Discursos João Paulo II 2000 298

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Castel Gandolfo, 27 de Agosto de 2000

Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. É-me grato acolher-vos por ocasião do vosso Congresso, que da celebração jubilar em curso recebe uma orientação e um estímulo particular. Saúdo-vos a todos com intensa cordialidade, dirigindo um particular pensamento ao Cardeal Eduardo Martínez Somalo, Prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, que interpretou com entusiasmo os vossos sentimentos.

No ano do Grande Jubileu a Igreja convida todos os leigos, mas com um título particular os membros dos Institutos Seculares, ao empenho de animação evangélica e de testemunho cristão no interior das realidades seculares. Como tive ocasião de dizer por ocasião do nosso encontro para o quinquagésimo aniversário da Provida Mater Ecclesia, vós estais, por vocação e missão, no ponto de encruzilhada entre a iniciativa de Deus e a expectativa da criação: a iniciativa de Deus, que levais ao mundo através do amor e da íntima união a Cristo; a expectativa da criação, que compartilhais na condição quotidiana e secular dos vossos semelhantes (cf. L'Osservatore Romano, ed. port. de 8/2/1997, pág. 4 n. 5). Por isto, como consagrados seculares, deveis viver com consciência operosa as realidades do vosso tempo, porque o seguimento de Cristo, que dá significado à vossa vida, vos empenha seriamente em relação àquele mundo que sois chamados a transformar segundo o projecto de Deus.

2. O vosso Congresso Mundial concentra a atenção no tema da formação dos membros dos Institutos Seculares. É preciso que eles sejam sempre capazes de discernir a vontade de Deus e as vias da nova evangelização em cada "hoje" da história, na complexidade e mutabilidade dos sinais dos tempos.

Na Exortação Apostólica Christifideles laici dediquei amplo espaço ao tema da formação dos cristãos nas suas responsabilidades históricas e seculares, como também na sua directa colaboração na edificação da comunidade cristã; e indiquei as fontes indispensáveis dessa formação: "a escuta pronta e dócil da palavra de Deus e da Igreja, a oração filial e constante, a referência a uma sábia e amorosa direcção espiritual, a leitura, feita na fé, dos dons e dos talentos recebidos, bem como das diversas situaçes sociais e históricas em que nos encontramos" (n. 58).

A formação, portanto, de modo global diz respeito à vida inteira do consagrado. Ela nutre-se também das análises e das reflexões dos especialistas de sociologia e das outras ciências humanas, mas não pode esquecer, como seu centro vital e critério para a avaliação cristã dos fenómenos históricos, a dimensão espiritual, teológica e sapiencial da vida de fé, que fornece as chaves últimas e decisivas para a leitura da actual condição humana e para a escolha das prioridades e dos estilos dum autêntico testemunho.

O olhar que dirigimos para as realidades do mundo contemporâneo, olhar que desejaríamos que fosse sempre repleto da compaixão e da misericórdia que nos foi ensinada por nosso Senhor Jesus Cristo, não se detém a detectar erros e perigos. Sem dúvida, não pode deixar de anotar também os aspectos negativos e problemáticos, mas dirige-se imediatamente a determinar vias de esperança e a indicar perspectivas de fervoroso empenho pela promoção integral da pessoa, pela sua libertação e a plenitude da sua felicidade.

3. No coração de um mundo que muda, no qual persistem e se agravam injustiças e sofrimentos inauditos, sois chamados a uma leitura cristã dos factos e dos fenómenos históricos e culturais. Em particular, deveis ser portadores de luz e de esperança à sociedade de hoje. Não vos deixeis enganar por ingénuos optimismos, mas permanecei fiéis testemunhas de um Deus que certamente ama esta humanidade e lhe oferece a graça necessária, a fim de que possa trabalhar de maneira eficaz para a construção de um mundo melhor, mais justo e mais respeitdor da dignidade de todo o ser humano. O desafio, que a cultura contemporânea dirige à fé, parece ser precisamente este: abandonar a fácil inclinação a descrever cenários sombrios e negativos, para traçar percursos possíveis, não ilusórios, de redenção, libertação e esperança.

A vossa experiência de consagrados na condição secular mostra-vos que não se deve esperar o advento de um mundo melhor só das opções que provêm do alto das grandes responsabilidades e das grandes instituições. A graça do Senhor, capaz de salvar e de redimir também esta época da história, nasce e cresce nos corações dos crentes. Eles acolhem, ajudam e favorecem a iniciativa de Deus na história e fazem-na crescer a partir de baixo e do interior das simples vidas humanas, que se tornam assim as verdadeiras portadoras da transformação e da salvação. Basta pensar na acção exercida neste sentido pela inumerável plêiade de santos e santas, mesmo daqueles não oficialmente declarados tais pela Igreja, que marcaram de modo profundo a época em que viveram, levando-lhe valores e energias de bem, cuja importância escapa aos instrumentos da análise social, mas é bem visível aos olhos de Deus e à atenta reflexão dos crentes.

4. A formação para o discernimento não pode descuidar o fundamento de todo o projecto humano, que é e continua a ser Jesus Cristo. A missão dos Institutos Seculares é "infundir na sociedade as energias novas do Reino de Cristo, procurando transfigurar o mundo a partir de dentro com a força das bem-aventuranças" (Vita consecrata, VC 10). A fé dos discípulos torna-se deste modo alma do mundo, segundo a feliz imagem da carta "A Diogneto", e produz uma renovação cultural e social que deve ser posta à disposição da humanidade. Quanto mais a humanidade se encontrar distante e estranha em relação à mensagem evangélica, tanto mais deverá ressoar forte e persuasivo o anúncio da verdade de Cristo e do homem redimido por Ele.

299 Certamente, dever-se-á sempre prestar atenção às modalidades deste anúncio, para que a humanidade não o perceba como invasão e imposição por parte dos crentes. Ao contrário, será nossa tarefa fazer com que apareça sempre mais claro que a Igreja, portadora da missão de Cristo, cuida do homem com amor. E fá-lo não para a humanidade em abstracto, mas para este homem concreto e histórico, na convicção de que "este homem é o primeiro caminho que a Igreja deve percorrer na realização da sua missão... o caminho traçado pelo próprio Cristo, caminho que invariavelmente passa pelo mistério da Encarnação e da Redenção" (Redemptor hominis, RH 14 cf. Centesimus annus, CA 53).

5. A vossa formação inicial e permanente, queridos responsáveis e membros dos Institutos Seculares, deve ser nutrida por estas certezas. Ela produzirá frutos abundantes na medida em que continuar a haurir do inexaurível tesouro da Revelação, lida e proclamada com sabedoria e amor pela Igreja.

A Maria, Estrela da evangelização, que da Igreja é ícone inigualável, confio o vosso caminho pelas estradas do mundo. Esteja Ela ao vosso lado e a sua intercessão torne fecundos os trabalhos do vosso Congresso e dê fervor e renovado impulso apostólico às Instituições que aqui representais, a fim de que o evento jubilar assinale o início de um novo Pentecostes e de uma profunda renovação interior.

Com estes votos a todos concedo, como penhor de constante afecto, a Bênção Apostólica.





DISCURSO DO SANTO PADRE JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NO


XVIII CONGRESSO INTERNACIONAL


SOBRE OS TRANSPLANTES


Terça-feira, 29 de Agosto de 2000



Ilustres Senhoras e Senhores

1. É-me grato saudar todos vós por ocasião deste Congresso internacional, que vos vê reunidos para reflectir sobre a complexa e delicada temática dos transplantes. Agradeço aos Professores Raffaello Cortesini e Óscar Salvatierra as amáveis palavras que me dirigiram. Uma particular saudação dirige-se às Autoridades italianas aqui presentes.

A todos vós exprimo o meu reconhecimento pelo gentil convite a participar neste encontro, e aprecio vivamente a séria consideração que manifestais em relação ao ensinamento moral da Igreja. No respeito pela ciência e na atenção sobretudo à lei de Deus, a Igreja tem em vista exclusivamente o bem integral da pessoa humana.

Os transplantes são uma grande conquista da ciência ao serviço do homem e nos nossos dias não são poucos aqueles que devem a própria vida ao transplante de um órgão. Portanto, a técnica dos transplantes revela-se cada vez mais como um instrumento precioso na consecução da finalidade primária de toda a medicina: o serviço à vida humana. Por esta razão, na Carta Encíclica Evangelium vitae recordei que, entre os gestos que concorrem para alimentar uma autêntica cultura da vida, "merece particular apreço a doação de órgãos feita, segundo formas eticamente aceitáveis, para oferecer uma possibilidade de saúde e até de vida a doentes, por vezes já sem esperança" (n. 86).

2. Como se verifica em qualquer conquista humana, também este sector especial da ciência médica, apesar de oferecer toda a esperança de saúde e de vida a muitos, não deixa de apresentar alguns pontos críticos, que requerem ser examinados à luz de uma atenta reflexão antropológica e ética.

Também nesta área da ciência médica o critério fundamental de avaliação reside na defesa e promoção do bem integral da pessoa humana, segundo a peculiar dignidade que temos em virtude da nossa humanidade. Por conseguinte, é evidente que todas as intervenções médicas na pessoa humana estão sujeitas a limitações que não se reduzem à eventual impossibilidade técnica de realização, mas que estão ligadas ao respeito da própria natureza humana entendida no seu significado integral: "Aquilo que é tecnicamente possível não é necessariamente, por esta mera razão, admissível do ponto de vista moral" (Congregação para a Doutrina da Fé, Donum vitae, 4).

300 3. A primeira ênfase deve-se dar ao facto de que qualquer intervenção de transplante de órgãos, como já noutra ocasião tive a oportunidade de ressaltar, tem geralmente origem numa decisão de grande valor ético: "A decisão de oferecer, sem recompensa, uma parte do próprio corpo, em benefício da saúde e do bem-estar de outra pessoa" (Discurso ao I Congresso Internacional sobre os Transplantes de Órgãos, cf. L'Osservatore Romano, ed. port. de 11/8/1991, pág. 5, n. 3). Precisamente nisto reside a nobreza do gesto, que se configura como um autêntico acto de amor. Não se oferece simplesmente uma parte do corpo, mas doa-se algo de si, a partir do momento que "por força da sua união substancial com uma alma espiritual, o corpo humano não pode ser considerado apenas como um conjunto de tecidos, órgãos e funções... Ele é parte constitutiva da pessoa que através dele se manifesta e se exprime" (Congregação para a Doutrina da Fé, Donum vitae, 3).

Por conseguinte, toda a práxis tendente a negociar os órgãos humanos ou a considerá-los como unidade de intercâmbio ou de comércio, resulta moralmente inaceitável, pois através da utilização do corpo como "objecto", viola-se a própria dignidade da pessoa.

Este primeiro ponto tem uma imediata consequência de notável relevância ética: a necessidade de um consentimento informado. A "autenticidade" humana de um gesto tão decisivo requer, de facto, que a pessoa humana seja adequadamente informada sobre os processos nele implicados, a fim de exprimir de modo consciente e livre o seu consentimento ou a sua recusa. O consentimento dos parentes tem o seu próprio valor ético, quando falta a opção do doador. Naturalmente, um consentimento com características análogas deverá ser expresso por aquele que recebe os órgãos doados.

4. O reconhecimento da dignidade singular da pessoa humana tem uma ulterior consequência subjacente: os órgãos vitais individualmente só podem ser removidos após a morte, isto é, do corpo de um indivíduo decerto morto. Esta exigência é evidente, uma vez que comportar-se diversamente significaria causar a morte intencional do doador, mediante a remoção dos seus órgãos. Daqui surge uma das questões mais frequentemente presentes nos debates bioéticos actuais e, não raro, também nas dúvidas das pessoas simples. Refiro-me ao problema da certificação da própria morte.Quando uma pessoa pode ser considerada completa e certamente morta?

A respeito disso, é oportuno recordar que a morte da pessoa é um evento único, que consiste na total desintegração do complexo unitário e integrado que a pessoa é em si mesma, como consequência da separação do princípio vital, ou da alma, da realidade corporal da pessoa. A morte da pessoa, entendida neste sentido original, é um evento que não pode ser directamente identificado por qualquer técnica científica ou método empírico.

Mas a experiência humana ensina também que o evento da morte produz inevitavelmente sinais biológicos, que a medicina aprendeu a reconhecer de maneira sempre mais específica. Os chamados "critérios" de certificação da morte, usados pela medicina moderna, não devem portanto ser entendidos como a determinação técnico-científica do momento exacto da morte da pessoa, mas como uma modalidade cientificamente segura para identificar os sinais biológicos de que a pessoa de facto morreu.

5. Sabe-se muito bem que, desde há algum tempo, diversas abordagens científicas da certificação da morte transferiram a ênfase dos tradicionais sinais cardiorrespiratórios para o chamado critério "neurológico", nomeadamente para a constatação segundo parâmetros bem determinados e em geral compartilhados pela comunidade científica internacional, da cessação total e irreversível de qualquer actividade encefálica (cérebro, cerebelo e tronco encefálico), como sinal da perda da capacidade de integração do organismo individual como tal.

Diante dos parâmetros hodiernos de certificação da morte quer se refira aos sinais "encefálicos", quer se faça recurso aos mais tradicionais sinais cardiorrespiratórios a Igreja não toma decisões técnicas, mas limita-se a exercer a responsabilidade evangélica de confrontar os dados oferecidos pela ciência médica com uma concepção cristã da unidade da pessoa, evidenciando semelhanças e eventuais contradições, que poderiam pôr em perigo o respeito pela dignidade humana.

Nesta perspectiva, pode-se afirmar que o supramencionado critério de certificação da morte recentemente adoptado, isto é, a cessação total e irreversível de toda a actividade encefálica, se for aplicado de maneira escrupulosa, não parece contrastar os elementos essenciais duma sólida antropologia. Como consequência, o operador no campo da saúde que tem a responsabilidade profissional da certificação da morte pode basear-se neles para alcançar, caso por caso, aquele grau de certeza no juízo ético que a doutrina moral qualifica com o termo de "certeza moral", a qual é a base necessária e suficiente para se poder agir de maneira eticamente correcta. Portanto, só na presença dessa certeza será moralmente legítimo activar os necessários processos técnicos para a remoção dos órgãos a serem transplantados, tendo o médico sido informado do prévio consentimento do doador ou dos seus legítimos representantes.

6. Outro aspecto de grande relevo ético diz respeito ao problema da designação dos órgãos doados, mediante a compilação de listas de espera ou de "prioridades". Apesar dos esforços por promover uma cultura da doação de órgãos, os recursos actualmente disponíveis em muitos países ainda resultam insuficientes às necessidades médicas. Daqui nasce a exigência de compilar listas de espera para os transplantes, segundo critérios clarividentes e oportunamente motivados.

Do ponto de vista moral, um ponderado princípio de justiça exige que esses critérios de designação dos órgãos doados não derivem de modo algum de lógicas de tipo "discriminatório" (por exemplo, baseadas na idade, sexo, raça, religião, condição social, etc.), ou de tipo "utilitário" (por exemplo, assentes na capacidade de trabalho, utilidade social, etc.). Pelo contrário, na determinação das prioridades de acesso aos transplantes dever-se-á respeitar avaliações imunológicas e clínicas. Qualquer outro critério se revelaria arbitrário e subjectivo, pois não reconheceria o valor intrínseco que cada ser humano tem enquanto tal, independentemente das circunstâncias extrínsecas.

301 7. A última questão refere-se a uma possível solução alternativa, ainda em fase experimental, ao problema de encontrar órgãos a transplantar: trata-se dos chamados xenotransplantes, isto é, o transplante de órgãos de outras espécies animais.

Não é minha intenção enfrentar aqui de maneira pormenorizada os problemas suscitados por essa forma de intervenção. Limito-me a recordar que já em 1956 o Papa Pio XII levantou a questão sobre a sua liceidade. Fê-lo comentando a possibilidade científica, que então se pressagiava, do transplante da córnea animal no homem. A resposta que ele deu, ainda hoje é iluminadora para nós: como princípio, dizia ele, a liceidade de um xenotransplante requer, por um lado, que o órgão transplantado não prejudique a integridade da identidade psicológica ou genética da pessoa que o recebe; por outro, que exista a comprovada possibilidade biológica de efectuar com êxito esse transplante, sem expor a imoderados riscos quem o recebe (cf. Discurso à Associação Italiana de Doadores de Córnea e aos Clínicos Oculistas e Médicos Legais, 14 de Maio de 1956).

8. Ao concluir exprimo votos por que, graças à obra de muitas pessoas generosas e altamente qualificadas, a investigação científico-tecnológica no sector dos transplantes se desenvolva ainda mais, estendendo-se também à experimentação de novas terapias sucedâneas ao transplante de órgãos, como parecem prometer alguns dos recentes progressos protéticos. Em todo o caso, será preciso evitar sempre os métodos que não respeitam a dignidade e o valor da pessoa; penso de modo particular nas tentativas de clonagem humana, que visam a obtenção de órgãos de transplante: enquanto implicam a manipulação e a destruição de embriões humanos, tais técnicas não são moralmente aceitáveis, mesmo que tenham em vista um objectivo em si bom. A ciência deixa entrever outras vias de intervenção terapêutica, que não comportam a clonagem nem o uso de células embrionárias, bastando para essa finalidade a utilização de células estaminais extraídas de organismos adultos. É ao longo desta via que deverá progredir a investigação, se quiser ser respeitosa da dignidade de cada ser humano, mesmo na fase embrionária.

No estudo de todas estas questões, é importante a contribuição dos filósofos e teólogos, cuja atenta e competente reflexão sobre os problemas éticos ligados à terapia dos transplantes poderá levar a especificar melhor os critérios de juízo, com base nos quais avaliar que tipos de transplante se podem considerar moralmente admissíveis e sob que condições, sobretudo no que concerne à salvaguarda da identidade pessoal de cada indivíduo.

Faço votos por que os líderes sociais, políticos e educativos renovem o seu compromisso em promover uma genuína cultura da generosidade e da solidariedade. É preciso suscitar no coração de todos, e em particular dos jovens, uma autêntica e profunda consideração da necessidade da caridade fraterna, de um amor que se possa exprimir na decisão de se tornar doador de órgãos.
O Senhor ajude cada um de vós no próprio trabalho, orientando-vos para o serviço do autêntico progresso humano.

Acompanho estes votos com a minha Bênção.



                                                                   Setembro de 2000

DISCURSO DO SANTO PADRE JOÃO PAULO II


ÀS AUTORIDADES MUNICIPAIS DE


CASTEL GANDOLFO


Sexta-feira, 1° de Setembro de 2000

Senhor Presidente
da Câmara Municipal
Senhores Membros
302 da Junta e do Conselho Municipal!

Obrigado por esta vossa visita! Chegou o momento de me despedir de Castel Gandolfo, e é-me grato encontrar-vos, antes de voltar para o Vaticano. Apresento de bom grado a minha saudação reconhecida e cordial a cada um de vós e, por vosso intermédio, às pessoas que representais.

De maneira especial agradeço-lhe, Senhor Presidente da Câmara Municipal, a sua cortesia, as amáveis palavras e os sentimentos que quis exprimir, também em nome da Administração e de toda a população de Castel Gandolfo, tão próxima de mim. Todas as vezes que volto a Castel Gandolfo, aprecio o calor humano do seu povo, que de tantos modos e com múltiplos sinais me exprime a sua proximidade espiritual.

Também neste Verão tive ocasião de experimentar a acolhedora hospitalidade da vossa bonita cidade para comigo e os meus colaboradores, assim como para com as pessoas que vieram visitar-me. Em particular, quereria agradecer-vos tudo o que fizestes em favor dos jovens vindos em tão grande número também a Castel Gandolfo para a Jornada Mundial da Juventude. Estou certo de que também para vós, como para toda a comunidade eclesial, o grande encontro dos jovens permanecerá gravado na memória, como sinal de esperança e poderoso estímulo a uma corajosa renovação espiritual e moral.

Nesta tarde volto para Roma, deixando-vos o meu cordial "até à vista". Levo-vos comigo na oração, confiando ao Senhor o vosso trabalho e o vosso serviço à cidade. Deus proteja cada um de vós e Maria, Mãe da Esperança, sustente com a sua materna intercessão os vossos projectos de bem. Também eu de coração vos abençoo, e torno esta bênção extensiva aos vossos familiares e a todos os cidadãos e veraneantes de Castel Gandolfo.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II AOS PARTICIPANTES


NA PEREGRINAÇÃO NACIONAL DO SENEGAL


E A UM GRUPO DE SUÍÇOS

Sábado, 2 de Setembro de 2000



1. Queridos Irmãos e Irmãs do Senegal, é com grande alegria que vos recebo, por ocasião da peregrinação nacional a Roma, durante este ano do Grande Jubileu. Saúdo de modo particular D. Maixent Coly, Bispo de Ziguinchor que acompanha o vosso grupo. Ficar-lhe-ia grato se se dignasse transmitir a minha afectuosa saudação ao estimado Cardeal Hyacinthe Thiandoum, Arcebispo Emérito de Dacar.

A peregrinação que realizais é um momento privilegiado para encontrar plenamente Cristo, Salvador encarnado no seio de Maria há dois mil anos. Nele, fonte de vida divina para a humanidade, a história da salvação encontra o seu auge e o seu sentido perfeito. O vosso caminho jubilar vos permita renovar a fé na presença do Senhor Jesus, sobretudo a sua presença eucarística no nosso mundo e na nossa vida! De facto, "nos sinais do Pão e do Vinho consagrados, Cristo ressuscitado e glorioso, luz das nações (cf. Lc. Lc 2,32), revela a continuidade da sua Encarnação.

Ele permanece verdadeiramente vivo no nosso meio, para alimentar os crentes com o seu Corpo e Sangue" (Incarnationis mysterium, 11) . Que a Eucaristia esteja sempre no centro das vossas vidas: amai-a, adorai-a, celebrai-a com respeito e fé!

Neste mundo que tem grande necessidade de paz e de fraternidade, vivei a Eucaristia testemunhando com fervor que ninguém é excluído do amor de Deus! Oxalá as vossas comunidades cristãs sejam autênticos sinais de comunhão eclesial, de unidade e de reconciliação entre todos os homens!

A celebração do Grande Jubileu é também uma chamada premente à conversão do coração e a um empenho renovado, para que se desenvolva uma verdadeira cultura de fraternidade e de solidariedade. Convido-vos a prosseguir, em colaboração com todos os vossos compatriotas, os esforços corajosos para fazer desaparecer as causas da violência, do rancor e da injustiça, que ainda obrigam um grande número de homens e mulheres a continuar na pobreza e na marginalização.

303 Queridos irmãos e irmãs, permiti-me dirigir uma palavra particular aos jovens das vossas comunidades. Não vos resigneis a um mundo no qual o homem não é respeitado na sua dignidade, onde a violência e a injustiça o impedem de progredir plenamente! Esforçai-vos com todas as vossas energias por tornar esta terra cada vez mais humana e fraterna. Confiai em Cristo, confiai n'Ele como Ele confia em vós, e Ele vos orientará para a verdade e dar-vos-á a força!

Confio todos vós à intercessão materna da Virgem de Poponguine, que gostais de invocar com o nome de Nossa Senhora da Libertação, e peço-lhe que vos guie pelo caminho que leva ao seu Filho. A cada um de vós, às vossas famílias e às pessoas que vos são queridas, concedo de todo o coração a Bênção apostólica.

2. Desejo saudar calorosamente a "Sociedade musical Breil/Dardin" proveniente da Suíça.

Queridos músicos, viestes a Roma no Ano jubilar para venerar o túmulo dos Santos Apóstolos. Estou feliz por terdes trazido convosco também os vossos instrumentos musicais. As portas do coração abrir-se-ão a quem sabe fazer música. A música é um elemento de qualquer festa. A música também faz parte do Grande Jubileu do Ano 2000. Há acaso um modo melhor para louvar a Encarnação de Deus do que com cânticos e hinos? A este propósito recordo-me dum pensamento de Santo Agostinho: "Qui cantat, bis orat" quem canta, reza duas vezes. Isto é válido para os cantores, e em igual medida para os músicos: quem faz música, quem toca instrumentos, reza duas vezes. Congratulo-me convosco por essa maneira de rezar e espero que toqueis com entusiasmo os instrumentos também no vosso país: para a glória dos homens e para a maior glória de Deus. Concedo-vos de coração a Bênção apostólica.



DISCURSO DO SANTO PADRE JOÃO PAULO II


AOS VÁRIOS GRUPOS DE PEREGRINOS


VINDOS A ROMA PARA A


CERIMÓNIA DE BEATIFICAÇÃO


Segunda-feira, 4 de setembro de 2000

Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Com grande alegria me encontro de novo convosco, no dia seguinte à solene Beatificação dos Papas Pio IX e João XXIII, do Bispo Tomás Reggio, do sacerdote Guilherme José Chaminade e do beneditino Columba Marmion.

Dirijo a minha cordial saudação a todos vós, que estais ligados aos novos Beatos por especial afecto e devoção, e agradeço-vos a presença e activa participação. Saúdo, em particular, o Cardeal Angelo Sodano, meu Secretário de Estado, que celebrou há pouco a Santa Missa em honra dos novos Beatos. Além disso, saúdo os Cardeais e Bispos presentes, juntamente com as outras Autoridades religiosas e civis.

2. Ontem foram propostos à veneração de todos os fiéis dois Pontífices, que marcaram a história dos últimos séculos: Pio IX, que guiou a barca de Pedro no meio de tempestades violentas durante cerca de trinta e dois anos; João XXIII, que no seu breve pontificado convocou um Concílio ecuménico de extraordinário relevo na história da Igreja.

Pio IX era muito querido pelo povo devido à sua bondade paterna: gostava de pregar como um simples sacerdote, administrar os sacramentos nas igrejas e hospitais, encontrar o povo romano pelas ruas da Cidade. O mundo nem sempre o entendeu: aos "hosanas" do início, seguiram-se muito depressa as acusações, os ataques e as calúnias. Mas ele jamais deixou de ser indulgente para com os seus próprios inimigos. O espírito de pobreza, a fé em Deus e o abandono à Providência, juntamente com um acentuado sentido do humorismo, ajudaram-no a superar também os momentos mais difíceis. "A minha política - costumava repetir - é: Pai nosso que estais nos céus", indicando assim que o seu guia na opções da vida e do governo da Igreja era Deus, por quem nutria uma confiança total. Teve também um abandono filial para com a Virgem Maria, da qual definiu o dogma da Imaculada Conceição.

Apraz-me recordar também que Pio IX foi singularmente atento à Terra Santa, onde quis restabelecer o Patriarcado Latino de Jerusalém. Para o sustentar, depois, fundou de novo a Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém. Volto a pensar mais uma vez com afecto e gratidão nos Lugares Santos e nas pessoas que encontrei durante a minha recente peregrinação na Terra Santa, saúdo a delegação, guiada pelo Patriarca Latino de Jerusalém Michel Sabbah e a todos renovo os sentimentos da minha proximidade espiritual. Em particular, desejo saudar os Bispos e os fiéis que vieram da Região das Marcas e, de modo especial, de Senigallia e de Ímola.

304 3. Entre os devotos do novo Beato Pio IX sobressai um seu sucessor, o Papa João XXIII, que desejaria - foi ele mesmo a escrevê-lo - vê-lo elevado às honras dos altares. O Papa João unia às virtudes cristãs um profundo conhecimento da humanidade, nas suas luzes e sombras. A paixão longamente cultivada pela história servia-lhe, nisto, de ajuda.

Os traços fundamentais da sua personalidade foram assimilados por Angelo José Roncalli no ambiente familiar. "Aquelas poucas coisas que aprendi de vós em casa - escrevia aos pais - ainda são as mais preciosas e importantes, sustentam e dão vida e calor às muitas que aprendi depois. Quanto mais avançava na vida e na santidade, tanto mais conquistava todos com a sua sábia simplicidade.

Na célebre Encíclica Pacem in terris propôs a crentes e não-crentes o Evangelho como caminho para chegar ao fundamental bem da paz: estava de facto convencido de que o Espírito de Deus faz sentir de algum modo a sua voz a todo o homem de boa vontade. Não se perturbou diante das provações, mas soube sempre olhar com optimismo para as várias vicissitudes da existência. "Basta cuidar do presente: não é necessário empregar fantasia e ansiedade para a construção do futuro". Assim escrevia em 1962 no Giornale dell'anima.

Ao apresentar a minha saudação a quantos vieram especialmente de Bérgamo e de Veneza, juntamente com o Cardeal Cé e o Bispo Amadei, faço votos para que o exemplo do Papa João vos encoraje a confiar sempre no Senhor, que guia os seus filhos ao longo das veredas da história.

4. Dirijo-me agora a vós, fiéis de Génova, de Ventimiglia e de toda a Ligúria, e a vós, Irmãs de Santa Marta, para recordar a luminosa figura do Bispo Tomás Reggio. Na segunda parte do século passado, ele foi educador nos Seminários de Génova e de Chiávari e jornalista, promovendo o primeiro jornal católico genovês. Mas a Providência queria-o Pastor, e ele foi chamado a orientar a diocese de Ventimiglia; em seguida, precisamente quando, por causa da idade, pedira que fosse dispensado do encargo, o Papa confiou-lhe a arquidiocese de Génova.

A sua vida foi operosa como nunca, mas o segredo de tanta actividade foi sempre uma profunda comunhão com Deus. "Sou eclesiástico - escrevia -, é necessário que eu seja santo..., portanto sejam postos em prática todos os meios para o ser. Custe o que custar, é preciso chegar lá...". Ele propôs este ideal de santidade a todas as categorias de fiéis: leigos, sacerdotes e pessoas consagradas; de modo particular às suas Irmãs. Hoje, como Beato, reproponho-o a todos, oferecendo do céu a sua intercessão.

5. Uma cordial saudação a todos vós, vindos a Roma para a beatificação do Padre Guilherme José Chaminade, e em particular àqueles que provêm do sudeste da França, região em que ele se formou e começou a sua vida pastoral e missionária. Desejo dirigir uma particular saudação aos membros das Congregações e a toda a Família Marianista. Queridos jovens, no Padre Chaminade tendes um exemplo de vida cristã, que conduz a uma vida plena e à felicidade prometida por Deus.

Vós todos, sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos, que viveis o carisma do Padre Chaminade, oferecei o vosso dinamismo à Igreja e sede no mundo fermento do Reino! A personalidade e a acção do novo Beato, que desejava realizar em tudo a obra de Deus, convidam todos os fiéis a uma formação catequética séria, para desenvolver e consolidar a sua vida espiritual, e entrar de maneira mais profunda no encontro com Cristo, em particular na vida sacramental, no interior da sua comunidade cristã. A exemplo do novo Beato, oxalá vos inspireis sempre em Maria, Mãe dos cristãos, Mãe dos discípulos do seu Filho!

6. A vós que viestes a Roma para a beatificação de Dom Columba Marmion, de modo particular aos membros e amigos da grande família beneditina, vindos da Irlanda, da Bélgica e de outros países, dirijo a minha saudação cordial. O meu pensamento dirige-se também aos religiosos da Abadia de Maredsous, da qual Dom Columba foi Abade e onde exerceu com zelo o seu ministério de guia espiritual ao serviço da sua comunidade e, sobretudo pelos seus escritos, ao serviço de numerosos sacerdotes, religiosos e leigos.

Apresento cordiais boas-vindas aos peregrinos de língua inglesa, que vieram a Roma por ocasião da beatificação de Dom Columba Marmion. Esta beatificação chama a atenção para um lugar especial da vida monástica na Igreja, da qual a Irlanda, terra natal de Marmion, tem uma longa e rica tradição. No grande espírito beneditino, o Beato Columba, contemplativo e apóstolo, foi um mestre excepcional de vida interior, baseada na meditação da Palavra de Deus, na celebração da liturgia e na oração pessoal. Que o Beato Marmion ajude todos nós a viver a vida cristã de maneira cada vez mais intensa e a ter uma compreensão sempre mais profunda da nossa pertença à Igreja, Corpo místico de Cristo! Deus abençoe todos vós!

7. Caríssimos Irmãos e Irmãs! O Ano jubilar convida-nos a todos a uma peregrinação rumo a Cristo. Peregrinação que os novos Beatos percorreram com empenho e fadiga, passando através da "porta estreita" que é Cristo. Precisamente por isto, agora participam da sua glória. Impelidos pelo exemplo deles e ajudados pela sua intercessão, apressemos também nós o passo rumo à Pátria celeste.

305 Para isto, invoco sobre cada um a protecção materna de Maria Santíssima e dos novos Beatos, enquanto de coração vos abençoo a todos.




Discursos João Paulo II 2000 298