Discursos João Paulo II 2001 - Sexta-feira, 9 de Fevereiro de 2001

DISCURSO AOS MEMBROS DA


"LIGA INTERNACIONAL DE HUMANISTAS"


DE SARAJEVO (BÓSNIA-HERZEGÓVINA)


9 de Fevereiro de 2001






Ilustres Senhores e Senhoras

1. Sinto-me feliz por vos encontrar e dirijo a cada um de vós a minha cordial saudação. Com a vossa presença em Roma, desejais dar testemunho dos sofrimentos, alegrias e esperanças da população da Bósnia-Herzegovina, de modo particular do drama dos refugiados e dos exilados, que até agora não obteve uma solução satisfatória, à luz dos Acordos de Washington e Dayton. A vossa visita oferece a ocasião de renovar àquelas queridas populações a garantia da minha proximidade espiritual.

Vivemos numa época em que se sentem com crescente evidência as consequências do fenómeno da globalização. Não são só consequências negativas. De facto, o fenómeno supõe uma crescente proximidade e um melhor conhecimento entre os homens de todas as partes do mundo e isto abre o caminho para possíveis compreensões para uma mais solidária partilha dos recursos. Contudo, com muita frequência isto não acontece. Desta forma surgem problemas que interpelam a consciência de cada um, convidando a uma tomada de posição. Para responder a este género de problemas "humanos" desejastes criar a vossa "Liga internacional". Desejais empregar as vossas energias para promover o advento de um mundo mais justo e mais humano.

2. A Igreja está próxima, hoje como ontem, de todos os que se põem ao serviço da causa do homem. O Concílio Vaticano II recorda, a este propósito, que "nada existe de verdadeiramente humano que não encontre eco no coração" dos discípulos de Cristo (Gaudium et spes, GS 1).

A atenção que a Igreja dedica ao homem faz parte integrante da sua missão. O ser humano é o caminho da Igreja, precisamente porque a salvação realizada por Jesus Cristo, Filho de Deus que também quis ser Filho do homem, diz respeito a cada pessoa na sua totalidade. A acção social da Comunidade eclesial desenvolve-se de tantas formas e inclui numerosas iniciativas. Diversas estruturas surgiram no interior da Igreja, a fim de ir ao encontro das necessidades da humanidade.

De igual modo, é grande a sua colaboração com todos os homens de boa vontade que têm a peito o bem comum. Trata-se de uma colaboração que alcança amplos campos de acção e está relacionada com o respeito do homem, da sua dignidade e dos seus direitos inalienáveis, a sua promoção material, moral e espiritual, e o apoio à qualidade da vida.

3. É com este espírito que ela age nas várias partes do mundo, como também na Bósnia-Herzegovina, terra que me é particularmente querida. Conheço bem os problemas sociais, políticos e económicos que as populações locais vivem neste período. Durante os anos do recente conflito armado, a Santa Sé não deixou de fazer sentir a sua presença pacificadora. Também agora ela continua a empenhar-se em várias iniciativas em favor da justiça e da paz.

O período mais difícil para a Bósnia-Herzegovina passou, mas o sofrimento do povo continua, sobretudo no drama dos refugiados e dos exilados. Dezenas de milhar de pessoas da região de Banja Luka, de Bosanska e de outras partes do País ainda esperam regressar às suas casas. Não podemos esquecer este drama. Ao contrário, devemos fazer-nos promotores de uma solidariedade efectiva a nível local e internacional. É necessário, antes de mais, corrigir as injustiças existentes, atendendo as legítimas expectativas de quem está directamente interessado e pede o respeito dos seus direitos inalienáveis. Eis a base para construir um futuro de esperança na sociedade multiétnica, multicultural e multirreligiosa que caracteriza a Bósnia-Herzegovina.

4. Peço a Deus que, graças ao empenho de todos, se ponha depressa fim aos sofrimentos, na Bósnia-Herzegovina, causados pelo recente conflito armado e sejam oferecidas a todos iguais oportunidades, garantindo juntamente a plena e incondicionada liberdade de religião. Há necessidade de apoio e de compreensão: apoio, para superar os actuais problemas sociais, políticos e económicos; compreensão, para encontrar soluções que correspondam melhor às legítimas expectativas dos três Povos que constituem o País.

Ilustres Senhores e Senhoras! Tenho a certeza de que nesta importante obra de construção para um futuro de paz não faltará a vossa colaboração activa. Exorto-vos a um generoso empenho na promoção, juntamente com as Autoridades civis e religiosas, do bem das populações da Bósnia-Herzegovina.

Confio os vossos propósitos à intercessão da Bem-aventurada Virgem Maria, que conhece os sofrimentos, as alegrias e as esperanças daquelas populações, e concedo com afecto a vós e a quantos vos são queridos a Bênção apostólica.



PALAVRAS DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DO


IX DIA MUNDIAL DO DOENTE


Basílica de São Pedro, 11 de Fevereiro de 2001




Caríssimos Irmãos e Irmãs

1. Como acontece todos os anos, hoje 11 de Fevereiro estamos aqui para um encontro já tradicional na Basílica do Vaticano. Naturalmente, o pensamento dirige-se à Gruta de Massabielle, onde muitas pessoas durante o ano se detêm em oração aos pés da estátua da Imaculada Conceição. É precisamente em nome de Maria que vos saúdo a todos, que marcastes um encontro para a celebração eucarística e para uma sugestiva procissão de velas, que faz reviver o clima típico de Lourdes. Saúdo também aqueles que promoveram e concretamente organizaram esta manifestação mariana, sempre comovedora.

Em primeiro lugar, a minha saudação dirige-se ao Cardeal Vigário e aos Bispos aqui presentes; além disso, saúdo os responsáveis da Obra Romana de Peregrinações e quantos, sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos, participam no Simpósio nacional teológico-pastoral sobre o tema "Igreja local, peregrinação e "traditio fidei"".

Saúdo em particular cada um de vós, prezados enfermos e, juntamente convosco, os responsáveis e voluntários da UNITALSI, benemérita associação que cuida de vós, de maneira especial durante as peregrinações.

2. Queridos doentes e voluntários, a vossa presença aqui adquire um significado singular porque celebramos o Dia Mundial do Doente, que já chegou à sua nona edição. Ainda conservo na mente o Dia que vivemos no ano passado. Estávamos no intenso clima espiritual do grande Jubileu e suscitou muita impressão o testemunho de fé oferecido por aqueles que nele participaram. A adesão generosa dos sofredores à vontade do Senhor constitui sempre uma grandiosa lição de vida. Como tive oportunidade de repetir noutra ocasião, a Igreja conta muito com o apoio de quantos são provados pela enfermidade: o seu sacrifício, às vezes também pouco compreendido, unido à oração intensa, resulta misteriosamente eficaz para a difusão do Evangelho e para o bem de todo o Povo de Deus.

Estimados Irmãos e Irmãs, hoje gostaria de reiterar o mais profundo agradecimento por esta vossa silenciosa missão na Igreja. Sede sempre fortemente persuadidos de que ela imprime um vigor extraordinário no caminho de toda a comunidade eclesial.

3. Nesta tarde, no sugestivo contexto deste encontro, desejamos sentir-nos em comunhão com os nossos irmãos que marcaram um encontro em Sidney, na Austrália, para o Dia Mundial do Doente. O tema que neste ano escolhi para a mencionada data é: "A nova evangelização e a dignidade do homem que sofre". Trata-se de um argumento sobre o qual é importante deter-se para meditar, porque a dor física e espiritual assinala, mais ou menos profundamente, a vida de todos e é necessário que a luz do Evangelho ilumine também este aspecto da existência humana.

Na Carta Apostólica Novo millennio ineunte, que assinei no dia do encerramento do Jubileu, exortei todos os fiéis a contemplarem o Rosto de Jesus. Nessa Carta, escrevi: "Assim, a nossa contemplação do rosto de Cristo trouxe-nos até ao aspecto mais paradoxal do seu mistério, que se manifesta na hora extrema a hora da Cruz" (n. 25).

Sobretudo vós, amigos enfermos, compreendeis como a Cruz é paradoxal, porque vos é dado sentir o mistério do sofrimento na vossa própria carne. Quando, por causa de uma doença grave, faltam as forças, afastam-se os projectos longamente cultivados no coração. Ao sofrimento físico, é com frequência que se acrescenta a dor espiritual, devida a um sentido de solidão que atormenta a pessoa. Na sociedade contemporânea, uma determinada cultura considera a pessoa doente como um obstáculo incómodo, não reconhecendo a preciosa contribuição espiritual que ela oferece à comunidade. É necessário e urgente redescobrir o valor da Cruz compartilhada com Cristo.

4. Em Lourdes, no dia 18 de Fevereiro de 1858, Nossa Senhora disse a Bernadete: "Não te prometo que serás feliz neste mundo, mas no outro". Durante outra aparição, convidou-a a fixar o seu olhar no céu. Escutemos de novo esta exortação da Mãe celestial, como se fosse dirigida a nós: trata-se de um convite a saber avaliar de maneira correcta as realidades terrestres, sabendo que somos destinados a uma existência eterna. É uma ajuda a suportar com paciência as contrariedades, as dores e as doenças, na perspectiva do Paraíso. Às vezes, há quem considera que pensar no Paraíso constitui uma evasão da vida concreta de cada dia; pelo contrário, a luz da fé faz com que se compreenda melhor e, por conseguinte, se aceite mais conscientemente a difícil experiência do sofrimento. A própria Santa Bernadete, provada de forma árdua pelo mal físico, certo dia exclamou: "Cruz do meu Salvador, Santa Cruz, Cruz adorável, somente em ti deposito a minha força, a minha esperança e a minha alegria. Tu és o madeiro da vida, a escada misteriosa que une a terra ao céu e o altar sobre o qual quero sacrificar-me, morrendo por Jesus" (Maria Bernadete Soubirous, Carnet de notes intimes, pág. 20).

5. Eis a mensagem de Lourdes que inúmeros peregrinos, sadios e enfermos, acolheram e fizeram própria. Oxalá estas palavras da Virgem ressoem como um conforto interior para vós, Irmãos e Irmãs sofredores, a quem renovo a expressão da minha solidariedade fraternal. Na enfermidade, se aceitardes docilmente a vontade divina, podeis ser para muitas pessoas uma palavra de esperança e até mesmo de alegria, porque dizeis ao homem do nosso tempo, frequentemente inquieto e incapaz de dar um sentido à dor, que Deus não nos abandonou. Vivendo com fé a vossa situação, dais testemunho de que Deus está perto. Vós proclamais que esta proximidade terna e amorosa do Senhor faz com que não haja uma fase da vida que não valha a pena ser vivida. A doença e a morte não constituem realidades das quais se deve fugir ou condenar porque são inúteis mas, ao contrário, ambas são etapas de um caminho.

Quero também encorajar quantos se dedicam com paixão ao cuidado dos doentes, para que prossigam na sua preciosa missão de amor, e nela possam experimentar as consolações interiores que o Senhor dispensa a quem se faz bom samaritano ao lado do próximo que sofre.
Com estes sentimentos, abraço todos vós no Senhor e abençoo-vos de coração.



PALAVRAS DO SANTO PADRE


NO INÍCIO DA SANTA MISSA


CONCELEBRADA COM O PATRIARCA DE


ANTIOQUIA DOS GRECOS MELQUITAS


Segunda-feira, 12 de Fevereiro de 2001




Beatitude
Queridos Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
Queridos Amigos!

Estamos para concelebrar o Sacrifício do Senhor. Em Cristo realiza-se a comunhão na fé e no amor dos Pastores e dos discípulos em redor do Sucessor de Pedro. A vossa presença esta manhã é muito significativa.

Saúdo-o, querida Beatitude Gregório III, novo Patriarca da Igreja greco-melquita, que, em comunhão com o Bispo de Roma leva as riquezas espirituais do povo que o Senhor lhe confiou, manifestando assim a catolicidade da Igreja. Peço a Cristo que lhe conceda em abundância os seus dons, a fim de que possa ser todos os dias, com todos os Bispos e com o clero, um Pastor segundo o coração de Deus.

O meu pensamento dirige-se às comunidades do seu Patriarcado, pedindo ao Senhor que as acompanhe na sua vida espiritual e no testemunho de fé e de esperança que podem oferecer a toda a população. Baseando-se no dinamismo do qual fomos testemunhas no centro do Grande Jubileu, que elas possam permanecer intimamente unidas a Cristo, para obter d'Ele a força da fé, a coragem da esperança e a audácia no anúncio do Evangelho! Que a Théotokos e os santos da vossa Igreja intercedam por todos vós!



DISCURSO AOS MEMBROS DA PEREGRINAÇÃO


DO PATRIARCADO DE ANTIOQUIA DOS


GRECO-MELQUITAS


12 de Fevereiro de 2001

Beatitude
Estimados Irmãos no Episcopado
Queridos Irmãos e Irmãs!

1. É com alegria que os braços do Sucessor de Pedro, o Bispo de Roma, se abrem para receber o Patriarca dos Greco-Melquitas católicos, que veio para celebrar a nossa plena comunhão eclesial. Com este gesto abraço espiritualmente os Bispos, os sacerdotes, os religiosos, as religiosas e os fiéis da Igreja greco-melquita católica aqui presentes, bem como todos os seus membros que hoje, com o seu empenho e muitas vezes à custa de grandes dificuldades, proclamam a sua adesão a Cristo.

Não existe um símbolo mais profundo do que o gesto litúrgico que realizámos: celebrar a plenitude da comunhão eclesial partilhando o Corpo e o Sangue do Senhor. Neles resplandece a unidade da Igreja, a sua fé, esperança e caridade. Neles saboreamos antecipadamente a profunda alegria que imploramos do Senhor: a do dia em que todos os cristãos estarão unidos, haurindo do único Pão e do único Cálice a força para dar um testemunho unânime de evangelização.

2. A união com a Sé de Roma não diminui a vossa especificidade nem as vossas riquezas, ao contrário, fortifica-as e faz delas um dom precioso que enriquece toda a catolicidade. O Papa aprecia o vosso apego e a vossa fidelidade às tradições do Oriente cristão, das quais sois justamente orgulhosos; deseja que elas sejam sempre ciosamente guardadas e descobertas de maneira plena, para serem acessíveis aos homens e mulheres de hoje e, desta forma, alimentarem a sua vida cristã. Sois uma Igreja forte, coerente, radicada na sua identidade: tende a preocupação de prosseguir o vosso empenho pastoral, valorizando os tesouros antigos e dando respostas adequadas às interrogações dos homens de hoje. Os vossos esforços para vos integrardes plenamente no âmbito em que os fiéis vivem demostram que o cristianismo sabe receber tudo o que existe de positivo nas culturas e, ao mesmo tempo, pode enriquecer essas culturas de maneira fecunda.

O vosso empenho ecuménico é particularmente apreciado. Exorto-vos a encontrar na Liturgia Divina a força sacramental e o estímulo teológico para participar cada vez mais activamente na procura da unidade, com uma coragem prudente, em união com toda a Igreja católica, para que chegue rapidamente o tempo da plena comunhão.

3. Beatitude, formulo os meus votos fraternos para que o Espírito fecunde a obra eminente à qual está chamado e que Sua Beatitude possa ser um modelo para o povo que lhe foi confiado: a exemplo do Bom Pastor, tenha a solicitude, com igual amor, de todas as ovelhas do rebalho, edificando-as com a sua oração de sacerdote, com o amor apaixonado do "pater et caput" que recebeu a missão de as guiar, e com o espírito de universalidade que provém da pertença à Igreja católica: isto ajudá-lo-á a situar as suas decisões e opções no âmbito mais amplo do bem da Igreja e da humanidade. No contexto atormentado do Médio Oriente, seja ao mesmo tempo um fervoroso defensor dos débeis e um incansável artífice de paz. Mantenha sempre no seu coração um lugar particular para os seus filhos da diáspora, a fim de que, sabendo que são amados pelo seu Pastor, se sintam sempre membros da sua Igreja-Mãe, permanecendo igualmente em fraterna união com as outras comunidades católicas locais e com os seus Pastores. Atinja-vos a todos, não com o poder e a riqueza dos homens, mas só com o amor desarmado da pobreza de Cristo que, sendo rico se fez pobre, para enriquecer todos os homens.

4. Beatitude, apresente a minha saudação particularmente reconhecida ao seu venerado predecessor, o Patriarca Maximos V. Devem-se ao seu zelo pastoral numerosas realizações que fizeram progredir a Igreja greco-melquita católica. Garanta-lhe o afectuoso reconhecimento do Papa, que reza por ele e pede a Deus que lhe conceda a abundância do seu conforto.
Ao regressar à sua Sede, tenha a certeza de que a oração do Sucessor de Pedro o acompanha. A cordialidade do santo abraço que trocámos sirva de apoio aos esforços e à alegria do seu empenho pastoral!

Com estes sentimentos, concedo a todos de coração a Bênção apostólica.




À COMUNIDADE DA RÁDIO VATICANO


POR OCASIÃO DOS 70 ANOS DE SUA FUNDAÇÃO


13 de Fevereiro de 2001

Caríssimos Irmãos e Irmãs

1. É de bom grado que dirijo uma cordial saudação de boas-vindas a todos vós, que formais a grande família da Rádio Vaticano. Obrigado por esta visita, que me quisestes fazer por ocasião do 70° aniversário de fundação da vossa benemérita emissora radiofónica.

Dirijo o meu pensamento afectuoso a cada um de vós que, com inteligência e dedicação, a tornais todos os dias instrumento vivo e eficaz ao serviço da Sé Apostólica. O encontro de hoje oferece-me a ocasião para exprimir a todos o meu reconhecimento. Agradeço de maneira particular ao Director-Geral, Pe. Pasquale Borgomeo, as gentis palavras que me quis dirigir em vosso nome, ilustrando ao mesmo tempo as numerosas actividades por vós desempenhadas, sobretudo durante o ano jubilar. Com ele, saúdo o Padre Federico Lombardi, Director dos programas, e o Padre Lino Dan, Director dos Serviços Técnicos. Nas suas pessoas desejo alcançar todos os Padres da Companhia de Jesus, que desdo o início prestaram o seu precioso contributo nesta estrutura, com genuíno espírito de fidelidade ao carisma de Santo Inácio de Loiola.

E para concretizar este meu apreço, quis incluir entre os membros do Colégio Cardinalício o Pe. Roberto Tucci, Presidente do vosso Comité de gestão. Dirijo-lhe um obrigado muito cordial pela obra desempenhada no âmbito da Rádio Vaticano, e por me ter ajudado durante longos anos na realização das viagens apostólicas em tantas partes do mundo, coadjuvado pelo diligente Director Administrativo, Dr. Alberto Gasbarri.

2. Hoje desejamos comemorar os setenta anos da Rádio Vaticano. Como deixar de elevar um hino de louvor e de acção de graças ao Senhor por ter concedido à Igreja fazer-se, por amor ao Evangelho, pioneira no campo da comunicação radiofónica? Penso de novo no dia 12 de Fevereiro de 1931, quando o meu venerado predecessor, o Papa Pio XI, com uma profética mensagem ao mundo, inaugurava a primeira estação de rádio com raio universal.

Desde então as vicissitudes daquela que vós, com legítimo orgulho, chamais a "Rádio Vaticano" entrelaçam-se com os dramas, as expectativas e as esperanças da humanidade. Durante sete décadas a vossa emissora acompanhou os acontecimentos, exaltantes e terríveis, do século que há pouco terminou. Difundiu em todas as partes do globo o anúncio do Evangelho e a palavra do Sucessor de Pedro. Seria muito demorado fazer o elenco dos numerosos serviços prestados à Sé Apostólica. Desejaria limitar-me a recordar o contributo dado à frutuosa realização do Grande Jubileu que acabámos de concluir, e sobretudo as transmissões especiais Jubilaeum, difundidas também através da Internet, com milhares de horas de actividades em várias línguas, com mais de dois mil e quinhentos hóspedes no estúdio e quase o dobro ao telefone, e um número excepcional de ligações. Estes programas empenharam voluntários, mantiveram contactos regulares com outras emissoras espalhadas pelo mundo, organizando encontros especiais para as peregrinações nacionais, juntamente com muitas outras iniciativas. Mais uma vez, obrigado a todos os que, de vários modos, colaboraram nestes sententa anos de trabalho quotidiano da Rádio Vaticano. Um pensamento especial e uma oração para os que, durante estes anos, partiram para a vida eterna.

3. Por Estatuto, à Rádio Vaticano está confiada a tarefa de "anunciar com liberdade, fidelidade e eficácia a mensagem cristã e ligar o centro da catolicidade com os diversos Países do mundo, difundindo a voz e os ensinamentos do Romano Pontífice, informando sobre a actividade da Santa Sé, fazendo-se eco da vida católica no mundo, orientando para avaliar os problemas do momento à luz do magistério eclesiástico e na constante atenção aos sinais dos Tempos".
Este texto encontra um iluminador comentário nas palavras que o meu venerado predecesor, o Servo de Deus Paulo VI, considerado por vós com razão o segundo fundador da Rádio Vaticano, vos dirigiu por ocasião do quadragésimo aniversário: "Que poder adquire a voz dizia ele nessa ocasião que função é confiada à Rádio! Existe um serviço mais apropriado à nossa missão apostólica, como o que vós, tornados ministros da palavra, prestais à causa do Evangelho e da Igreja?" (27/2/1971, AAS LXIII [1971] pág. 225).

Sim, a vossa missão primária é difundir o magistério, as palavras e a própria voz do Sucessor de Pedro; dar a conhecer através das vossas antenas a vitalidade da Igreja, as suas iniciativas de caridade, as suas alegrias, os seus sofrimentos e as suas esperanças. Continuais a dedicar-vos a esta particular missão eclesial com as vossas melhores energias para o bem de todo o povo cristão. O vosso é um qualificado e moderno contributo à obra da nova evangelização neste nosso tempo, que se caracteriza pela expansão e a intensificação do fenómeno da comunicação global.

4. A este propósito tendes hoje diante de vós dois grandes desafios: o tecnológico e o editorial. O primeiro, o tecnológico, diz respeito à produção e difusão dos programas. Há anos que foi oportunamente iniciada a difusão via satélite e telemática, com um decisivo incremento de ouvintes, graças à retransmissão consentida a cerca de oitocentas estações locais. Além disso, a introdução da técnica digital, oferecendo à produção inéditas e amplas possibilidades, modifica notavelmente os perfis profissionais clássicos. Se o desafio tecnológico requer recursos financeiros e capacidades técnicas e de gestão, o editorial empenha sobretudo capacidades intelectuais e criativas. Trata-se de dar à riqueza e à densidade dos conteúdos a serem comunicados formas e linguagens específicas do meio radiofónico, adequados à sua evolução e eficazes para o alcance dos objectivos próprios de uma emissora radiofónica ao serviço da Igreja.

Evangelizar através da rádio significa oferecer uma informação profissionalmente perfeita que, no comentário implícito e explícito dos factos, se torne catequese quotidiana ancorada na vida e na experiência do ouvinte. Esta acção evangelizadora exige um esforço contínuo de adaptação, de actualização, mas também uma sólida formação humana, cultural e profissional, unida a firmes motivações espirituais e missionárias. A capacidade de anunciar eficazmente a Boa Nova baseia-se, antes de mais, numa oração intensa, na escuta de Deus e numa corajosa fidelidade a Cristo, divino Comunicador de salvação.

5. Caríssimos Irmãos e Irmãs! O septuagésimo aniversário da Rádio Vaticano festeja-se no início do terceiro milénio e pouco tempo depois da conclusão da extraordinária experiência jubilar. O dinamismo que o Grande Jubileu imprimiu na Igreja não pode deixar de vos solicitar a partir de novo, com humilde coragem, para um novo trecho de caminho ao serviço do Evangelho. O Papa conta muito com a vossa ajuda para desempenhar o seu ministério petrino, e pede que vos façais todos os dias difusores da verdade que torna livres.

Continuai a escrever páginas interessantes da vossa história, já rica de nobres memórias. As urgências apostólicas da Igreja, nesta fase de rápidas mudanças, sejam para vós um estímulo a prosseguir com entusiasmo. Dirijo também a vós a exortação que escrevi na recente Carta apostólica Novo millennio ineunte: "Agora devemos olhar para a frente, temos de "nos fazer ao largo" confiantes na palavra de Cristo: Duc in altum!" (n. 15). Fazei-vos ao largo e não temais, caríssimos membros da grande família da Rádio Vaticano. Tendes à vossa frente um futuro certamente com sombras, no qual contudo a esperança cristã entrevê promessas que não desiludem. Não vos desencoragem as dificuldades, os recursos limitados e os vossos próprios limites. Não vos perturbe a mudança, cada vez mais acelerada, de cenários, de estruturas, de métodos e de modos de viver.

"Duc in altum! - Faz-te ao largo!" No serviço da fé e da unidade dos cristãos, na defesa da vida e dos direitos humanos, no anúncio da paz a todos os homens de boa vontade, não vos encontrais sozinhos: estais no coração da Igreja. Estais presentes também na minha solicitude e na minha oração de todos os dias.

Confio de bom grado as vossas pessoas, o vosso trabalho e os vossos projectos à materna protecção de Maria, Estrela da evangelização. Acompanho os meus votos com uma especial Bênção apostólica que, com afecto, faço extensiva às vossas famílias e aos milhões de ouvintes espalhados pelo mundo inteiro, riqueza e orgulho da Rádio Vaticano.




AO NOVO EMBAIXADOR DA ÁUSTRIA


JUNTO À SANTA SÉ


13 de Fevereiro de 2001



Senhor Embaixador Walter Greinert

1. Agradeço-lhe sinceramente as palavras que me dirigiu por ocasião da apresentação das Cartas que o acreditam como novo Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República da Áustria junto da Santa Sé. No momento em que assume este cargo apresento-lhe calorosas boas-vindas e os votos por esta tarefa importante e prestigiosa. Ao mesmo tempo, peço que tenha a bondade de transmitir a minha saudação ao Presidente da República da Áustria.

2. Se penso na Áustria vêm-me inevitavelmente à memória as três inesquecíveis visitas pastorais que, durante o meu Pontificado, me levaram ao seu amado País.

Ao lado das recordações dos encontros pessoais com os numerosos representantes da vida social e eclesial permaneceu vivo em mim o clima cultural que distingue a República dos Alpes. Ela possui tesouros levados pelo cristianismo, que é preciso defender e conservar no milénio que há pouco teve início.

Esta tarefa é tanto mais urgente quanto mais se considera a posição da Áustria na Europa.
Desejo realçar o que Vossa Excelência recordou durante o nosso colóquio: a queda da cortina de ferro constituiu também uma viragem no papel que agora compete ao seu País. A Áustria, terra de fronteira, passou a ser terra de ligação.

A linha de marcação entre dois mundos foi cancelada e cedeu o lugar a um areópago aberto no qual Leste e Oeste da Europa se podem encontrar.

Verifico com satisfação que a Áustria se torna cada vez mais consciente da própria responsabilidade de País no centro da Europa e com base nas suas possibilidades apoia com vigor a abertura da União Europeia no sentido de uma europeização de todo o continente. Esta é também a intenção da Santa Sé que, com os seus esforços, jamais se cansará de reclamar neste momento histórico uma "mudança cultural", a fim de tutelar e promover a dignidade do homem (cf. Evangelium vitae EV 95).

3. Quem olha para a Áustria não pode deixar de olhar também para o continente. A cultura europeia é um entrelaçamento de múltiplas origens, porque foi o Espírito que animou a antiga Grécia, assim como o Imperium Romanum com os povos latinos, eslavos, germânicos e ugro-fínicos. Quando a fé cristã chegou a Roma, o Império romano foi a base a partir da qual o cristianismo se "inculturou" nos vários povos e pôde, desta forma, difundir-se de maneira eficaz. O Corpus Christianorum desenvolveu-se cada vez mais como família espiritual de Estados, composta por membros romanos, germânicos e eslavos e é impensável sem os valores cristãos.

Plasmou o rosto da Europa e determinou a herança ocidental, tarefa que temos de manter viva.
Precisamente quando o cristianismo completa dois mil anos, temos o sumo dever de ser não só administradores do passado, mas também criadores de um futuro que desperte a esperança para o homem. O projecto "Europa" na sua integridade e como realidade constituída por diversos Países, que nela devem encontrar lugar, está hoje numa encruzilhada: tornar-se-á um jardim em flor ou um pântano estagnado.

Quero aproveitar esta feliz circunstância para indicar alguns âmbitos em que a Santa Sé e a Áustria podem prosseguir e aprofundar a sua provada colaboração para criar um jardim florido.
4. Para que um jardim possa florescer, deve encontrar-se um espaço favorável para a vida.

Portanto nas nossas sociedades deve prevalecer a "cultura da vida". Quem afirma com razão que a dignidade pessoal é um bem inalienável de cada homem não pode alimentar dúvidas sobre o facto de que esta dignidade pessoal encontre a sua expressão primária e fundamental na inviolabilidade da vida humana. Quando o direito à vida não é defendido como condição para todos os outros direitos da pessoa, outras menções aos direitos do homem, como à saúde, à habitação, ao trabalho, à criação de uma família, permanecem ilusões enganadoras.

Não nos podemos resignar perante as múltiplas feridas infligidas ao homem em referência ao seu direito à vida. Por isso, a Igreja defende todas as iniciativas políticas em sintonia com o princípio que formulei na minha primeira mensagem de Natal e que hoje é um critério mais válido do que nunca: "O homem é sempre único e irrepetível, alguém eternamente ideado e escolhido, alguém chamado e denominado com o próprio nome" (Mensagem "Urbi et Orbi" de 25 de Dezembro de 1978).

5. Por isso o homem tem direito à vida em todas as fases da sua existência, desde o momento da concepção até à morte natural. Detém este direito em qualquer situação que se venha a encontrar: na saúde e na doença, na alegria e no sofrimento, na riqueza e na pobreza. A legalidade do aborto durante os primeiros meses de gravidez, que existe também em muitos países europeus além da Áustria, permanece por esse motivo uma ferida aberta no meu coração.

O que é válido para o início, é válido de igual modo para o fim da vida humana: infelizmente parece que no amplo debate sobre a eutanásia se compartilha cada vez menos a ideia que o homem recebeu a vida como um dom. Desta forma torna-se cada vez mais difícil defender o direito do homem a morrer com dignidade quando Deus quer. Também a morte é uma parte da vida. Quem quer privar o homem do direito à vida no final da sua existência terrena, no fim de contas é a própria vida que lhe tira, mesmo se procura esconder o crime da eutanásia sob a veste de "morte mais humana".

Por fim, é com profunda preocupação que desejaria falar da responsabilidade que surge do enorme progresso das ciências biológicas e médicas e do surpreendente poder tecnológico com elas relacionado: hoje, o homem está em condições não só de observar a vida humana no seu início e nos seus primeiros estádios de desenvolvimento, mas também de a "manipular" e "clonar".

Diante destes poderosos desafios exorto a empreender "acções concretas" com a finalidade de tomar "a peito o enquadramento da cultura nos princípios de um humanismo autêntico, de forma que a promoção e a defesa dos direitos do homem possam encontrar fundamento dinâmico e seguro na sua própria essência" (Christifideles laici, CL 38).

6. Por conseguinte, um jardim é florido quando desabrocham muitas flores ao mesmo tempo. A sociedade é um sinal do facto de que o homem é chamado a viver em comunidade. Esta dimensão social do homem encontra a sua primeira e originária expressão no matrimónio e na família. Como berço da vida, na qual o homem nasce e cresce, a família representa a célula primária da sociedade.

Eis por que a Igreja, através das suas iniciativas pastorais, se torna de bom grado aliada de quem, através de decisões políticas, medidas legislativas ou meios financeiros se empenha pelo casal e pela família como lugar privilegiado de "humanização" da pessoa e da sociedade. A finalidade de edificar paralelamente com a "cultura da vida" uma "civilização do amor" mediante o revigoramento do matrimónio e da família, deve ser perseguida tanta maior urgência quanto mais se alastram os ataques contra a estabilidade e a fecundidade do matrimónio e também as tentativas de tornar juridicamente relativa a importância da célula primária da sociedade.

A experiência demonstra que a estabilidade dos povos é favorecida sobretudo pelo florescimento das famílias. Além disso, "o futuro da humanidade passa através da família" (Familiaris consortio, FC 86). Por isso, a família exige o respeito e a tutela por parte das autoridades públicas.

O jardim da nossa sociedade será vigoroso, quando as famílias voltarem a florescer.

7. A família é um lugar importante de aprendizagem. Não é só o "santuário da vida" (Evangelium vitae, EV 94), mas também uma escola de "caridade social" em pequeno (cf. Centesimus annus, CA 10), que em grande se chama "solidariedade". Este não é "um sentimento de compaixão vaga ou de enternecimento superficial pelos males sofridos por tantas pessoas, próximas ou distantes. Pelo contrário, é a determinação firme e perseverante de se empenhar no bem comum: ou seja, pelo bem de todos e de cada um, porque todos nós somos verdadeiramente responsáveis por todos" (Sollicitudo rei socialis, SRS 38).

A respeito disto, desejaria recordar um princípio elementar de qualquer sadia organização política: quanto mais indefesos são numa sociedade, os indivíduos tanto mais precisam do interesse e do cuidado dos outros e, em particular, da intervenção da autoridade pública.

Por conseguinte, congratulo-me por todas as iniciativas que se destinam a promover uma política familiar e social que se distinga pela distribuição de ajudas válidas e de formas activas de apoio às crianças e aos idosos, a fim de evitar que sejam afastados das suas famílias e reforçar, assim, as relações entre as gerações. Além disso, exprimo gratidão por todos os esforços realizados no seu País, a fim de entrelaçar redes familiares o mais densas possível. Onde isto for realizado, a Igreja pôr-se-á de bom grado ao lado das associações caritativas.

A este propósito, é preciso não esquecer que algumas necessidades do homem não requerem apenas ajudas materiais. Muitas vezes trata-se de ouvir profundas exigências interiores. Pensemos na situação dos imigrados e dos refugiados, dos deficientes e de todas as pessoas pobres, que se socorrem verdadeiramente só quando, além da ajuda material, se lhes oferece uma ajuda fraterna autêntica. Por isso, tenho a firme convicção de que a Áustria, também no futuro, não negará a sua excepcional solidariedade e um efectivo amor ao próximo que se encontra em dificuldade.

Este desejo não se detém nas fronteiras de um País, mas expande-se a todo o continente, de forma a que a Europa que se está a desenvolver se deixe julgar também com base no constante florescimento da solidariedade dos países ricos para com as nações pobres.

8. Não posso concluir as minhas reflexões sem garantir que as relações amistosas entre a Santa Sé e a Reública da Áustria, que Vossa Excelência justamente realçou no seu discurso, continuarão a ser fecundas.

No actual contexto social, caracterizado por uma luta dramática entre "cultura da vida" e "cultura da morte" une-nos a finalidade comum de nos empenharmos há mais de dez anos numa mudança não só política, mas também cultural, que leve a uma mobilização geral das consciências e estabeleça novas prioridades para a vontade humana: a primazia do ser sobre o ter, da pessoa sobre as coisas (cf. Evangelium vitae, EV 98). O Estado e a Igreja devem ter a preocupação pelo bem-estar do homem, promovendo valores e ideais nobres mediante uma cooperação participativa.

Senhor Embaixador, ao desejar-lhe uma boa permanência em Roma, concedo de coração a Vossa Excelência, aos seus válidos colaboradores na Embaixada e à sua família a Bênção apostólica.




Discursos João Paulo II 2001 - Sexta-feira, 9 de Fevereiro de 2001