Discursos João Paulo II 2001

AOS DIRIGENTES E SÓCIOS DO


CÍRCULO DE SÃO PEDRO


Sexta-feira, 3 de Maio de 2001




Caríssimos Dirigentes e Sócios
do "Círculo de São Pedro"!

1. Agradeço-vos de coração esta visita, que me oferece, como todos os anos, a agradável ocasião de vos encontrar. Saúdo-vos com afecto e faço extensivo o meu pensamento às vossas famílias e a quantos não puderam estar aqui presentes.

Saúdo e agradeço ao vosso Presidente-Geral, Dr. Marcello Sacchetti, que gentilmente quis fazer-se intérprete dos sentimentos de todos. Nas palavras por ele pronunciadas senti o entusiasmo e a generosidade com que a vossa Associação desempenha quotidianamente o próprio serviço litúrgico e a intensa actividade caritativa, sobretudo para com os mais pobres. Escutei também com atenção os projectos que desejais realizar para que, como foi dito há pouco, a vossa Associação seja cada vez mais "um fiel prolongamento da mão caridosa" do Sucessor de Pedro. Dirijo uma saudação fraterna ao vosso Assistente espiritual, D. Ettore Cunial, e aos outros sacerdotes que se ocupam da vossa formação religiosa.

2. Ao receber-vos hoje, o meu pensamento dirige-se para o Ano Santo, que se concluiu felizmente há alguns meses, e para o significativo e qualificado contributo que oferecestes para o seu desenvolvimento. Além das actividades litúrgicas, foi recordada no início deste encontro a distribuição quotidiana das refeições aos pobres por vós realizada nos quiosques preparados nas quatro Basílicas Patriarcais. A vossa Associação também se ocupou da recolha de numerosos testemunhos de pessoas de todas as nações e continentes que vieram a Roma para o Jubileu. Quisestes recolher algumas delas num pequeno livro, que desejais oferecer-me. Obrigado pela vossa apreciada colaboração!

Com o ânimo repleto das emoções vividas ao longo do caminho jubilar, entramos no novo século e no novo milénio, conscientes de que o Senhor nos chama a ser os apóstolos deste nosso tempo. A recordação das grandes experiências eclesiais vividas constitui, sem dúvida, um estímulo para abrir de par em par as portas do coração aos horizontes prometedores da nova evangelização. É com este espírito que também vós, caríssimos, deveis retomar o caminho "ordinário" do vosso apostolado, ao mesmo tempo simples e profundo, difundindo em toda a parte a esperança cristã.

3. Não vos esqueçais de que a santidade é o primeiro empenho de cada cristão e comunidade. Quis recordar isto na Carta apostólica Novo millennio ineunte, confiada a todo o Povo de Deus como dom do Jubileu.

Por conseguinte, procurai viver este ideal evangélico em primeiro lugar nas vossas famílias, para que sejam "oásis" de espiritualidade familiar e de abertura ao próximo. Depois, no trabalho e nas actividades profissionais, manifestai a vossa adesão a Cristo, difundindo a sua luz com todos os gestos e comportamentos. Tenho a certeza de que a busca incessante da santidade por parte de todos os sócios dará ao Círculo um renovado anseio de autêntica novidade, sobretudo se for amparada pela oração e pela escuta dócil da palavra de Deus, bem como pela assídua participação nos sacramentos e por um estilo de vida conforme aos ensinamentos evangélicos.

Só uma firme espiritualidade é um apoio válido para uma eficaz e generosa acção caritativa. Só se forem animadas pelo sopro do Espírito, as iniciativas de assistência e de promoção humana para com os idosos e as crianças, os pobres e os doentes, por vós geridas aqui em Roma, se tornarão sinais eloquentes do Evangelho da caridade. Com esta abertura de espírito realizais também os numerosos projectos que vos levam a amplos horizontes missionários, fazendo experimentar a todos o amor misericordioso de Deus. Levai aos necessitados, em nome do Papa, o alívio do amor fraterno, traduzido em partilha e solidariedade fraterna. Faz parte desta vossa missão a recolha em Roma do Óbolo de São Pedro, por ocasião do Dia da caridade do Papa, confiada ao vosso Círculo por um antigo privilégio. Hoje viestes trazer-me o resultado; obrigado por isto! O Senhor vos ajude a realizar cada vez mais fielmente o vosso serviço eclesial e, como o vosso lema expressa muito bem, requer "oração", "acção" e "sacrifício".

Confio-vos a todos a Maria, ao entrarmos no mês de Maio a ela dedicado. Nossa Senhora vos acompanhe e vos proteja, bem como às vossas famílias e torne fecundo o vosso apostolado. Garanto-vos uma recordação na minha oração e abençoo-vos de coração.




AOS MEMBROS DO


COLÉGIO INTERNACIONAL


SÃO BERNARDO "IN URBE"


Quinta-feira, 3 de Maio de 2001




Caríssimos Irmãos e Irmãs

1. É com imensa alegria que vos recebo e dou as minhas mais cordiais boas-vindas a cada um de vós. Saúdo em particular o Abade Ugo Gianluigi Tagni e agradeço-lhe as palavras com que interpretou os sentimentos de todos vós.

Dirijo uma saudação e um apreço cordiais também às Irmãs Missionárias Filhas do Coração de Maria que, como madres e irmãs, assistem os hóspedes do Colégio internacional, fundado pelos Monges cistercienses com louvável atenção às exigências pastorais da Igreja. Nele são acolhidos sacerdotes e religiosos de várias nacionalidades, vindos a Roma para aperfeiçoar os seus estudos, frequentando os diversos Centros académicos da Cidade. Encontrar-se em comunidade num lugar tão adequado para as exigências de quem é chamado a dedicar-se ao ministério sacerdotal permite realizar uma maravilhosa permuta de dons, certamente útil para a futura actividade apostólica.

Além disso, o contacto com a espiritualidade típica da Ordem monástica cisterciense é um modo de aproveitar uma ulterior possibilidade para a formação espiritual e apostólica. Formulo votos cordiais a fim de que cada um de vós possa haurir abundantemente desta nascente que, ao longo dos séculos, alimentou muitas experiências de vida consagrada.

2. Como bem sabeis, a vida monástica é caracterizada por uma constante tensão para a conversão. A Regra de São Bento, na qual se inspira a Ordem cisterciense, prescreve que o candidato à vida monástica prometa, na presença de toda a comunidade e com a ajuda de Deus e dos Santos protectores, uma conversão sincera e radical (cf. Regra de São Bento, 58, 17). Ela não é apenas um exercício típico do tempo quaresmal, mas deve constituir a tensão do cristão para uma vida genuinamente evangélica. Por outras palavras, é o esforço sincero e ininterrrupto que cada baptizado, e sobretudo os sacerdotes e religiosos, devem alimentar a fim de tender para a santidade.

Desejaria recordar aqui quanto tive a ocasião de afirmar na recente Carta Apostólica Novo millennio ineunte, ou seja, que "é hora de propor de novo a todos, com convicção, esta "medida alta" da vida cristã ordinária" (n. 31). E isto é ainda mais válido para vós, caríssimos Irmãos ordenados para o serviço do povo cristão. Jesus pergunta-vos, como fez a Pedro: "Simão, filho de João, tu amas-me mais do que estes?" (Jn 21,15). E espera a vossa resposta, expressa não só com palavras mas também, e sobretudo, na solidez das opções quotidianas.

Na escola da espiritualidade cisterciense, sois impelidos a orientar toda a vossa existência para a contemplação de Deus, segundo o conselho de São Bento: "Nada anteponhas ao amor de Cristo" (cf. Regra de São Bento, 4, 21 e 72, 11). A experiência monástica estimula-vos, outrossim, a praticar a Lectio divina, a celebrar em comum a Liturgia das Horas, sobretudo a Eucaristia quotidiana, e a prolongar a vossa intimidade com o Senhor na Adoração eucarística. A preocupação pelo estudo não vos distraia desta imersão diária em Deus. Com efeito, somente d'Ele podereis haurir a força indispensável para o apostolado que vos for confiado pelos vossos superiores, quando regressardes às vossas nações e dioceses.

O teólogo autêntico é aquele que reza. Nesta perspectiva, eu escrevia na citada Carta Apostólica Novo millennio ineunte: "Nós que temos a graça de acreditar em Cristo, revelador do Pai e Salvador do mundo, temos a obrigação de mostrar a profundidade a que pode levar o relacionamento com Ele" (n. 33).

3. Desta contemplação incessante, que leva a uma intimidade cada vez maior com Deus, brotará a necessidade de comunhão também entre vós e com os irmãos. Vós provindes de múltiplas Nações e Institutos religiosos: a variedade dos ritos, das culturas, das experiências e das instâncias pastorais das vossas Comunidades ou das Igrejas locais de pertença constitui um património significativo, que deve ser compartilhado e vos há-de levar a amar ainda mais a única Igreja de Cristo. Com efeito, é a Igreja que o Senhor vos pede para servir com a pluralidade dos vossos carismas e serviços pastorais.

Diante de vós reluz o testemunho de muitos Santos que hauriram a inspiração constante da fonte beneditina e cisterciense. Olhai de forma especial para São Bernardo, vosso grande mestre espiritual, homem de contemplação e de acção. A propósito das várias Ordens religiosas, ele observava com profunda sabedoria: "Todos nós temos necessidade uns dos outros: o bem espiritual que não tenho e não possuo, recebo-o dos outros... e todas as nossas diversidades, que manifestam a riqueza dos dons de Deus, subsistirão na única casa do Pai, que comporta muitas moradas. Agora há divisão de graças: depois, haverá distinção de glória. Tanto aqui como ali, a unidade consiste na mesma coisa" (Apologia a Guilherme de Saint Thierry, IV, 8: PL 182, 903-904).

Portanto, o vosso Colégio seja uma Cenáculo: um lugar onde, assíduos e unânimes na oração com Maria, a Mãe de Jesus (cf. Act Ac 1,14), tende um só coração e uma só alma (cf. Ibid., 4, 32). Uma escola de vida fraterna em que, como ensina São Bento (cf. Regra de São Bento, 72, 4 ss.), nos louvores uns se devem antecipar aos outros, suportando com suma paciência as debilidades recíprocas. Ninguém busque a sua própria utilidade, mas antes a do outro, amando o próximo com amor casto. Este estilo de vida, esta experiência de comunhão entre sacerdotes e religiosos servir-vos-á de válida ajuda nas vossas comunidades de proveniência quando, terminado o tempo da formação aqui em Roma, empreenderdes a obra à qual o Espírito Santo vos chamar.

Maria, que queremos invocar como Mater boni consilii, vele sobre os vossos propósitos de bem e sobre toda a vossa actividade quotidiana. Caríssimos, recorrei com constância e confiança a Ela e à sua intercessão. Com estes sentimentos, abençoo-vos cordialmente a todos e a cada um.



SAUDAÇÃO DO SANTO PADRE


AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA DA GRÉCIA


Atenas, 4 de Maio de 2001



Senhor Presidente

1. Agradeço-lhe as amáveis palavras de boas-vindas que acaba de me dirigir. Sinto-me profundamente feliz por poder saudá-lo nesta ocasião e, através de Vossa Excelência, saúdo também cordialmente todos os Membros do Governo e das representações diplomáticas.

Conservo uma terna recordação da visita que Vossa Excelência, Senhor Presidente, realizou ao Vaticano no passado mês de Janeiro e agradeço-lhe o convite que me fez para vir a Atenas. De igual modo, por seu intermédio, dirijo as minhas cordiais saudações a todo o povo do seu País, desejando de uma certa forma reconhecer a dívida que todos nós temos para com a Grécia; de facto, nunca se pode ignorar a influência duradoura que a sua história única e a sua cultura tiveram sobre a civilização europeia e também sobre a de todo o mundo.

No ano passado, os cristãos celebraram em toda a parte os dois mil anos do nascimento de Cristo. Senti um profundo desejo de assinalar esse acontecimento, fazendo-me peregrino aos lugares ligados à história da salvação, o que se concretizou com a minha peregrinação ao Monte Sinai e à Terra Santa. Agora, é à Grécia que venho como peregrino, seguindo os passos de São Paulo, cuja importante figura é predominante nos dois milénios de história cristã, e cuja memória permanece gravada para sempre no solo deste País. Aqui em Atenas, Paulo fundou uma das primeiras comunidades do seu périplo no Ocidente e da sua missão no continente europeu; aqui ele trabalhou incansavelmente para tornar Cristo conhecido; aqui sofreu por causa do anúncio do Evangelho; e como deixar de recordar que precisamente aqui, na cidade de Atenas, foi instaurado o diálogo entre a mensagem cristã e a cultura helénica, diálogo este que modelou de forma duradoura a civilização europeia?

2. Muito tempo antes da era cristã, a influência da Grécia tinha-se difundido amplamente. Na própria literatura bíblica, os últimos livros do Antigo Testamento, alguns dos quais foram escritos em grego, estão profundamente marcados pela cultura helénica. A tradução grega do Antigo Testamento, conhecida com o nome de "Livro dos Setenta", teve uma grande influência na Antiguidade. O mundo com o qual Jesus entrou em contacto estava largamente impregnado de cultura grega. Quanto aos textos do Novo Testamento, foram divulgados em grego, o que permitiu que se difundissem mais rapidamente. Mas tratava-se de algo mais do que de uma simples questão de língua; os primeiros cristãos também recorreram à cultura grega para a transmissão da mensagem evangélica.

Sem dúvida, os primeiros encontros entre os cristãos e a cultura grega foram difíceis. Encontramos acerca disto uma primeira indicação no acolhimento reservado a Paulo quando pregou no Areópago (cf. Act Ac 17,16-34). Ao responder à profunda expectativa do povo ateniense, que procurava o Deus verdadeiro, não lhe foi fácil anunciar Cristo morto e ressuscitado, no qual se encontra o sentido pleno da vida e o fim de qualquer experiência religiosa. Será tarefa dos primeiros Apologistas, como o mártir São Justino, demonstrar que um encontro fecundo entre a razão e a fé é possível.

3. Tendo sido vencida a primeira desconfiança, os escritores cristãos começaram a considerar a cultura grega como uma aliada e não mais como uma inimiga, e grandes centros do cristianismo helénico viram a luz à volta da bacia do Mediterrânio.

Percorrendo as páginas densas de Agostinho de Hipona e de Dionísio o Areopagita, vemos que a teologia e a mística cristãs tiraram elementos do diálogo com a filosofia platónica. Autores, como Gregório de Nazianzo, que estavam impregnados da retórica grega, foram capazes de criar uma literatura cristã digna do seu passado clássico. Progressivamente, o mundo helénico tornou-se cristão e o cristianismo tornou-se, num certo sentido, grego; em seguida surgiram a cultura bizantina no Oriente e a cultura medieval no Ocidente, as duas igualmente impregnadas da fé cristã e da cultura grega. E como não mencionar a intervenção de São Tomás que, ao reler a obra de Aristóteles, propôs uma síntese teológica e filosófica magistral.

A obra pictórica de Rafael A escola de Atenas, que se enconra no Palácio do Vaticano, mostra claramente o contributo dado pela escola de Atenas à cultura do Renascimento, período no qual se chegou a uma grande simbiose entre a Atenas clássica e a cultura da Roma cristã.

4. O helenismo caracteriza-se pela atenção pedagógica dada à juventude. Platão insistia sobre a necessidade de formar a alma da juventude no bem e em tudo o que é honesto, assim como no respeito dos princípios divinos. Quantos filósofos e autores gregos, começando por Sócrates, Esquilo e Sófocles, convidaram os seus contemporâneos a viver "segundo as virtudes"! Os santos Basílio e João Crisóstomo não deixarão de louvar o valor da tradição pedagógica grega, devido à sua preocupação por desenvolver o sentido moral dos jovens, ajudando-os a escolher livremente o bem.

Os traços fundamentais desta longa tradição continuam a ser válidos para os homens e os jovens do nosso tempo. Entre os elementos mais certos, permanecem os aspectos morais contidos no sermão de Hipócrates, que realça o princípio do respeito incondicionado da vida humana no seio materno.

A Grécia também é o País onde nasceram duas grandes tradições desportivas, os jogos olímpicos e a maratona. Através destas competições, é expressa uma ideia significativa da pessoa humana, na harmonia entre a dimensão espiritual e a corporal, mediante um esforço medido, impregnado de valores morais e civis. Não podemos deixar de nos alegrar por ver que estas competições se perpetuaram, que continuam a criar vínculos profundos entre os povos de toda a terra.

5. A inculturação do Evangelho no mundo grego permanece um exemplo para qualquer inculturação. Nas suas relações com a cultura grega, o anúncio do Evangelho teve que fazer esforços para um discernimento vigilante, para receber e valorizar todos os seus elementos positivos, recusando ao mesmo tempo todos os aspectos incompatíveis com a mensagem cristã.

Temos nisto um desafio permanente para o anúncio evangélico no seu encontro com as culturas e com os processos de mundialização. Tudo isto nos chama a ter um diálogo respeitador e franco, e exige aquelas novas solidariedades que o amor evangélico pode inspirar, levando à sua realização o ideal grego de cosmopolis, para um mundo verdadeiramente unido, impregnado de justiça e de fraternidade.

Encontramo-nos numa época decisiva da história europeia; faço sentidos votos para que a Europa que está para nascer retome de maneira renovada e criativa esta longa tradição de encontro entre a cultura grega e o cristianismo, mostrando que não se trata de vestígios de um mundo que desapareceu, mas que nele se encontram as bases verdadeiras do autêntico progresso humano desejado para o nosso mundo.

Na fachada do Templo de Delfos, encontram-se gravadas estas palavras: "conhece-te a ti mesmo"; por conseguinte, convido a Europa a conhecer-se a si mesma de maneira cada vez mais profunda. Este conhecimento de si própria só se realizará se ela explorar de novo as raízes da sua identidade, raízes que mergulham profundamente na herança helénica clássica e na herança cristã, que deram origem a um humanismo fundado na consciência de que todos os seres humanos são criados, desde a sua origem, à imagem e semelhança de Deus.

6. A geografia e a história situaram o seu País, Senhor Presidente, entre o Oriente e o Ocidente, o que significa que a vocação natural da Grécia consiste em construir pontes e edificar uma cultura do diálogo. Isto, hoje, é fundamental para o futuro da Europa. Foram abatidos numerosos muros nos últimos tempos, mas muitos ainda permanecem. A tarefa da unificação entre as partes orientais e ocidentais da Europa continua a ser complexa; resta ainda muito para fazer a fim de chegar à harmonia entre os cristãos do Oriente e do Ocidente, para que a Igreja possa respirar com os seus dois pulmões. Todos os crentes se devem sentir empenhados para alcançar este objectivo. A Igreja católica que está na Grécia deseja participar louvavelmente na promoção desta nobre causa que incide de modo positivo também no âmbito social.

Sob este ponto de vista, oferecem um contributo significativo as escolas, nas quais se formam as novas gerações. A escola é por excelência um lugar de integração dos jovens com diferentes horizontes. A Igreja católica, em harmonia com as outras Igrejas e confissões religiosas, deseja colaborar com todos os cidadãos na educação da juventude. Ela deseja prosseguir a sua longa experiência educativa no seu País, sobretudo através da acção dos Irmãos Maristas e dos Irmãos das Escolas Cristãs, das Religiosas Ursulinas e das Irmãs de São José. Estas diferentes famílias religiosas demonstraram que sabem, com delicadeza e no respeito das tradições culturais dos jovens que lhes são confiados, educar homens e mulheres, para que sejam verdadeiros Gregos entre os Gregos.

Senhor Presidente, ao terminar o nosso encontro agradeço de novo o acolhimento que me foi reservado por Vossa Excelência e manifesto ao mesmo tempo a minha gratidão a quantos permitiram a realização da minha peregrinação, seguindo os passos de São Paulo. Peço a Deus que conceda cada vez mais as suas abundantes Bênçãos aos habitantes do seu País para que, ao longo do terceiro milénio, a Grécia continue a oferecer novos e maravilhosos dons ao continente europeu e a toda a família das nações!




A SUA BEATITUDE CHRISTÓDOULOS


ARCEBISPO DE ATENAS E DE TODA A GRÉCIA


Atenas, 4 de Maio de 2001






Beatitude
Veneráveis Membros
do Santo Sínodo
Reverendíssimos Bispos
da Igreja Ortodoxa da Grécia
Christòs anèsti!

1. No júbilo da Páscoa, saúdo-vos com as palavras que o Apóstolo São Paulo dirigiu à Igreja em Tessalonica: "Que o Senhor da paz vos conceda a paz em todo o tempo e por todas as formas" (2Th 3,16).

Tenho muito prazer em encontrar-me com Vossa Beatitude neste Sé Primacial da Igreja Ortodoxa da Grécia. Transmito calorosas saudações aos membros do Santo Sínodo e a toda a Hierarquia. Saúdo o clero, as comunidades monásticas e os fiéis leigos em toda esta nobre terra. A paz esteja com todos vós!

2. Em primeiro lugar, desejo expressar-vos o afecto e a estima da Igreja de Roma. Em conjunto, compartilhamos a fé apostólica em Jesus Cristo como Senhor e Salvador; temos em comum a herança apostólica e o vínculo sacramental do Baptismo; e por conseguinte, todos nós somos membros da família de Deus, chamados a servir o único Senhor e a proclamar o seu Evangelho ao mundo. O Concílio Vaticano II exortava os católicos a considerar os membros das outras Igrejas como "irmãos e irmãs no Senhor" (Unitatis redintegratio, UR 3) e este vínculo sobrenatural de fraternidade entre a Igreja de Roma e a Igreja da Grécia é vigoroso e duradouro.

Sem dúvida, custam-nos quer as controvérsias do passado e do presente quer os persistentes mal-entendidos. Contudo, num espírito de caridade recíproca, eles podem e devem ser superados, porque é isto que o Senhor nos pede. Claramente, há a necessidade de um processo libertador de purificação da memória. Pelas ocasiões do passado e do presente, em que filhos e filhas da Igreja católica pecaram em actos ou omissões contra os seus irmãos e irmãs ortodoxos, que o Senhor nos conceda o perdão que lhe pedimos.

Algumas memórias são particularmente dolorosas, e determinados acontecimentos do passado mais longínquo deixaram profundas feridas nas mentes e nos corações das pessoas, e ainda hoje se fazem sentir. Refiro-me ao desastroso saque da cidade imperial de Constantinopla, que por longo tempo foi a fortaleza da cristandade no Oriente. É trágico o facto de que os salteadores, que partiram com a finalidade de garantir o livre acesso dos cristãos à Terra Santa, agredissem os seus próprios irmãos na fé. O facto de que eles eram cristãos latinos enche os católicos de profundo arrependimento. Como podemos deixar de ver nisto o mysterium iniquitatis, que age no coração humano? Só Deus pode julgar, e, portanto, confiamos o pesado fardo do passado à sua misericórdia infinita, implorando dele a cura das feridas que ainda causam sofrimento no espírito do povo grego. Devemos trabalhar em conjunto em favor desta purificação, se a Europa que agora emerge quiser ser fiel à sua identidade, que é inseparável do humanismo cristão compartilhado tanto pelo Oriente como pelo Ocidente.

3. No contexto deste encontro, também desejo assegurar a Vossa Beatitude que a Igreja de Roma considera com natural admiração a Igreja Ortodoxa da Grécia, pela maneira como ela tem preservado a sua herança de fé e de vida cristã. O nome da Grécia ressoa lá onde o Evangelho é anunciado. Os nomes das suas cidades são familiares aos cristãos do mundo inteiro, através das leituras dos Actos dos Apóstolos e das Cartas de São Paulo. A partir da era apostólica até ao presente, a Igreja Ortodoxa da Grécia tem sido uma rica fonte em que também a Igreja do Ocidente bebe para a sua liturgia, espiritualidade e jurisprudência (cf. Unitatis redintegratio, UR 14).

Um património de toda a Igreja são os Padres, privilegiados intérpretes da tradição apostólica, e igualmente os Concílios, cujo ensinamento constitui um elemento fulcral de toda a fé cristã. A Igreja universal jamais pode esquecer-se daquilo que a cristandade grega lhe transmitiu, nem cessar de dar graças pela duradoura influência da tradição católica.

O Concílio Vaticano II lembrou aos católicos o amor da Igreja ortodoxa pela liturgia, mediante a qual os fiéis "entram em comunhão com a Santíssima Trindade, feitos "partícipes da natureza divina"" (Unitatis redintegratio, UR 15). Ao oferecer louvores litúrgicos agradáveis a Deus ao longo dos séculos, ao anunciar o Evangelho mesmo em épocas de escuridão e de dificuldade, ao apresentar uma didaskalia infalível, inspirada nas Escrituras e na grandiosa Tradição da Igreja, a Igreja Ortodoxa da Grécia deu vida a uma plêiade de Santos que intercedem por todo o Povo de Deus junto do Trono da Graça. Nos Santos, testemunhamos o ecumenismo da santidade que, com a ajuda de Deus, um dia há-de instaurar a plena comunhão entre nós, o que não consiste numa absorção nem numa fusão, mas num encontro na verdade e na caridade (cf. Slavorum Apostoli, 27).

4. Beatitude, desejo enfim expressar a esperança de que possamos caminhar juntos pelos caminhos do Reino de Deus. Em 1965, mediante um acto conjunto, o Patriarca Ecuménico Atenágoras e o Papa Paulo VI eliminaram e cancelaram da memória e da vida da Igreja a sentença da excomunhão entre Roma e Constantinopla. Este gesto histórico manifesta-se-nos como uma admoestação, a fim de trabalharmos cada vez mais ardentemente pela unidade, segundo a vontade de Cristo. A divisão entre os cristãos constitui um pecado contra Deus e um escândalo perante o mundo. É um impedimento à difusão do Evangelho, porque torna a nossa proclamação menos credível. A Igreja católica está convencida de que deve fazer tudo o que está ao seu alcance para "preparar o caminho do Senhor" e para "endireitar as suas veredas" (cf. Mt Mt 3,3); e ela compreende que isto deve ser realizado em companhia dos outros cristãos em diálogo fraternal, em cooperação e em oração. Se determinados modelos de reunião do passado já não correspondem ao impulso para a unidade, que o Espírito Santo despertou nos cristãos em toda a parte nos últimos tempos, devemos ser ainda mais abertos e atentos àquilo que o Espírito está a dizer hoje às Igrejas (cf. Ap Ap 2,11).

Neste tempo pascal, o meu pensamento volta-se para o encontro no caminho de Emaús. Sem o saberem, os dois discípulos caminhavam com o Senhor ressuscitado, que lhes ensinava, interpretando-lhes as Escrituras, "começando por Moisés e seguindo por todos os profetas" (Lc 24,27). Todavia, no início eles não compreendiam este ensinamento. Eles só o entenderam quando os seus olhos se abriram e O reconheceram. Nesse momento, eles perceberam o poder das Suas palavras, enquanto diziam um ao outro: "Não estava o nosso coração a arder cá dentro, quando Ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?" (Lc 24,32). A busca da reconciliação e da plena comunhão significa que também nós devemos estudar as Escrituras, a fim de aprendermos de Deus (cf. 1Th 4,9).

Beatitude, com fé em Jesus Cristo, "o Primogénito dos mortos" (Col 1,18) e num espírito de caridade e de esperança amorosa, desejo assegurar-lhe que a Igreja católica está irrevogavelmente comprometida no caminho da unidade com todas as Igrejas. Somente desta forma o único Povo de Deus brilhará no mundo como sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano (cf. Lumen gentium, LG 1).




AOS BISPOS CATÓLICOS DA GRÉCIA


Atenas, 4 de Maio de 2001




Caríssimos Bispos católicos da Grécia

1. Este nosso encontro reveste para mim uma importância e um significado muito particular. É esta a razão pela qual o esperei com viva ansiedade. É a vós que me ligam os vínculos de mais forte comunhão. Vós sois, no sentido mais estrito, a minha família na Grécia e é nesta dimensão de intimidade que quero dirigir-vos a minha palavra do mais íntimo do coração.

Quero afirmar-vos, antes de mais, o meu afecto de pai e de irmão e a admiração sincera que nutro por vós, que guardais o rebanho da Igreja católica em condições, por vezes, muito difíceis. Tendes a vosso cuidado, em muitas ocasiões, comunidades que são pequenas e dispersas e sois os seus Pastores no verdadeiro sentido do termo. Vós reforçais com a vossa pessoa e o vosso ministério o laço de unidade visível, e sois a voz da pregação da Palavra e os primeiros dispensadores da vida sacramental para as comunidades católicas deste País. E é precisamente pelo trabalho destes contactos que sois particularmente amados pelos vossos fiéis e que as vossas visitas constituem motivo de grande alegria espiritual. Nesta dimensão de um episcopado itinerante há qualquer coisa que recorda a antiguidade cristã, de que esta terra da Grécia é um vivo testemunho.

2. Nesta terra vivem irmãos e irmãs da Igreja ortodoxa, aos quais nos une um fortíssimo laço de fé no mesmo Senhor. Como queríamos que todos os corações se abrissem e os braços se escancarassem para acolher a saudação fraterna da paz! Quanto sonhamos que os Pastores desta terra ilustre, quer pertençam à Igreja ortodoxa ou à católica, superadas as dificuldades do passado e enfrentando com coragem e espírito de caridade as do presente, se sentissem ao mesmo tempo responsáveis pela única Igreja de Cristo e da sua credibilidade aos olhos do mundo.

Se no passado, as vicissitudes históricas, ligadas a mentalidades e costumes do tempo, afastaram os corações, a memória é para o cristão acima de tudo o sacrário que guarda o testemunho vivo do Ressuscitado. É a memória que torna possível a Tradição, à qual tanto devem as nossas Igrejas; à memória é confiado o Sacramento, que é a garantia da graça operante: "Fazei isto em memória de mim", exorta-nos o Senhor na última Ceia.

A memória é para o cristão um sacrário demasiado alto e nobre para que possa ser corrompido pelo pecado dos homens. Certamente, isto pode ferir dolorosamente o tecido da memória, mas não rasgá-lo; tal tecido é como a túnica inconsútil do Senhor Jesus, que ninguém ousou dividir.
Meus caros Irmãos, trabalhemos sem descanso para que a memória torne a fazer resplandecer as grandes coisas que Deus fez em nós; levantemos o olhar da mesquinhez e da culpa, e contemplemos no céu o trono do Cordeiro, onde a eterna liturgia de louvor é cantada por homens de veste branca, de todos os povos e raças. Lá, eles contemplam o rosto de Deus, não mais "per speculum et in aenigmate" (por espelho ou em imagem), mas como é realmente. A memória deixa, lá em cima, espaço à plenitude, na qual não há mais lágrimas, nem morte, porque as coisas antigas passaram.

3. Vós sois Bispos de fronteira: precisamente pelas condições particulares em que viveis, a vossa sensibilidade se torna exigente e queríeis que os obstáculos que se opõem à plena união, e que tanto sofrimento suscitam em vós e nos vossos fiéis, fossem depressa superados. E assim, enquanto sublinhais os vossos justos direitos, estimulais a Igreja católica, às vezes com impaciência, a dar passos que podem cada vez mais decididamente mostrar as bases comuns que unem as antigas Igrejas de Cristo.

Agradeço-vos por esta apaixonada solicitude, que leva consigo tanta generosidade. Asseguro-vos que partilho convosco a mesma ânsia ardente que vós experimentais, para que a unidade da Igreja possa o mais depressa possível tornar-se visível em toda a sua extensão. Estou de acordo convosco, que se devem continuar os esforços, que o Concílio Vaticano II quis poderosamente apresentar e reforçar, para que a própria Igreja católica se prepare, na articulação interna da sua experiência de cada dia, para se tornar cada vez mais solícita ao colocar as bases para uma melhor compreensão com os fiéis das outras Igrejas, que entretanto não deixarão de empreender a parte que lhes respeita na procura da comunhão.

Mas vós sabeis também que as maturações requerem tempos longos, assimilações prudentes, confrontos francos e prolongados. Isto supõe o exercício da paciência da caridade, para que clero e fiéis possam assimilar e seguir gradualmente as necessárias mudanças, compreendendo-as a partir de dentro e fazendo-se os seus próprios promotores. E não se esqueça que, depois das dolorosas separações do passado, a Igreja católica acumulou uma experiência e esclareceu alguns aspectos da fé de modo específico.

O Espírito Santo pede-nos que tudo isto seja revisto, que podem ser adoptadas novas formas - ou talvez antigas formas redescobertas - mas com a certeza de que nada do depósito da fé seja perdido, ou somente posto na sombra. Foi este duplo esforço de abertura e de fidelidade que inspirou o meu Pontificado. Estou certo de que isto é também a base dos vossos desejos e das vossas aspirações.

4. Durante a vossa visita "ad limina" de 1999 quis oferecer-vos algumas indicações concretas, mesmo de ordem pastoral, que não julgo necessário retomar aqui: elas parecem-me ainda válidas e com elas vos podeis confrontar para a elaboração dos vossos projectos em favor do povo que vos está confiado. Aquilo que me agrada sublinhar hoje é que o Papa está aqui, convosco, nesta mesma terra, a significar para vós uma solidariedade mesmo física, uma estima autêntica e afectuosa, uma proximidade infatigável na lembrança e na oração. Queria poder encontrar um por um os amados filhos e filhas da Igreja católica. A minha peregrinação seguindo os passos de São Paulo encontra comunidades vivas. Estou feliz por rezar com elas e de celebrar com elas a comunhão com o Ressuscitado e entre nós. Acima de tudo, abraço convosco os presbíteros e os diáconos, que guardam, nutrem e reforçam na fé e na caridade as comunidades que lhes estão confiadas, juntamente com os Religiosos e Religiosas, cuja presença é essencial para a Igreja católica na Grécia. Não esqueçamos mais que estas terras de antigo testemunho são santuários da fé e que dos tesouros do passado é necessário tirar força espiritual para desempenhar no mundo de hoje o nosso ministério.

Aos jovens desejo que enfrentem com confiança o caminho da nova Grécia, cada vez mais vivamente integrada na Europa, cada vez mais cosmopolita e, por isso, necessariamente aberta ao diálogo e ao reconhecimento dos direitos de todos, mas também exposta aos perigos de uma secularização desenfreada, que tende a secar a linfa vital que dá força à alma e esperança à pessoa humana. Aos idosos e aos doentes, particularmente próximos da Cruz do Senhor, quero fazer sentir a misericordiosa fraternidade da Igreja.

5. Queridos e amados Irmãos, na multiplicidade das situações pastorais e rituais, vós representais a variedade na unidade no interior da Igreja católica. E toda a Igreja católica vos testemunha hoje, na minha pessoa, a sua solidariedade e o seu amor. Não vos sintais sós, não percais a esperança: o Senhor reserva certamente inesperadas consolações àqueles que se confiam a Ele. Trabalhai sempre unidos, com a doçura da caridade e a coragem da verdade.

Estai certos de que o Papa se lembra de vós e vos acompanha em cada dia, e quotidianamente faz a sua oração por vós, a partir de agora mais fortalecida pela alegria deste encontro.
A vós e às vossas comunidades a minha afectuosa Bênção.




Discursos João Paulo II 2001