Discursos João Paulo II 1979 - 13 de Janeiro de 1979

A criança deve, ainda, ser criada e educada na sua família, já que os pais são sempre os seus «primeiros e principais educadores», papel que «se falta, dificilmente poderá ser suprido» (Declaração conciliar sobre a Educação Cristã Gravissimum Educationis GE 3). Isto é exigido pela atmosfera de afecto e de segurança moral e material que a psicologia da criança requer e deve acrescentar-se que a procriação fundamenta este direito natural, que é também duma grave obrigação» (Id., ibid.). E mesmo a existência dos laços familiares mais amplos, com os irmãos e as irmãs, com os avós, com outros parentes próximos, é um elemento importante - que hoje se tende para negligenciar - para o equilíbrio harmonioso da criança.

Na educação, para a qual contribuem, com os pais, a escola e outros organismos da sociedade, deve a criança encontrar a possibilidade «de se desenvolver de maneira sã e normal nos planos físico, intelectual, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade», como afirma o 2° princípio da Declaração dos Direitos da Criança. A este propósito, a criança tem igualmente direito à verdade, a um ensino que tenha em conta valores éticos fundamentais e que torne possível uma educação espiritual, conforme à sua pertença religiosa, à orientação legitimamente querida pelos pais e às exigências de uma liberdade de consciência bem compreendida, para a qual o jovem deve ser preparado e formado ao longo de toda a sua infância e adolescência. Sobre este ponto, é normal que a Igreja possa fazer valer as suas próprias responsabilidades.

Na verdade, falar dos direitos da criança, e falar dos deveres dos pais e dos educadores, que continuam a estar ao serviço da criança, do seu interesse superior; mas a criança que cresce deve participar por si mesma no seu próprio desenvolvimento, com responsabilidades que correspondam às suas capacidades; e não deve esquecer-se de lhes falar dos seus próprios deveres para com os outros e para com a sociedade.

Eis algumas reflexões que me destes ocasião de exprimir, a propósito dos objectivos que vos propusestes. Este é o ideal para o qual é necessário tender, para o bem mais profundo das crianças e para honra da nossa civilização. Eu sei que vós dedicais atenção prioritária às crianças cujos direitos elementares não são satisfeitos quer nos vossos países quer nos de outros continentes. Jornalistas europeus, não hesiteis, pois, a lançar também o vosso olhar sobre as regiões do globo menos favorecidas do que a Europa! Peço a Deus que ilumine e fortifique o vosso interesse por estas crianças.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


DURANTE O ENCONTRO COM OS JOVENS


NA BASÍLICA VATICANA


Quarta-feira, 17 de Janeiro de 1979

Queridos jovens

Esta manhã renova-se para mim uma grande alegria ao dar-vos as minhas cordiais boas-vindas a esta Basílica Vaticana. Agradeço-vos sentidamente o espectáculo estupendo que a vossa presença festiva oferece neste momento aos meus olhos. Os vossos rostos, límpidos como fontes e intensos como chamas, representam na comunidade eclesial aquelas formas ideais de vida cristã, graças as quais a Igreja, na sua permanente juventude espiritual, não pode deixar de reconhecer-se em vós, que estais a viver a estação em certos aspectos mais bela da vida.

Entre vós encontra-se também um grupo especialmente numeroso de estudantes da Pontifícia Escola Pio IX, os quais — com os seus Superiores, os diligentes Irmãos de Nossa Senhora da Misericórdia, e com os seus familiares — vieram em peregrinação para manifestar ao Papa o seu empenho sério de formação espiritual e cultural na esteira da luminosa tradição que desde 1859 — quando o Servo de Deus, Pio IX, meu venerado Predecessor, deu início a este Instituto — conta gerações de jovens que se formaram nos altos ideais da fé e da ciência. Caríssimos filhos, sede émulos briosos dos exemplos que vos deixaram os que vos precederam e sede sobretudo corajosas testemunhas do Evangelho na sociedade moderna.

E agora façamos juntos algumas breves reflexões sobre a "Semana de orações pela unidade dos cristãos", que amanhã se abrirá no mundo inteiro para implorar do Senhor a graça de se restaurar a unidade de todas as Igrejas cristãs e se chegar finalmente a que haja um só rebanho sob um só Pastor (Cfr. Jo Jn 10,16).

Nesta semana a nossa oração pela unidade, que foi definida "a alma de todo o movimento ecuménico" (Cfr. Unitaris Redintegratio, 8), deve ser continua e fervorosa, tanto para agradecer ao Senhor que despertou entre todos os cristãos o desejo da unidade, como para suplicar novas luzes na contínua busca para descobrir o que temos em comum com os irmãos separados e o que falta ainda superar para se atingir a perfeita unidade tão desejada pelo Senhor na sua oração ao Pai: para que todos sejam uma só coisa, .como tu, ó Pai, estás em Mim e eu em Ti, para que todos sejam também uma só coisa, a fim de que o mundo creia que Tu Me enviaste (Jn 17,21).

Em obediência a esta vontade de Cristo, a Igreja católica estabelece relações fraternas com as outras Igrejas e confissões cristãs. A este propósito, desejo informar-vos que está para iniciar-se um diálogo teológico entre a Igreja católica e as Igrejas ortodoxas de tradição bizantina, com a finalidade de eliminar as dificuldades que impedem, ainda a concelebração eucarística.

Estão também a decorrer, desde há tempos, diálogos com os irmãos separados anglicanos, luteranos, metodistas e reformados, e tenho o prazer de informar-vos que sobre temas, que originavam no passado profundas divergências, se encontraram consoladores pontos de encontro. Foram também estabelecidas amistosas e frutuosas relações com o Conselho Ecuménico das Igrejas e com as outras organizações interconfessionais. O caminho é todavia longo ainda: devemos por isso acelerar o passo para atingir a meta tão ambicionada.

Renovemos portanto a nossa oração ao Senhor para que dê a todos os cristãos luz e força a fim de realizarem quanto é possível para se conseguir o mais depressa possível a plena unidade na caridade e na verdade, de maneira que praticando o verdade — como diz o Apóstolo das Gentes — cresçamos por meio da caridade sob todos os aspectos n'Aquele que é a Cabeça, Cristo. É por Ele que o Corpo inteiro, coordenado e unido por meio de todas as junturas, opera o seu crescimento orgânico, segundo a actividade de cada uma das partes, a fim de se edificar na caridade (Ep 4,15-16).

Procuremos viver esta Semana pela unidade, neste espírito de plena comunhão eclesial, ajustando-nos ao tema bíblico inspirador, este ano, das celebrações ecuménicas: Estai ao serviço uns dos outros para a glória de Deus (1P 4,7-11). Este tema convida-nos a vivermos juntos o mais possível a herança. comum a todos os cristãos. A cooperação, o amor mútuo, o serviço recíproco fazem que nos conheçamos melhor uns aos outros e incitam-nos ainda a que procuremos os caminhos para vencer as divergências.

Com esta finalidade disponhamos os nossos ânimos para a oração e rezemos agora todos juntos o Pai Nosso...

Na firme confiança de que, durante esta semana, querereis continuar a pedir pela importante causa da unidade, de todo o coração vos concedo a Bênção Apostólica, que desejo fazer chegar também aos vossos companheiros e familiares que não puderam tomar parte nesta Audiência.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS SENHOR CARLOS MARIA ROMERO


NOVO EMBAIXADOR DO URUGUAI JUNTO


DA SANTA SÉ POR OCASIÃO DA APRESENTAÇÃO


DAS CARTAS CREDENCIAIS


Quinta-feira, 18 de Janeiro de 1979

: Senhor Embaixador

É de muito bom grado que lhe dou as boas-vindas ao Vaticano e aceito as Cartas Credenciais mediante as quais Vossa Excelência é designado Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República Oriental do Uruguai junto da Santa Sé.

Agradeço-lhe as amáveis palavras que me dirigiu. Recordo muito bem como no início do meu Pontificado encontrei Vossa Excelência com a Missão de seus país para confirmar na ocasião não apenas as boas relações existentes entre Uruguai e a Santa Sé, mas também os sentimentos cristãos que, com filhos da Igreja, animam os fiéis uruguaios. Hoje Vossa Excelência vem-nos dar o testemunho incessante desta permanente proximidade espiritual: uma nobre missão, para cujo feliz desenvolvimento conta com a minha benevolência cordial e sincera.

É muito bom que esta proximidade, este bom entendimento, que gostaria que fosse cada vez mais amplo e mais fecundo, tenha como raiz profunda um reconhecimento leal da obra incansável da Igreja no Uruguai.

Uma obra segundo a sua missão evangelizadora, de serviço ao homem, ao seu progresso, à sua maturação pessoal como indivíduo e membro da sociedade. Tal obra deve também constituir um firme compromisso a não poupar esforços nem sacrifícios quando se trata de dar vida e promover valores, sobretudo os valores morais e espirituais, que são conformes e conaturais à dignidade humana.

Neste campo da promoção integral da pessoa, para o qual devem convergir precisamente as iniciativas e as actividades a Igreja no Uruguai continuará a oferecer a sua decidida colaboração, grata de contribuir para aperfeiçoar o edifício comunitário, com que se vejam aceitas e realizadas as legítimas aspirações de todos, e sejam corroborados os ideais de convivência pacífica e de progresso solidário.

Senhor Embaixador,

Senhor Embaixador, reiterando minha benevolência, peço-lhe que se faça intérprete dos meus sentimentos e esperanças junto do Senhor Presidente da República assim como dos queridos filhos e filhas uruguaios sobre os quais invoco as bênção do Altíssimo.

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS MEMBROS DA JUNTA DA REGIÃO DO LÁCIO

Sábado, 20 de Janeiro de 1979

: Ilustres Senhores

Agradeço cordialmente esta visita, que desejastes fazer-me no início do meu Pontificado e também início deste novo ano, vós Membros da Junta Regional do Lúcio, em nome dos sessenta Membros do Conselho Regional, que desejaríamos hoje encontrar e saudar todos, com prazer.

Sede bem-vindos, porque representais a Região italiana mais particularmente ligada aos cuidados pastorais do Bispo de Roma e vindes em nome das suas cinco Províncias: Roma, Viterbo, Frosinone, Latina e Rieti.

1. Nestes últimos anos, os problemas humanos e sociais da Região multiplicaram-se, cresceu cada vez mais a necessidade urgente de estruturas e serviços mais modernos, mais em correspondência com as exigências da dignidade da pessoa humana. Neste esforço, todos devem empenhar-se, e a Igreja não pode manter-se estranha a tudo o que está relacionado com o bem autêntico do homem. O Concílio Vaticano II assim se exprimiu com grande lucidez: "Certamente, a missão própria, confiada por Cristo à sua Igreja, não é de ordem política, económica ou social: o fim que lhe propôs é, com efeito, de ordem religiosa. Mas desta missão religiosa deriva um encargo, uma luz e uma energia, que podem servir para o estabelecimento e consolidação da comunidade humana, segundo a lei divina", que é lei de justiça e de amor (cfr. Const. past. Gaudium et Spes GS 42), Por isso, sempre a Igreja fomentou, segundo a necessidade dos tempos c lugares, obras destinadas ao serviço de todos, especialmente dos necessitados; obras que foram promovidas pelas instituições religiosas, com grande mérito histórico, cívico e social.

No vosso gesto e na certeza dada — por meio das palavras amáveis que nos foram dirigidas pelo Senhor Presidente da Junta — de serem dedicados especiais cuidados aos sectores, que mais directamente têm em vista o bem-estar da população, apraz-me ver um reconhecimento do contributo que estas obras oferecem ao bem comum, reconhecimento a que não pode deixar de corresponder um compromisso de respeitar-lhes o fim institucional e os espaços de liberdade que lhes são conaturais, de modo que possam actuar sempre em conformidade com os princípios religiosos e morais, a que vão buscar a sua razão de ser.

Oxalá a Junta e o Conselho Regional, com verdadeiro espírito de serviço e de responsabilidade, consigam aprontar as soluções adequadas para que — graças também ao contributo de todas as forças sociais — todos os cidadãos, no respeito dos seus direitos, possam viver uma vida verdadeiramente digna do homem. O meu pensamento dirige-se nesta altura para os doentes, as crianças, os anciãos, os desempregados e os drogados.

2. Mas para conseguir isto, uma das condições fundamentais é que seja assegurada a todos a pacífica, serena e harmoniosa convivência. O pluralismo significa primeiramente respeito dos outros e renúncia a querer alguém impor-se aos outros pela força. Porque há hoje tanta violência? É necessário talvez subir mais atrás, àquelas concepções e àqueles grupos que proclamaram e inculcaram, e continuam a proclamar e inculcar, especialmente nas consciências dos jovens — como ideais de vida — a luta contra os outros, o ódio contra os que pensam ou actuam diversamente, a violência como único meio para o progresso social e político. Mas a violência gera violência; o ódio gera o ódio; e tanto um quanto o outro humilham e depreciam a pessoa humana. Os cristãos não podem esquecer o que nos recorda o Concílio Vaticano II: "Não podemos, porém, invocar Deus como Pai comum de todos, se nos recusamos a tratar como irmãos alguns homens, criados à Sua imagem. De tal maneira estão ligadas a relação do homem a Deus Pai e a sua relação aos outros homens seus irmãos, que a Escritura afirma: 'quem não ama, não conhece a Deus' (1Jn 4,8)" (Nostra Aetate NAE 5).

De coração desejo que em toda a Região do Lácio, em toda a Itália, os cidadãos possam, neste ano e no futuro, viver uma vida pacífica, serena, próspera e contribuam, com seu honesto e produtivo trabalho, ao contínuo crescimento e ao verdadeiro progresso da Nação.

Com estes votos de boa vontade invoco sobre a sua delicada acção a graça do Senhor e concedo-vos a minha Bênção Apostólica.



SAUDAÇÃO DO PAPA JOÃO PAULO II


A UM GRUPO DE DESPORTISTAS PARTICIPANTES


NO 47º RALLY DE MONTECARLO


Sábado, 20 de Janeiro de 1979

: Caríssimos Automobilistas

Correspondi de boa vontade ao desejo, que me foi expresso pela Comissão Desportiva Automobilística Italiana, de que dirigisse desta janela uma palavra de saudação e bons votos, a vós pilotos e às equipagens, que vos dispondes a partir desta sugestiva Praça de São Pedro a fim de participardes no 47° Rally de Montecarlo, em competição com outras equipagens, que à mesma hora se põem em movimento de várias metrópoles da Europa, entre as quais a querida e sempre amada Cidade de Varsóvia.

Agradeço-vos vivamente esta significativa presença, caros atletas, que fazeis do desporto uma razão de estilo e de vida, e também legítimo motivo de prestígio e de honrosas afirmações. Ao mesmo tempo, desejava exortar-vos a que façais que estas competições desportivas se caracterizem não só pela virtude da lealdade e da probidade, mas também por um empenho constante para chegardes às conquistas mais verdadeiras e duradoiras, às vitórias do espírito, que devem sempre ter o primado na escala dos valores humanos, sejam eles agonísticos, sejam sociais e cívicos.

A boa sorte vos sorria, caríssimos irmãos, e acompanhe-vos, como penhor de bens, a minha especial Bênção, concedida agora a vós, às equipagens e a todos os organizadores desta manifestação popular, como penhor e auspício da contínua assistência e protecção divinas.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO INSPECTORADO DE SEGURANÇA PÚBLICA


JUNTO DO VATICANO


Segunda-feira, 22 de Janeiro de 1979



Ilustres Senhores

Também vós desejastes vir ter com o Papa para lhe apresentar os vossos afectuosos bons votos de novo ano, há pouco iniciado.

A cada um de vós dirijo a minha saudação sincera e cordial, que faço chegar também à família de cada um de vós. A todos expresso o meu reconhecido apreço por esta visita e por tão gentis bons votos.

Ao Senhor Inspector-Chefe desejo, em seguida, patentear o meu agradecimento também pelas amáveis palavras, com que se tornou intérprete dos vossos sentimentos.

Alegro-me com este primeiro encontro convosco, que tendes a missão de velar pela ordem pública nas proximidades do Vaticano.

O encargo, que desempenhais com diligência e solicitude, é certamente importante e delicado; exige profundo sentido de responsabilidade e atitude de dedicação total ao próprio dever; requer força de vontade e dedicação ao ideal, num trabalho humilde e não espectacular, nem sempre de todo estimado pelo público, mas tão útil para o bem da comunidade.

Aproveito a ocasião para exortar-vos paternalmente a que estejais sempre à altura da vossa missão, e correspondais à confiança em vós depositada.

Depois, a vossa permanência no centro da Cristandade, aonde acorrem multidões imensas e contínuas para receber luz para a inteligência e conforto nas alternativas da vida; e o desempenho da vossa actividade não longe do Vigário de Cristo, que por divino mandato é "fundamento da Igreja" e "Mestre de verdade", vos ajudem a aprofundar cada vez mais a vossa fé cristã, e de vós exijam urna vida. exemplar. Faço votos por que as vossas convicções e a vossa coerência vos procurem alegria e consolação no cumprimento do vosso dever.

Prometo-vos uma recordação especial na oração: o Senhor esteja perto de vós nas fadigas e nas responsabilidades. E Nossa Senhora vos auxilie e acompanhe sempre.

Invocando sobre vós e as vossas famílias a abundância dos mais escolhidos dons celestes, de todo o coração concedo, a vós e aos que vos são queridos, a propiciadora Bênção Apostólica.

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS MEMBROS DO CONSELHO PERMANENTE

DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL ITALIANA


23 de Janeiro de 1979



Queridos Irmãos

1. Agradeço ao vosso Presidente as amáveis palavras que quis dirigir-me e exprimo a todos a minha alegria pelo encontro de hoje. Penso que os motivos desta alegria são tão óbvios que não necessitam de explicação. Este encontro foi por mim esperado de um modo particular e atribuo-lhe importância singular.

«Arcano Dei consilio», em virtude do inescrutável decreto de Deus, chamado a 16 de Outubro de 1978 pelos votos do Colégio dos Cardeais, assumi, depois dos meus grandes e amados Predecessores, a guia da Sede romana de São Pedro e juntamente com ela o ministério sobre toda a Igreja, em virtude do qual o Bispo de Roma se tornou, segundo a definição de São Gregório, «Servo dos Servos de Deus».

Do mesmo modo que é meu vivo desejo exercer este ministério e todas as tarefas que dele derivam, dedicando as minhas forças e o meu amor a todas as Igrejas que estão na unidade universal da Igreja católica e a todos os seus Pastores, que são meus Irmãos no múnus episcopal, assim também, mas de maneira muito especial, desejo prestar o meu serviço à Igreja, nesta terra italiana predestinada pela Providência, e aos Bispos que, em união colegial com o Sucessor de Pedro, são nela Pastores.

2. Esta é verdadeiramente a terra eleita pela Providência para se tornar o centro da Igreja. Aqui, a esta que foi a capital do Império Romano, veio Pedro (e, ao mesmo tempo também Paulo) para trazer o Evangelho e para dar início não só a esta Sede, mas também a muitas outras: por toda a parte surgiram comunidades cristãs plenas de fé e de sacrifício, prontas a darem a vida e a derramarem o sangue por Cristo, durante as perseguições que se sucederam até ao ano 313. Precisamente a tempos assim antigos e a outros mais recentes mas também remotos, remontam nesta Península, situada entre os Alpes e a Sicília, numerosas Sedes Episcopais que durante dois milénios se tornaram centros da evangelização e da vida do novo Povo de Deus, pontos de apoio para tantos cristãos e de amparo humano para tantas comunidades, iniciativas e instituições.

Com que sentimentos de veneração e de emoção se vem a encontrar, em meio de toda esta riqueza de vida e de tradição cristã o filho de uma nação que, de modo tão evidente, ligou a sua história milenária a este centro da fé e da cultura que se desenvolveu em torno à Sede de São Pedro!

E não encontra palavras capazes de exprimir a sua gratidão por tudo aquilo que, durante estes primeiros meses do seu pontificado, lhe testemunharam os filhos e as filhas desta terra gentil. É a expressão desta gratidão que desejo depor hoje nas vossas mãos, queridos e venerados Irmãos, que, como membros do Conselho Permanente, aqui representais todo o Episcopado Italiano. Se a eleição de João Paulo II se tornou — como frequentemente ouvimos dizer —uma nova manifestação e uma prova da universalidade da Igreja, seja-me então permitido dizer que nisso tem também a sua parte o Povo de Deus, que está em Roma e em toda a Itália. A consciência da universalidade da Igreja é certamente também um dos sinais daquele «sensus fidei» de que fala a constituição Lumen Gentium. «A totalidade dos fiéis, que possuem a unção que vem do Espírito Santo (cfr. ), não pode enganar-se na fé, e manifesta esta propriedade particular através do sentido sobrenatural da fé do Povo inteiro, quando 'desde os Bispos até aos últimos fiéis leigos' (cfr. Santo Agostinho, De Praed. Sanct. 14, 27: PL 44, 980) mostra o seu consenso universal a respeito das verdades de fé e costumes. Graças a este sentido da fé, provocado e sustentado pelo Espírito de verdade, e sob a orientação do sagrado magistério, que garante aos que lhe obedecem fielmente não uma palavra humana, mas a palavra de Deus (cfr. 1Th 2,13), o Povo de Deus adere indefectivelmente à fé transmitida aos santos duma vez para sempre (cfr. Jud Jud 3), penetra-a mais profunda e convenientemente, e transpõe-na mais intensamente para a sua vida» (Lumen Gentium LG 12, cfr. 35).

3. Assim, pois, encontrando-me hoje perante vós, desejo convosco repropor a causa que nos é comum a todos: construir a Igreja de Deus, anunciar o Evangelho, servir a causa da elevação do homem à dignidade de filho de Deus, difundir todos os valores do espírito humano intimamente ligados a esta elevação. Desejo exercer tal missão juntamente convosco, queridos Irmãos, inspirando-me em todos os princípios da unidade colegial que, com profundeza, simplicidade e precisão, foram elaborados pelo Concílio Vaticano II, o qual sublinha que o Senhor Jesus constituiu os Apóstolos «sob a forma de colégio, isto é, de grupo estável, cuja presidência entregou a Pedro escolhido de entre eles»( Lumen Gentium LG 19). E assim como São Pedro e os outros Apóstolos constituíam, por vontade do Senhor, um colégio único, assim também os Bispos e o sucessor de Pedro estão unidos entre si num único colégio ou corpo episcopal com e sob o Sucessor de Pedro (Cfr. Lumen Gentium LG 19-22 Christus Dominus CD 22).

Por conseguinte, o Romano Pontífice — como afirma ainda o Concílio — «é o princípio e o fundamento perpétuo e visível da unidade quer dos Bispos quer da multidão dos fiéis. Por sua vez, cada Bispo é princípio e fundamento visível da unidade na sua Igreja particular formada à imagem da Igreja universal, em todas e de todas as Igrejas particulares resulta a Igreja católica una e única» (Lumen Gentium LG 23).

Daqui nasce a exigência de uma plena comunhão dos Bispos entre si e com o Sucessor de Pedro, na fé, no amor, nas intenções e na acção pastoral.

Esta comunhão expande-se na comunhão de cada um dos Bispos com os próprios Sacerdotes, com os Religiosos e as Religiosas, isto é, com as almas que consagram totalmente a própria vida ao serviço do Reino. Aqui, a comunhão exprime-se, por um lado, na solicitude dos Pastores pelas necessidades espirituais e materiais destes filhos, que lhes estão mais próximos e muitas vezes mais expostos às dificuldades provenientes de um ambiente secularizado, e, por outro, no empenho colocado pelos Sacerdotes, Religiosos e Religiosas em unirem-se em torno dos respectivos Bispos para escutarem com docilidade a sua voz e porem fielmente em prática as suas directrizes.

A comunhão entre Bispos, Clero e Religiosos constrói a comunhão com o laicado, o qual com toda a sua riqueza de dons e de aspirações, de capacidades e de iniciativas, tem uma tarefa decisiva na obra de evangelização do mundo contemporâneo. Na Igreja podem existir, legitimamente, graus diversos de coligação com o apostolado hierárquico e formas múltiplas de empenho no campo pastoral. Da aceitação cordial de todas as forças de inspiração claramente católica e da sua valorização nos planos de acção pastoral não pode deixar de derivar vantagem segura para a presença cada vez mais incisiva da Igreja no mundo.

Além disso, é urgente que nos dediquemos a um esforço de recuperação para a plena comunhão eclesial daqueles movimentos, organismos e grupos que, nascidos do desejo de uma adesão generosa e coerente ao Evangelho, não se encontram ainda na óptica comunitária, necessária para um agir cada vez mais consciente da comum responsabilidade de todos os membros do Povo de Deus. Será necessário criar novas ocasiões de encontro e de confronto, num clima de abertura e de cordialidade alimentado à mesa da Palavra de Deus e do Pão eucarístico; será necessário retomar com paciência e confiança o diálogo nos casos em que ele tenha sido interrompido, sem nos deixarmos desencorajar por obstáculos e asperezas no caminho para a compreensão e o entendimento. Mas isto não pode alcançar-se sem a docilidade devida por todos os fiéis ao Magistério autêntico da Igreja, mesmo a respeito das questões conexas com a doutrina concernente à fé e aos costumes. A harmonia entre unidade institucional e pluralismo pastoral é rima meta difícil e nunca definitivamente alcançada; ela depende do esforço concorde e constante de todas as componentes eclesiais e deve ser buscada à luz do sempre actual axioma: «In necessariis unitas, in dubiis libertas, in omnibus caritas».

4. Por último, quereria sublinhar que a comunhão tem as suas defesas, as quais, pelo que diz respeito aos Bispos, se resumem sobretudo na vigilância prudente e corajosa perante as insídias que, de fora e de dentro, ameaçam a coesão dos fiéis em torno do comum património de verdades dogmáticas, de valores morais, de normas disciplinares.

A comunhão tem os seus instrumentos, entre os quais está em primeiro lugar o que é representado pela vossa Conferência nacional, para a qual é dever desejar uma eficiência cada vez maior e uma união cada vez mais articulada com as outras estruturas eclesiais, a nível regional e diocesano.

Nem se deve subestimar o instrumento constituído pela imprensa, e em particular pelo diário católico, dadas as possibilidades que ela oferece de diálogo construtivo entre os fiéis de todas as partes do País, em ordem à maturação pessoal e comunitária de opções responsáveis e, se necessário, corajosamente proféticas, no contexto de uma opinião pública demasiado frequentemente solicitada por vozes que nada têm de cristão. Permito-me, por isso, apelar para a vossa boa vontade, para as vossas energias, para as capacidades organizativas de cada uma das dioceses, para um apoio cada vez mais válido a uma causa tão importante e meritória.

5. Uma vez que a Igreja está colocada corno «sacramento universal de salvação», a ela «necessitas incunibit simulque ius sacrum evangelizandi» (Ad Gentes AGD 7).

Na palavra do Senhor: Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Nova a toda a criatura (Mc 16,15) se funda o «direito sagrado» de ensinar a própria doutrina e os princípios morais que regulam a acti vidade humana em ordem à salvação.

Só quando este «direito sagrado» é respeitado, em si e no seu exercício, se actua aquele princípio que o Concílio proclama como a coisa mais importante entre as que dizem respeito ao bem da Igreja, ou melhor, ao bem da própria cidade terrena e que devem ser, sempre e em toda a parte, conservados e defendidos: «no seu agir, a Igreja disponha de tanta liberdade quanta lhe é necessária para prover à salvação dos seres humanos».

É esta, de facto, a liberdade sagrada, com a qual o Unigénito Filho de Deus enriqueceu a Igreja adquirida com o Seu sangue.

Neste princípio fundamental, a liberdade, se apoia a Igreja nas suas relações com a comunidade política e, de modo particular, quando — de comum acordo — procura chegar à actualização dos instrumentos jurídicos, em ordem à sã cooperação entre Igreja e Estado, no respeita leal pela soberania própria de cada ordenamento, para o bem das pessoas humanas.

6. Haveria ainda muitas coisas a dizer. Porém, neste primeiro colóquio, temos de limitar-nos às mais importantes e às mais actuais.

Desejo que este encontro seja o início da nossa cooperação colegial, isto é, de cada um de Vós, queridos e venerados Irmãos, e de todos os Bispos e Pastores da Igreja em Itália.

Desejo de todo o coração compartilhar o Vosso ministério, a Vossa solicitude, as Vossas dificuldades, as Vossas esperanças, os Vossos sofrimentos e as Vossas alegrias.

Em conformidade com o meu múnus, e, ao mesmo tempo, conservando o pleno respeito pela missão individual e colegial de cada um de Vós, filhos desta terra italiana, desejaria que se realizasse, de modo particular, este voto: «fecit illos Dominus crescere in plebem suam».

Vivifica-nos a fé comum e o mesmo amor a Cristo, o único que sabe o que há no homem (Cfr. Jo Jn 2,25).

E ao encontro deste homem dos nossos tempos — por vezes desorientado (mesmo nesta terra rica do mais belo património cristão) — queiramos caminhar juntos, mediante o nosso serviço exercido em união com os sacerdotes, os religiosos e as religiosas, e em solidária cooperação com todos os leigos.

De coração desejo que, sob a protecção da Mãe da Igreja e dos Santos Padroeiros da Itália, possamos cumprir bem a missão que nos foi confiada pelo Senhor, e que os nossos Irmãos e Irmãs experimentem a alegria da nossa comunhão, e juntamente convosco vivam a grande dignidade da vocação cristã.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


DURANTE O ENCONTRO COM OS JOVENS


NA BASÍLICA VATICANA


Quarta-feira, 24 de Janeiro de 1979



Caríssimos

O encontro desta manhã, tão festivo e cordial, dá-me — como todas as quartas-feiras — muito conforto e muita consolação. Ver esta imensa Basílica cheia de meninos e jovens, com tanta vitalidade e entusiasmo, é espectáculo que leva o Papa a exclamar: Eis a verdadeira, a autêntica juventude da sociedade contemporânea; a juventude, que é alegre e serena porque tem um grande amigo e irmão: Cristo Jesus, Homem e Deus.

1. Desejava saudar-vos um por um; mas, abraçando-vos todos com o olhar e o coração, dirijo um pensamento especial aos grupos mais numerosos: à peregrinação das Religiosas, do professorado e das alunas, com os seus familiares, do Instituto romano "Santa Úrsula"; à peregrinação do professorado e dos alunos das Escolas médias e liceais de Casalpalocco; à da escola média oficial romana "Giulio Salvadori", e à dos Institutos napolitanos dos Padres Barnabitas, "Bianchi" e "Denza".

2. Embora o Tempo Natalício tenha já passado, desejo apresentar brevemente à vossa consideração a atitude dos Magos, que, ajudados pela indicação da misteriosa estrela, depois de encontrarem Maria com Jesus menino, "prostrando-se adoraram-no" e depois "abriram os seus cofres e ofereceram-lhe como presentes ouro, incenso e mirra". Também o homem moderno — o jovem moderno — se encontra com Deus quando se abre diante d'Ele apresentando o dom interior do próprio "eu" humano, para aceitar e retribuir os dons imensos que Ele foi o primeiro a oferecer: o dom da existência, o dom da Redenção e o dom da Fé.

E aquele Menino, que aceitou as dádivas dos Magos, é ainda e será sempre Aquele diante do qual os homens e os Povos inteiros "abrem os seus cofres", isto ë, os seus tesouros. Os dons do espírito humano, ao dar-se esta abertura diante de Deus encarnado, adquirem valor especial, tornam-se os tesouros das várias culturas, riqueza espiritual dos Povos e das Nações, património comum de toda a Humanidade. O centro desta troca é Ele: o mesmo que aceitou os presentes dos Magos. Ele próprio, que é o Dom visível e encarnado, causa a abertura das almas e aquela troca de dons, de que vivem não só os homens individualmente, mas também os Povos, as Nações e a Humanidade inteira.

3. Estas reflexões, caríssimos jovens, estão relacionadas com tudo o que estou para dizer-vos agora: e nosso encontro de hoje tem significado especial para mim e para vós: amanhã começarei, com a graça de Deus, uma viagem ao México, para tomar parte, em Puebla, na Reunião da Conferência Episcopal da América Latina. Conhecerei o grande povo mexicano, que tem uma história antiga e gloriosa, e em tempos recentes fez grandes progressos. Todavia embora no meio do progresso politico, técnico e cívico — a alma mexicana mostrou e mostra claramente querer ser e continuar cristã, demonstrando não só bons sentimentos religiosos mas uma fortaleza e firmeza de fé não indiferente, antes por vezes heróica, como muitos recordarão.

Dirigindo-me a essa Nação, seguirei as pegadas de muitos peregrinos que de toda a América se encaminham para o Santuário da Mãe de Deus, em Guadalupe. E nesse lugar sagrado pedirei pela Humanidade inteira, pela Igreja, por vós jovens, para que sejais sempre bons, puros e alegres, e para que vos prepareis, com empenho e dedicação, para os deveres que devereis enfrentar, daqui a não muito tempo, como adultos.


Discursos João Paulo II 1979 - 13 de Janeiro de 1979