outros continentes e aos responsáveis de Institutos religiosos, manifestando assim a sua preocupação por oferecer o próprio apoio à Igreja universal. Com efeito, para preparar o futuro é particularmente importante formar uma nova geração de sacerdotes, capazes de assumir grandes responsabilidades diocesanas e a direcção a todos os níveis da Igreja.

O discernimento e a formação são elementos essenciais para a direcção espiritual dos sacerdotes investidos de responsabilidade. Esses elementos fazem apelo, em primeiro lugar, a um trabalho interior em vós mesmos, que realizais durante o ano de maneira especial com o vosso retiro inaciano, a fim de dardes um sentido único ao vosso caminho sacerdotal, e também progredir na via da santidade e do amor a Cristo e à sua Igreja. Eles supõem uma abertura interior às moções do Espírito Santo, nosso mestre e educador, e uma atenção vigilante às realidades e comportamentos humanos. Exigem que se saiba reler com lucidez e seriedade a própria prática de pastor e de mestre, a fim de permitir aos jovens amadurecer a sua vocação e desenvolver-se no seu ministério ou na vida religiosa, mediante um acompanhamento fraterno. Trata-se, afinal, de uma renovação profunda da pessoa e do modo de considerar o ministério sacerdotal que é assim assumido, para que toda a missão proporcione uma alegria verdadeira e produza frutos.

Agradeço aos sacerdotes, aos professores dos seminários, aos vigários-gerais e episcopais, assim como aos membros dos Institutos consagrados que, apesar dos seus numerosos compromissos ministeriais e tarefas de governo, aceitaram formar-se no plano intelectual, espiritual, pedagógico e pastoral, para participarem de maneira activa na formação sacerdotal e religiosa, cuja importância é capital (cf. Decreto Optatam totius, Preâmbulo). Numerosos são os países que fazem a experiência da falta de vocações e da fragilidade dos jovens marcados por um mundo, no qual as dificuldades sociais não contribuem para a maturação da personalidade. Compete aos pastores e a todos os fiéis serem, mediante o próprio testemunho de vida, modelos que infundam o desejo de seguir totalmente a Cristo e de saber retransmitir, de modo mais directo, o apelo ao sacerdócio e ao compromisso religioso.

Desejaria, além disso, chamar a vossa atenção para a formação permanente do clero, que ajuda os sacerdotes a viverem as diferentes realidades do ministério, a superarem as inevitáveis crises da existência e a estarem sempre mais disponíveis à missão. A formação permanente permite aprofundar o encontro com o Senhor nos sacramentos, em particular na Eucaristia, consolida o amor confiante para com a Igreja, permite actualizar os conhecimentos religiosos e humanos a fim de estabelecer um diálogo mais frutuoso com os homens, favorece a vida fraterna, que é como que a alma do presbitério (cf. Presbyterorum ordinis PO 19). Faço ardentes votos, portanto, por que numerosas pessoas possam aproveitar um ano de formação no IFEC, fiel às intuições que presidiram à sua criação.

Ao confiar-vos à intercessão da Virgem Maria, que acompanhou e sustentou com a sua solicitude materna os Apóstolos na origem da Igreja, concedo-vos de bom grado a Bênção Apostólica, assim como a todas as pessoas que beneficiam do vosso ministério.

MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II

POR OCASIÃO DOS450 ANOS DO NASCIMENTO

DE SÃO CAMILO DE LELIS


FUNDADOR DOS CAMILIANOS


Ao Padre ANGELO BRUSCO
191 Superior-Geral dos Clérigos Regulares
Ministros dos Enfermos
(Camilianos)

1. A alegria que acompanha a celebração do Grande Jubileu da Encarnação adquire uma particular tonalidade para a Família Camiliana, que se prepara para recordar os 450 anos do nascimento de São Camilo de Lelis, ocorrido em Bucchianico a 25 de Maio de 1550. Uno-me de bom grado à acção de graças dessa Ordem, por ele fundada, assim como à das Congregações das Ministras dos Enfermos de São Camilo e das Filhas de São Camilo, dos Institutos seculares das Missionárias dos Enfermos, Cristo Esperança e Kamillianische Schwestern, assim como à da Família Camiliana leiga, que sucessivamente nasceram do carisma e da espiritualidade do grande Santo da Região dos Abruzos.

A comemoração adquire um particular relevo no mundo da saúde e do sofrimento, não só pelo generoso empenho dos filhos de São Camilo em favor dos doentes, mas sobretudo porque em 1886 o Papa Leão XIII proclamou o vosso Fundador Padroeiro dos doentes e dos hospitais; em 1939 o Papa Pio XI o aclamou Padroeiro dos agentes no campo da saúde; e em 1974 Paulo VI o proclamou Padroeiro da saúde militar italiana.

A coincidência dessa celebração com o Ano jubilar assume, além disso, um significado muito particular, porque o inteiro itinerário humano e espiritual de São Camilo se inseriu no contexto das grandes datas jubilares, das quais ele hauriu um profundo desejo de conversão e de generosos propósitos de servir Cristo nos irmãos doentes. Com efeito, nasceu no Ano Santo de 1550, converteu-se em 1575 e, durante o Jubileu do ano 1600, aperfeiçoou as orientações para a actuação do carisma da caridade misericordiosa para com os doentes. Essas coincidências constituem para essa Ordem e para as Famílias religiosas a ela ligadas um especial convite a acolher as graças do Grande Jubileu e do aniversário do nascimento do Fundador, como ocasião de renovada fidelidade ao Senhor e ao carisma camiliano.

2. São Camilo de Lelis viveu num período particularmente complexo, no qual dominavam profundos anseios à santidade, mas também tenazes resistências a uma vida evangelicamente inspirada. Com a sua rica personalidade e o seu testemunho de caridade, ofereceu à sociedade do seu tempo preciosos estímulos de renovação espiritual, contribuindo de maneira original para o projecto de reforma da Igreja, promovida pelo Concílio de Trento. A sua vida, sob a influência do Espírito, mostrou-se como que uma narração maravilhosa do amor de Deus criador e redentor, que manifesta de modo especial a sua ternura misericordiosa de médico das almas e dos corpos.

A sua obra ao serviço dos que sofrem apresenta-se como uma autêntica escola, da qual o Papa Bento XIV reconhecerá a novidade no serviço prestado com amor e competência, isto é, unindo aos conhecimentos científicos e técnicos os ricos gestos e atitudes da humanidade atenta e partícipe, que tem as suas raízes no Evangelho. Nas Disposições e modos que se devem seguir nos hospitais para servir os doentes pobres, por ele redigidos em 1584, propôs intuições e directrizes que foram retomadas em grande parte pela ciência de enfermagem dos nossos dias. Ele afirma a importância de considerar com atenção e respeito todas as dimensões do doente, da física à emotiva, da social à espiritual. Num conhecido trecho das Regras, convida a pedir ao Senhor a graça "de um afecto materno para com o seu próximo", de maneira a "poder servi-lo com toda a caridade, tanto na alma como no corpo. De facto, com a graça de Deus desejamos servir os enfermos com aquele afecto que uma mãe amorosa costuma ter para com o seu único filho doente".

Contudo, São Camilo com o seu exemplo ensina sobretudo a fazer do serviço aos enfermos uma intensa experiência de Deus, que leva a procurar constantemente o Senhor na oração e nos sacramentos. A sua vida parece ressaltar o gesto da mulher a que se refere o Evangelho de São João (cf. 12, 3). Também ele unge os pés de Jesus, presente naqueles que sofrem, com o unguento precioso da caridade misericordiosa, inundando toda a Igreja e a sociedade com o perfume do seu ardor apostólico e da sua espiritualidade. O seu testemunho ainda hoje constitui um forte apelo a amar Cristo, presente nos irmãos que carregam o fardo da enfermidade.

3. No decurso dos séculos, esse apelo, acolhido por tantas almas generosas manifestou amplamente a fecundidade do carisma de Camilo de Lelis. Assim essa Ordem, realizando os ardentes desejos do amor sem limites do seu santo Fundador, estendeu os seus ramos nos cinco Continentes, difundindo-se nestes últimos cinquenta anos em vinte novos países, cuja maior parte está em vias de desenvolvimento. Recentemente, obedecendo ao desejo do Sucessor de Pedro, fez brilhar a cruz de São Camilo também na Arménia e na Geórgia, proclamando o Evangelho da caridade para com os doentes entre aqueles povos, durante muitos anos oprimidos por regimes contrários à religião cristã.

Que dizer, depois, daqueles que, abraçando os ideais e o modelo de vida de São Camilo, alcançaram os cumes da santidade? Nesta circunstância, desejo recordar em particular os membros eleitos da grande Família Camiliana, que eu mesmo tive a alegria de elevar à honra dos altares: Henrique Rebuschini, religioso dessa Ordem; Josefina Vannini, Fundadora das Filhas de São Camilo, Maria Domingas Brun Barbantini, Fundadora das Ministras dos Enfermos de São Camilo.

192 Mas não posso esquecer, ao mesmo tempo, os religiosos camilianos que, ao longo dos séculos, "sacrificaram a sua vida no serviço às vítimas de doenças contagiosas, mostrando que a dedicação até ao heroísmo pertence à índole profética da vida consagrada" (Vita consecrata VC 87). Como não ver neste florescimento de santidade uma confirmação da validade do carisma camiliano, como caminho para a perfeição da caridade?

4. A celebração do 450° aniversário do nascimento de São Camilo constitui para os seus Filhos um importante convite a enfrentar, com fidelidade e criatividade, os desafios do mundo contemporâneo, e a demonstrar com renovado empenho a actualidade dos seus ensinamentos e do seu carisma.

No início do terceiro milénio cristão, os Camilianos são chamados, de modo especial, a testemunhar fielmente Cristo, divino Samaritano, através duma vida santa e fervorosa, sustentada pela oração constante e por uma experiência alegre da misericórdia divina. Eles contribuirão assim para ajudar a comunidade eclesial a procurar descobrir o rosto do Senhor crucificado, em toda a pessoa que sofre.

Será necessário, portanto, cultivar uma sólida espiritualidade para superar os fáceis riscos de um pragmatismo sem alma, esquecido da verdade fundamental, segundo a qual a salvação de quem sofre e morre é obra da graça de Deus. Seguindo o exemplo do santo Fundador, todo o Camiliano seja um verdadeiro contemplativo em acção, conjugando constantemente consagração e missão.

5. Tal opção tornará esta Ordem capaz de infundir nas estruturas sanitárias uma forte inspiração evangélica, hoje particularmente necessária no mundo sanitário e da saúde, insidiado por enormes conflitos éticos, provocados por um preocupante afastamento da ciência e da tecnologia do autêntico respeito pelos direitos da pessoa humana nas diversas fases do seu desenvolvimento.

Nesses contextos difíceis, os Religiosos Camilianos são chamados a empenhar-se com generosa dedicação, para que nas instituições de saúde os doentes sejam sempre considerados como "senhores e patrões", segundo a feliz expressão de São Camilo. Eles, além disso, dedicarão particular cuidado para que o doente se torne consciente de poder ser sujeito activo de evangelização, através da oferenda do próprio sofrimento, em comunhão com Cristo crucificado e glorificado (cf. Christifideles laici CL 53-54 Vita consecrata, VC 83).

A sua atenção seja dirigida, além disso, para a promoção de uma cultura respeitosa dos direitos e da dignidade da pessoa humana através dos Institutos académicos, em particular o "Camillianum", dos Centros de pastoral e das estruturas sanitárias, já presentes em várias nações.

6. Os filhos de São Camilo sabem que são chamados a privilegiar "os doentes mais pobres e abandonados, bem como os idosos, os inválidos, os marginalizados, os doentes em fase terminal, as vítimas da droga e das novas doenças contagiosas" (Vita consecrata VC 83). A opção de estar ao lado dos pobres, promovendo a saúde comunitária e testemunhando o amor da Igreja pelos homens, resulta particularmente urgente nos países em vias de desenvolvimento, onde a situação de indigência agrava as condições de saúde da população, favorecendo a difusão das nossas doenças sociais, em particular da toxicomania e da sida, expressões de degradação moral da civilização e de injustiças sociais, que levantam numerosos problemas humanos e éticos.

Conheço o notável empenho do Instituto na assistência às vítimas destas doenças e na relativa obra de formação e de prevenção. Ao congratular-me convosco pelos notáveis resultados alcançados, sobretudo nos últimos anos, formulo votos por que os filhos de São Camilo tenham sempre mais a peito essas dramáticas situações, dedicando-se-lhes de maneira generosa, competente e sistemática.

7. Também no vosso Instituto foi aberto recentemente um capítulo rico de esperanças, por causa do enorme grupo de leigas e leigos que optaram por viver a sua vida cristã à luz do carisma e da espiritualidade camiliana. Ao exprimir o meu encorajamento a essas colaborações promissoras, faço votos por que o empenho de formação e a participação na vida da Ordem possam trazer "inesperados e fecundos aprofundamentos de alguns aspectos do carisma, reavivando uma interpretação mais espiritual do mesmo e levando a tirar daí indicações para novos dinamismos apostólicos" (Vita consecrata VC 55).

À Família Camiliana leiga, novo fruto da árvore frondosa que nasceu da fé e do amor do Santo de Bucchianico, dirigem-se a minha saudação particular e o convite a aprofundar a própria adesão a Cristo, através da prática dum serviço generoso aos doentes, sobretudo aos mais pobres.

193 De coração formulo à inteira Ordem os votos por que viva o 450° aniversário do nascimento de São Camilo na alegria e no compromisso apostólico e, enquanto confio esperanças e projectos à Virgem Imaculada, Rainha dos Ministros dos Enfermos e Saúde dos doentes, desejo que, assim como o foi para o Fundador, também para todo o Camiliano o Ano jubilar seja ocasião de fervor, de santidade e de graça.

Com estes votos, concedo-lhe com afecto, caro Padre, a Bênção Apostólica, assim como aos Religiosos seus Coirmãos e a quantos compõem a grande Família Camiliana, e também a todos aqueles que beneficiam do seu serviço caritativo e competente.

Vaticano, 15 de Maio de 2000.

PAPA JOÃO PAULO II



MENSAGEM DO SANTO PADRE AOS

IRMÃOS DAS ESCOLAS CRISTÃS POR OCASIÃO DO

CENTENÁRIO DA CANONIZAÇÃO DE


SÃO JOÃO BAPTISTA DE LA SALLE



Ao Irmão JOHN JOHNSTON
Superior-Geral
dos Irmãos das Escolas Cristãs

O Grande Jubileu da Encarnação assinalará para os Irmãos das Escolas Cristãs um dúplice aniversário. No decurso deste mês de Maio, será festejado o centenário da canonização de São João Baptista de La Salle, fundador do vosso Instituto, assim como o cinquentenário da sua proclamação, feita pelo meu predecessor o Papa Pio XII, como Padroeiro especial de todos os educadores da infância e da juventude. Este dúplice evento dá-me a ocasião de me unir profundamente à vossa oração e acção de graças, assim como à de todos os membros da vossa família religiosa, e de dirigir a todos uma saudação cordial, sobretudo no momento em que se reúne, sob a sua presidência, o 43° Capítulo geral do vosso Instituto.

Com o seu génio pedagógico, São João Baptista de La Salle foi um ilustre pioneiro da educação popular das crianças e dos jovens. Como verdadeiro apóstolo, soube servir as crianças que frequentavam as suas escolas, esforçando-se antes de tudo por formar os seus mestres. Essa intuição continua fundamental hoje, pois ressalta como a educação supõe, por um lado, a transmissão dos valores humanos e cristãos e, por outro, o testemunho dos adultos que mostram aos jovens o que é uma vida bela e equilibrada. A educação, portanto, mais do que uma profissão, é uma missão, que consiste em ajudar toda a pessoa a reconhecer aquilo que tem de insubstituível e de único, a fim de que cresça e se desenvolva. Ao proclamar o vosso Fundador Padroeiro de todos os educadores da infância e da juventude, a Igreja propõe-no como modelo a imitar e exemplo para todos aqueles que têm uma tarefa educativa, convidando-os a experimentar a imaginação, a paciência e a dedicação, e a discernir as necessidades dos jovens, respondendo assim às suas profundas aspirações.

Compete aos Irmãos dar a conhecer a grandeza do apostolado e a visão cristã de educador de São João Baptista de La Salle, que conservam toda a sua actualidade no mundo de hoje. O seu carisma, nutrido pela contemplação assídua de Deus, Criador e Salvador, e vivida segundo o ideal religioso duma existência consagrada ao Senhor numa vida comunitária e fraterna, mostra que educar, ensinar e evangelizar formam um todo. A educação permanece incompleta se não conduzir à aprendizagem do respeito pela vida e a liberdade, do serviço à verdade e do desejo do dom de si. Ao anunciardes o Evangelho nas escolas, que é a finalidade do vosso apostolado, esforçais-vos por formar todo o homem e o homem todo.

Encorajo, portanto, todos os Irmãos na sua missão educativa e evangelizadora, sobretudo entre as crianças e os jovens pobres ou em dificuldade, mostrando-lhes que cada um é infinitamente precioso aos olhos de Deus. Eles participam assim de maneira insigne na missão da Igreja.

Exorto-os a serem verdadeiros filhos de São João Baptista de La Salle, sustentando-se reciprocamente ao longo da via da santidade. Ao participarem na "obra de Deus" e ao viverem plenamente a dimensão catequética da sua nobre tarefa, que eles acolham sempre, nos numerosos países onde estão presentes, os desafios presentes e futuros, de modo particular neste tempo em que, num mundo em evolução, muitos pontos de referência da vida moral estão a desaparecer!

194 Como vos dizia no vosso último Capítulo geral, no dia 14 de Maio de 1993, "sede em todas as circunstâncias mestres, testemunhas de Cristo, educadores cristãos, mediante o exemplo e a palavra"! Oxalá, por ocasião desta dúplice comemoração no centro do Ano jubilar, reaviveis a vossa missão e convideis os jovens a seguirem o ideal lassalista na vida religiosa!

Ao confiar-vos à intercessão da Virgem Maria e de São João Baptista de La Salle, assim como todos os vossos Irmãos, os Professores, os estudantes das vossas escolas e os seus pais, os ex-alunos e a família lassalista que colaboram convosco na vossa missão, concedo-vos de todo o coração a Bênção Apostólica.

Vaticano, 2 de Maio de 2000.

PALAVRAS DO SANTO PADRE NA VIGÍLIA DE ORAÇÃO

PARA O JUBILEU DOS PRESBÍTEROS

Quarta-feira, 17 de Maio de 2000

Caríssimos Sacerdotes

No termo desta vossa terceira jornada jubilar, é-me grato dirigir-vos uma saudação cordial, antecipando de algum modo a alegria do encontro e da celebração de amanhã.

Hoje, pusestes-vos à escuta do testemunho dos Santos. Alegro-me com isto vivamente, porque ele restitui a experiência de Cristo vivo. Com efeito, se o Grande jubileu faz memória da Encarnação do Verbo na história, os Santos são aqueles irmãos e irmãs que, desse mistério, constituem uma espécie de prolongamento, em virtude da sua grande docilidade ao Espírito Santo.

Na longa plêiade de almas eleitas que constelam os dois milénios da era cristã, numerosos são os Sacerdotes, que em todas as gerações tornaram presente no meio do Povo de Deus a santidade de Cristo Bom Pastor. De Sacerdotes santos - mártires e confessores - é rica a Igreja também do século XX. Caríssimos, sigamos os seus passos, porque disto depende a eficácia do nosso ministério. É este o pensamento - e bons votos - que vos deixo, enquanto nos preparamos para elevar juntos, amanhã, a nossa sacerdotal acção de graças.

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NO TERMO DA EXECUÇÃO DO CONCERTO

DA "LONDON SYMPHONY ORCHESTRA"


EM HOMENAGEM AOS SEUS 8O ANOS


Quinta-feira, 18 de Maio de 2000


Ilustres Senhores e gentis Senhoras
Prezados Irmãos e Irmãs

195 1. Obrigado por este concerto que me oferecestes, por ocasião do meu 80º aniversário. Este conclui um dia que para mim foi de comovido reconhecimento ao Senhor pelo inestimável dom da vida e pelas numerosas graças com que Ele quis enriquecê-la.

Dirijo-me com afecto em primeiro lugar aos organizadores e aos músicos que, com esta apresentação, desejaram expressar-me os seus sentimentos de estima e de bons votos. Agradeço sinceramente ao Maestro Gilbert Levine, que interpretou com profunda sensibilidade a partitura de "A Criação", obra-prima de José Haydn, dirigindo com intensidade artística os solistas, os músicos e o coro da Orquestra Filarmónica. Estou grato aos compositores e cantores, assim como àqueles que contribuíram para o bom êxito deste concerto.

Depois, dirijo a minha respeitosa saudação às autoridades e aos clérigos aqui presentes. Em particular, desejo cumprimentar as ilustres personalidades da Comunidade judaica e os representantes das outras Igrejas e Comunidades eclesiais, que amavelmente quiseram unir-se a todos aqueles que, nesta ocasião, estiveram próximos de mim mediante a oração e gratas expressões de bons votos.

2. A maravilhosa interpretação das primeiras duas partes do Oratório de José Haydn consentiu-nos contemplar com alegria e emoção a narração bíblica da criação, proposta através do poder evocativo das palavras do Texto sagrado e da poesia, mediante a linguagem arcana e universal da música. Envolvidos nesta mesma narração, pudemos assim participar na alegria expressa pelos coros de louvor ao Senhor e sentimo-nos todos filhos do mesmo Deus criador. "Os céus narram a glória de Deus / e a obra das suas mãos / manifesta-se no firmamento". Como é poderosa esta chamada à transcendência de Deus e à sacralidade e grandeza da criação!

Através da transparência dos sons e da beleza do texto, este solene afresco musical propôs a aurora da criação. A narração desenvolve-se segundo o ritmo dos seis dias que caracterizaram o nascimento da luz quando se retrai "o caos e surge a ordem" do céu e da terra, das coisas e das criaturas vivas.

Todavia, repropondo com força e beleza a narração bíblica, o génio artístico de José Haydn evidencia o facto de que o ápice da criação é constituído pelo nascimento do homem: "Deus criou o homem à Sua imagem; à imagem de Deus Ele o criou; e criou-os homem e mulher. Depois, soprou-lhes um sopro de vida, e o homem tornou-se alma viva". A conclusão não é senão um hino de louvor: "A magnífica obra completou-se / O nosso canto seja louvor ao Senhor / Pois só Ele é o Altíssimo!".

3. Irmãos e Irmãs! Obrigado por nos terdes oferecido esta singular experiência de meditação espiritual e de estética no mistério da criação, que funda a certeza da nossa origem comum. Formulo votos por que, através da arte e da música, também no nosso tempo possam estar sempre vivos a atenção ao homem e o respeito pela natureza.

Além disso, oxalá a reflexão sobre a origem comum contribua para fazer com que cada um volte a descobrir os profundos laços de fraternidade que nascem do facto de sermos todos filhos do único Deus, Criador do céu e da terra. Ao seu amor de Pai confio todos vós aqui presentes, os promotores e os organizadores, os artistas e os intérpretes desta manifestação, invocando sobre cada um a bênção divina.

Discursos João Paulo II 2000 187