Discursos João Paulo II 2001 - 28 de Abril de 2001

1. Dirijo-vos uma cordial saudação de boas-vindas por ocasião do Congresso internacional das Escolas católicas da Europa, organizado pelo Comité europeu para a Educação Católica. Unindo-me a vós numa fervorosa oração, faço votos para que o vosso encontro esteja na origem de novas tomadas de consciência do papel da missão específica da escola católica no espaço histórico e cultural europeu. Fundamentando-vos sobre a riqueza das vossas tradições pedagógicas, sois convidados a procurar de novo com audácia respostas apropriadas aos desafios postos pelos novos modos de pensar e de agir dos jovens de hoje, a fim de que a escola católica seja um espaço de educação integral, com um projecto educativo claro que tem o seu fundamento em Cristo. O tema do vosso Congresso, "A missão de educar: dar testemunho de um tesouro escondido" põe no centro do projecto educativo da escola católica a exigência fundamental de todo o educador cristão: transmitir a verdade não só com a palavra, mas testemunhá-la também explicitamente com a própria existência.

Assegurando um ensinamento escolástico de qualidade, a escola católica propõe uma visão cristã do homem e do mundo que oferece aos jovens a possibilidade de um diálogo fecundo entre a fé e a razão. Do mesmo modo, é seu dever transmitir valores a assimilar e verdades a descobrir, "com a consciência de que todos os valores humanos encontram a sua plena realização e, por consequência, a sua unidade em Cristo" (Congresso para a Educação católica, Carta circular de 28 de Dezembro de 1997, n. 9).

2. As perturbações culturais, a mundialização dos intercâmbios, a relativização dos valores morais e a preocupante desintegração do vínculo familiar geram em numerosos jovens uma viva inquietação, que se reflecte inevitavelmente sobre o seu modo de viver, de aprender e de projectar o seu futuro. Um contexto semelhante convida as escolas católicas europeias a propor um autêntico projecto educativo que permitirá aos jovens não só o adquirir de uma maturidade humana, moral e espiritual, mas também o compromisso eficaz na transformação da sociedade, preocupando-se em colaborar na chegada do Reino de Deus. Estarão, então, em posição de espalhar nas culturas e nas sociedades europeias, assim como nos Países em vias de desenvolvimento, onde a escola católica pode oferecer o seu próprio contributo, o tesouro escondido do Evangelho, para edificar a civilização do amor, da fraternidade, da solidariedade e da paz.

3. Para responder aos numerosos desafios que devem enfrentar, as comunidades educativas devem ter em atenção a formação dos mestres, religiosos e leigos, a fim de que adquiram uma consciência cada vez mais viva da sua missão de educadores, combinando competência profissional e escolha livremente feita de testemunhar de modo coerente os valores espirituais e morais, inspirados pela mensagem evangélica de "liberdade e caridade" (Gravissimum educationis, GE 8). Conscientes da nobreza e também das dificuldades de ensinar e educar hoje, encorajo na sua missão todo o pessoal comprometido no sistema educativo católico, a fim de que alimente a esperança dos jovens, com a ambição de "propor simultaneamente a aquisição de um saber quanto mais amplo e profundo possível, uma educação exigente e perseverante para a verdadeira liberdade humana e introdução das crianças e adolescentes que lhe estão confiadas para o ideal concreto mais elevado, que seja: Jesus Cristo e a sua mensagem evangélica" (Discurso ao Conselho da União mundial dos Professores católicos, 1983).

A experiência adquirida pelas comunidades educativas das escolas católicas na Europa, numa "fidelidade criativa" ao carisma vivido e transmitido pelos fundadores e fundadoras das famílias religiosas comprometidas no mundo da educação, é insubstituível. Ela permite aperfeiçoar continuamente o vínculo que une as instituições pedagógicas e espirituais propostas e a sua conformidade ao desenvolvimento integral dos jovens que dele beneficiam. Como não insistir também nas estreitas relações de colaboração que devem unir a escola e a família, de modo particular neste tempo em que o tecido familiar é mais frágil? Qualquer que seja a estrutura escolástica, os pais são os primeiros responsáveis da educação dos seus filhos. Respeita às comunidades educativas promover a colaboração, a fim de que os pais tomem consciência, de um modo renovado, da sua missão educativa e sejam assistidos no seu dever fundamental, mas também para que o projecto educativo e pastoral da escola católica seja adequado às legítimas aspirações das famílias.

4. As escolas católicas devem, enfim, enfrentar um outro desafio, que diz respeito ao diálogo construtivo nas sociedades multi-culturais do nosso tempo. "A educação tem uma particular função na construção de um mundo mais solidário e pacífico. Ela pode contribuir para a afirmação daquele humanismo integral, aberto à dimensão ética e religiosa, que sabe atribuir a devida importância ao conhecimento e à estima das culturas e dos valores espirituais das várias civilizações" (Mensagem para a Jornada Mundial da Paz, 8 de Dezembro de 2000, n. 20.

Deste modo o esforço realizado para acolher no seio das escolas católicas jovens pertencentes a outras tradições religiosas deve continuar, todavia sem que isto diminua o carácter próprio e a especificidade católica dos institutos. Ao consentir a aquisição de competências no mesmo âmbito educativo, este acolhimento estrutura o vínculo social, favorece o conhecimento recíproco num confronto sereno e permite projectar em comum o futuro. Este modo concreto de superar o medo do outro constitui indubitavelmente um passo decisivo para a paz na sociedade.

5. As escolas católicas na Europa são, assim, chamadas a ser comunidades dinâmicas de fé e de evangelização, em estreita relação com a pastoral diocesana. Estando ao serviço do diálogo entre a Igreja e a comunidade dos homens, empenhando-se em promover o homem na sua integridade, elas recordam ao povo de Deus o ponto central da sua missão: permitir a todo o homem dar um sentido à própria vida, fazendo aparecer o tesouro escondido que lhe é próprio, e convidar assim a humanidade a aderir ao projecto de Deus manifestado em Jesus Cristo.

Confiando a fecundidade do vosso Congresso à intercessão da Virgem Maria, convido-vos a deixar-vos instruir por Cristo, recebendo dele que é "o Caminho, a Verdade e a Vida" (Jn 14,6), a força e o prazer de realizar a vossa missão entusiasmante e delicada. A vós todos, organizadores e participantes neste Congresso, assim como às vossas famílias, a todo o pessoal do campo educativo católico e aos jovens que ele acompanha, concedo do coração a Bênção Apostólica.



MENSAGEM DO SANTO PADRE


AO SUPERIOR GERAL DAS ESCOLAS CRISTÃS


POR OCASIÃO DO 350° ANIVERSÁRIO


DO NASCIMENTO DE


SÃO JOÃO BAPTISTA DE LA SALLE







Ao Irmão Alvaro Rodríguez Echeverría
Superior-Geral dos Irmãos das Escolas Cristãs

1. Por ocasião do 350° aniversário do "dies natalis" de São João Baptista de La Salle, sinto-me feliz por me associar aos Irmãos das Escolas Cristãs e às pessoas que compartilham o ideal lassalista, dando graças pelo exemplo do "Padroeiro especial dos educadores da infância e da juventude", que fundou o vosso Instituto "a fim de oferecer a educação cristã aos pobres e de fortalecer a juventude no caminho da verdade". Com o coração repleto de alegria pelas maravilhas realizadas pelos Irmãos ao longo da sua história, convido-vos a "propor de novo corajosamente o espírito de iniciativa, a criatividade e a santidade" do vosso Fundador (Vita consecrata, VC 37), para que se revigore em cada um o desejo de corresponder com generosidade ao carisma da vossa Família religiosa.

2. Já tive a oportunidade de recordar o génio pedagógico de João Baptista de La Salle, bem como a importância da vossa missão junto das crianças e dos jovens, especialmente dos pobres e das pessoas que se encontram em dificuldade. O vosso ideal, sempre actual, requer discípulos que se deixem modelar por Deus e que, repletos de entusiasmo pela educação e a evangelização, saibam propor à juventude a esperança cristã e razões de vida. Fazendo com que os jovens descubram a fascinante figura do vosso Fundador, convidai-os a viver, no seu seguimento, a experiência de um encontro íntimo com Cristo, introduzindo-os no "olhar do coração voltado para o mistério da Trindade, que habita em nós e cuja luz há-de ser percebida também no rosto dos irmãos que estão ao nosso redor" (Novo millennio ineunte, 43).

3. O segredo de João Baptista de La Salle é o relacionamento íntimo e vivo que ele mantinha com o Senhor na oração quotidiana, fonte da qual ele hauria a coragem criativa que o caracterizava. Escutando a Deus, ele recebeu as luzes que, pouco a pouco, lhe permitiram discernir as urgências da sua época, para lhe corresponder de maneira oportuna. Impelidos pelo Espírito "que habita em vós" e que "deve imbuir o fundo da vossa alma" (João Baptista de La Salle, Meditações para todos os domingos do ano, n. 62, 3), haveis de viver cada vez mais em conformidade com o dom recebido pelo vosso Fundador. Ele, que suplicava que seus Irmãos vivessem como "homens interiores" (Explicações sobre o método de oração, n. 3), revela-nos no tesouro dos seus escritos a dimensão contemplativa da sua vida e, portanto, também de toda a vida cristã e missionária. A seu exemplo, renovados pelo seu encontro pessoal com Cristo, os Irmãos serão capazes de anunciar o Evangelho aos jovens que lhes forem confiados e de os acompanhar com delicadeza no seu crescimento humano, moral e espiritual.

4. Quereria chamar a atenção dos membros do Instituto para a importância do testemunho da vida fraternal. João Baptista de La Salle via nele um instrumento essencial para permitir aos Irmãos cumprir da melhor forma a sua missão de educação e de evangelização. "É necessário empenhar-se particularmente para estar unido em Deus e para ter um só coração e um só espírito; e o que deve animar em maior medida é o facto de que, como diz São João, quem permanece na caridade permanece em Deus e Deus nele" (Meditações, n. 113, 3). Chamada a tornar visível o dom de fraternidade que Cristo ofereceu à Igreja, a comunidade tem o dever de "ser e se manifestar como uma célula de intensa comunhão fraterna, sinal e estímulo para todos os baptizados" (A vida fraternal em comunidade, n. 2b). Assim, ela exerce uma atracção natural, e a alegria de viver que ela emana, mesmo no meio das dificuldades, torna-se um testemunho que dá à vida religiosa uma grande força de atracção que é fonte de vocações.

5. Neste contexto, encorajo os Irmãos a fazer das suas casas escolas de vida fraterna, a desenvolver e a "promover uma espiritualidade da comunhão" (Novo millennio ineunte, 43), associando-lhes os jovens que lhes forem confiados e os leigos que colaborarem para a sua missão, ajudando-os a todos a descobrir e a compartilhar o carisma do Instituto. Alegro-me com as iniciativas já tomadas, como a criação da "Rede Lassalista dos Jovens", que será bom continuar e desenvolver. Daqui nasce um intercâmbio que permite aos baptizados descobrir e viver plenamente a sua vocação específica, e aos Irmãos, recordar a exigência da "medida alta da vida cristã ordinária" que é a santidade, com uma "pedagogia da santidade, capaz de se adaptar ao ritmo dos indivíduos" (Ibid., 31), em particular dos jovens.

6. "Não tendes apenas uma história gloriosa a recordar e narrar, mas uma grande história a construir! Olhai para o futuro, para o qual vos projecta o Espírito, a fim de realizar convosco ainda grandes coisas" (Vita consecrata, VC 110). Caros Irmãos, este aniversário renove a vossa fidelidade a Cristo e ao Evangelho! Para a Família lassalista abre-se um milénio em que ela é convidada a progredir, contando "com a ajuda de Cristo" (Novo millennio ineunte, 58) que, contemplado e amado, nos chama uma vez mais a segui-lo.

A Santíssima Virgem nos acompanhe ao longo deste caminho. Confiei-lhe o terceiro milénio e invoquei-a como estrela da nova evangelização. Possa ela acompanhar também os filhos espirituais de São João Baptista de La Salle, fazendo-os crescer na disponibilidade e na santidade, bem como no serviço a Cristo e aos seus irmãos! Do íntimo do coração, confiando-vos à intercessão do vosso Fundador e de todos os Santos do vosso Instituto, concedo a cada um dos Irmãos a Bênção apostólica que faço extensiva aos jovens, aos membros das vossas comunidades educativas e a todos aqueles que compartilham o ideal lassalista.

Vaticano, 26 de Abril de 2001.




AOS PEREGRINOS VINDOS A ROMA


PARA A CERIMÓNIA DE BEATIFICAÇÃO


Segunda-feira, 30 de Abril de 2001




Caríssimos Irmãos e Irmãs

1. É com grande alegria que vos saúdo e vos recebo, a vós que viestes a Roma para honrar os novos Beatos: Manuel González García, Maria Ana Blondin, Catarina Volpicelli, Catarina Cittadini e Carlos Manuel Cecílio Rodríguez Santiago. Vós representais muitas nações, quase que reflectis a propagação do testemunho destes generosos discípulos de Cristo, uma propagação que, pela graça de Deus, não conhece fronteiras. De facto, a Igreja exprime plenamente a sua missão universal quando fala a linguagem da santidade, e deve adoptar esta linguagem, mais do que nunca, na época contemporânea, na qual o Espírito a estimula a fazer um novo anúncio do Evangelho em todas as partes da terra.

2. Saúdo com afecto os Bispos e peregrinos espanhóis que participaram com alegria na Beatificação de D. Manuel González García, conhecido como "o Bispo dos Sacrários abandonados", fundador das Missionárias Eucarísticas de Nazaré e de diversas obras para a propagação da devoção eucarística, tão importante para a espiritualidade cristã.

A sua vida foi a de um Pastor totalmente dedicado ao seu ministério, utilizando todos os meios ao seu alcance: a pregação, a publicação de escritos, a promoção de instituições para fomentar a vida cristã, e sobretudo, o testemunho de uma vida exemplar, cuja mensagem continua a ser profundamente actual. De facto, a nossa existência seria carente de um elemento fundamental se nós não fôssemos os primeiros contempladores do rosto de Cristo (cf. Novo millennio ineunte, 16). Que melhor contemplação do Senhor, do que adorá-Lo e amá-Lo no Sacramento da sua presença real por excelência? O culto eucarístico é o centro que fortalece toda a vida cristã porque os fiéis, respondendo ao pedido do Senhor: "Ficai aqui e vigiai Comigo" (Mt 26,38), encontram nele a força, o conforto, a firme esperança e a fervorosa caridade que provêm da presença misteriosa e oculta, mas real, do Senhor.

Por conseguinte, exorto-vos a todos a imitar o novo Beato na sua relação assídua com o Senhor sacramentado, apresentando-lhe as alegrias e as esperanças, as tristezas e as amarguras da humanidade actual (cf. Gaudium et spes, GS 1). Ao mesmo tempo, animo as Missionárias Eucarísticas de Nazaré a permanecerem sempre fiéis ao carisma do seu Fundador, acompanhando os homens e mulheres de hoje a escutar a voz de Jesus Cristo, Caminho, Verdade e Vida, presente no sacrário.

3. Desejo saudar agora o Senhor Cardeal Luis Aponte Martínez, Arcebispo Emérito de São João e os demais Bispos de Porto Rico que, acompanhados por Autoridades, sacerdotes e numerosos peregrinos, participaram ontem na cerimónia de Beatificação de Carlos Manuel Rodríguez Santiago, carinhosamente conhecido como Charlie. Nascido em Caguas, consumou a sua entrega ao Senhor com quarenta e quatro anos, depois de uma vida fecunda de apostolado e após ter sofrido com grande fortaleza os padecimentos da enfermidade.

A vida deste novo Beato é a de um leigo empenhado na difusão do humanismo cristão no âmbito universitário. Desempenhou a sua tarefa apostólica no Centro Universitário Católico, animando os seus membros a viver o momento presente, em fidelidade ao passado e abertos ao futuro, promovendo a difusão de um pensamento de perfeito equilíbrio cristão entre o natural e o sobrenatural, entre o antigo e o moderno.

Os leigos de Porto Rico encontraram nesta figura serena da vossa terra, e tão próxima de nós no tempo, um exemplo que se deve imitar. Por isso, reunidos nos "Círculos" que têm o seu nome, e animados também pelos Bispos, promovestes a sua causa. Alegro-me com esta iniciativa que se viu culminada com a solene cerimónia de ontem. Agora, tendo já sido proposto oficialmente como modelo de santidade, é também um dos vossos cidadãos que do céu intercede por vós.

4. A existência e o apostolado da Madre Maria Ana Blondin testemunha a sua capacidade de se entregar a Cristo, para passar quotidianamente com ele da morte para a vida. Na intimidade com Cristo, a Madre Maria Ana Blondin baseia não só o seu dinamismo missionário, mas também a força profética para viver no dia-a-dia o perdão evangélico. Os momentos mais dolorosos da sua existência serão transfigurados pela sua vontade de perdoar sem cessar em nome de Cristo, considerando que há mais alegria em perdoar do que em se vingar. Oxalá o testemunho estimulante da Madre Marie-Anne Blondin encorage a Igreja a levar a paz ao mundo e a tornar-se próxima de todas as pessoas feridas pela vida, sobretudo nos âmbitos da educação, da saúde e da animação pastoral e social, para testemunhar o amor que Deus tem por todos os homens e para anunciar o seu perdão libertador, que reduz ao nada todas as lógicas de ódio e de exclusão!

5. Catarina Volpicelli viveu em Nápoles, nos meados do século XIX. Recebeu na família uma sólida formação humana e religiosa e teve ocasião de se encontrar com alguns homens de Deus, tais como o Beato Ludovico de Casoria, o barnabita Leonardo Matera e o Beato Bartolo Longo, que marcaram profundamente o seu itinerário espiritual. O seu coração foi-se dilatando cada vez mais segundo as dimensões do Coração de Cristo, do qual se tornou discípula e apóstola fervorosa, cultivando uma intensa vida eucarística e o Apostolado da Oração.

Precisamente com as primeiras zeladoras do Apostolado da Oração, Catarina fundou o Instituto das Escravas do Sagrado Coração que, depois da aprovação do Arcebispo de Nápoles, recebeu o decreto de louvor do meu predecessor Leão XIII. Nutridas com um alimento interior tão rico, Catarina e as outras Irmãs tornaram-se "boas samaritanas" em diversas situações de pobreza, fazendo não só uma obra de filantropia e de beneficência, mas testemunhando uma autêntica caridade evangélica com um estilo sóbrio e discreto, solidário e respeitador para com as pessoas simples e humildes. A sua herança apostólica é um dom bastante precioso para a Igreja, pelo qual desejamos dar graças ao Senhor. Oxalá este património religioso seja conservado e incrementado pelas suas filhas espirituais.

6. Dirijo-me agora a vós, caríssimos Irmãos e Irmãs, que exultais pela beatificação de Catarina Cittadini, dirigindo um pensamento particular às Irmãs Ursulinas de São Jerónimo em Somasca, por ela fundadas.

A grande intuição desta ilustre filha da terra de Bérgamo foi a de ter compreendido a importância da escola como meio fundamental de formação do cidadão e do cristão. Desta forma, ela antecipou profeticamente as orientações do Concílio Vaticano II, que na Declaração sobre a educação cristã Gravissimum educationis sobre a escola católica exorta a "coordenar o conjunto da cultura humana com a mensagem da salvação" (n. 8).

O método pedagógico elaborado pela nova Beata baseia-se no conhecimento pessoal e na relação directa com as educandas. Ela mesma indica isto às suas professoras na exortação contida na Regra: "Considerem como um singular benefício de Deus ocupar-se de uma tarefa que pertence aos Anjos, e julguem-se felizes e indignas de estarem empenhadas na instrução das alunas; mostrem o desejo do seu proveito, recordando-se de que nosso Senhor diz: o que fazeis a uma destas crianças, é a mim mesmo que o fazeis" (cap. XVI, 2).

Desejo-vos de coração a vós, queridas Irmãs Ursulinas de Somasca, e a todos os que, como vós, se inspiram na espiritualidade e no exemplo de Catarina Cittadini, que continueis fielmente as orientações por ela traçadas, para serdes guias seguras no caminho de fé e na formação cultural dos jovens.

7. Caríssimos Irmãos e Irmãs, a vossa presença devota e alegre, ontem e hoje, deu maior ressonância eclesial à proclamação dos novos Beatos. Vos próprios sois os primeiros imitadores destes Irmãos e Irmãs, que a Igreja indica como modelos de vida evangélica! Invocai-os na oração; aprofundai e dai a conhecer o seu testemunho; imitai as suas virtudes. Na comunhão dos Santos, a fé permite que os sintamos próximos, juntamente com a Virgem Maria, Rainha de todos os Santos, a quem vos confio, juntamente com quantos vos são queridos. Com estes sentimentos, abençoo-vos a todos.



MENSAGEM DO SANTO PADRE


AO MOVIMENTO LAICAL DOS


TERCIÁRIOS MÍNIMOS






Caríssimos Terciários Mínimos!

1. Na ocasião do V Centenário da aprovação da Primeira Regra, com a qual tomava forma jurídica o Movimento laical dos Terciários Mínimos, quisestes pedir-me, através do Superior Geral da Ordem, Pe. José Fiorini Morosini, uma palavra de encorajamento para prosseguir no caminho de fé e de compromisso apostólico em plena comunhão com a Sé de Pedro. Acolho de boa vontade este vosso desejo e faço votos para que vos mantenhais sempre na mais generosa fidelidade à Igreja e aos seus Pastores, como é próprio do vosso Movimento, desde que, no dia 1 de Maio de 1501, com a bula Ad ea quae, o Papa Alexandre VI, acolhendo o pedido do eremita Francisco de Paula, aprovou a primeira redacção da Regra dos Frades Mínimos da Primeira Ordem e nasceu, assim, oficialmente, o vosso movimento laical de Terciários de fr. Francisco de Paula.

No fim do século XV, o Eremita de Paula apareceu a todos como insigne promotor da reforma da Igreja. Alguns entre a nobreza e o povo, sem renunciar à sua actividade e ao estado conjugal, pediram para partilhar mais de perto o seu compromisso penitencial. Para lhes permitir a participação nos privilégios e benefícios espirituais concedidos pelo Papa aos Irmãos, o Paulano, durante o Ano Santo de 1500, amadureceu a ideia de escrever de novo a Regra para os religiosos e de redigir uma totalmente nova para os fiéis que o tinham escolhido como guia e mestre de vida espiritual. Os Terciários Mínimos quiseram empenhar-se, juntamente com os Frades, num particular testemunho de penitência evangélica, que se exerceu fundamentalmente mediante o retomar da antiga forma da disciplina penitencial, assinalada no século XV por profunda crise.
Na história plurissecular das Ordens Terceiras seculares, a aprovação da vossa Regra constitui um interessante sinal de novidade: nunca tinha acontecido, de facto, que as Regras da Primeira e da Terceira Ordem tivessem sido compostas ainda no tempo do próprio fundador, definindo assim, desde o princípio, relações e carismas.

Como em todos os momentos de mudança, também hoje a Igreja pede aos crentes a indispensável conversão das consciências, que pode garantir a renovação da sociedade. Não foi, porventura, sob o símbolo da penitência e da conversão que celebrámos o Grande Jubileu do ano 2000, há pouco concluído?

2. È nesta mesma perspectiva que vos convido a comemorar a feliz data do vosso centenário, redescobrindo o valor e a actualidade da vossa Regra. Ela começa com o convite solene para tomar a sério o caminho evangélico, garantia de autêntica felicidade: "Se queres entrar na vida, observa os mandamentos" (Mt 19,17); cf. Regra, cap I). É este o ponto de partida para quem decide meter-se na sequência de Jesus, aceitando a radicalidade evangélica, que não se contenta com uma honestidade natural, mas exige decisões corajosas, não raro em contraste com o sentir comum. Nisto, segui o vosso Fundador, que foi apontado pela Igreja como imitador ardentíssimo do nosso Redentor (cf. Alexandre VI, Ad fructus uberes, 20 de Maio de 1502).

Muito a propósito aparece hoje a proposta penitencial da vossa Regra, fundada sobre a espiritualidade "quaresmal", verdadeira novidade do carisma da família dos Mínimos, que vós partilhais. O meu predecessor Alexandre VI, aprovando simultaneamente a vossa Regra e a dos Frades da Primeira Ordem, desejou apresentar à Igreja um estilo evangélico baseado sobre a penitência, segundo um itinerário caracterizado pelos ensinamentos salutares de fr. Francisco de Paula (cfr. Bula Ad ea quae). É propriamente no esforço penitencial de conversão que vós encontrais hoje a actualidade e originalidade da vossa missão eclesial.

O convite a fazer penitência, dirigido por Jesus no início da sua pregação (cfr. Mc Mc 1,15), coloca os baptizados na condição de estar no mundo sem ser do mundo. Por isso, a vossa regra (cfr. cap. IV) vos lembra, com as palavras do apóstolo João, o distanciamento afectivo do mundo: "Não ameis o mundo, nem as coisas do mundo" (1Jn 2,15); e com São Tiago recorda-vos que "quem quer ser amigo do mundo torna-se inimigo de Deus" (4, 4). A exortação clara para fugir da usura, dos contratos ilícitos e de toda a forma de avareza (cf. Regra, cap. I) mostra como o Fundador tinha, então, a percepção clara das mudanças que se operavam na sociedade; mudanças que tinham criado, fora da óptica evangélica, os desiquilíbrios sociais e económicos, de que ainda hoje nos lamentamos.

Como são úteis, ainda hoje, as sábias sugestões do eremita penitente, Francisco de Paula: "A glória deste mundo é falsa e as riquezas fugazes. Feliz aquele que pensa numa vida boa, mais do que longa; feliz o que se preocupa mais com uma consciência pura do que com uma caixa cheia (Regra, cap. IV).

3. O Concílio Vaticano II ensina quão necessária é a liberdade interior, que não impede o compromisso no mundo, nem a vontade de o servir e salvar (cf. Gaudium et spes, cap. IV), a exemplo de Jesus (cf. Mt Mt 9,36). Assim, é precisamente na força desta "distância amorosa" que os cristãos podem mostrar a razão da esperança que a fé em Jesus, único Salvador, lhes dá (cf. 1P 3,15), ensinando-os a ser "bons samaritanos" nesta nossa sociedade (cf. Paulo VI, Homilia para o encerramento do Concílio Ecuménico Vaticano II).

Tudo isto implica sacrifício, porque pede para nos mortificarmos e cortarmos aqueles laços que pedem para nos tornarmos escravos do mal. Nasce daqui a importância do combate espiritual, que se realiza na oração, na contemplação do rosto de Cristo e na ascese interior. O vosso Fundador orientou-vos pelo caminho da ascese, pedindo-vos este empenho espiritual como condição necessária para pertencer à Ordem: "Quem quiser combater por Deus neste género de vida deve dominar a sua carne" (Regra, cap. V). Depois, ele recordou, como apoio das prescrições da Regra, as palavras do apóstolo Paulo: "Mortificai, pois, os vossos membros no que têm de terreno" (Col 3,5), porque "se viverdes segundo a carne morrereis; mas, se pelo Espírito fizerdes morrer as obras da carne, vivereis" (Rm 8,13).

O compromisso requerido pela vossa Regra não vos fecha numa espiritualidade intimista, mas, fazendo apelo à vossa peculiar missão penitencial, lança-vos na partilha do que é vosso com os irmãos mais necessitados. Todo o baptizado é convidado a inspirar-se nesta constante tensão religiosa da Igreja. São Francisco de Paula, sequaz e imitador dos antigos Padres, uniu muito sabiamente num único discurso, na Regra que vos deixou, o jejum, a abstinência e as obras de misericórdia (cf. Regra, cap. V), dando-vos assim, na unidade do carisma que partilhais com os Frades e as Monjas, a preferência pelo compromisso de uma caridade operante. Acolhei, caríssimos Terciários Mínimos, o convite que dirigi a toda a Igreja, a dar espaço a uma nova fantasia da caridade ( cf. Novo millennio ineunte, 50), considerando as exigências que já descobristes na procura feita em comum com os Religiosos da Primeira Ordem. Não podemos partir e fazer-nos ao largo no início deste novo milénio, sem nos tornarmos mais atentos às necessidades dos irmãos: "A caridade das obras assegura uma força inequívoca à caridade das palavras (Ibid, 1). Aprendei do vosso Fundador a admirável síntese entre a dimensão contemplativa e o testemunho da caridade, que ele desenvolveu mediante um apostolado de acolhimento de quantos a ele recorriam, confiantes de encontar compreensão e partilha. Ele soube entrar em sintonia com todos os necessitados, aflitos do corpo e do espírito.

4. A alegre celebração deste V Centenário oferece-vos a oportunidade de ser protagonistas privilegiados da nova evangelização. Não tenhais medo diante das dificuldades, porque a Regra vos indica os meios necessários para ser fortes e proceder com segurança. Ela propõe-vos, antes de tudo, a oração como sacrifício de louvor a oferecer diariamente a Deus (cf. Regra, cap. II), para que possais distinguir-vos "naquela arte da oração (cf. Novo millennio ineunte, 32), que expus a todas as comunidades cristãs, a fim de que a acção pastoral seja profundamente enraizada na contemplação e na oração (Ibid, 15).

Está, pois, no vosso código de vida a exortação a cuidar a purificação da consciência com o sacramento da Reconciliação. As expressões usadas a propósito conservam todo o seu encanto, apesar de estarem ligadas a uma espiritualidade distante do nosso modo de sentir: "Jesus Nazareno - escreve ele -todo cheio de flores, para quem a alegria é estar com os filhos dos homens, deleita-se com as flores da virtude" (Regra, cap III). É, por fim, o convite à participação na Eucaristia, na qual encontrais a fonte da vossa fidelidade. As palavras do Fundador merecem ser recordadas pela sua força expressiva: "A escuta quotidiana da Missa seja para vós um conselho salutar, a fim de que, munidos das armas da Paixão de Cristo, que se recorda na Missa, possais ser fortes e sólidos na observância dos mandamentos de Deus.

Ouvindo a Missa rezareis também para que a morte de Cristo seja a vossa vida, o seu sofrimento o alívio das vossas dores, a sua canseira o vosso repouso eterno" (Regra, cap. III). Por conseguinte, ao meditar longamente a vossa regra, encontrareis um novo estímulo para dar ainda mais valor ao sacramento da Reconciliação e à Missa dominical.

5. Por conseguinte, espero que o V Centenário vos leve a uma mais íntima descoberta do precioso código de vida espiritual, que São Francisco de Paula vos deixou. Fazei-o como simples cristãos empenhados no mundo. Fazei-o como comunidade, testemunhando que é possível edificar uma fraternidade universal, segundo o projecto divino. As vossas associações locais chamam-se "Fraternidade", no interior das quais os irmãos são chamados a ser instrumentos de perdão, de reconciliação e de paz (cf. Regra, cap. VII).

Participando com os Irmãos da Primeira Ordem e com as Monjas da Segunda Ordem no mesmo carisma, encontrais com eles formas de colaboração e de partilha apostólica. A participação de uma vossa delegação no último Capítulo Geral da Primeira Ordem coroou um louvável caminho iniciado há já alguns anos, de acordo com o que eu sugeri e desejei após o Sínodo sobre a vida consagrada (cf. Vita consecrata, VC 56). Continuai este caminho rumo a uma partilha ainda mais plena do vosso carisma comum.

Acompanhe-vos a Virgem Maria, Mãe da Igreja e apoio da nossa esperança. Por meu lado, asseguro-vos uma recordação na oração e, enquanto invoco sobre os vossos propósitos e sobre o vosso empenho a protecção do Fundador São Francisco de Paula e dos santos Padroeiros, também Terciários Mínimos, São Francisco de Sales e Santa Joana de Valois, abençoo-vos do coração.

Vaticano, 1 de Maio de 2001.



                                                                                 Maio de 2001



Discursos João Paulo II 2001 - 28 de Abril de 2001