Discursos João Paulo II 2001 - Damasco, 8 de Maio de 2001

NA CHEGADA À ILHA DE MALTA


Malta, 8 de Maio de 2001






Senhor Presidente
Membros do Governo
Irmãos Bispos
Senhoras e Senhores

1. É com sincera gratidão a Deus que piso o solo maltês pela segunda vez. A Peregrinação jubilar que estou a realizar por ocasião dos dois mil anos do nascimento de Jesus Cristo trouxe-me a Malta. Depois de ter visitado alguns dos lugares especialmente ligados à história da salvação, no Sinai, na Terra Santa e agora em Atenas e em Damasco, a minha Peregrinação no seguimento dos passos de São Paulo traz-me agora até vós.

2. Obrigado, Senhor Presidente, pelo deferente convite que me transmitiu em nome do Povo maltês. Obrigado pelas amáveis palavras de boas-vindas que me dirigiu hoje aqui. Estou grato também aos ilustres membros do Parlamento, às Autoridades civis e militares, aos membros do Corpo Diplomático e a todas as pessoas que honram este momento com a sua presença.
É com afecto no Senhor que saúdo o Arcebispo D. Mercieca, o Bispo D. Cauchi, acompanhado do Bispo Auxiliar D. Depasquale, assim como os demais Bispos aqui presentes, alguns dos quais representam a vocação missionária da Igreja maltesa, enquanto outros são descendentes de imigrantes malteses. Saúdo os sacerdotes, os diáconos, os religiosos, as religiosas e, de maneira especial, os jovens que se estão a preparar para servir o Senhor no sacerdócio e na vida consagrada. Saúdo também os catequistas e todos aqueles que colaboram de modo activo na missão da Igreja.

Com as palavras do vosso Padroeiro São Paulo, saúdo todo o Povo maltês, sem qualquer excepção: "Graças e paz vos sejam dadas da parte de Deus nosso Pai e do do Senhor Jesus Cristo" (Ph 1,2).

3. A lembrança da minha primeira visita, realizada há onze anos, vem-me à mente de forma espontânea. Recordo-me dos encontros com os sacerdotes, os religiosos, os trabalhadores, os intelectuais, as famílias e os jovens. Vêm-me ao pensamento também a co-Catedral de São João em La Valeta e os Santuários Marianos de Mellieha e de Ta' Pinu, na Ilha de Gozo. Lembro-me ainda da Baía e das Ilhas de São Paulo e, de modo particular, da antiga Gruta, venerada como o lugar onde ele se refugiou.

Recordo-me sobretudo da fé e do entusiasmo dos malteses e dos habitantes da Ilha de Gozo.
São Paulo chegou a Malta como prisioneiro a caminho de Roma, lugar do seu martírio. Aqui ele e os seus companheiros de viagem naufragaram, e depois foram recebidos como podemos ler nos Actos dos Apóstolos "com invulgar humanidade" (28, 2). Aqui ele deu testemunho de Cristo e curou o pai de Públio e outras pessoas doentes da Ilha (cf. Act Ac 28,8). A generosidade do Povo maltês encontrou-se com "a bondade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor" (Tt 3,4). Durante dois milénios fostes fiéis à vocação que nasceu desse singular encontro.

Hoje o Sucessor de Pedro deseja confirmar-vos na mesma fé, encorajando-vos no espírito da esperança e caridade cristãs. Ele reza a fim de que, assim como fizeram os vossos antepassados, também vós deis frutos bons e abundantes. A árvore boa dá frutos bons e abundantes (cf. Mt Mt 12,33-35), como aconteceu com os Veneráveis Servos de Deus, que amanhã terei a alegria de declarar Beatos.

4. Caracterizada pela sua posição na Europa e no Mediterrâneo, Malta é herdeira de uma tradição cultural particularmente rica, cujo centro se encontra no humanismo do Evangelho. Num mundo que está em busca de uma luz segura para orientar as transformações pelas quais está a passar, dispondes de uma herança espiritual e moral perfeitamente capaz de sanar e elevar a dignidade da pessoa humana, de fortalecer o tecido social e de incutir na actividade humana um sentido e significado mais profundos (cf. Gaudium et spes GS 40). Esta é a sabedoria e a visão que Malta pode oferecer à nova era histórica que, lenta mas seguramente, está a surgir.

Queridos Amigos malteses, valorizai a vossa vocação cristã! Sede orgulhosos da vossa herança religiosa e cultural! Olhai para o futuro com esperança e progredi com renovado vigor, a fim de fazer deste novo milénio um tempo de solidariedade, de paz, de amor pela vida e de respeito pela criação de Deus.

5. Confiei esta minha Peregrinação à protecção da Bem-Aventurada Virgem Maria e do Apóstolo Paulo. Invoco a intercessão de ambos sobre todos os habitantes de Malta e da Ilha de Gozo!
Abençoo-vos a todos e, de maneira particular, os enfermos, os idosos e todos aqueles que estão a sofrer no corpo e no espírito.

Il-Mulej ibierek il-poplu kollu ta 'Malta u ta 'Ghawdex!

Deus abençoe o Povo de Malta e de Gozo!




DURANTE O ENCONTRO COM OS


MEMBROS DA SOCIEDADE DA DOUTRINA CRISTÃ


Malta, 9 de Maio de 2001






Senhor Presidente
Autoridades maltesas
Estimados Cardeais e Irmãos Bispos
Dilectos Irmãos e Irmãs

1. Na alegria da Páscoa, faço minhas estas palavras do Senhor ressuscitado: "A paz esteja convosco!". Il-paci maghkom! Agradeço-vos as vossas calorosas boas-vindas. Elas constituem uma demonstração de que a hospitalidade com que outrora foi recebido o Apóstolo Paulo (cf. Act Ac 28,2), ainda hoje existe em Malta. Estou grato pelas amáveis palavras proferidas em nome de ambos os ramos da Sociedade, por parte do seu Superior-Geral, que expressou todo o vosso amor à Igreja e ao Sucessor de Pedro.

2. A Ilha de Malta é um rochedo que sobressai no mar, onde o solo é com frequência estéril e o calor intenso. Até mesmo este lugar onde agora nos encontramos tem o nome de Blata l-Bajda, ou seja, "Rocha Branca". Contudo, ao longo dos séculos Malta tem sido extraordinariamente generosa e fértil nas sendas mais profundas do Espírito. A inabalável fé do Povo maltês assegurou que esta rocha fosse o solo fértil de que nos fala o Evangelho. Nesta terra, o Beato Jorge Preca implantou a Sociedade da Doutrina Cristã, onde ela floresceu nos cem anos da sua vida. Diversamente da figueira da parábola evangélica, que acábamos de ouvir (cf. Lc Lc 13,6-9), produzistes fruto em abundância e por isso, hoje aqui, damos glória e graças a Deus.

O Padre Jorge não só lançou a semente; ele cuidou da pequena planta e alimentou a jovem árvore, de maneira que ela pudesse crescer forte e fecunda, como de facto aconteceu. Florescestes porque as vossas raízes estão profundamente implantadas em Cristo e porque fostes nutridos de forma oportuna pela vida de santidade do Padre Jorge.

Para compreenderdes a vossa vocação de modo mais profundo, pensai na figueira. As suas folhas novas constituem um sinal de que o Verão se aproxima (cf. Lc Lc 21,29-31); na estação quente, a sua sombra oferece abrigo do sol; dá frutos abundantes e doces como alimento; e as Escrituras dizem que o seu fruto tem poderes lenitivos (cf. Is Is 38,21). Trata-se de uma imagem daquilo que sois chamados a ser! Como catequistas, deveis oferecer o alimento doce a todas as pessoas que têm fome de Deus; além disso, haveis de curar os indivíduos que sofrem devido à falta de luz e de amor. Se fizerdes estas coisas, sereis verdadeiramente um sinal da primavera que agora o Espírito Santo está a preparar para a Igreja.

3. Aonde quer que o Padre Jorge fosse pregar, era seguido por multidões de pessoas, que se deixavam cativar pelas suas palavras. Porquê? Porque reconheciam na pregação do Padre Jorge a voz do próprio Jesus. Era o Senhor a quem elas ouviam; elas eram arrebatadas pela atracção irresistível de Cristo, o único eles sabiam-no que podia satisfazer os mais profundos anseios dos seus corações. A beleza da santidade que se encontra de maneira suprema em Jesus e se reflecte nos novos Beatos dos dias de hoje jamais deixarão de atrair o coração humano. Sem dúvida, se pudermos mostrar ao mundo o rosto do Senhor ressuscitado, sensibilizaremos e conquistaremos almas de maneira surpreendente!

4. É nas profundezas da contemplação que descobrimos "a glória de Deus, que se reflecte na face de Criso" (2Co 4,6). Eis por que motivo a vossa regra de vida vos exorta a rezar com frequência e a encontrar-vos regularmente com o vosso director espiritual, que vos serve de guia e companheiro ao longo do caminho da vossa fidelidade. Contemplar a face de Cristo significa estar repleto de energia espiritual para a missão que vos é confiada. À maneira de São Paulo, sois chamados a agir como missionários a partir da contemplação: não apenas como mestres, mas como testemunhas que conseguem falar com poder, uma vez que podeis dizer, como os primeiros discípulos: "Vimos o Senhor!" (Jn 20,25). O Papa Paulo VI escreveu que "o homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas do que os mestres... ou se escuta os mestres, é porque eles são testemunhas" (Evangelii nuntiandi, EN 41). Esta era uma verdade maravilhosa no caso do Padre Jorge e deve ser também verdade no vosso caso, dado que sois seus filhos espirituais.

Na sua Carta aos Gálatas, São Paulo escreve que Deus queria "revelar o seu Filho em mim, para que O anunciasse entre os gentios" (1, 16). Ele não fala de Cristo que se revelou "para mim", mas sim de Cristo que se revelou "em mim". Uma vez que Jesus se revela a Saulo no caminho de Damasco, e que Paulo abre o seu coração para receber este dom, o próprio Apóstolo se torna revelação. Ele está repleto de Cristo, de tal forma que, nessa mesma Carta, pode dizer: "Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim" (2, 20). Toda a sua vida, tudo o que ele faz, diz e pensa, o seu corpo, a sua mente, coração e alma se tornam a revelação de Jesus ao mundo. Eis o mistério da sublime vocação concedida não apenas a São Paulo e ao Beato Jorge Preca, mas de igual modo a cada um de vós.

5. O vosso Fundador tinha uma especial devoção às palavras: "Verbum Dei caro factum est!", baseadas no Prólogo do Evangelho de São João: "O Verbo fez-se homem" (1, 14). Com efeito, é aqui que se encontra o fundamento da vossa vocação e apostolado. Num certo sentido, o Verbo divino faz-se continuamente homem no seu Corpo místico, que é a Igreja. Vós deveis contribuir para isto, fazendo aos outros o que o Padre Jorge fez por vós. Haveis de lançar a semente da palavra de Deus no coração das pessoas, de tal forma que Cristo possa viver nelas! A vós cabe o dever de ensinar a todos crianças, jovens e adultos a contemplar o rosto de Cristo, a ver o Senhor (cf. Novo millennio ineunte, 16), a fim de que a luz da glória de Deus, que brilha no rosto de Cristo, possa reluzir também neles. Este é o "enraizamento da Igreja no tempo e no espaço (que) reflecte... o próprio movimento da Encarnação" (Novo millennio ineunte, 3).

Ao partirdes e dardes continuidade a esta missão sagrada, deixai que as palavras do vosso Fundador ressoem de modo incessante nos vossos corações: MUSEUM Magister, utinam sequatur Evangelium universus mundus! Mestre divino, que o mundo inteiro siga o Evangelho! Enquanto vos confio à intercessão da Virgem Maria, de São Paulo e do Beato Jorge Preca, assim como do Beato Inácio e da Beata Adeodata, também beatificados hoje, concedo a minha Bênção Apostólica a todos os membros da Sociedade da Doutrina Cristã, como penhor da misericórdia infinita em Jesus Cristo, "fiel testemunha e primogénito dos mortos" (Ap 1,5).
Il-paci maghkom!



DISCURSO DO SANTO PADRE

NA CERIMÓNIA DE DESPEDIDA NO

AEROPORTO DE GUDJA


Malta, 9 de Maio de 2001



Senhor Presidente
Senhor Primeiro-Ministro
Excelências
Amado Povo de Malta

1. Como Sucessor de Pedro, devo regressar a Roma, à Sé de Pedro, e aos meus deveres de Pastor da Igreja universal.

Mas não me esquecerei desta visita às Ilhas maltesas. Sobretudo, não olvidarei o Povo maltês! Obrigado por serdes uma parte da minha Peregrinação jubilar nos passos de São Paulo, na "geografia da salvação"!

No final da minha primeira visita, disse-vos que quando voltasse para Roma diria ao Apóstolo Paulo que os malteses são "bons católicos". Agora, direi ao vosso Padroeiro que continuais a fazer o que ele queria: "Combate o bom combate da fé e conquista a vida eterna, para a qual foste chamado" (1Tm 6,12), exactamente como o Beato Padre Jorge, o Beato Inácio e a Beata Adeodata fizeram. Deixo-vos o seu exemplo a seguir e confio-vos à sua intercessão.

2. Obrigado, Senhor Presidente, pela sua amabilidade pessoal durante a minha brevíssima visita. Estou grato também ao Primeiro-Ministro, ao Governo, às Forças Armadas, à Força da Polícia e a todos aqueles que, de alguma maneira, colaboraram para a realização desta Peregrinação. Sei que o fizestes com sacrifício e amor. E agradeço-vos do íntimo do meu coração.

A minha visita foi um momento de intensa comunhão com o Arcebispo D. Mercieca, os Bispos D. Cauchi e D. Depasquale, com os sacerdotes, os religiosos e os fiéis leigos. Às Igrejas que estão em Malta e em Gozo, só digo isto: sede fiéis a São Paulo, vosso pai na fé nestas Ilhas, e permanecei firmes na união com Pedro e com a Igreja universal. Desta forma, sereis sempre fiéis a Cristo.

3. Malta encontra-se no centro do Mediterrâneo. Portanto, tendes a singular vocação de ser construtores de pontes entre os povos da bacia mediterrânea, entre a África e a Europa. O futuro da paz no mundo depende do fortalecimento do diálogo e da compreensão entre as culturas e as religiões. Dai continuidade à vossa tradição de hospitalidade e ao vosso compromisso nacional e internacional em benefício da liberdade, da justiça e da paz.

4. Agora que a minha Peregrinação jubilar chega ao fim, confio solenemente os povos dos lugares que visitei à protecção amorosa de Deus Omnipotente. Nos lugares ligados à celebração dos dois mil anos do nascimento do Salvador, esperei e rezei por uma grande renovação da fé entre os cristãos. Fiz questão de encorajar os fiéis e todas as pessoas de boa vontade a defender a vida, a promover o respeito pela dignidade de cada ser humano, a salvaguardar a família contra as inúmeras ameaças do tempo presente, a abrir os seus corações aos pobres e explorados do mundo inteiro e a trabalhar por uma ordem internacional, no respeito da lei e na solidariedade para com os menos afortunados.

Esta é também a tarefa e o ideal que te deixo a ti, querido Povo de Malta.
Nos Actos dos Apóstolos, São Lucas escreve que os malteses "os cumularam [a São Paulo e aos seus companheiros] de honras e, na altura da partida, os proveram do que [lhes] era necessário" (28, 10). Espiritualmente, tive a mesma experiência e agora parto louvando a Deus no meu coração, por todos vós.

Obrigado, Malta!

Il-Bambin iberikkom ilkoll!

Deus vos abençoe a todos!



 DISCURSO DO SANTO PADRE

AOS PARTICIPANTES NA

ASSEMBLEIA PLENÁRIA DAS


PONTIFÍCIAS OBRAS MISSIONÁRIAS


11 de Maio de 2001




Senhor Cardeal
Venerados Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio
Estimados Directores nacionais
Colaboradores e Colaboradoras das Pontifícias Obras Missionárias

1. É para mim uma grande alegria encontrar-me convosco, por ocasião da vossa Assembleia anual. Dirijo a minha saudação, em primeiro lugar, ao Senhor Cardeal Crescenzio Sepe, que há pouco tempo foi nomeado Prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos, enquanto lhe agradeço as palavras que me transmitiu também em vosso nome. Saúdo D. Charles Schleck, Secretário Adjunto da mesma Congregação e Presidente das Pontifícias Obras Missionárias, juntamente com os Secretários-Gerais das quatro Obras. De maneira especial, saúdo-vos a vós, caríssimos Directores nacionais, que nos vossos respectivos países vos dedicais generosamente à animação e à cooperação missionárias. Através de vós, gostaria de fazer chegar os meus sentimentos de gratidão a todos aqueles que, com discrição e no silêncio, trabalham com empenhamento para que o anúncio da Boa Nova se difunda em todos os recantos do mundo.

2. O encontro de hoje tem lugar enquanto ainda ressoa na Igreja e no mundo inteiro o eco do Grande Jubileu, que não foi apenas uma "memória do passado", mas uma "profecia do futuro". Na Carta Apostólica Novo millennio ineunte, escrevi que "é nossa obrigação... lançar-nos para o futuro que nos espera" (n. 3). Fruto do Jubileu é olhar para a frente, em atitude de fé e de esperança cristã, para viver com paixão o presente e abrir-nos com confiança ao futuro, na certeza de que "Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e sempre" (He 13,8)! Espera-nos um novo e fecundo período de evangelização.

Portanto a missão, que é tarefa de todos os fiéis, seja de maneira especial o vosso compromisso. Dedicai-vos incessantemente à animação, à formação e à cooperação missionárias; tende a coragem de ousar e a sabedoria do discernimento, projectando e desenvolvendo todas as iniciativas úteis ao serviço de Cristo. Assim, correspondendo aos dons do Espírito, haveis de contribuir para a obra da salvação universal, objectivo fundamental para o qual devemos sempre tender com confiança constante.

3. Nos dias que precederam este vosso encontro anual, coadjuvados por estudiosos e especialistas, reflectistes sobre a figura do Venerável Paolo Manna, Fundador da Pontifícia União Missionária, obra esta que o meu Predecessor Paulo VI definiu como "alma das Obras Missionárias". Paolo Manna constitui um luminoso exemplo de audácia apostólica. Estimulado pelo fogo do amor a Cristo, fundou uma nova Obra, indicando possibilidades inéditas, e novas e audazes fronteiras para a missão. Ele viveu e comunicou aos seus colaboradores uma constante tensão para Deus, que "deseja que todos os homens se salvem e conheçam a verdade" (1Tm 2,4). A sua preocupação com o empenhamento de todos, especialmente dos sacerdotes e dos religiosos, revelou-se providencial para uma sensibilização mais completa dos pastores e dos fiéis.

Seja este também o vosso incessante anseio, estimados Directores nacionais, a fim de que, com a ajuda da graça divina, aumentem as vocações missionárias "ad gentes" e sejam cada vez mais generosas e repletas de paixão. Penso sobretudo nas pessoas que dedicam ao trabalho missionário toda a sua existência. A este propósito, sinto a necessidade de agradecer uma vez mais a quantos, mesmo no meio de dificuldades de todos os tipos, com o olhar fixo em Jesus autor e consumador da fé (cf. Hb He 12,2), perseveram no anúncio e no testemunho, sem se preocupar com os riscos, e prontos até mesmo ao sacrifício da sua própria vida. Deus não deixará de fazer sentir a sua presença e consolação. Quantas vezes a morte destas testemunhas da fé abre inesperadas possibilidades ao Evangelho do amor e da paz! Esta invencível paixão por Cristo é um singular e eloquente testemunho para os homens da nossa época.

4. Estamos a viver na aurora de um novo milénio, tempo de graça, tempo oportuno (cf. 2Co 6,2). O Senhor associa-nos a si mesmo, como fez com os seus primeiros discípulos, e convida-nos a "fazer-nos ao largo" (cf. Lc Lc 5,4), enquanto como escrevi na conclusão da Carta Encíclica Redemptoris missio alvorece "uma nova época missionária" (n. 92). Todos os fiéis são chamados a "preparar os caminhos do Senhor" (cf. Mt Mt 3,3), abandonando todo o temor e hesitação. Todos são convidados a aceitar, embora conscientes da sua própria pobreza, o convite de Cristo: "Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Nova a toda a criatura" (Mc 16,15).

Jesus chama-nos e envia-nos como fez com os Apóstolos; não nos escolhe com base nos nossos méritos ou nas nossas obras; pelo contrário, sustenta-nos e fortalece-nos com o seu "Espírito... de fortaleza, amor e sabedoria" (2Tm 1,7). Somente "armados" com a sua graça é que poderemos levar a Boa Nova até aos extremos confins da terra. Dificuldades e obstáculos não deterão os nossos passos, porque o nosso sustento permanente será o amor do Pai celestial por todo o género humano.

Caríssimos Irmãos e Irmãs, confio-vos a vós e a quantos fazem parte das vossas Comunidades, às mãos misericordiosas de Maria, Mãe da Igreja e Estrela da Evangelização. Orientados por Ela, levai a toda a parte o Evangelho do seu Filho divino, nosso único Redentor. Quanto a mim, acompanho-vos com a oração e, do íntimo do coração, abençoo-vos a vós e àqueles que, em muitas regiões da terra, trabalham pela animação, formação e cooperação missionárias.




AOS MEMBROS DO CONSELHO GERAL DOS


MISSIONÁRIOS DO ESPÍRITO SANTO


12 de Maio de 2001





Queridos Missionários do Espírito Santo

1. A paz do Ressuscitado e a presença do seu Espírito estejam sempre convosco! Agradeço-vos de coração esta visita que me faz a vossa Cúria Geral e agradeço ao Superior-Geral, Padre Jorge Ortiz González, as carinhosas palavras que me dirigiu.

O nosso encontro está em sintonia com o que o meu Predecessor São Pio X teve em 1913 com os Veneráveis Servos de Deus Ramón Ibarra y González, Arcebispo de Puebla, e Conceição Cabrera de Armida, que lhe pediram a autorização para o início da fundação. Foi naquela ocasião que recebestes o nome de Missionários do Espírito Santo, do qual o vosso Fundador, o Venerável Servo de Deus, Padre Félix de Jesus Rougier, disse que constituía "o programa da vossa vida religiosa e sacerdotal".

Continuai com ânimo renovado a obra que a Igreja vos confiou! Sei que enquanto Cúria Geral tendes uma tarefa específica, delineada na indicação que o Espírito Santo traçou no vosso XIII Capítulo Geral: "Entrar no terceiro Milénio conscientes de que, consagrados pela missão, é necessário aprofundar e orientar, com fidelidade criativa, o vosso trabalho pastoral".

Queridos filhos, prossegui o trabalho delicado que vos compete, e sob a orientação do Espírito Santo, ajudai os vossos irmãos para que ofereçam na Igreja um testemunho eloquente de unidade e caridade pastoral.

2. Desejo convidar-vos, nesta ocasião, a fixar o olhar no Rosto de Cristo; foi o que pedi a toda a Igreja na minha última Carta apostólica Novo millennio ineunte (cf. n. 16-28). De acordo com o carisma que recebestes, contemplai-o ungido pelo Espírito Santo, para anunciar a Boa Nova aos pobres e proclamar o ano de graça do Senhor (cf. Lc Lc 4,18-19); olhai para ele quando emprega o seu tempo e os seus esforços para seguir de perto o caminho espiritual dos seus discípulos (cf. Mc Mc 6,7-13 Mc Mc 6,30-33). Por conseguinte, o vosso modelo é Jesus Sacerdote, compassivo e misericordioso; Jesus Vítima voluntária de um amor que se consagra em cada momento até dar a vida pela salvação de todo o género humano e que ressuscita glorioso.

Desta contemplação surge a urgência de uma conversão pessoal e comunitária profunda e continuada, que requer, como dizia o vosso Fundador, que renoveis a vossa atenção amorosa a Deus, de forma a poder encontrá-l'O na oração quotidiana, na experiência sacramental, na escuta atenta da Palavra.

3. Na vida da Igreja e de cada Instituto religioso a unidade é favorecida pela contemplação do Ressuscitado e pela escuta atenta da Palavra. Desejaria recordar-vos que procurar, promover e rezar pela comunhão é tarefa de todos. Não se trata da uniformidade que faz perder as próprias características, mas do esforço por encarnar todos juntos, a riqueza do corpo comunitário, movidos pelo mesmo Espírito e comprometidos em realizar uma missão idêntica. Como disse o Senhor: "É por isto que todos saberão que sois Meus discípulos: se vos amardes uns aos outros" (Jn 13,35).

O XIII Capítulo Geral traçou, para o vosso Instituto, pontos claros de renovação acerca da promoção da santidade no Povo de Deus. Trata-se de construir juntos um mundo mais justo e humano em que todos se sintam irmãos segundo o desígnio de Deus. Por isso, o Capítulo pediu-vos que dinamizeis significativa e efectivamente o vosso serviço aos sacerdotes e às Obras da Cruz. Ao mesmo tempo orientou-vos para vos renovardes e empenhardes no exercício ministerial da direcção espiritual.

4. Estimulados pelo Espírito, "Duc in altum" (Lc 5,4), fazei-vos ao largo, transformando o vosso compromisso em orientações pastorais que correspondam às exigências do vosso carisma e às necessidades das comunidades que vos foram confiadas.

Orientai os vossos esforços para a difusão de uma verdadeira e própria pedagogia da santidade (cf. Carta apostólica Novo millennio ineunte, 31) conscientes de que "todos os fiéis, seja qual for o seu estado ou classe, são chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade" (Constituição dogmática Lumen gentium, LG 40).

Por isso, considerando que as vossas Constituições privilegiam os sacerdotes entre os destinatários da vossa missão pastoral (205), devereis renovar a consciência de que a chamada à santidade "diz respeito antes de tudo a nós, Bispos e a vós, caríssimos sacerdotes. Antes de interpelar o nosso "agir", interpela o nosso "ser". "Sede santos diz o Senhor porque Eu sou santo" (Lv 19,2)" (Homilia da Missa Crismal, n. 2; ed. port. de 21 de Abril de 2001, pág. 6).

Na minha Exortação apostólica Pastores dabo vobis encontrareis indicações úteis e sugestões pormenorizadas que darão luz ao vosso procedimento neste ministério especial. Deixai-vos guiar pelo Espírito Santo, para que seja Ele mesmo quem vos estimula na vossa fidelidade criativa. A colaboração fraterna com os bispos e presbíteros diocesanos é um caminho privilegiado para construir, de acordo com o vosso carisma, a Igreja-comunhão.

5. Devereis continuar a empenhar-vos, com todos os que partilham a mesma espiritualidade, na construção de uma verdadeira comunhão eclesial. "O novo século há-de ver-nos empenhados mais intensamente na valorização e desenvolvimento dos sectores e instrumentos que, segundo as grandes directrizes do Concílio Vaticano II, servem para assegurar e garantir a comunhão" (Carta apostólica Novo millennio ineunte, 44; cf. 43-45). Convido-vos a promover, entre os membros da Família da Cruz, "uma espiritualidade da comunhão, elevando-a ao nível de princípio educativo em todos os lugares onde se plasma o homem e o cristão, onde se educam os ministros do altar, os consagrados, os agentes pastorais, onde se constroem as famílias e as comunidades" (Ibid., 43).

Além disso, como escrevi na Exortação apostólica Pastores dabo vobis, "é preciso redescobrir a grande tradição do acompanhamento espiritual pessoal, que sempre deu tantos e tão preciosos frutos, na vida da Igreja" (n. 40). Continuai com alegria e empenho o vosso estudo e preparação no que as vossas Constituições chamam "o mais característico dos vossos meios pastorais" (229).

6. O vosso Capítulo Geral quis tratar o tema das vocações e a internacionalização do Instituto visto a partir da óptica do mandato que a Igreja recebe do Ressuscitado: "Ide, pois, ensinai todas as nações" (Mt 28,19) e em recordação da figura e dos anseios do vosso Fundador (cf. XIII Capítulo Geral, Prioridade, 3).

A vivência alegre e generosa da vossa consagração, uma maior definição nos vossos ministérios pastorais e o amor fraterno nas vossas comunidades, se transformem num convite dirigido a todos os que procuram o seguimento radical de Jesus na vocação religiosa e sacerdotal. "Além de promover a oração pelas vocações, é urgente empenhar-se, através de um anúncio explícito e uma catequese adequada, para favorecer nos que são chamados à vida consagrada aquela resposta livre, pronta e generosa, que torna operante a graça da vocação" (Exortação apostólica Vita consecrata, VC 64).

Queridos filhos, ao regressardes à vossa pátria, recordai-vos das palavras de Jesus: "E Eu estarei sempre convosco, até ao fim do mundo" (Mt 28,20). O Espírito Santo vos acompanhe sempre e vos dê força para continuar a obra que a Igreja vos confiou.

Entrego-vos aos braços maternos de Maria, Mãe da Igreja, para que entreis no Novo Milénio repletos de alegre esperança.




AOS PARTICIPANTES NA ASSEMBLEIA DA C.E.I.


SOBRE A PASTORAL NO CAMPO DA SAÚDE


Quinta-feira, 17 de Maio de 2001

1. Estou feliz por dar as boas-vindas a todos vós, que durante estes dias reflectis sobre a presença da Igreja no mundo da saúde, da doença e do sofrimento. Dirijo a minha saudação, em primeiro lugar, ao Cardeal Camillo Ruini, Presidente da Conferência Episcopal Italiana, e ao Bispo D. Javier Lozano Barragán, Presidente do Pontifício Conselho para a Pastoral da Saúde, e agradeço-lhes as suas palavras cordiais. Saúdo os outros Prelados aqui presentes, de maneira especial D. Alessandro Plotti, Arcebispo de Pisa e Vice-Presidente da Conferência Episcopal Italiana, e D. Benito Cocchi, Bispo de Módena e Presidente da Comissão Episcopal da Conferência Episcopal Italiana para o serviço da caridade e a pastoral no campo da saúde.

Além disso, faço extensiva a minha saudação a todas as pessoas que vivem na enfermidade e no sofrimento, às suas famílias e a quantos cuidam delas. Como desejei escrever na Mensagem deste ano para o Dia Mundial do Doente, quero ir, verdadeira e espiritualmente, todos os dias visitar quem sofre, para "me deter ao lado dos enfermos, dos familiares e do pessoal que trabalha no campo da saúde" (Ed. port. de L'Osservatore Romano de 2 de Setembro de 2000, pág. 7, n. 3).

Esta vossa Assembleia, significativa por muitos motivos, insere-se no caminho empreendido pela Igreja italiana para uma promoção da pastoral da saúde, que seja cada vez mais activa. Encorajo-vos a prosseguir ao longo deste caminho, para que seja reconhecida à pastoral da saúde toda a sua força de testemunho evangélico, em plena fidelidade ao mandato de Cristo: "Ide, proclamai o Reino de Deus e curai os enfermos" (cf. Lc Lc 5,1-2 Mt 10,7-9 Mc 3,13-19).

2. Reunistes-vos para aprofundar o sentido e as modalidades com que actualizar este mandato de Cristo nos dias de hoje. De um atento discernimento das actuais realidades socioculturais, sem dúvida surgem indicações concretas sobre qual deve ser a presença da Igreja no campo do cuidado da saúde, melhorando a sua qualidade e identificando os seus novos percursos de inserção apostólica.

A este propósito é útil recordar, como eu escrevia na Carta Apostólica Novo millennio ineunte, que "não se trata de inventar um "programa novo". O programa já existe: é o mesmo de sempre, expresso no Evangelho e na Tradição viva. Concentra-se, em última análise, no próprio Cristo" (n. 29).

E na Mensagem para o VIII Dia Mundial do Doente, durante o Grande Jubileu do Ano 2000, eu observava: "Jesus não só purificou e curou os enfermos, mas foi também um incansável promotor da saúde através da sua presença salvífica, do ensinamento e da acção... N'Ele, a condição humana mostrava o rosto remido, e as aspirações humanas mais profundas encontravam a sua própria realização. Ele quer comunicar esta harmoniosa plenitude de vida aos homens de hoje" (Ed. port. de L'Osservatore Romano de 14 de Agosto de 1999, pág. 6, n. 10). Sim, Jesus veio para que todos "tenham vida e a tenham em abundância" (Jn 10,10). E que âmbito, mais do que o da saúde e do sofrimento, espera o anúncio, o testemunho e o serviço do Evangelho da vida?
Imitando Cristo, que assumiu o rosto "doloroso" do homem a fim de o tornar "glorioso", a Igreja é chamada a percorrer o caminho do homem, especialmente quando ele sofre (cf. Redemptor hominis, RH 7,14 Redemptor hominis, 7, 14 e 21; cf. também Salvifici doloris, 3). A sua acção vai ao encontro da pessoa enferma para a escutar, cuidar e curar as suas feridas, abrindo-a para a compreensão do sentido e do valor salvífico da dor.

Jamais se insistirá suficientemente e vós fizeste-lo nesta Assembleia sobre a necessidade de pôr no centro a pessoa, tanto do doente como dos agentes que trabalham no campo da saúde.

3. A Igreja estima aquilo que os outros fazem neste campo e oferece às estruturas públicas a sua contribuição para corresponder às exigências de uma cura integral da pessoa.

Nisto, ela é impelida e sustentada por uma visão da saúde que não seja uma simples ausência da doença, mas uma tensão para a harmonia completa e o sadio equilíbrio a níveis psíquico, espiritual e social. Propõe um modelo de saúde que se inspira na "salvação salutar", oferecida por Cristo: uma oferta de saúde "global", "integral", que cura o enfermo na sua totalidade. Assim, a experiência humana da doença é iluminada pela luz do Mistério pascal. Experimentando o afastamento do Pai, Jesus crucificado dirige-lhe o seu pedido de ajuda mas, num acto de amor e de confiança filial, abandona-se nas Suas mãos. No Messias crucificado no Gólgota, a Igreja contempla a humanidade que, com confiança, estende a Deus os seus braços dolorosos. Ela aproxima-se com compaixão e solidariedade dos indivíduos que vivem no sofrimento, fazendo seus os sentimentos da misericórdia divina. Este serviço ao homem provado pela doença exige a estreita colaboração entre os agentes no campo da saúde e da pastoral, os assistentes espirituais e o voluntariado no sector médico. A este propósito, como é preciosa a acção das várias associações eclesiais de agentes no campo da saúde, tanto de tipo profissional, incluindo médicos, enfermeiros e farmacêuticos, como de tipo mais explicitamente pastoral e espiritual!

4. Quanto a isto, merecem uma menção especial as Instituições religiosas que, fiéis ao seu carisma, continuam a desempenhar um papel importante neste sector. Enquanto agradeço a estas Instituições, tanto masculinas como femininas, o seu testemunho que mesmo no meio de não poucas dificuldades elas oferecem com generosidade e competência, peço-lhes que salvaguardem e tornem cada vez mais reconhecível o seu carisma nas actuais situações.

Formulo votos sinceros para que ao seu serviço público jamais falte o justo reconhecimento por parte das autoridades civis. Além disso, trata-se de um serviço que exige um vigoroso e convicto investimento no sector da formação específica dos agentes que trabalham no campo da saúde.

Trata-se de "obras da Igreja", património e diaconia do evangelho da caridade para quantos têm necessidade de cuidados médicos. A tais obras nunca deve faltar o apoio de toda a Comunidade eclesial.

Caríssimos Irmãos e Irmãs! Eis um campo privilegiado em que a Igreja é chamada a testemunhar a presença do Senhor ressuscitado. A todos aqueles que estão comprometidos neste serviço, gostaria de reiterar aquilo que escrevi na mencionada Carta Apostólica Novo millennio ineunte:

"Sigamos em frente, com esperança! Diante da Igreja abre-se um novo milénio, como um vasto oceano em que se aventurar com a ajuda de Cristo" (n. 58). Que no início deste século se apresse o passo de quem é chamado, como o Bom Samaritano, a cuidar do homem ferido que sofre.

Maria, que do Céu vela maternalmente sobre as pessoas provadas pela dor, seja o sustento constante de quantos se dedicam a aliviá-la.

Com estes sentimentos, é de bom grado que concedo a todos uma especial Bênção apostólica.




Discursos João Paulo II 2001 - Damasco, 8 de Maio de 2001