Discursos João Paulo II 2001 - Sábado, 24 de março de 2001

4. Deveis enfrentar, na vossa pátria, o desafio de uma mentalidade cada vez mais materialista, que está a afectar muitos dos valores humanos autenticos, sobre os quais tradicionalmente se funda a sociedade coreana. Isto exige um renovado empenho para enfrentar a crise muito sentida dos valores e reforçar o sentido do transcendente na vida dos fiéis. A vossa recente iniciativa para promover o Evangelho da vida mediante a instituiçao de uma especial Subcomissao do Comité para a Doutrina da Fé na vossa Conferencia, que se ocupe das questões relacionadas com a bioética, é louvável, como também a vossa firme oposiçao ao aborto, nao só porque ele é uma terrivel ofensa ao dom da vida que nos é feito por Deus, mas também porque introduz na sociedade uma atitude relativista em relaçao a todos os principios morais e éticos fundamentais.

Neste como em muitos outros âmbitos da vida da Igreja, o papel dos fiéis leigos é indispensável. É significativo que a fé tenha sido introduzida na vossa pátria no final do século XVIII, graças aos esforços persistentes de leigos empenhados. Entre os que foram mortos durante as perseguições de 1801, encontrava-se a primeira mulher catequista da Coreia, Columba Kang Wan-suk, que promoveu, sem receio, o Evangelho em Seul e em todo o Pais antes de ser executada juntamente com outras quatro pessoas que se tinham convertido graças à sua influencia. Dos 103 mártires canonizados em 1984, vitimas sobretudo das perseguições de 1839 e de 1866, 92 eram leigos. Que inspiraçao melhor do que estas testemunhas e esta herança podem ter os fiéis leigos da Coreia no seu generoso empenho pela evangelizaçao, a catequese, a promoçao da doutrina social católica e as obras de caridade? Compete-vos a vós a tarefa de discernir os dons dos leigos, de promover neles uma consciencia mais profunda da missao na qual participam em comunhao com a Igreja, e de os encorajar a usar as suas capacidades para a renovaçao da sociedade e para a difusao de uma cultura baseada no respeito por todas as pessoas humanas.

5. Os vossos mais estreitos colaboradores na obra de evangelizaçao sao os vossos sacerdotes, chamados com a ordenaçao a serem autenticos Pastores do rebanho, pregadores do Evangelho da salvaçao e dignos ministros dos sacramentos. A Coreia é abençoada por um nùmero elevado de vocações sacerdotais, com Pastores cuja vida se caracteriza profundamente pela fidelidade a Cristo e pela generosa dedicaçao aos seus irmaos e irmas. É importante que os fiéis vejam os seus sacerdotes como homens cujas mentes e corações estao consagrados às coisas profundas do Espirito (cf. Rm Rm 8,5), como homens de oraçao, empenhados no seu ministério sacerdotal e que se distinguem pela sua rectidao moral. O novo Pontificio Colégio Coreano aqui em Roma é um sinal da vossa decisao de garantir aos vossos sacerdotes uma sólida formaçao permanente que os ajudará a dar um testemunho convicto de Cristo e a desempenhar as tarefas do seu ministério com dedicaçao e alegria.

Encorajo-vos a prestar particular atençao à formaçao daqueles que ensinarao nos seminários. Nao devem ter apenas uma profunda formaçao nas ciencias sagradas, mas também uma formaçao especifica nos âmbitos da espiritualidade sacerdotal, na arte da direcçao espiritual e nos outros aspectos da dificil e delicada tarefa que os espera na formaçao dos futuros sacerdotes (cf. Ecclesian in Asia, 43). Dirijo mais uma vez palavras de piedoso encorajamento à Korean Foreign Mission Society, pedindo ao Senhor que abençoe o seu trabalho e lhe conceda um aumento de vocações para a abundante colheita que se anuncia à Igreja no terceiro Milénio cristao.

6. Os documentos do Concilio Vaticano II contem numerosas referencias acerca da importância para a Igreja universal e para cada Igreja particular do testemunho e do apostolado dos homens e das mulheres consagrados. Através da observância dos conselhos evangélicos, eles tornam visivel na Igreja a forma que o Verbo Encarnado assumiu na sua vida terrena (cf. Vita consecrata, VC 14). Eles sao um sinal da nova criaçao inaugurada por Cristo e tornada possivel em nós pela graça e pela força do Espirito Santo, e dao testemunho da supremacia de Deus e da sublimidade do conhecimento de Cristo (cf. Fl Ph 3,8). Além das diferentes e inestimáveis formas de serviço que os homens e as mulheres consagrados desempenham nas obras caritativas, no apostolado intelectual, na assistencia no campo da saùde e noutros âmbitos da actividade eclesial, é seu carisma especial oferecer uma resposta à procura, hoje muito difundida, de uma autentica espiritualidade, que se exprime amplamente como busca de oraçao e de direcçao espiritual. Convido-vos a proteger a vida consagrada como um dom especial de Deus às vossas comunidades locais e a dar aos homens e às mulheres consagrados o apoio do vosso ministério e da vossa amizade.

7. Estimados Irmaos no Episcopado, a vossa terra natal está muitas vezes nas minhas orações. Alegro-me cada vez que tomo conhecimento dos progressos na promoçao da reconciliaçao, da compreensao reciproca e da cooperaçao entre todos os membros da familia coreana. Este é um campo de acçao e de serviço que a Igreja a que vós presidis deve prosseguir resolutamente, dia após dia, discernindo e seguindo os sinais que a Providencia oferece. A solidariedade material e espiritual para com a comunidade católica e para com todo o povo coreano, de formas apropriadas e com caridade pastoral, demonstrar-se-á inevitavelmente um passo positivo para a reconciliaçao. Rezo para que Deus Omnipotente continue a abençoar os esforços daqueles que se empenham pelo bem de todo o povo da peninsula.

Agradeço-vos mais uma vez a vossa generosidade e empenho no cumprimento dos deveres do vosso ministério episcopal, e a comunhao espiritual e o apoio que sempre me demonstrastes. Aos sacerdotes, aos religiosos e aos leigos da Coreia, exprimo mais uma vez o meu sentido

encorajamento e, de maneira particular, rezo pelos idosos e pelos doentes, cujo sofrimento em uniao com o Senhor Crucificado é fonte de uma imensa riqueza espiritual para todo o Povo de Deus. Com estes sentimentos, recomendo-vos a todos a Maria, Mae do Redentor, e confio-lhe as necessidades da Igreja na Coreia, bem como as alegrias e as dificuldades do vosso ministério.

Peço ao Espirito Santo que derrame sobre as vossas Dioceses novas graças e energias para a missao que ainda deve ser realizada. Concedo de coraçao a cada um de vós e aos membros da Igreja no vosso Pais a minha Bençao apostólica.



MENSAGEM DO SANTO PADRE


À ORDEM DO CARMELO


POR OCASIÃO DA DEDICAÇÃO DO ANO 2001


À VIRGEM MARIA







Aos Reverendíssimos Padres
JOSEPH CHALMERS Prior-Geral da Ordem dos Frades da Bem-Aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo (O. Carm.) e
CAMILO MACCISE Prepósito-Geral da Ordem dos Irmãos Descalços da Bem-Aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo (O.C.D.)

1. O providencial acontecimento de graça, que foi para a Igreja o Ano jubilar, leva-a a olhar com confiança e esperança para o caminho que acabamos de empreender no novo milénio. "Ao princípio deste novo século, escrevi na Carta Apostólica Novo millennio ineunte o nosso passo deve fazer-se mais lesto... Neste caminho acompanha-nos a Virgem Santíssima; a Ela... confiei o terceiro milénio" (n. 58).

Por conseguinte foi grande a alegria quando tomei conhecimento que a Ordem do Carmelo, nos seus dois ramos, o antigo e o reformado, deseja exprimir o seu amor filial à sua Padroeira, dedicando-lhe o ano 2001, a ela que é invocada como flor do Carmelo, Mãe e Guia no caminho da santidade. A respeito disto, não posso deixar de realçar uma feliz coincidência: a celebração deste ano mariano para todo o Carmelo é feita, segundo é transmitido por uma venerável tradição da própria Ordem, no 750° aniversário da entrega do Escapulário. É portanto uma celebração que constitui para toda a Família carmelita uma maravilhosa ocasião para aprofundar tanto a sua espiritualidade mariana, como para a viver cada vez mais à luz do lugar que a Virgem Mãe de Deus e dos homens ocupa no mistério de Cristo e da Igreja e, portanto, de a seguir, Ela que é a "Estrela da Evangelização" (cf. Novo millennio ineunte, 58).

2. As várias gerações do Carmelo, desde as suas origens até aos dias de hoje, no seu itinerário rumo à "montanha santa, Jesus Cristo nosso Senhor" (Missal Romano, Colecta da Missa em honra da Bem-Aventurada Virgem Maria do Carmelo, 16 de Julho), procuraram plasmar a própria vida segundo os exemplos de Maria.

Por isso no Carmelo, e em qualquer alma movida pelo terno afecto à Virgem e Mãe Santíssima, floresce a sua contemplação, d'Ela que, desde o princípio, soube estar aberta à escuta da Palavra de Deus e ser obediente à sua vontade (cf. Lc Lc 2,19 Lc Lc 2,51). De facto, Maria educada e plasmada pelo Espírito (cf. Lc Lc 2,44-50), foi capaz de ler na fé a própria história (cf. Lc Lc 1,46-55) e, dócil às sugestões divinas, "avançou no caminho da fé, e conservou fielmente a união com seu Filho até à cruz, junto da qual, por desígnio de Deus, se manteve de pé (cf. Jo Jn 19,25); sofreu profundamente com o seu Unigénito e associou-se de coração maternal ao seu sacrifício" (Lumen gentium, LG 58).

3. A contemplação da Virgem apresenta-no-la enquanto, como Mãe solícita, vê crescer o seu Filho em Nazaré (cf. Lc Lc 2,40 Lc Lc 2,52), o segue pelas estradas da Palestina, o assiste nas bodas de Caná (cf Jn 2,5) e, aos pés da Cruz, torna-se a Mãe associada à sua oferenda e doada a todos os homens na entrega que o próprio Jesus faz dela ao seu discípulo predilecto (cf. Jo Jn 19,26). Como Mãe da Igreja, a Virgem Santa está unida aos discípulos que se "entregavam assiduamente à oração" (Ac 1,14) e, como Mulher nova que antecipa em si o que um dia se realizará para todos na plena fruição da vida trinitária, é elevada ao Céu, e onde estende o manto de protecção da sua misericórdia sobre os filhos peregrinos para o monte santo da glória.

Uma atitude contemplativa da mente e do coração como esta leva a admirar a experiência de fé e de amor da Virgem, que já vive em si o que cada fiel deseja e espera realizar no mistério de Cristo e da Igreja (cf. Sacrosanctum Concilium, SC 103 Lumen gentium, LG 53). Justamente por isto os carmelitas, nos seus dois ramos, escolheram Maria como própria Padroeira e Mãe espiritual e têm sempre diante dos olhos do coração a Virgem Puríssima que guia a todos para o perfeito conhecimento e imitação de Cristo.

Floresce assim uma intimidade de relações espirituais que incrementam cada vez mais a comunhão com Cristo e com Maria. Para os Membros da Família carmelita Maria, a Virgem Mãe de Deus e dos homens, não é só um modelo para imitar, mas também uma doce presença de Mãe e Irmã na qual confiar. Justamente Santa Teresa de Jesus exortava: "Imitai Maria e ponderai qual deva ser a grandeza desta Senhora e o benefício de a ter como Padroeira" (Castelo interior, III, 1, 3).

4. Esta intensa vida mariana, que se exprime em oração confiante, em entusiástico louvor e em diligente imitação, leva a compreender como a forma mais genuína da devoção à Virgem Santíssima, expressa pelo humilde sinal do Espapulário, seja a consagração ao seu Coração Imaculado (cf. Pio XII, Carta Neminem profecto later [11 de Fevereiro de 1950: AAS 42, 1950, pp. 390-391]; Const. dogm. sobre a Igreja Lumen gentium, LG 67). É assim que no coração se realiza uma crescente comunhão e familiaridade com a Virgem Santa, "como maneira nova de viver para Deus e de continuar aqui na terra o amor do Filho à sua mãe Maria" (cf. Angelus, em Insegnamenti XI/3, 1988, p. 173). Pomo-nos desta forma, segundo a expressão do Beato mártir carmelita Tito Brandsma, em profunda sintonia com Maria, a Theotokos, tornando-nos como Ela transmissores da vida divina: "Também a nós o Senhor envia o seu anjo... também nós devemos receber Deus nos nossos corações, levá-lo dentro dos nossos corações, nutri-lo e fazê-lo crescer em nós de tal forma que ele nasça de nós e viva connosco como Deus-connosco, o Emanuel" (Da relação do Beato Tito Brandsma ao Congresso Mariológico de Tongerloo, Agosto de 1936).

Este rico património mariano do Carmelo tornou-se, no tempo, através da difusão da devoção do Santo Escapulário, um tesouro para toda a Igreja. Pela sua simplicidade, pelo seu valor antropológico e pela relação com o papel de Maria em relação à Igreja e à humanidade, esta devoção foi profunda e amplamente recebida pelo povo de Deus, a ponto de encontrar a sua expressão na memória de 16 de Julho, presente no Calendário litúrgico da Igreja universal.

5. No sinal do Escapulário evidencia-se uma síntese eficaz de espiritualidade mariana, que alimenta a devoção dos crentes, tornando-os sensíveis à presença amorosa da Virgem Mãe na sua vida. O Escapulário é essencialmente um "hábito". Quem o recebe é agregado ou associado num grau mais ou menos íntimo à Ordem do Carmelo, dedicado ao serviço de Nossa Senhora para o bem de toda a Igreja (cf. Fórmula da imposição do Escapulário, no "Rito da Bênção e imposição do Escapulário", aprovado pela Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, 5/1/1996). Por conseguinte, quem veste o Escapulário é introduzido na terra do Carmelo, para que "coma os seus frutos e produtos" (cf. Jer Jr 2,7), e experimente a presença doce e materna de Maria, no empenho quotidiano de se revestir interiormente de Jesus Cristo e de o manifestar vivo em si para o bem da Igreja e de toda a humanidade (cf. Fórmula da imposição do Escapulário, cit.).

São portanto duas as verdades recordadas no sinal do Escapulário: por um lado, a protecção contínua da Virgem Santíssima, não só ao longo do caminho da vida, mas também no momento da passagem para a plenitude da glória eterna; por outro, a consciência de que a devoção a Ela não se pode limitar a orações e obséquios em sua honra em algumas circunstâncias, mas deve constituir um "hábito", isto é, um ponto de referência permanente do seu comportamento cristão, tecido de oração e de vida interior, mediante a prática frequente dos Sacramentos e o exercício concreto das obras de misericórdia espiritual e corporal. Desta forma o Escapulário torna-se sinal de "aliança" e de comunhão recíproca entre Maria e os fiéis: de facto, ele traduz de maneira concreta a entrega que Jesus, na cruz, fez a João, e nele a todos nós, da sua Mãe, e o acto de confiar o seu apóstolo predilecto e a nós a Ela, constituída nossa Mãe espiritual.

6. Desta espiritualidade mariana, que plasma interiormente as pessoas e as configura com Cristo, primogénito de muitos irmãos, são um maravilhoso exemplo os testemunhos de santidade e de sabedoria de tantos Santos e Santas do Carmelo, todos crescidos à sombra e sob a tutela da Mãe.

Também eu levo no meu coração, desde há muito tempo, o Escapulário do Carmo! Pelo amor que nutro pela Mãe celeste de todos nós, cuja protecção experimento continuamente, desejo que este ano mariano ajude todos os religiosos e as religiosas do Carmelo e os piedosos fiéis que a veneram filialmente, a crescer no seu amor e a irradiar no mundo a presença desta Mulher do silêncio e da oração, invocada como Mãe da misericórdia, Mãe da esperança e da graça.

Com estes votos, concedo de bom grado a Bênção apostólica a todos os frades, monjas, irmãos, leigos e leigas da Família carmelita, que tanto se empenham para difundir entre o povo de Deus a verdadeira devoção a Maria, Estrela do mar e Flor do Carmelo!

Vaticano, 25 de Março de 2001.




AO SENADO ACADÉMICO DA


UNIVERSIDADE DE POZNAN


Segunda-feira, 26 de Março de 2001



Ilustres Senhores e Senhoras

Agradeço-vos de coração a vossa presença. Saúdo o Cardeal Zenon Grocholewski, o Arcebispo Juliusz e o Bispo Marek. Dou as boas-vindas aos ilustres Professores, aos estudantes e ao pessoal não docente da Universidade "Adam Mickiewicz". Agradeço ao Senhor Reitor as palavras gentis que me dirigiu.

Viestes aqui como representantes de toda a comunidade da Universidade "Adam Mickiewicz" de Poznan para honrar o Papa com o título de doutor da vossa benemérita Universidade. Aceito com gratidão este privilégio. Mesmo se os meus contactos directos com a Universidade de Poznan não foram frequentes, senti-me sempre ligado a ela, como de resto a todas as Universidades da Polónia e do mundo. Com efeito, considero o ambiente científico que se criou à sua volta um importante centro de formação da cultura da nossa Nação, amplamente entendida. Neste momento, não posso deixar de recordar as palavras pronunciadas por Adam Poszwinski, durante a cerimónia de inauguração da Universidade, em 1919: "O nosso desejo é que desta escola saiam não só bons professores, mas cidadãos de coração e de espírito nacional, cidadãos com um elevado sentido de serviço cívico, que vejam a sua profissão como serviço à nação"! Se é assim, se a solicitude pelo bem espiritual da nação é o princípio fundamental da vossa Alma Mater, ela não pode deixar de ser amada por mim.

Hoje, este bem espiritual da nação, deve ser visto na perspectiva da unificação da Europa. E também num delineamento deste género é difícil sobreestimar o papel do Ateneu dos Piastas. Em 1983, em Poznan, eu disse que a vossa cidade tivera um papel significativo na formação da cultura polaca de maneira que fez com que ela adquirisse as marcas características sobretudo do ocidente europeu (cf. 20/06/1983). A vossa Universidade, desde o seu longínquo alvorecer ligado à figura do Bispo Jan Lubranski, e mais tarde ao Bispo Adam Konarski, até aos nossos dias, inseriu-se activa e eficazmente na obra de construção de pontes entre o património da dinastia dos Piastas, dos Jagelões e das épocas seguintes, e o espírito da Europa. Faço votos para que também no futuro a Universidade de Poznan continue a ser lugar de encontro entre a cultura polaca consolidada na identidade e a cultura europeia respeitadora dos valores perenes.

Mais um pensamento. Não gostaria que o significado deste doutorado honoris causa se limitasse apenas à minha pessoa. Aceito-o como sinal de uma coexistência criativa de ciência e de religião e de uma frutuosa cooperação dos ambientes científicos e eclesiásticos. Este parece ser um sinal muito eloquente porque a atribuição deste título foi proposto por todas as faculdades da Universidade. Alegro-me pelo facto de ter sido incluída recentemente, a Faculdade de Teologia.

Que esta presença revele sempre mais a forma espiritual da ciência, aberta ao infinito, e ajude, ao mesmo tempo, a descobrir as bases sólidas e científicas da fé.

Agradeço mais uma vez a benevolência que me demonstrastes. Peço-vos que transmitais as minhas cordiais saudações a todos os professores, aos Estudantes e ao Pessoal não docente da Universidade, que não estao aqui presentes. Levo a todos no coraçao e a todos recordo hoje na oração. Peço a Deus a abundância da sua bênçao para vós aqui presentes e para toda a comunidade da Universidade "Adam Mickiewicz" de Poznan.

Deus vos abençoe!




AOS EDITORES DO TERCEIRO VOLUME DAS


MENSAGENS DO PAPA PARA OS DIAS DA PAZ


Quarta-feira, 28 de março de 2001




Ilustre Senhor Núncio!
Estimados Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio!
Queridos Irmãos e Irmãs!

1. "Graça e paz vos sejam dadas por parte de Deus nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo" (Ph 1,2). Com estes votos de Paulo, o apóstolo das Nações, dou-vos as boas-vindas ao Palácio Apostólico, onde tivemos a ocasião de celebrar juntos há pouco a Eucaristia e de nos darmos o abraço da paz.

Retomo de bom grado as palavras que me dirigiu o Núncio Apostólico, D. Donato Squicciarini em nome de todos vós. Como ele que, olhando para este encontro, falou de uma grande honra, assim também eu desejo exprimir a profunda alegria que esta ocasião me dá: a entrega do terceiro volume das minhas Mensagens para o Dia da Paz dos anos 1993-2000.

2. Agradeço ao meu representante na Áustria o empenho que assumiu como editor desta notável obra e o precioso contributo que, desta forma, oferece para a difusão das Mensagens da Paz. Ao mesmo tempo, exprimo o meu agradecimento a quantos se dedicaram com estudos intensos aos meus pensamentos sobre a paz, tornando-se desta forma seus intérpretes competentes. Desejo ainda exprimir os meus sentimentos de estima também àqueles que, com grande cuidado, publicaram e realizaram tecnicamente este livro tão útil.

3. A mensagem de paz é actual como nunca, num tempo em que os povos se aproximam cada vez mais sob o ponto de vista do espaço, de forma que se tem a impressão de que o globo terrestre se reduza cada vez mais a um "mundo-aldeia". Com todos os riscos e perigos que o processo de globalização sem dúvida comporta, não se deve ignorar um fenómeno que representa um sinal de esperança: a crescente consciência da recíproca dependência entre as pessoas individualmente, os grupos étnicos e as nações.

O facto de que os homens e as mulheres, em várias partes do mundo, sintam as injustiças e as violações dos direitos humanos mesmo se se verificam em Países distantes como se fossem eles próprios a sofrê-las, indica uma crescente sensibilização dos corações. Mas paralelamente existe um motivo de preocupação, quando os interesses nacionalistas aumentam de tal forma que o encontro entre as culturas deixa de ser sentido como enriquecimento, e é visto como ameaça. Por conseguinte os progressos devidos à globalização devem alcançar também as consciências. Assim, a mensagem de paz obtém um novo eco.

4. O crescente entrelaçamento entre as relações recíprocas dos homens, nas coisas grandes e pequenas, exige literalmente a solidariedade. De facto, a paz só é possível quando a dependência recíproca, em si, supera qualquer exclusão, renuncia a todas as formas de imperialismo económico, militar ou nacional e transforma a desconfiança recíproca numa amistosa colaboração. Consiste precisamente nisto o gesto particular de solidariedade entre as pessoas e os povos.

Neste contexto, desejaria recordar o mote sob o qual o meu venerado Predecessor, o Papa Pio XII, pôs o seu pontificado: Opus iustitiae pax. A paz é o fruto da justiça. Hoje o mesmo mote pode ser visto de novo da mesma perspectiva bíblica (cf. Is Is 32,17 Jc 3,18); Opus solidarietatis pax. A paz é fruto da solidariedade.

Para que a "paz das armas" possa crescer e durar no tempo, o homem deve confiar-se às "armas da paz": entre elas encontra-se o respeito à dignidade humana, e a prática da justiça e da solidariedade. Estas "armas da paz" erguem-se quando não é respeitada a dignidade da pessoa humana, quando o débil é oprimido e o pobre desfavorecido.

5. Oxalá esta obra ajude muitos leitores a compreender de maneira cada vez mais profunda a mensagem de paz e a pô-la em prática na própria vida! O tema da paz não deve limitar-se às palavras; deve tornar-se também acção. Alimento no coração a esperança de que a "cultura da paz" se difunda ainda mais, para que o globo terrestre seja envolvido pela "rede da paz", tecida pela "globalização da solidariedade". O volume por vós preparado e agora publicado pode sem dúvida contribuir para alcançar este objectivo. Como sinal de gratidão e de reconhecimento pela realização do projecto deste livro, concedo-vos a Bênção apostólica.




AOS MEMBROS DA


COMISSÃO DOS EPISCOPADOS DA


COMUNIDADE EUROPEIA


Sexta-feira, 30 de Março de 2001






Senhores Cardeais,
Venerados Irmãos no Episcopado
Caríssimos Irmãos e Irmãs

1. Estou contente por dirigir uma cordial saudação a cada um de vós, que viestes a Roma para a Assembleia plenária da primavera da Comissão dos Episcopados da Comunidade Europeia. Agradeço em particular, a D. Josef Homeyer, Bispo de Hildesheim, pelas palavras cordiais que me dirigiu em vosso nome. Saúdo, depois, os Representantes das Conferências Episcopais dos Estados candidatos à União Europeia e os Membros da Presidência do Conselho das Conferências Episcopais da Europa, que tomam parte no vosso encontro de estudo e de fraternidade. Dirijo, ainda, o meu pensamento aos sacerdotes e aos leigos que com generosidade e competência vos ajudam na vossa missão de cada dia.

A reunião de hoje, sinal da intensa e profunda comunhão que vos une ao Sucessor de Pedro, permite-me conhecer mais de perto os projectos e as perspectivas de trabalho de colaboração das Comunidades eclesiais europeias. A vossa Comissão propõe-se enfrentar sob o ponto de vista pastoral as temáticas de crescente importância aliadas às competências e actividades da União Europeia e favorecer a cooperação entre os Episcopados em tudo o que diz respeito às questões de interesse comum.

2. O processo de integração europeia, apesar de algumas dificuldades, prossegue o seu caminho e outros Estados pedem para se associarem à União dos Quinze. O que se está a consolidar não deve, porém, ser apenas uma realidade geográfica e económica continental, mas deve propor-se, acima de tudo, um acordo cultural e espiritual, forjado mediante um fecundo intercâmbio de múltiplos e significativos valores e tradições. A Igreja continua a oferecer, num espírito de participação, a tão importante processo de integração o seu próprio e específico contributo. Os meus venerados Predecessores saudaram o caminho como um itinerário seguro para a paz e a concórdia entre os povos, abrindo-vos uma via mais rápida para atingir o "bem comum europeu".

Eu mesmo, várias vezes, evoquei a imagem de uma Europa que respira a dois pulmões, não só do ponto de vista religioso, como também cultural e político. Desde o início do meu ministério petrino, nunca deixei de sublinhar que a construção da civilização europeia se deve fundar no reconhecimento da "dignidade da pessoa humana e dos seus inalienáveis direitos fundamentais, a intregridade da vida, a liberdade e a justiça, a fraternidade e a solidariedade" (cf. Discurso à 76ª Reunião de diálogo de Bergedorf sobre o tema "A divisão da Europa e a possibilidade de superar tal situação" (17 de Dezembro de 1984, Ed. port. 30/12/1984, pág. 6).

3. Quis mesmo que à missão da Igreja na Europa fossem dedicadas duas Assembleias Especiais do Sínodo dos Bispos, a de 1991 e de 1999. Sobretudo esta última, que tinha como tema "Jesus Cristo vivo na sua Igreja, fonte de esperança para a Europa", insistiu com vigor no modo como o cristianismo pode oferecer ao continente europeu um determinante e substancial contributo de renovação e esperança, propondo com renovado impulso o anúncio sempre actual de Cristo, único Redentor do homem.

A Igreja encontra "força no poder do Senhor ressuscitado para vencer na paciência e na caridade as próprias aflições e dificuldades, internas e externas, e para revelar ao mundo, com fidelidade, o mistério de Cristo" (Lumen gentium LG 8). É com esta consciência que também vós, caros Irmãos e Irmãs, sois chamados a assumir o dever de despertar e cultivar nos cristãos europeus o compromisso de testemunhar a esperan-ça evangélica. É necessária, para tal fim, uma renovada era missionária que envolva todos os elementos do povo cristão. Oportunamente, a vossa Comissão e os Episcopados do continente estão a dedicar-se à formação religiosa e cultural dos fiéis e ao acompanhamento permanente das pessoas que, a todos os níveis, são responsáveis pela unificação europeia. A construção de uma nova Europa, de facto, tem necessidade de homens e mulheres dotados de humana sabedoria, de um sentido vivo de discernimento, baseado numa sólida antropologia que não esteja desligada da experiência pessoal da transcendência divina.

4. Talvez apareça no mundo contemporâneo a convicção de que o homem pode estabelecer por si próprio os valores de que tem necessidade. A sociedade não raro quer delegar a determinação das próprias metas no cálculo da razão, na tecnologia ou no interesse de uma maioria. É preciso voltar a dizer com força que a dignidade da pessoa humana está radicada nos desígnios do Cridor, assim como os direitos que dela vêm não estão sujeitos às intervenções arbitrárias da maioria, mas devem ser reconhecidos por todos e mantidos no centro de cada plano social e de toda a decisão política. Só uma visão integral da realidade, inspirada nos perenes valores humanos, pode favorecer o fortalecimento de uma comunidaede livre e solidária.

Devem olhar constantemente para o ser humano e suas exigências fundamentais sobretudo aqueles que são escolhidos para o governo, a formulação das leis e a administração do Estado. Neste campo, a Igreja não deixará de oferecer o seu contributo específico. Experiente em humanidade, ela sabe que o primeiro dever de cada sociedade é salvaguardar a autêntica dignidade humana e o bem comum que, como afirma o Concílio Vaticano II "compreende o conjunto daquelas condições de vida social, que permitem aos homens, às famílias e aos grupos poderem alcançar mais plena e facilmente a sua própria perfeição" (Gaudium et spes GS 74).

5. Caríssimos Irmãos e Irmãs, para que este esforço seja eficaz, ele deve ser constantemente precedido e acompanhado pela oração. É no humilde e confiante recurso a Deus que podemos obter a luz e a coragem indispensáveis para comunicar aos irmãos o Evangelho da esperança e da paz. Só a partir de Cristo e da sua mensagem de salvação é possível construir a civilização do amor. A Virgem Maria, venerada em tantos santuários espalhados pelo continente europeu, vos fortaleça na vossa acção apostólica e missionária. Com estes votos, enquanto vos encorajo a continuar no vosso louvável serviço à causa europeia, do coração vos abençoo a todos.




AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL DO JAPÃO


EM VISITA "AD LIMINA APOSTOLORUM"


Sábado, 31 de Março de 2001




Estimados Irmãos Bispos

1. Rejubilando novamente pelas "imperscrutáveis riquezas de Cristo" (Ep 3,8), dou-vos as boas-vindas, a vós Bispos do Japão, por ocasião da vossa visita ad Limina apostolorum, uma peregrinação autêntica em espírito de comunhão com a Igreja universal e com o Sucessor de Pedro. Através de vós, saúdo todos os amigos de Deus no vosso País, "dou graças ao meu Deus todas as vezes que me lembro de vós, em todas as minhas orações peço sempre com alegria por todos vós, recordando-me da parte que tomastes na difusão do Evangelho, desde o primeiro dia até ao dia de Jesus Cristo" (Ph 1,3-4).

No Ano do Grande Jubileu, toda a Igreja louvou a Deus pelas graças infinitas de dois mil anos do nascimento do Salvador. Agora, ao saudar-vos, não posso deixar de dar graças a Deus pela herança da fé cristã que floresceu no Japão a partir do dia em que São Francisco Xavier desembarcou nas vossas margens. Os primeiros missionários ensinaram aos cristãos do Japão um profundo temor reverencial pela majestade de Deus, uma grande estima pela Redenção, um fervoroso amor pelo Salvador crucificado e uma decidida recusa do pecado. Fizeram apelo ao sentido inato do vosso povo pela caducidade das coisas terrenas e à falta de medo perante a morte, infundindo neles o amor pelas coisas do Céu e pela eternidade que lá se encontra. Por conseguinte, os primeiros séculos de cristianismo no Japão foram marcados indelevelmente pela coragem e pela solidez dos vossos mártires. O seu testemunho heróico não só enriquece o vosso passado com o esplendor do Senhor crucificado, mas indica também o caminho da vocação presente e futura e do empenho dos cristãos japoneses.

2. Na Carta Apostólica Novo millennio ineunte, reflecti acerca da histórica pesca milagrosa descrita pelo Evangelho de São Lucas (5, 1-11).

Duc in altum! Estas palavras ressoaram na minha mente recordando-me da graça do Grande Jubileu e pensando no futuro, para o qual o Jubileu constituiu uma preparação excelente. Não só no Japão, mas em muitas outras partes do mundo, os Pastores podem sentir-se como Pedro quando Jesus lhe ordenou que lançasse as redes para a pesca. Fazemos o possível para realizar esta pesca, mas por vezes, sentimos que pescamos pouco ou nada e que, pelo menos momentaneamente, não há mais nada para pescar. Todavia, Jesus diz: lança as tuas redes! A fé garante-nos que o Senhor conhece o nosso mundo melhor que nós, que Ele vê através das águas profundas do ânimo humano e da cultura que estais chamados a evangelizar.

A história demonstra que períodos que parecem ser particularmente difíceis para a proclamação de Jesus Cristo e hostis ao seu Evangelho, podem ser também os mais fecundos. De facto, existem muitos sinais de uma generalizada exigência de espiritualidade (Novo millennio ineunte, 33).

Cristo chama-nos a "uma entusiasmante obra de relançamento pastoral" (Ibid. 29). Devemos procurar aplicar ao mundo de hoje, com imaginação e coragem, o programa sempre actual do Evangelho e apresentar a quem nos escuta a figura infinitamente fascinante do Senhor Jesus e a verdade do Evangelho, "poder de Deus para a salvação" (Rm 1,16).

3. A necessária inculturação da fé no contexto da sociedade japonesa não pode ser o resultado de um plano ou de uma teoria pré-constituídas, mas deve surgir da experiência vivida de todo o Povo de Deus num diálogo constante de salvação com a sociedade em que vive. Na orientação deste diálogo, os Padres da Igreja na Ásia têm um dever delicado e de importância vital a realizar, que a Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Ásia tratou longamente, oferecendo orientações que retomei na Exortação Apostólica Ecclesia in Asia.Os vínculos estreitos entre religião, cultura e sociedade tornam particularmente difícil, para os seguidores das grandes religiões da Ásia, que sejam abertos ao mistério da Encarnação e concebam Jesus como único Salvador.

Por conseguinte, a proclamação de Cristo requer um esforço atento e duradouro para traduzir com exactidão as verdades da fé em categorias mais facilmente acessíveis à sensibilidade asiática e à mentalidade do vosso povo. O desafio consiste em apresentar "o rosto asiático de Jesus" de uma forma que esteja em perfeita harmonia com a tradição teológica, filosófica e mística da Igreja.

A Boa Nova do amor de Deus manifestada em Jesus Cristo é uma boa nova para todos, porque diz respeito ao significado da existência e do destino do homem. Um conhecido texto do Concílio Vaticano II afirma: "Na realidade, o mistério do homem só se esclarece verdadeiramente no mistério do Verbo encarnado" (Gaudium et spes, GS 22). Numa época em que muitos estão confundidos acerca do significado da vida ou procuram uma luz que ilumine as numerosas questões morais e existenciais que os afligem, a verdade acerca da condição humana é a base fundamental para a edificação de uma cultura e de uma sociedade dignas da imagem de Deus, inata em todos os homens e mulheres. Quando se realiza um esforço para promover o progresso e a prosperidade sem contudo fazer referência a Deus, causando por conseguinte um dano incalculável à dignidade da pessoa humana, a Igreja tem o dever de recordar às pessoas o que é essencial: a verdade, a bondade, a justiça e o respeito de todos. A apresentação desta realidade é uma forma fundamental de solidariedade com os outros seres humanos. Proclamar isto à sociedade é uma forma excelente de caridade pastoral.

4. Ao responder aos anseios do espírito humano confiamo-nos completamente à graça de Deus, reconhecendo também a necessidade de um programa pastoral atento e confiante (cf. Novo millennio ineunte, 29). Os desafios que o vosso ministério pastoral deve enfrentar são numerosos e complexos. Agora o direito à liberdade religiosa é plenamente reconhecido no vosso País e os dias da perseguição pertencem ao passado. Contudo verificam-se pressões de outro tipo que perturbam a fé e desafiam o vosso ministério. Alguns destes desafios são comuns à Igreja em todos os Países industrializados, enquanto outros são específicos do vosso País.

Como acontece com frequência, o bem-estar traz consigo uma série de problemas, cujas raízes devem ser procuradas no coração humano. Enquanto alguns gozam dos benefícios do progresso material, outros são postos à margem, em formas novas e por vezes particularmente degradantes de pobreza. Quando se arreiga uma mentalidade consumista, as pessoas são absorvidas pela preocupação do "ter" em desvantagem do "ser". A harmonia do espírito fragmenta-se e a consequência é a insatisfação e a incapacidade de estabelecer relações pessoais e assumir um empenho de amor e de serviço generosos em relação ao próximo. Quantas pessoas, até as que são ricas, estão ameaçadas pelo desespero devido à falta de significado na sua vida, pelo medo do envelhecimento ou da doença, pela marginalização ou discriminação social! Algumas formas nas quais as pessoas procuram alívio são extremamente danosas e destrutivas dos indivíduos e da sociedade: vêm imediatamente ao pensamento a violência, a droga e o suicídio. Contudo, como Pastores de almas, estais plenamente conscientes da verdade daquilo que São Paulo escreve aos Romanos: "Onde, porém, abundou o pecado, superabundou a graça" (5, 20). A vossa confiança nesta graça de Deus que vos dá a esperança e a força para enfrentar os desafios e é uma autêntica caridade pastoral que vos estimula a reunir todas as energias das comunidades confiadas ao vosso cuidado pastoral, no esforço grande e generoso de fazer com que o Evangelho incida de maneira mais visível e eficaz na realidade em que viveis.

5. No clima de oração que reina durante a vossa visita aos túmulos dos Apóstolos, será talvez mais fácil reafirmar que a finalidade de toda a programação e das actividades é a santidade segundo os modelos das Bem-Aventuranças (cf. Novo millennio ineunte, 31). O chamamento à santidade, mesmo se se aplica de maneira específica aos Bispos, aos sacerdotes e aos religiosos é, como realça o capítulo 5 da Lumen gentium, uma chamada universal. Existem diversos ministérios e diferentes missões na Igreja, mas isto não significa que alguns são chamados à santidade e outros não. Quem é baptizado é chamado à santidade de Deus e, portanto, "seria um contra-senso contentar-se com uma vida medíocre, pautada por uma ética minimalista e uma religiosidade superficial" (Novo millennio ineunte, 31).

Num certo sentido, a santidade do clero e dos religiosos é entendida como serviço aos leigos, permitindo-lhes progredir cada vez mais no caminho da santidade, de forma que possam realizar a própria vocação baptismal. Um laicado impregnado de virtudes cristãs até ao grau heróico não é uma novidade na história da Igreja no Japão. Na lista dos vossos mártires encontram-se muitíssimos nomes de leigos e quando, durante longos períodos persistiram dificuldades, foram os leigos que transmitiram uma fé fervorosa às gerações vindouras. A verdade é que os Pastores santos produzirão leigos santos e destes surgirão aquelas vocações para o sacerdócio e para a vida religiosa das quais a Igreja tem necessidade em qualquer tempo e em todos os lugares.

Devemos recordar este conceito de complementaridade e colaboração, de forma que a relação entre clero e laicado reflicta sempre mais a comunhão (Koinonia) que é a natureza autêntica da Igreja.

6. Um dos principais objectivos da vossa programação pastoral, em união com os vossos colaboradores, será ajudar as comunidades eclesiais no Japão a tornarem-se cada vez mais "autênticas "escolas" de oração, onde o encontro com Cristo não se exprima apenas em pedidos de ajuda, mas também em acção de graças, louvor, adoração, contemplação, escuta, afectos de alma, até se chegar a um coração verdadeiramente "apaixonado"" (Novo millennio ineunte, 33).

Esta oração tem mais significado do que a comodidade ou a força na vida do discípulo: ela é também a fonte da evangelização. Uma "nova evangelização" surgirá de uma nova intensidade de oração e contemplação.

É necessária uma renovação específica da actividade e da metodologia pastorais nas paróquias e nas comunidades que são transformadas pela influência dos imigrantes, muitos dos quais são católicos. Na maior parte dos casos estes irmãos e irmãs na fé enfrentam com pouquíssimos recursos dificuldades de adaptação a uma situação que não lhes é familiar. Muitas vezes não têm amigos, estão em desvantagem do ponto de vista linguístico e são culturalmente marginalizados, com consequências negativas para as oportunidades de trabalho, a educação dos filhos e até para os serviços necessários, como a saúde e a tutela legal. Muitos não são bem instruídos na fé e precisam de apoio espiritual e material. É preciso fazer o possível para satisfazer as suas legítimas necessidades e para os fazer sentir aceites na comunidade católica. A Igreja não pode deixar de se opor às formas de discriminação e de injustiça, agindo com determinação em nome de quantos são explorados ou não têm voz activa.

Uma "nova evangelização" no Japão significa também uma abertura ponderada mas generosa às comunidades e aos movimentos que o Espírito Santo está a fazer surgir na Igreja como fruto especial do Concílio Vaticano II. É com frequência nestes grupos que as pessoas, sobretudo os jovens, encontram o fervor espiritual e a experiência da comunidade que os conduz a um encontro pessoal com Cristo, tornando-os por sua vez missionários do novo milénio. É claro que estas comunidades e estes movimentos devem trabalhar em união com os Bispos locais. É tarefa do Bispo "encaminhar tudo e reter o que é bom" (cf. 1Th 5,21).

Queridos Irmãos Bispos, a semente boa foi lançada no solo fértil do Japão (cf. Lc Lc 8,8-15). A obra de São Francisco Xavier e dos primeiros missionários, que levou esse fruto no passado, continuará a dar frutos abundantes enquanto a sua memória for venerada. O testemunho dos mártires japoneses não deixará de mostrar "a glória de Deus, que se reflecte no rosto de Cristo" (2Co 4,6). A fidelidade heróica destes cristãos japoneses que mantiveram em segredo a própria fé durante séculos, apesar das perseguições e da falta de sacerdotes é, sem dúvida, uma garantia do facto que o encontro fecundo entre fé e cultura japonesas se pode verificar a níveis mais profundos da mente e do coração.

Ao confiar-vos a vós, os sacerdotes, os religiosos e os fiéis de Cristo no Japão a Maria "Mãe da Nova Criação e Mãe da Ásia" (Ecclesia in Asia ), concedo de coração a Bênção apostólica como penhor de graça e paz no Seu Filho divino.





Discursos João Paulo II 2001 - Sábado, 24 de março de 2001