Discursos João Paulo II 2001 - Astana, 23 de Setembro de 2001

VISITA PASTORAL AO CAZAQUISTÃO


ENCONTRO DO SANTO PADRE


COM OS REPRESENTANTES DO MUNDO DA CULTURA,


DA ARTE E DA CIÊNCIA


Astana, 24 de Setembro de 2001






Senhor Presidente da República
Gentis Senhoras, Ilustres Senhores!

1. É com grande alegria que me encontro convosco esta tarde. Apresento a todos a minha respeitosa e cordial saudação, enquanto agradeço sentidamente a quem, com nobres palavras, exprimiu os sentimentos de todos os presentes. Aceitei de bom grado o convite para passar alguns momentos convosco, para manifestar mais uma vez a atenção e a confiança com que a Igreja Católica e o Papa olham para os homens da cultura. De facto, estou bem consciente do insubstituível contributo que podeis dar ao estilo e aos conteúdos da vida da humanidade, com a investigação honesta e a eficaz expressão do verdadeiro bem.

Homens da cultura, da arte e da ciência! O Cazaquistão é herdeiro de uma história que as vicissitudes complexas, e muitas vezes dolorosas, enriqueceram de tradições diversas, de forma que fizeram dele hoje um exemplo singular de sociedade multi-étnica, multicultural e multiconfessional. Sede orgulhosos da vossa Nação e conscientes da grande tarefa que tendes de preparar o seu futuro. Penso, de modo particular, nos jovens que têm o direito de esperar de vós um testemunho de ciência e de sabedoria, que lhes é transmitido através do ensino e sobretudo com o exemplo da vida.

2. O Cazaquistão é um grande País, que ao longo dos séculos cultivou uma cultura local viva e rica de fermentos, graças também ao contributo de representantes da cultura russa, aqui confinados pelo regime totalitário.

Quantas pessoas percorreram esta vossa Terra! Apraz-me recordar, em particular, o diário do viajante e comerciante veneziano Marco Polo que, já na Idade Média, descreveu com admiração as qualidades morais e a riqueza das tradições dos homens e das mulheres da estepe. A grande extensão das vossas planícies, o sentido da humana fragilidade alimentado pelo desencadear das forças da natureza, a percepção do mistério escondido por detrás dos fenómenos experimentados pelos sentidos, tudo favorece no vosso povo a abertura às interrogações fundamentais do homem e a exploração de respostas significativas para a cultura universal.

Ilustres Senhores e Senhoras, vós sois chamados a difundir no mundo a rica tradição cultural do Cazaquistão: tarefa árdua e ao mesmo tempo fascinante, que vos empenha a descobrir os elementos mais profundos para os reunir numa síntese harmoniosa.

Um grande pensador da vossa Terra, o mestre Abai Kunanbai, exprimia-os assim: "O homem não pode ser homem se não tiver a percepção dos mistérios visíveis e escondidos do universo, sem procurar uma explicação para cada coisa. Aquele que renuncia a isto em nada se distingue dos animais. Deus diferencia o homem do animal dotando-o de uma alma..." (Ditos de Abai, cap. 7).

3. Como não captar a profunda sabedoria destas palavras, que parece que desenvolvem um comentário à perturbadora pergunta feita por Jesus no Evangelho: "Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro se perder a sua alma?" (Mc 8,36).Existem no coração do homem perguntas insuprimíveis, as quais, se o homem as ignora, não se torna mais livre, mas mais frágil, acabando muitas vezes à mercê da própria instintividade, e também da prepotência do próximo.

"Se o coração nada mais deseja diz ainda Abai Kunanbai / quem pode despertar o pensamento? / ... Se a razão se abandona à vontade, / perde toda a sua profundidade. / ... Pode um povo digno deste nome dispensar a razão?" (Poesia 12).

Perguntas como esta são por sua natureza religiosas, no sentido de que evocam aqueles valores supremos que têm em Deus o seu fundamento último. Por sua vez a religião não pode deixar de se confrontar com estas interrogações existenciais sob pena de perder o contacto com a vida.

4. Os cristãos sabem que em Jesus de Nazaré, chamado Cristo, é dada uma resposta que satisfaz as interrogações que o homem leva no coração. As palavras de Jesus, os seus gestos e, finalmente, o seu Mistério pascal revelaram-no como Redentor do homem e Salvador do mundo. Desta "boa nova", que há dois mil anos corre nos lábios de numerosos homens e mulheres em todas as partes da terra, o Papa de Roma é hoje diante de vós humilde e convicta testemunha, no pleno respeito da busca que outras pessoas de boa vontade estão a realizar por caminhos diferentes.

Quem encontrou a verdade no esplendor da sua beleza não pode deixar de sentir a necessidade de fazer participantes dela também os outros. Antes de ser uma obrigação derivante de uma norma, para o crente trata-se da necessidade de partilhar com todos o Valor da própria existência.

Por isso mesmo no contexto de uma sadia laicidade do Estado, chamado por sua função a garantir a cada cidadão, sem diferença de sexo, raça ou nacionalidade, o direito fundamental à liberdade de consciência é preciso afirmar e defender o direito do crente a testemunhar publicamente a sua fé. Uma autêntica religiosidade não se pode reduzir à esfera do privado nem fechar-se em espaços restritos e marginais da sociedade. A beleza dos novos edifícios sagrados, que se começam a ver quase em todas as partes do novo Cazaquistão, é um sinal precioso de renascimento espiritual e deixa prever o futuro.

5. Os próprios centros da educação e da cultura só poderão tirar proveito da abertura ao conhecimento das experiências religiosas mais vivas e significativas na história da Nação. Na Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 1 de Janeiro de 2001 fiz uma advertência contra a "homologação servil" da cultura ocidental, observando que "devido à sua elevada conotação científica e técnica, os modelos culturais do Ocidente apresentam-se atraentes e sedutores, mas revelam infelizmente, de forma cada vez mais clara, um progressivo empobrecimento humanista, espiritual e moral. A cultura que os gera caracteriza-se pela dramática pretensão de realizar o bem do homem pondo Deus, o sumo Bem, de lado" (n. 9).

Ouvimos ainda o grande mestre Abai Kunanbai: "A prova da existência de um Deus único e omnipotente é que há vários milénios, os homens falam em línguas diferentes desta existência e todos, qualquer que seja a sua religião, atribuem a Deus o amor e a justiça. Na origem da humanidade, estão o amor e a justiça. Aquele no qual dominam os sentimentos do amor e da justiça é um verdadeiro sábio" (Ditos de Abai, cap. 45).

Neste contexto, e precisamente aqui, nesta Terra, aberta ao encontro e ao diálogo, e perante uma assembleia tão qualificada, desejo reafirmar o respeito da Igreja Católica pelo Islão, o autêntico Islão: o Islão que reza, que sabe ser solidário com quem se encontra em necessidade.

Recordando-nos dos horrores do passado também recente, todos os crentes devem unir os seus esforços, para que jamais Deus seja refém das ambições dos homens. O ódio, o fanatismo e o terrorismo profanam o nome de Deus e desfiguram a autêntica imagem do homem.

6. Apraz-me ver e saudar em vós aqui presentes, ilustres Senhores e Senhoras, outros tantos "investigadores da verdade", empenhados em transmitir às novas gerações deste grande País os valores sobre os quais fundar a própria existência pessoal e social. Sem um firme enraizamento nestes valores, a vida é como uma árvore com ramos frondosos, que o vento da prova pode facilmente sacudir e arrancar.

Obrigado Senhor Presidente, obrigado Senhores e Senhoras representantes do mundo da cultura do Cazaquistão. No final deste encontro, que num certo sentido conclui a minha visita ao vosso maravilhoso País, desejo garantir, juntamente com a colaboração efectiva, a oração mais sincera do Papa e de toda a Igreja Católica ao Deus Altíssimo e Omnipotente, para que o Cazaquistão, fiel à sua natural vocação euro-asiática, continue a ser terra de encontro e de acolhimento, na qual os homens e as mulheres dos dois grandes Continentes possam viver longos dias de prosperidade e paz.

Desejo agradecer cordialmente este encontro com a cultura cazaque. O encontro com a cultura é sempre o coração do encontro com um povo. Agradeço-vos por me terdes aberto este coração que é a vossa cultura, na conclusão da minha visita ao vosso País. Muito obrigado.

Permanecerá para sempre na minha memória e no meu coração esta visita ao Cazaquistão. Estou-vos grato por quanto fizestes por mim, por tudo o que fizeram o Senhor Presidente e os seus colaboradores. Ao Cazaquistão, a todo o seu povo e à sua sociedade, aos representantes do Governo, à Igreja do Cazaquistão, a todas as comunidades religiosas, desejo a Bênção de Deus, por muitos anos, num futuro renovado.

Desejo muitos anos, muitos anos ao Presidente, aos Representantes do Estado e a todo o povo.



MENSAGEM DO SANTO PADRE


POR OCASIÃO DO 40° ANIVERSÁRIO DA


ACÇÃO EPISCOPAL ADVENIAT







Ao meu venerado Irmão no Episcopado D. Franz Grave
Presidente da Acção Episcopal ADVENIAT

1. Há quarenta anos, a Assembleia Plenária da Conferência Episcopal Alemã decidiu introduzir pela primeira vez, durante os serviços litúrgicos do Santo Natal, uma colecta a favor da Igreja na América Latina. Esta decisão de 30 de Agosto de 1961 é o início da exímia obra de cooperação e de solidariedade entre as Igrejas particulares na Alemanha e entre as Igrejas locais no Continente latino-americano, que em seguida assumiu o nome de Acção Episcopal ADVENIAT e, nos anos da sua existência, contribuiu de maneira essencial para reforçar e promover o compromisso na evangelização da América Latina.

2. Também eu desejo inserir-me entre as pessoas que dão graças a Deus pela generosidade com que os católicos alemães suberam satisfazer o desejo do meu venerado Predecessor, o Beato João XXIII, e sustentaram com oferendas as Igrejas na América Latina, para ali realizarem alguns projectos eclesiais.

Com gratidão e estima especiais, recordo dois Cardeais que se distinguiram de maneira especial:

Joseph Frings, Arcebispo de Colónia, e Franz Hengsbach, Bispo de Essen, podem considerar-se os herdeiros desta obra episcopal. O meu reconhecimento vai também para toda a Conferência Episcopal Alemã, que conseguiu promover e dar impulso a um empreendimento tão significativo.

De igual forma, agradeço a todos os benfeitores e aos inúmeros "simples" fiéis que, ano após ano, sustentaram activamente com a sua contribuição os irmãos e irmãs na América Latina. O Senhor, que vê também o que está escondido, vos há-de recompensar abundantemente pela vossa bondade (cf. Mt Mt 6,2-4).

3. Hoje, depois de quarenta anos de colaboração na Igreja, podemos olhar repletos de alegria para esta colheita abundante, fruto do amor grande e inexaurível dos católicos alemães pelas suas Igrejas irmãs na América Latina. Isto garantirá a ajuda na formação dos sacerdotes, religiosos e catequistas, assim como na edificação de igrejas, capelas, seminários, centros paroquiais e conventos. Pôr-se-ão à disposição também automóveis e outros meios de transporte, além de inúmeros outros instrumentos úteis para a obra de evangelização e para as necessidades da pastoral.

Desta forma, os católicos alemães responderam juntamente com os seus Pastores ao grande desafio pastoral de ir ao encontro das necessidades materiais, que pesam sobre as Igrejas particulares, ricas de fé mas não raro pobres em infra-estruturas religiosas. Num certo sentido, os católicos alemães participam também na particular solicitude que o Sucessor de Pedro nutre pelos irmãos e pelas irmãs na América Latina, e têm cada vez mais em consideração o facto de que são membros da Igreja universal.

4. Os gestos concretos de afecto para com as Igrejas irmãs, a assistência económica e outros sinais de solidariedade exprimem o mistério da Igreja como Communio: todos nós somos membros de um único Corpo, e Cristo é a sua Cabeça. Desejo expressar a minha estima também pela geminação entre as Dioceses alemãs e as latino-americanas que foram criadas com a contribuição de ADVENIAT e, no intercâmbio recíproco de dar e de receber, deram óptimos e abundantes frutos de solidariedade.

Graças à obra incansável de ADVENIAT, criou-se uma sólida rede de ligação entre as Igrejas na Alemanha e as Igrejas particulares na América Latina, cujos países receberam a luz de Cristo há mais de 500 anos e cujos habitantes representam quase metade dos católicos do mundo inteiro.
Essas regiões distinguem-se por uma identidade cultural em que o Evangelho está profundamente inserido. Ao mesmo tempo, ali existe uma Igreja viva que deseja dar início à obra de evangelização (cf. Discurso à Pontifícia Comissão para a América Latina, 23 de Março de 2001).

5. Para os católicos alemães, a riqueza e a vitalidade da Igreja no "continente da esperança" devem constituir um encorajamento a viver a sua fé com intensidade e convicção cada vez maiores, como São Paulo recomendou sentidamente à Igreja de Corinto, em relação à Igreja de Jerusalém:

"No tempo presente, a vossa abundância supra a sua indigência para que também a sua abundância venha suprir a vossa indigência. Só assim reinará a igualdade" (2Co 8,14).
Formulo votos a fim de que o estreito vínculo entre as vossas Igrejas locais e as Igrejas da América Latina produzam frutos abundantes inclusivamente na Alemanha, de tal forma que a Igreja se renove e seja orientada para aquela ""medida alta" da vida cristã", que realcei na minha Carta Apostólica Novo millennio ineunte (n. 31).

6. No início do terceiro milénio, exorto os Pastores e os fiéis da Alemanha a "guardar o tesouro da graça recebida" no Ano jubilar, "traduzindo-a em ardentes propósitos e directrizes concretas de acção" (Ibid., n. 3), de tal forma que possam florescer e prosperar obras tão importantes e positivas como ADVENIAT, para uma solidariedade eclesial mundial.

Oxalá o Senhor, por intercessão da Virgem de Guadalupe, protectora da América, cumule o vosso coração com as dádivas do amor e acompanhe as acções que levais a cabo em benefício dos irmãos e das irmãs mais pobres, unidos na fé!

Com estes bons votos, concedo-vos do íntimo do coração a minha Bênção apostólica.

Castelgandolfo, 30 de Agosto de 2001.



MENSAGEM DO SANTO PADRE


AO PRESIDENTE INTERNACIONAL DO


EXÉRCITO DA IMACULADA








Ao Rev.do Padre

EUGÉNIO GALIGNANO

O.F.M. Conv.
Presidente Internacional
do Exército da Imaculada

1. Tomei conhecimento com grande interesse de que este Centro Internacional do Exército da Imaculada, apoiado pelas Pontifícias Faculdades Teológicas "São Boaventura" e "Marianum", às quais se une a Associação Mariológica Interdisciplinar Italiana, promoveu o Congresso internacional "Massimiliano Maria Kolbe no seu tempo e hoje. Aproximação interdisciplinar à personalidade e aos escritos".

Ao exprimir a minha complacência pela iniciativa, saúdo-te cordialmente a ti, Rev.do Padre, aos Senhores Cardeais, aos venerados Irmãos no Episcopado, às Autoridades Académicas, ao Ministro-Geral e aos Frades Menores Conventuais, aos Relatores do Congresso e a todos os que participam neste acontecimento tão significativo.

O Congresso, sessenta anos depois do heróico martírio do Padre Maximiliano Maria, realça como é actual o seu testemunho e como o seu pensamento está presente na reflexão actual da teologia católica. O gesto extraordinário do Mártir de Oswiecim oferece a oportunidade, através de uma investigaçao interdisciplinar, de compreender melhor a sua fifura e a sua obra; de aprofundar as suas penetrantes intuições teológicas e espirituais na óptica da nova evangelização e do renovado impulso missionário que empenham a Igreja do terceiro milénio.

2. Como homem que conheceu profundamente os anseios e as aspirações dos seus contemporâneos, Maximiliano Maria Kolbe soube distinguir em cada cultura a presença vivificante de "sementes do Verbo" e, através de um diálogo confiante e amoroso com Aquela que gerou no tempo o Filho de Deus, esforçou-se por valorizá-la para uma obra corajosa de evangelização. A Imaculada foi para ele, além de "doce Mãe", exemplo e critério de fidelidade absoluta ao plano salvífico de Deus.

Desde a juventude desejou ser completamente e sem condições de Maria, Aquela que Deus destinou, a partir da eternidade, como Mãe do Filho. A Bem-Aventurada foi a criatura que melhor soube aceitar o plano da redenção que a Santíssima Trindade quisera, em Cristo, para toda a humanidade. "Quantos mistérios sobre Cristo escreveu S. Maximiliano terá revelado única e exclusivamente à tua alma imaculada aquele Espírito Divino que vivia e actuava em ti" (SK, 1236).
Estava profundamente convicto de que quem está com Maria é dócil ao sopro do Paráclito, sabe colher a inspiração e pode aderir plenamente a Cristo. A quem deseja conhecer e pregar o Evangelho, parece que ele sugere que se aproxime com confiança da Imaculada, porque ela conheceu profundamente os mistérios do Filho de Deus.

A Igreja, na sua caminhada confiante rumo ao cumprimento do reino de Deus, continua a anunciar a Boa Nova num mundo que muda, fiel à herança recebida, mas consciente de que os métodos e as palavras devem ser adequadas à mentalidade do homem de hoje. São Maximiliano soube falar e fazer-se compreender pelos seus contemporâneos; soube ser fiel a Deus e fiel ao homem na verdade e na santidade.

3. Padre Kolbe deixou esta herança aos seus Irmãos, os Menores Conventuais e, através do seu empenho e testemunho, a toda a comunidade cristã. O Exército da Imaculada, por ele fundado e recentemente reconhecido pública e ineternacionalmente como Associação de fiéis, reuniu de modo especial esta consagração a Maria, para que o Evangelho continue a ser generosamente anunciado a todos e seja luz para toda a humanidade. Oxalá este Congresso, através das diferentes aproximações à personalidade e aos escritos do Santo mártir da caridade, contribua para aprofundar os conteúdos de doutrina e os métodos apostólicos ao serviço da obra evangelizadora da Igreja.

Com estes sentimentos, ao confiar-te a ti, Reverendo Padre, aos participantes no Congresso e a todos os membros do Exército da Imaculada r celeste protecçao da Bem-Aventurada Virgem Maria e à intercessão de S. Maximiliano Maria Kolbe, concedo de coração a todos uma especial Bênção apostólica.

Castelgandolfo, 18 de Setembro de 2001.



VISITA PASTORAL AO CAZAQUISTÃO



DE DESPEDIDA DA NAÇÃO


Astana, 25 de Setembro de 2001




Senhor Presidente
Venerados Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
Ilustres Senhoras e Senhores

1. Estamos prestes a concluir estes dias memoráveis, que me permitiram encontrar, aqui em Astana, muitas pessoas e conhecer de perto numerosas forças vivas do povo cazaque.

Acompanhar-me-á por muito tempo a recordação da minha permanência nesta nobre Nação, rica de história e de tradições culturais.

Obrigado pelo gentil e cordial acolhimento que me foi reservado. Obrigado, Senhor Presidente, pela sua amável hospitalidade, testemunhada de muitas formas! Agradeço também às Autoridades administrativas, militares e religiosas, assim como a quantos prepararam a minha visita e cuidaram da organização dos seus pormenores: a todos e a cada um, dirijo a expressão do meu mais profundo reconhecimento.

Ficaram impressas na minha alma as palavras que escutei nos vários momentos que vivemos juntos. Conheço bem as esperanças e as expectativas deste querido povo, que pude encontrar e estimar mais profundamente. Um povo que sofreu anos de dura perseguição, mas que não hesita em retomar com energia o caminho do seu desenvolvimento. Um povo que quer construir um futuro sereno e solidário para os seus filhos, porque ama e procura a paz.

2. Cazaquistão, Nação rica de séculos de história, tu bem sabes como a paz é importante e urgente! Por conformação geográfica, és uma Terra de fronteira e de encontro. Aqui, nestas imensas estepes, encontraram-se e continuam a encontrar-se pacificamente homens e mulheres pertencentes a diferentes etnias, culturas e religiões.

Cazaquistão, com a ajuda de Deus, oxalá possas crescer unido e solidário! Estes são os cordiais bons votos que renovo, retomando o lema inspirador de toda a visita: "Amai-vos uns aos outros!" (cf. Jo Jn 13,34). Estas comprometedoras palavras de Jesus, pronunciadas na vigília da sua morte na Cruz, iluminaram e cadenciaram as etapas desta minha peregrinação.

"Amai-vos uns aos outros!". Este País, onde convivem homens e mulheres de diversas origens, tem necessidade de entendimentos sólidos e de relações sociais estáveis. Não é um exagero, afirmar que o vosso País tem uma uma vocação totalmente singular: a de ser, de maneira cada vez mais consciente, uma ponte entre a Europa e a Ásia. Esta seja a vossa opção civil e religiosa. Sede uma ponte de homens que abraçam outros homens, pessoas que transmitam a plenitude de vida e de esperança.

3. Enquanto me despeço de ti, querido povo cazaque, quero assegurar-te que a Igreja continuará a caminhar ao teu lado. Em íntima colaboração com as outras Comunidades religiosas e com cada homem e mulher de boa vontade, os católicos não deixarão faltar o seu apoio para que, juntos, se possa edificar uma casa conjunta, cada vez mais ampla e hospitaleira.

Aqui, a busca do diálogo e da harmonia distinguiu as relações entre o Cristianismo e o Islão desde o período da formação do Canato turco nos imensos teritórios das vossas estepes, permitindo que o País se tornasse um elo de união entre o Oriente e o Ocidente, no extenso caminho da seda.

Nesta perspectiva, também as novas gerações devem prosseguir com compromisso renovado.
"Amai-vos uns aos outros!" É desta palavra do Senhor que depende a nossa credibilidade de cristãos. E é o próprio Jesus que nos admoesta: "É por isso que todos saberão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros" (Jn 13,35).

4. Exortando os cristãos a um intenso despertar espiritual, o Grande Jubileu do Ano 2000 convidou-os a ser testemunhas do amor, para enfrentar os desafios do terceiro milénio. Sede-o incessantemente também vós! Estai prontos a responder à necessidade da "paz, frequentemente ameaçada com o pesadelo de guerras catastróficas" (Novo millennio ineunte, 51). Sede sentinelas vigilantes, atentas ao "respeito pela vida de cada ser humano" (Ibid.).

Sede testemunhas do amor também vós, homens e mulheres das outras religiões, que tendes a peito a sorte do vosso povo! A pergunta com que se interrogava Abai Kunanbai interpela todos: "Se me foi dado o nome de homem / posso eu deixar de amar?" (Poesia 12). Agora, no momento em que me despeço de vós, quero fazer ressoar esta interrogação: pode um ser humano deixar de amar?

Como Sucessor do Apóstolo Pedro, percorrendo de novo com a mente os numerosos acontecimentos que assinalaram a história do século passado, repito-vos: olhai para o futuro com confiança! Vim para o meio de vós como peregrino de esperança, e agora preparo-me para retomar o caminho do regresso, não sem emoção e saudade. Levarei comigo as recordações destes dias; levarei comigo a certeza de que tu, povo cazaque, não faltarás à tua missão de solidariedade e de paz.

Agradeçamos ao Senhor porque nos concedeu estes dias e o bom tempo, a fim de que pudéssemos apreciar a beleza do Cazaquistão.

Deus te abençoe, Cazaquistão, e te proteja sempre!



VIAGEM APOSTÓLICA À ARMÉNIA


DISCURSO DO SANTO PADRE DURANTE


A CERIMÓNIA DE BOAS-VINDAS NO


AEROPORTO "ZVARTNOTZ" DE IEVERAN


25 de Setembro de 2001





Senhor Presidente
Santidade
Queridos Amigos da Arménia

1. Dou graças a Deus Omnipotente porque hoje, pela primeira vez, o Bispo de Roma se encontra no solo arménio, nesta antiga e amada terra, acerca da qual assim cantava o vosso grande poeta Daniel Varujan: "Das aldeias até aos horizontes / se expande a maternidade da vossa terra" (A chamada das terras). Há muito tempo que esperava este momento de graça e alegria, e de modo especial desde as visitas ao Vaticano realizadas por Vossa Excelência, Senhor Presidente, e por Vossa Santidade, Patriarca Supremo e Catholicos de todos os Arménios.

Estou-lhe profundamente grato, Senhor Presidente, pelas amáveis palavras de boas-vindas que me dirigiu em nome do Governo e dos habitantes da Arménia. Agradeço também às Autoridades Civis e Militares, bem como ao Corpo Diplomático acreditado na Arménia, por me terem apresentado hoje as boas-vindas. Ao dirigir-me a Vossa Excelência, Senhor Presidente, desejo tornar extensivos os sentimentos da minha estima e amizade não só aos concidadãos que vivem na pátria, mas também aos milhões de arménios espalhados por todo o mundo, que permanecem fiéis à sua herança e identidade, e hoje olham para a sua terra de origem com renovado orgulho e satisfação. Também no coração deles palpitam os sentimentos expressos por Varujan numa poesia: "É bom para o meu coração imergir-se na vaga luminosa de azul, / naufragar se necessário for nos fogos celestes; / conhecer novas estrelas, a antiga pátria perdida, / de onde a minha alma caída ainda chora a saudade do céu" (Noite na Ásia).

2. Santidade, Catholicos Karekin, abraço com fraterno amor no Senhor Vossa Santidade e a Igreja a que preside. Sem o seu encorajamento, eu não estaria agora aqui, como peregrino em viagem espiritual para honrar o extraordinário testemunho de vida cristã oferecida pela Igreja Apostólica Arménia durante tantos séculos, e sobretudo no século XX, que foi para vós um tempo de indizível terror e sofrimento. No 1700º aniversário da proclamação do Cristianismo como religião oficial desta terra amadíssima, toda a Igreja Católica partilha a vossa profunda alegria e a de todos os arménios.

Desejo abraçar os Irmãos Bispos e todos os fiéis da Igreja Católica na Arménia e das regiões vizinhas, feliz por vos confirmar no amor de nosso Senhor Jesus Cristo, bem como no serviço ao próximo e ao vosso País.

3. Sinto-me profundamente comovido quando penso na gloriosa história do Cristianismo nesta terra, que, segundo a tradição, imita a pregação dos apóstolos Tadeu e Bartolomeu.

Sucessivamente, através do testemunho e da obra de São Gregório, o Iluminador, o Cristianismo tornou-se, pela primeira vez, a fé de uma Nação inteira. Os Anais da Igreja universal afirmam para sempre que o povo da Arménia foi o primeiro, como povo, a abraçar a graça e a verdade do Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo. Desde aqueles tempos épicos, a vossa Igreja jamais cessou de cantar os louvores de Deus Pai, de celebrar o mistério da morte e ressurreição do seu Filho Jesus Cristo, e de invocar a ajuda do Espírito Santo, o Consolador. Vós preservais com zelo a memória dos vossos numerosos mártires, e na verdade o martírio foi uma marca especial da Igreja e do povo arménios.

4. O passado da Arménia é inseparável da sua fé cristã. A fidelidade ao Evangelho de Jesus Cristo contribuirá de igual modo também para o futuro que a Nação está a edificar, depois das devastações do século passado. Senhor Presidente, queridos Amigos, acabastes de celebrar o décimo aniversário da vossa independência. Tratou-se de um passo significativo no caminho rumo a uma sociedade justa e harmoniosa, na qual todos se sintam plenamente como na sua casa e possam ver respeitados os seus legítimos direitos. Todos, e em particular, quantos são responsáveis pela gestão pública, estão chamados a um genuíno empenho pelo bem comum, na justiça e na solidariedade, pondo o progresso do povo diante de qualquer outro interesse parcial. E isto é válido também na urgente busca da paz nesta região. A paz só pode ser construída sobre as bases sólidas do respeito recíproco, da justiça nas relações entre comunidades diferentes, e na magnanimidade por parte dos fortes.

A Arménia tornou-se membro do Conselho da Europa, e isto indica a vossa determinação em trabalhar decididamente e com coragem para realizar as reformas democráticas das instituições do Estado, necessárias para garantir o respeito dos direitos humanos e civis dos cidadãos. São tempos difíceis, mas também tempos que desafiam a Nação e lhe infundem coragem. Cada um deve firmemente tomar a decisão de amar a própria terra e de se sacrificar a si mesmo pelo genuíno desenvolvimento, assim como pelo bem-estar espiritual e material do seu povo!

Deus abençoe o povo arménio com a liberdade, a prosperidade e a paz!



VIAGEM APOSTÓLICA À ARMÉNIA



DURANTE A VISITA DE ORAÇÃO


À CATEDRAL APOSTÓLICA DA ARMÉNIA


Etchmiadzin, 25 de Setembro de 2001





Venerado Irmão
Supremo Patriarca
e Catholicos de todos os Arménios
Caríssimos Irmãos e Irmãs em Cristo
A bênção de Deus desça sobre todos vós!

1. Os meus passos de peregrino trouxeram-me à Arménia, para louvar a Deus pela luz do Evangelho que, há 17 séculos, se espalhou por esta terra a partir deste lugar em que São Gregório, o Iluminador, recebeu a visão celeste do Filho de Deus em forma de luz. A Santa Etchmiadzin eleva-se como grandioso símbolo da fé da Arménia no Filho unigénito de Deus, que desceu do céu, morreu pela nossa redenção do pecado e cuja ressurreição inaugura os novos céus e a nova terra. Para todos os arménios, Etchmiadzin permanece a garantia da perseverança nessa mesma fé, apesar dos sofrimentos e do derramamento do sangue de ontem e de hoje, que a vossa difícil história exigiu como preço da vossa fidelidade. Neste lugar, desejo testemunhar que a vossa fé é a nossa fé em Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem: "Um único Senhor, uma única fé e um único Baptismo" (Ep 4,5).

Aqui, na Santa Etchmiadzin, com a alma repleta de alegria, retribuo o ósculo de paz que Vossa Santidade me concedeu no passado mês de Setembro, junto do túmulo do Apóstolo Pedro em Roma. É com intensa emoção que saúdo Vossa Santidade, os Arcebispos, os Bispos, os monges, os sacerdotes e os fiéis da Igreja Apostólica da Arménia. Como Bispo de Roma, ajoelho-me admirado diante do dom celestial do Baptismo do vosso povo e presto homenagem a este templo, símbolo da Nação que deste o início, segundo a visão de São Gregório, traz nas suas colunas o sinal do martírio.

2. Santidade, obrigado por me ter recebido na sua Casa. É a primeira vez que o Papa de Roma, durante toda a sua estadia num País, permanece na casa de um seu Irmão, que preside a uma gloriosa Igreja do Oriente, e juntamente com ele compartilha a vida quotidiana debaixo do mesmo tecto. Obrigado por este sinal de amor que me comove enormemente e, ao coração de todos os católicos, fala de amizade profunda e de caridade fraterna.

Neste momento, o meu pensamento volta-se para os seus veneráveis Predecessores. Refiro-me ao Catholicos Vazken I, que não poupou energias para que o seu povo pudesse ver a terra prometida da liberdade, e voltou para Deus precisamente no momento em que chegava a independência.

Penso no inesquecível Catholicos Karekin I, que para mim foi como um irmão. O meu projecto de lhe fazer uma visita, quando o mau estado de saúde tinha começado a prevalecer sobre ele, não pôde realizar-se, embora eu o desejasse do íntimo do coração. Este desejo realiza-se hoje, aqui com Vossa Santidade, Irmão igualmente estimado e amado. Espero com ansiedade os próximos dias quando, de mãos dadas com Vossa Santidade, me encontrarei com o povo arménio e juntos daremos graças ao Deus omnipotente pelos 17 séculos de fidelidade a Cristo.

3. Jesus Cristo, Senhor e Salvador, concede-nos compreender a maravilhosa verdade que São Gregório ouviu neste lugar: que "as portas do teu amor pelas tuas criaturas estão abertas de par em par... que a luz que cumula a terra é a pregação do teu Evangelho".

Senhor, torna-nos dignos da graça destes dias. Acolhe a nossa oração conjunta; aceita a gratidão de toda a Igreja pela fé do povo arménio. Inspira-nos palavras e gestos que demonstrem o amor entre os irmãos. É o que te pedimos por intercessão de Maria, a grande Mãe de Deus, Rainha da Arménia, e de São Gregório, a quem o Verbo aqui se manifestou em forma de luz. Amen.




Discursos João Paulo II 2001 - Astana, 23 de Setembro de 2001