Discursos João Paulo II 1979 - 15 de Março de 1979

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS REITORES DE COLÉGIOS


ECLESIÁSTICOS ROMANOS


16 de Março de 1979



Caríssimos Irmãos!

Na conclusão do vosso Congresso anual, desejastes encontrar-vos com o Papa, para receber a sua palavra de encorajamento e de orientação. Devo dizer-vos que também eu desejei este encontro para vos conhecer pessoalmente, para exprimir a minha viva gratidão pelo delicado ministério que realizais como Reitores dos Colégios Eclesiásticos de Roma, e para vos comunicar, com simplicidade e sinceridade, algumas reflexões.

1. Nestes dois dias de reunião meditastes juntos sobre o tema: «Os nossos jovens no contexto juvenil de hoje», analisando-o nos vários aspectos.

Os alunos dos vossos Colégios — seminaristas ou jovens sacerdotes — provenientes de todos os Continentes, devem ser antes de tudo formados para um profundo sentido da Igreja. Devem amar intensamente a Igreja como Cristo a amou e por ela Se entregou (Cfr. Ef Ep 5,25). O Concílio Vaticano II não deixou de inculcar este elemento fundamental para a formação dos sacerdotes: «Os alunos devem deixar-se impregnar do mistério da Igreja ... de modo a darem testemunho da unidade que atrai os homens a Cristo: primeiramente, por um humilde e filial amor ao Vigário de Cristo: depois — uma vez revestidos do sacerdócio — pela sua adesão ao Bispo, como fiéis cooperadores, colaborando em união com seus irmãos no sacerdócio» (Decr. Optatam Totius OT 9). Amor à Igreja, nossa Mãe, que se manifesta concretamente numa responsável e activa acção pessoal, a fim de que Ela se mostre e seja sempre gloriosa, sem mancha nem ruga, nem qualquer coisa semelhante, mas santa e imaculada (Ep 5,27). Quanto mais os seminaristas e os sacerdotes forem santos, tanto mais santa será a Igreja.

2. Os vossos alunos vêm de todas as partes do mundo para esta cidade de Roma, centro geográfico do Catolicismo. Trazem dentro de si o seu temperamento a sua cultura original, as suas variadas experiências históricas, o seu desejo de se prepararem, na diocese do Sucessor de Pedro, para o ministério futuro, que desempenharão nas próprias dioceses e Nações, depois de se terem enriquecido dos grandes valores religiosos e culturais que a Urbe acumulou durante os séculos e continua a oferecer às almas desejosas de verdade, de bondade e de beleza. A experiência da estadia em Roma é, para um seminarista ou para um jovem sacerdote, um verdadeiro dom da Providência: a visita orante às suas esplêndidas Basílicas, às Catacumbas, aos túmulos dos numerosos Mártires e Santos, aos monumentos da sua plurissecular história, complexa e singular, o estudo especializado nas Universidades Pontifícias, a estadia nos Colégios Eclesiásticos: tudo isto incide profundamente na personalidade e na maturação de um jovem.

Faço votos por que os vossos alunos saibam, com são discernimento, colher e entesourar todos estes elementos para a própria formação humana e sacerdotal. Mas, por outro lado, faço votos por que também Roma saiba sempre oferecer estas riquezas espirituais e não desiluda nunca as expectativas e as esperanças destes jovens e não deforme ou destrua a imagem que dela tinham criado. Oxalá eles possam fazer próprias e repetir, sobre a diocese de Roma, as palavras que, com férvido entusiasmo, lhe dirigia Santo Inácio de Antioquia: «A Igreja amada e iluminada na vontade d'Aquele que quis todas as coisas que existem ..., digna de Deus, de veneração e de louvor» (Santo Inácio de Antioquia, Carta aos Romanos, Introd).

3. Desejo, por fim, fazer sinceros votos por que a vida comum que se pratica nos Colégios Eclesiásticos não se reduza a simples conjunto de relações exteriores, mas se reflicta no espírito, que animava a vida dos Apóstolos e dos primeiros discípulos no Cenáculo: Todos ... se entregavam assiduamente à oração, em companhia de ... Maria, Mãe de Jesus (Ac 1,14). Pois bem. É precisamente isto que devem ser os Seminários, os Colégios, os Internatos Eclesiásticos de Roma: verdadeiros Cenáculos, nos quais se respire uma vida de oração intensa, pessoal e comunitária; uma vida de caridade mútua, activa e operosa; uma vida de auxílio espiritual recíproco para haver sempre fidelidade à vocação, e aos sagrados compromissos assumidos perante Deus, a Igreja e a própria consciência.

E em vós, Reitores, saibam os jovens descobrir e reconhecer não só o Superior que deve preocupar-se pelo bom andamento, ordenado e disciplinar, de uma casa, mas o guia sereno, o pai, o irmão, o amigo e, sobretudo o Sacerdote, que no seu comportamento irradia a presença de Cristo (Cfr. Gál Ga 2,20).

Com estes votos, concedo de todo o coração a vós e aos jovens dos vossos Colégios, uma especial Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS ALUNOS DA PONTIFÍCIA ACADEMIA ECLESIÁSTICA


Sábado, 17 de Março de 1979



Desejo exprimir a minha satisfação e a minha alegria por este primeiro encontro convosco, caros Alunos da Pontifícia Academia Eclesiástica, que viestes aqui, seguindo o vosso Presidente, D. Cesare Zacchi, para manifestardes ao Vigário de Cristo sentimentos de dedicação e a vossa promessa sacerdotal de fidelidade.

Agradeço a generosa entrega da vossa juventude à Igreja e ao seu Chefe visível, e é-me agradável, caros sacerdotes, conversar convosco como um pai entre filhos, numa atmosfera de cordialidade e de simplicidade, convosco que iniciastes ou completastes os cursos de preparação para o serviço da Santa Sé nas Representações Pontifícias. natural gostar o Papa de manifestar-vos as suas expectativas e esperanças, e querer animar-vos com todo o vigor a que vos lanceis, com espírito de fé e de confiante entrega ao Senhor, as canseiras apostólicas que vos esperam.

O vosso serviço será, com efeito, eminentemente pastoral, um "diakonia" dirigida para o bem das Igrejas locais, com o fim de tornar cada vez mais eficaz a união delas com a Sé Apostólica. O Representante Pontifício e os seus colaboradores devem ser, nos diferentes Países, um como testemunho visível da presença d'Aquele que foi escolhido, sucedendo a Pedro, para ser o fundamento de unidade e o centro de coesão de toda a Igreja, e recebeu o carisma de confirmar os irmãos (Lc 22,32).

Portanto, na realização do vosso trabalho — não isento de sacrifícios, quase sempre oculto, às vezes não suficientemente apreciado — tende presente que sois ministros de Cristo e administradores dos mistérios de Deus (1Co 4,1), na própria e delicada missão de fornecer Aquele que Jesus quis fosse a rocha da Igreja, uma voz que ressoe nas diversas partes do mundo.

Fácil se torna,. assim, compreender a solicitude com que a Santa Sé acompanha a vossa preparação cultural, com a intenção de vos garantir o fácil uso de todos aqueles instrumentos, noções e conhecimentos, que serão necessários ao exercício do vosso apostolado. Todavia, o que têm mais a peito o Papa e esta Sé Apostólica é a vossa santificação, a vossa vida sacerdotal exemplar e animada por convicções profundas de fé, por uma visão sempre teológica do mundo e da história, pois o padre, como eu disse recentemente aos Párocos e ao Clero de Roma, "está colocado mesmo no centro do ministério de Cristo, que abraça constantemente a humanidade e o mundo, a criação visível e a invisível". Não podereis desempenhar com fruto o vosso ministério especial, se não tiverdes o coração cheio da dedicação a Cristo, a fim de actuardes vós também "in persona Christi", para a salvação dos irmãos. Os conhecimentos humanos, se bem que necessários, das línguas, dos costumes, das tradições e da história dos povos de que vos aproximareis, reduzir-se-iam a coisas vãs e ineficazes, se não levásseis no coração o espírito de Cristo que, ajustando-se ao desígnio salvífico do Pai, se entregou a si mesmo por nós.

Um voto especialíssimo desejo formular para todos quantos, entre vós, estão para deixar a Academia a fim de assumirem em breve o seu primeiro cargo nas diversas Representações Pontifícias: auxilie o Senhor com a sua graça o vosso trabalho; o Papa, estai certos, acompanha-vos com a sua benevolência, o seu afecto e a sua oração.

Invocando sobre todos a protecção da Virgem Santíssima, abençoo de coração e cheio de reconhecimento o vosso amado Presidente, os seus Colaboradores, todo o Corpo docente e cada um de vós com especial afecto, e juntamente as vossas famílias, corno penhor de abundantes dolts e consolações celestiais.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DO 15° CENTENÁRIO


DE SÃO BENTO E DE SANTA ESCOLÁSTICA


18 de Março de 1979

Caríssimos jovens

Sede bem-vindos à Casa do Papa, que agora vos acolhe com grande simpatia e benevolência, acompanhados pelo vosso zeloso Arcebispo, D. Ottorino Alberti; pelo Abade de Subiaco, Padre Stanislau Andreotti; pelas Autoridades civis e por todos os que, ou eclesiásticos ou leigos, constituem a Comissão para as Celebrações do 15.° Centenário do nascimento de São Bento abade e de sua irmã Santa Escolástica, ilustres e venerados filhos da nobre terra umbra, pátria eleita de santos.

Estou muito reconhecido ao Senhor Presidente da Câmara de Áscoli Piceno, pelas palavras que quis dirigir-me, e reconhecido também a vós todos pelo delicado pensamento de terdes aqui vindo receber os meus votos e bênção, antes de começar a marcha da «Fiaccola benedittina» (facho beneditino), que, por vós levada à mão, passará por tantas cidades do Lácio e da Úmbria para chegar por fim a Núrcia, onde ficará acesa durante todo o tempo das festas em honra dos dois santos dessa terra.

Ao acender e benzer este significativo facho, faço votos por que, em todas as cidades e aldeias por onde ele passar, desperte sentimentos de fraternidade, amizade e paz, dos quais São Bento foi apóstolo infatigável no meio dos povos da Europa, que o viram empenhado na acção evangélica para um despertar cristão sob o signo da Cruz e do arado, e do correspondente mote «Ora et labora».

À luz esplendorosa deste facho, oxalá quantos encontrardes no percurso dos caminhos da vossa caravana, todos se sintam irmãos, harmonizem as razões dos dissídios e dos conflitos, que tornam os homens inimigos uns dos outros, e oxalá sejam capazes de perdão recíproco, de respeito, de concórdia e de colaboração. Seja o vosso, de verdade, facho da luz e da paz, num momento em que o egoísmo e a violência, como foi indicado, fazem que se note, mais do que nunca, a necessidade de maior tomada de consciência destes inestimáveis valores cristãos e sociais.

E a vós, caros jovens, que transportais com brio religioso e ao mesmo tempo desportivo esse facho benzido, não posso deixar de dirigir um particular pensamento de satisfação pela generosidade com que levais avante e honrais a tradição cristã da vossa terra e a pondes em prática, também no singular e comprometedor campo do desporto, não menos que no das virtudes cristãs, magistralmente descritas por São Bento, quando, no capítulo IV da sua Regra, recomenda ao monge, e depois a todo o cristão, que seja «não soberbo, não violento, não comilão, não sonolento, não preguiçoso, não murmurador, não detractor ... mas casto, manso, zeloso, humilde e obediente». Procurai conhecer, um pouco melhor e um pouco mais profundamente, as raízes de que provém tão bela maneira de viver e testemunhar a fé religiosa de cada um. Continuai neste sulco limpidamente traçado pelo vosso Santo conterrâneo e trazei-lhe o contributo da vossa pessoa e da vossa obra.

São estes os votos que por vós formulo de todo o coração, pedindo, para vós e convosco, ao vosso e meu São Bento que vos proteja sempre com a sua poderosa intercessão. Dê eficácia a estes votos a Bênção Apostólica, que de coração concedo a todos vós e às vossas famílias.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


NO ENCONTRO COM OS JOVENS


NA BASÍLICA VATICANA


Quarta-feira, 21 de Março de 1979



Este vosso encontro com o Papa, caros meninos e meninas, parece assumir hoje significado especial pela circunstância em que se realiza: a chegada da primavera. Esta circunstância confere à minha saudação de "boas-vindas", que dirijo a cada um de vós com paternal afecto, uma tonalidade mais viva e variada, porque traz à mente a vossa condição; sois a primavera da vida, a primavera da Igreja, a primavera de Deus. Cheguem, pois, a vós a minha saudação amorosa e os meus votos, como me são sugeridos pelo Livro Sagrado: Desabrochai como roseira plantada à beira das águas, como incenso exalai perfume, florescei como o lírio, difundi perfume, entoai um canto de louvor e bendizei o Senhor por todas as suas obras (Si 39,17-9).

Para tais votos não ficarem em pura expressão verbal, mas se transformarem em consoladora realidade, tende presente que a natureza nada concede que seja belo sem esforço e sem trabalho. O tempo quaresmal ensina-nos precisamente qual deve ser a actividade generosa do cristão para que se tenha a primavera do espírito, o reflorescer do bem e o ressurgir a vida nova com Jesus e em Jesus. Para a consecução de tão maravilhosa finalidade, a Igreja, Mãe sábia e amorosa, indica-nos os meios aptos, como são exactamente a oração, o jejum e a esmola. Com a oração toma-se contacto, estabelece-se um diálogo vivo e interessante com o Senhor.

O jejum, sobre o qual desejo hoje chamar brevemente a vossa atenção, é o segundo elemento necessário para a primavera do espírito. Ele, mais que simples abstinência de comestíveis ou alimento material, representa uma realidade complexa e profunda. O jejum é um símbolo, é um sinal, é um chamamento sério e estimulante para aceitar ou realizar renúncias. Que renúncias? Renúncias ao "eu", isto é, a tantos caprichos ou aspirações doentias; renúncia aos próprios defeitos, à paixão dominante e aos desejos ilícitos. Jejum é saber dizer um "não" seco e decisivo a tudo o que é sugerido ou requerido pelo orgulho, pelo egoísmo, pelo vício, dando ouvidos à própria consciência, respeitando o bem alheio e conservando a fidelidade à santa Lei de Deus. Jejum significa pôr limite a tantos desejos, às vezes bons, para se ter o domínio pleno de si, para aprender a regular os próprios instintos, para habituar a vontade ao bem. Gestos destes recebiam antigamente o nome de "florinhas" ou obséquios. Muda o nome, mas fica a substância. Eram e continuam a ser actos de renúncia, realizados por amor do Senhor ou de Nossa Senhora, com uma nobre finalidade para conseguir. Eram e são um "desporto", um treino insubstituível para se ficar vencedor nas competições do espírito. Jejum significa, por fim, privar-se dalguma coisa para valer à necessidade dum irmão, tornando-se o jejum desse modo exercício de bondade e caridade.

O jejum, compreendido, praticado e vivido desse modo, torna-se penitência, isto é conversão a Deus, na medida em que purifica o coração das numerosas escórias do mal, embeleza a alma de virtudes, habitua a vontade ao bem, e dilata o coração para receber a abundância da divina graça. Em tal conversão torna-se a fé mais sólida, a esperança mais alegre e a caridade mais activa.

Convertidos para Deus, cheios do Espírito do Senhor, tereis no coração uma alegria verdadeira, profunda e avassaladora; mostrareis um sorriso genuíno e conquistador; vereis a vossa juventude como dom estupendo, digno de ser vivido em plenitude e em autenticidade de vida, humana e cristã.

Com estas breves considerações, que desejo despertem eco profundo no ânimo e no proceder que tendes, recebei, como prova de grande benevolência e penhor de abundantes graças do céu, a minha Bênção paternal, que de coração torno extensiva às vossas famílias e a todas as pessoas que vos são queridas.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À COMISSÃO ECONÓMICA E SOCIAL


DAS COMUNIDADES EUROPEIAS


22 de Março de 1979

Senhora, Senhores

Por ocasião da vossa reunião em Roma, manifestastes o desejo desta visita. Tenho muito prazer em vos receber.

Como Responsáveis e Membros da Comissão económica e social das Comunidades europeias ou dos Conselhos económicos e sociais dos Estados membros, ofereceis um contributo importante a toda esta parte da Europa ocidental que procura viver numa simbiose mais desenvolvida — ao nível das suas produções e das suas trocas económicas — do seu património cultural, das suas realidades sociais e das suas instituições jurídicas e políticas. Esta articulação é um grande projecto que merece estima e incentivo, e desperta em muitas pessoas esperanças de progresso, embora levantando também problemas difíceis, que têm profundas repercussões na vida das populações. Aqueles a quem competem as decisões devem, é claro, poder beneficiar de estudos, pareceres, sugestões e conselhos de peritos competentes. E para isso vós contribuís em grande escala. O que me parece muito apreciável é a vossa solicitude e a vossa possibilidade de associar os vossos grupos responsáveis: chefes de empresa, trabalhadores e representantes de grandes sectores económicos e profissionais.

A Igreja católica, como tal, não tem competência nestes campos técnicos. Alegra-se, porém, vendo que se alarga a fraternidade e que toma corpo a comunidade, dentro do respeito da identidade e da liberdade de cada um. Faz sobretudo votos por que os protagonistas não descuidem nenhum aspecto deste vasto conjunto humano, por que a sua ética esteja à altura dos seus projectos económicos e sociais, por que os direitos duns e doutros sejam tomados em consideração e por que se promovam as instituições fundamentais que asseguram a justiça social, a vida familiar e o progresso humano e espiritual.

É neste espírito que invoco sobre os vossos trabalhos e as vossas pessoas as Bênçãos de Deus.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


À PEREGRINAÇÃO DA ARQUIDIOCESE DE NÁPOLES


Sala Paulo VI

Sábado, 24 de Março de 1979



Caríssimos Irmãos e Irmãs da Arquidiocese de Nápoles

Escutando a voz do vosso coração cristão e o convite do vosso venerado Pastor, o Cardeal Corrado Ursi, e dos vossos Sacerdotes, viestes ter com o Papa, numa peregrinação majestosa que me traz comoção. Sede bem vindos vós todos, trabalhadores e fiéis que encheis esta Basílica sem par.

E sede bem vindos também vós, estudantes e jovens, que na Sala Paulo VI estais agora ouvindo a minha voz, e com quem dentro de pouco terei também o prazer de encontrar-me. Enquanto falo, sinto-vos perto, embora a Basílica Vaticana não tenha bastante lugar para vos conter a todos.

Que vos hei-de dizer senão o meu "obrigado" pela vossa bondade? Que manifestar-vos senão o elogio da vossa fé?

Sim, dilectos fiéis de Nápoles. Fé religiosa e bondade de alma juntam-se magnificamente nas vossas tradições cristãs e nos vossos costumes de vida. E eu dirijo a vós aqui presentes, e a todos os vossos concidadãos, a minha saudação mais sentida e cordial: às Autoridades religiosas e civis; aos homens do estudo, da técnica e do trabalho; às mães de família; aos anciãos; aos jovens que assomam aos horizontes e às responsabilidades da vida; às crianças e aos meninos que alegram as famílias com a sua jovial confiança; aos doentes e aos que sofrem e a todos os que por qualquer motivo sentem algum desgosto na alma. Recebam todos a saudação do Vigário de Cristo.

A vossa Nápoles, tão sugestiva no maravilhoso espectáculo do céu e do mar, cheios de luz e de azul, é cidade fiel, é cidade boa, e é também cidade que sofre por tantos motivos, não sendo o último a insidiosa e funesta doença que subtraiu tão numerosas crianças ao afecto dos que tanto as amavam. E eu, como Pastor e Pai, comprazendo-me com a vossa fé e unindo-me à vossa dor, desejo recolher no meu coração todas as vossas alegrias e todas as vossas preocupações, dizendo cam o Salmista: Oh, como é bom e agradável viverem os irmãos em harmonia! (Ps 132,1).

Nos primeiros tempos da Igreja, em Jerusalém, em Antioquia e em Roma, os cristãos iam ter com Pedro para ouvir a sua palavra, escutar as suas experiências, e delas tirarem coragem e fervor espiritual. Assim viestes também vós ouvir do Sucessor dele uma palavra de amor e de vida. E eu, inspirando-me no tempo quaresmal, que estamos vivendo, e na minha primeira Carta Encíclica, falar-vos-ei brevemente da presença de Cristo Redentor na nossa vida quotidiana.

1 — Jesus é, primeiro que tudo, o sustentáculo do nosso sofrimento.

O sofrimento é realidade terrivelmente verdadeira e às vezes mesmo atroz e dilacerante. Dores físicas, morais e espirituais afligem a pobre humanidade de todos os tempos. Devemos ser reconhecidos à ciência, à técnica, à medicina e às organizações sociais e civis que procuram de todos os modos eliminar ou pelo menos aliviar o sofrimento; mas ele fica sempre vitorioso e a derrota pesa sobre o homem aflito e impotente. Mais, quase parece que a maior progresso social corresponde um regresso moral, com a consequência doutros sofrimentos, receios e inquietações.

O sofrimento é também realidade misteriosa e perturbadora.

Mas nós, cristãos, olhando para Jesus Crucificado, encontramos a força para aceitar este mistério. O cristão sabe que, depois do pecado original, a história humana é sempre risco, mas sabe também que o próprio Deus quis entrar na nossa dor, provar a nossa aflição e passar através da agonia do espírito e da laceração do corpo. A fé em Cristo não destrói o sofrimento, mas ilumina-o, eleva-o, purifica-o, sublima-o e torna-o valioso para a eternidade.

Em qualquer pena nossa, moral ou física, olhemos para o Crucifixo. Reine, bem visível e venerado, o Crucifixo nas vossas casas. Só ele nos pode confortar e animar. Amemos o Crucifixo, como queria o vosso grande Teólogo e Doutor da Igreja, Santo Afonso Maria de Ligório.

2 — Em segundo lugar, Jesus é o fundamento da nossa alegria.

A alegria cristã é realidade não fácil de descrever, porque é espiritual e faz parte, ela mesma, do mistério. Quem verdadeiramente crê que Jesus é o Verbo Encarnado, o Redentor do homem, não pode deixar de experimentar no íntimo um sentimento de imensa alegria, que é consolação, paz, entrega, resignação e alegria. Dizia o Salmista: Provai e vede como o Senhor é bom (Si 33, Si 33,9). 0 filósofo e cientista francês Blaise Pascal, na famosa noite da conversão, escreveu no Testamento: "Alegria! Alegria! Choro de alegria!". Não apagueis esta alegria que nasce da fé em Cristo, Crucificado e Ressuscitado. Testemunhai a vossa alegria. Aprendei a gozar esta alegria.

— É a alegria da luz interior sobre o significado da vida e da história;

— É a alegria da presença de Deus na alma, por meio da "graça";

— É a alegria do perdão de Deus, por meio dos seus Sacerdotes, quando por desgraça se ofendeu o Seu amor infinito, mas depois, arrependido, se volta aos seus braços de Pai;

— E a alegria da expectativa da felicidade eterna, graças à qual a vida é entendida como "êxodo", peregrinação, embora não cessem ás responsabilidades quanto ao andar do mundo.

Também a nós, como aos Apóstolos, diz Jesus: Digo-vos isto para que a minha alegria esteja em vás e o vosso gozo seja completo (Jn 15,11). Ninguém vos poderá tirar esta alegria (Jn 16,23).

3 — Por fim, Jesus é a garantia da vossa esperança.

O homem não pode viver sem esperança; todos os homens esperam em alguém ou em algo.

Mas, infelizmente, não faltam muitas desilusões e, por vezes, raia-se mesmo pelo abismo do desespero. Mas nós sabemos que Jesus Redentor, morto, crucificado e gloriosamente ressurgido, é a nossa esperança. "Surrexit Christus spes mea!".

Jesus diz-nos que, apesar das dificuldades da vida, vale a pena comprometermo-nos com vontade tenaz e benéfica na construção e no melhoramento da "cidade terrestre", com ânimo sempre lançado para a eterna. O cristão consome-se na realização concreta do bem comum, vence o próprio egoísmo com o sentido da solidariedade e no • esforço pela promoção de tudo o que serve para a dignidade e integridade da pessoa humana. A Igreja é comunidade de "servidores" e cada cristão deve sentir-se chamado a tomar cada vez mais bela, mais unida e mais justa, a própria cidade.

4 — Dirigindo-me de modo especial a vós — caros trabalhadores, que viestes aqui numerosos e fervorosos — digo-vos: iluminai, de caridade e de esperança cristã, o vosso trabalho. De facto, que é o trabalho senão colaboração com o poder e o amor de Deus, para manter a própria vida e a tornar mais humana e mais conforme ao desígnio de Deus?

E, sendo assim, levai a vossa serenidade e a vossa confiança cristã ao local de trabalho. Elevai as vossas almas e oferecei a Deus as vossas fadigas.

O Papa está especialmente perto de vós, trabalhadores, participa das vossas preocupações e dos vossos problemas, ama-vos com afecto sincero e anima todas as iniciativas tendentes a favorecer as vossas legítimas aspirações.

A vós, trabalhadores, estende Jesus a sua mão de amigo, de irmão, de Redentor. Seja Ele sempre para vós luz, sustentáculo e conforto.

Com tais votos, invoquemos Maria Santíssima nesta solenidade litúrgica da Anunciação. Maria Santíssima, venerada em Pompeia com tanta devoção por multidões imensas, seja a vossa Mãe e a vossa Rainha, e faça de vós, cristãos cada vez mais convictos e coerentes.

A todos chegue, propiciadora e confortadora, a minha Bênção Apostólica.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS JOVENS ESTUDANTES DE NÁPOLES


Sábado, 24 de Março de 1979



Caríssimos rapazes e meninas

Viestes numerosos, cheios de vida e de alegria, encontrar-vos com o Papa. E o Papa recebe-vos com viva cordialidade e amizade sincera, pois sabe que sois vós, jovens, o germe precioso que dará o seu fruto amanhã na Igreja e na sociedade; sabe que sois vós o futuro, e que nas vossas mãos e nos vossos corações está o destino da humanidade.

O Papa deseja, por isso, que vós sejais agora e sempre o bom grão no meio da cizânia, que — segundo avisa o Evangelho com esclarecido realismo — continuará infelizmente a crescer no campo da história.

Ao exprimir-vos, portanto, o meu reconhecimento por esta vossa visita, tão bela e agradável, tenho o gosto de me dirigir a vós com umas palavras do Apóstolo Pedro, para que fiquem nos vossos corações como recordação e lema de vida: Sede fortes na fé (1P 5,9).

1. Sede-o, em primeiro lugar, mediante o conhecimento aprofundado e gradual do conteúdo da doutrina cristã. Não basta ser-se cristão pelo Baptismo recebido, ou pelas condições histórico-sociais em que se nasceu e se vive. A medida que se vai crescendo nos anos e na cultura, assomam à consciência novos problemas e novas exigências de clareza e de certeza. E necessário então colocar-se a pessoa responsavelmente à busca das motivações da própria fé cristã. Se esta não se torna .pessoalmente consciente e se não é atingida a devida compreensão do que. se deve crer e dos motivos de tal fé, a certa altura tudo pode ruir fatalmente e ser varrido, apesar da boa vontade dos pais e educadores.

Por isso, agora especialmente é tempo de .estudo, de meditação e de reflexão. Digo-vos portanto: Usai bem da vossa inteligência, empenhai-vos em conseguir convicções exactas e pessoais, não percais tempo, aprofundai os motivos e fundamentos da fé em Cristo e na Igreja, para serdes fortes já agora e no vosso futuro.

2. É-se forte na fé, além disso, por meio da oração.

Já São Paulo recomendava: Orai sem cessar (1Th 5,17). Pode-se, com efeito, conhecer perfeitamente a Sagrada Escritura, pode-se ser instruído na Filosofia e na Teologia, e ao mesmo tempo não ter fé ou vir a naufragar nela; porque é sempre Deus quem toma a iniciativa de chamar, para nós O conhecermos e amarmos da maneira justa.

É necessário, por isso, sermos humildes diante do Altíssimo: é necessário conservarmos o sentido do mistério, porque, entre Deus e o homem, fica sempre o infinito; é necessário recordarmo-nos que diante de Deus e da sua Revelação não se trata tanto de compreender com a própria razão limitada, quanto de amar.

Por isso dizia Jesus: Bendigo-te, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos, e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado (Mt 11,25-26). Eis, caríssimos jovens, o pensamento que o Papa vos confia esta manhã: sirva-vos de guia e apoio no vosso esforço generoso.

Com a minha Bênção Apostólica.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS DEPENDENTES DAS EMPRESAS DE LIMPEZA URBANA


E DOS MONOPÓLIOS DE ESTADO DE FLORENÇA


Sábado, 24 de Março de 1979



Sede bem vindos, filhos caríssimos!

A vossa visita é-me particularmente grata: vós vindes de Florença, cidade conhecida e apreciada em toda a parte do mundo pela nobreza das suas tradições e pelo esplendor da sua arte. A vossa presença desperta no meu espírito as profundas impressões que nele se gravaram outrora, quando tive ocasião de contemplar os prodígios arquitectónicos que se revelam ao olhar do turista admirado, ou quando pude deter-me, confundido entre os visitantes, diante dos afrescos das igrejas, dos retábulos, das pinturas conservadas nas pinacotecas, ou quando não me cansava de observar com admiração sempre nova as esculturas que embelezam as praças e enriquecem os museus, ou, por fim, quando ia até à Praceta Miguel Angelo para saborear o espectáculo da cidade reclinada nas margens do Arno, dentro da muralha das colinas que se dissipam no crepúsculo da tarde.

Florença é uma cidade única no mundo; quem tem a honra de ali morar deve ser consciente do compromisso que isso comporta: as inestimáveis riquezas de história, de arte e de fé, de que os antigos enriqueceram templos, edifícios e bairros, perduram para as gerações posteriores, por conseguinte também para a vossa, como perene convite a um confronto estimulante e criativo. A nobreza de sentimentos, a generosidade de alma, a gentileza dos modos que distinguiram os cidadãos melhores daqueles templos gloriosos devem constituir também para os actuais habitantes de Florença uma herança empenhativa.

Isto é válido especialmente para quem, como vós Dependentes do Monopólio de Estado, presta um serviço que requer contacto assíduo com o público heterogéneo dos turistas; e vale de modo muito especial para vós, Dependentes da Empresa da Limpeza Urbana, que tendes a missão de renovar quotidianamente todo o vigor do seu encanto, o rosto maravilhoso da Cidade. Quem pode ignorar, de facto, o benéfico influxo que exercem no espírito do homem o decoro, a ordem e o bom gosto, sobretudo quando eles contribuem para assegurar a digna apresentação de um ambiente que faz de moldura a inestimáveis tesouros de beleza? A familiaridade com estes valores torna-se para o homem uma espécie de escola que o educa e, progressivamente, o abre à percepção de um mundo de valores mais altos, os quais, transcendendo as realidades sensíveis, o introduzem na contemplação da Beleza absoluta, que esplende sobre o próprio rosto de Cristo.

Os votos do Papa são por que esta consciência guie e ampare a vossa fadiga quotidiana. Confio estes meus votos à materna protecção d'Aquela que hoje veneramos no mistério da sua Assunção, mistério particularmente querido à alma mariana da vossa Cidade que, antigamente, fazia mesmo coincidir o início do ano com este dia central do mistério da salvação. Que imortais obras-primas surgiram do pincel inspirado dos vossos pintores, quando eles tentaram — e quantas vezes o fizeram — traduzir na magia das linhas e das cores as emoções provadas diante daquele diálogo em que se decidiram as sortes da humanidade inteira! Ao renovar à Virgem Santa a expressão da comum gratidão por aquele "fiat" que deu novamente a todos nós a alegria e a esperança, concedo-vos de todo o coração, como também às vossas famílias, a minha Bênção Apostólica, penhor de paterna benevolência e prenúncio dos mais eleitos dons do Céu.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A UMA PEREGRINAÇÃO


DA CIDADE DE BELLUNO (ITÁLIA)


Domingo, 25 de Março de 1979



Caríssimos filhos da terra belunense

Tenho o gosto de poder finalmente satisfazer hoje o vosso desejo de vos encontrardes com o Papa, desejo este que já o meu venerado e saudoso Predecessor e vosso ilustre conterrâneo de feliz memória, João Paulo I, tinha acolhido com alegria, sem todavia ter podido realizá-lo devido ao seu improviso e prematuro desaparecimento.

Saúdo, portanto, com particular efusão de sentimentos todos vós que vos reunistes aqui em número tão elevado; desejo saudar, de modo especial, o Bispo de Belluno e de Feltre, Dom Maffeo Bucoli, o Engenheiro Vincenzo Barcelloni Corte, Presidente da Associação de Emigrantes Belunenses e todas as outras Autoridades aqui presentes.

Caríssimos, agradeço-vos a vossa presença nesta casa pontifícia e a generosa soma que desejastes pôr à, minha disposição para os emigrantes do Terceiro Mundo. Asseguro-vos que vos recebo com não menor afecto de quanto teria tido, em meu lugar, o amado e inesquecível Papa João Paulo I, como vós belunense e filho de emigrantes, e, como eu, Sucessor de Pedro nesta Cátedra romana. O facto de eu ter querido manter e continuar o mesmo novo nome que Ele adoptara, é sinal externo de uma consonância íntima, e índice de uma mesma intenção de ministério pastoral.

Gostaria de dirigir-me a vós como Ele teria certamente feito, com simplicidade e sabedoria, e com tanta alegria espiritual. Exorto-vos, por Isso, antes do tudo, a serdes sempre orgulhosos da vossa terra generosa, onde quer que vos encontreis no mundo: não por estrito bairrismo, mas com o afecto que todos os seres vivos e todavia mortais, devem conservar pelas próprias raízes terrenas. Mas além disso, recordai constantemente que nós, cristãos, somos cidadãos do Céu (Ph 3,20) e que por conseguinte não devemos conformar-nos com a mentalidade deste mundo (Cfr. Rom Rm 12,2). Onde quer que vos encontreis, portanto, sempre se vos oferece ocasião para um testemunho de fé límpida e de caridade sincera, que as vossas nativas e reconhecidas tradições de laboriosidade e de tenacidade podem tornar ainda mais fortes e eficazes. Sei que vós, Belunenses, estais espalhados pelos cinco continentes e tendes notável espírito de união, favorecido por oportunas actividades associativas. Pois bem, não posso deixar de encorajar as vossas iniciativas próprias, de tal modo que elas promovam não só os indispensáveis valores humanos, mas também os valores típicos do Evangelho, o único em que o homem pode encontrar a própria salvação total.

Caríssimos, sabeis que, embora sejam tantos e tão diversos os caminhos do mundo por onde caminhais, a meta final é igual para todos. Faço votos por que o vosso caminho se torne cada dia mais alegre e fácil pela presença confortadora de Nosso Senhor, a quem vos recomendo paternalmente, ao mesmo tempo que de todo o coração concedo a todos vós e a todos os que vos são queridos a minha particular Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


DURANTE O ENCONTRO COM OS JOVENS


NA BASÍLICA VATICANA


Quarta-feira, 28 de Março de 1979



Caríssimos jovens


Discursos João Paulo II 1979 - 15 de Março de 1979