Discursos João Paulo II 1979 - Segunda-feira, 18 de Junho de 1979

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS CAPITULARES DA ORDEM DOS FRADES MENORES


Quinta-feira, 21 de Junho de 1979



Amadissimos filhos,
membros do Capítulo Geral da Ordem dos Frades Menores

Com gosto vos admitimos a esta especial reunião e vos saudamos cordialmente, e ao mesmo tempo apresentamos paternais congratulações ao novo Ministro-Geral John Vaughn, e manifestamos o nosso afecto ao Padre Constantino Koser, que depois de longo período abandonou o mesmo pesado cargo.

Agradecemo-vos a alegria que Nos comunicais com esta atenção. Na verdade, a vossa presença traz-nos à memória muitas relações que tivemos com os Franciscanos e renova ao Nosso espírito a recordação daqueles passos que demos, seguindo os caminhos em que São Francisco deixou ilustres pegadas: referimo-nos aos vestígios dum homem extraordinariamente inflamado no amor de Cristo, fiel Servidor da Igreja e fraternal amigo dos homens e de todas as criaturas.

Quanto a isto, apraz-Nos recordar que Nós, sendo Cardeal Arcebispo de Cracóvia, duas vezes no aniversário da Nossa ordenação sacerdotal, subimos em piedosa peregrinação o monte Alverne, onde o vosso Seráfico Pai foi transformado na imagem de Cristo crucificado.

Depois, eleito para o cargo supremo de Romano Pontífice, que é como vigário do amor de Cristo (Cfr. Santo Ambrósio, Expos. Evang. sec. Luc., X, 175; PL 15, 1848), bem no princípio desta nossa missão, precisamente no dia 5 de Novembro do ano passado, dirigimo-Nos a Assis para rogar, junto do sepulcro de São Francisco, que Nos ajudasse a dirigirmo-nos aos homens nossos contemporâneos segundo o modo próprio do coração do Salvador.

Recordados estes acontecimentos da Nossa vida, pedimo-vos que imprimais no peito e no coração as palavras iniciais da Nossa primeira Carta Encíclica: "O Redentor do homem Jesus Cristo é o centro do universo e da história". O que encerram estas palavras, devei-lo vos anunciar; quer dizer, é preciso que a vossa Ordem recupere aquelas forças primitivas, de maneira que se torne capaz de manifestar Cristo ao nosso século e de, a exemplo do vosso Seráfico Pai, dar aquele testemunho de amor à Igreja, que ele prestou de maneira verdadeiramente exímia. A recuperar o vigor primitivo sois levados, como julgamos com razão, até pelo lugar em que celebrais o Capítulo Geral: falamos do convento de Santa Maria dos Anjos onde — como diz São Boaventura — o vosso ínclito Pai "começou humildemente, progrediu virtuosamente e chegou felizmente à perfeição" (Legenda maior, c. II, n. 8: Analecta Franciscana, X, Ad Claras Aquas 1926, p. 566). De facto, aí praticou optimamente aquela penitência que se propusera desde o princípio da vida consagrada a Deus. Na verdade, para conseguir qualquer renovação espiritual, é necessário começar pela penitência, que é o mesmo que a "metanoia", quer dizer, mudança do espírito. Deste modo é que os filhos de São Francisco realizam a sua vocação.

À luz desta verdade, instantemente vos exortamos a não levantar qualquer dúvida sobre a vossa identidade, nem alguma coisa buscar ou fazer — individualmente ou em comum — que seja alheio daquela norma, que o legislador vosso Pai estabeleceu para todos os tempos: "A regra e vida dos Frades Menores é esta: observar o santo Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo vivendo na obediência, sem nada próprio e em castidade" (Regula, I: Opuscula ed. C. Esser (Bibl. Francisc. Ascet. M. Aevi, XII), Grottaferrata 1978, p. 226 s).

Da fidelidade a esta primitiva forma da vossa vida depende também a parte que vos toca na missão salvífica da Igreja, na medida em que apliqueis as pessoas e as vossas obras ao ministério da Igreja, em perfeita adesão ao magistério da mesma Igreja.

Recebei, pois, a exortação paternal, que o Romano Pontífice vos dirige hoje: amai a Igreja, como São Francisco a amou. Amai-a mais do que a vós mesmos, renunciando, se necessário, também aos modos do pensar e viver que, se no passado mereciam talvez aprovação, agora são menos adequados para fazer avançar a força vital da Igreja e alargar os espaços da Sua caridade.

Ao renovar portanto esta vossa vocação eclesial, é necessário que vos ajusteis à vontade do Seráfico Pai, que mandou os seus frades a todas as regiões da terra, para anunciarem aos homens a paz e a penitência para a remissão dos pecados (Cfr. Thom. a Celano, Vita I, p. 1, c. XII, n. 29: Analecta Franciscana mem., p. 24).

Aproximai-vos dos homens nas condições mesmas da vida que levam; protegei e cultivai aquela semente divina que está neles (Cfr. 1Jn 3,9), para conhecerem e receberem o Filho de Deus encarnado e virem a ser, eles próprios, filhos de Deus.

Ninguém, como é sabido, penetrou tão a fundo como São Francisco na índole sagrada da criação. Ele — para usarmos palavras do venerando Predecessor Nosso Paulo VI — "tudo tendo deixado por Cristo,... por meio da 'senhora pobreza' alguma coisa, por assim dizer, adquiriu da bem-aventurança primitiva, quando o mundo brotou íntegro das mãos do Criador. Na maior renúncia às criaturas, ele, já quase cego, pôde cantar o imortal Cântico das Criaturas, e do mesmo modo os louvores do nosso irmão sol, os louvores das coisas de toda a natureza, que para ele se tornou como espelho brilhante e puro da divina glória" (Paulo VI, Adhort. Ap. Gaudete in Domino, IV: AAS 67, 1975, p. 307). Pertence pois também à vossa vocação ensinar aos homens que as coisas deste mundo se referem à obra da salvação, e ao mesmo tempo, quando eles se detêm nas mesmas coisas, movidos pela inclinação natural, levá-los à esperança que ultrapassa tudo o que é terreno.

Amadíssimos Franciscanos: Por estardes, como religiosos, colocados por assim dizer no cimo da consciência cristã (Cfr. Paulo VI, Adhort. Ap. Evangelica testificatio, 19: AAS 63, 1971, p. 508), é que vos dirigimos estas palavras, a fim de vos confirmar, vos excitar, vos provocará cada vez maior prontidão com que deveis ser cooperadores do sucessor de São Pedro, "a quem foi confiado o grande encargo de propagar de modo singular o nome cristão" (Const. dogm. Lumen Gentium LG 23).

Guarde-vos e proteja-vos a Santa Mãe de Deus. Ela ocupa na verdade lugar singular na vossa tradição teológica, sobretudo no referente ao mistério da sua Conceição Imaculada; pois, graças a ele tornou-se perfeitíssimo tipo humano da Igreja, que o seu fundador, Cristo, quis sem mancha nem ruga... mas santa e imaculada (Cfr. Ef Ep 5,27). Imitai Maria, que era plenamente submissa à vontade de Deus, e ouvi quem a respeito do seu Filho vos exorta: Fazei tudo o que Ele vos disser (Jn 2,5).

Por último, para vos fortificar a corresponder sempre com ardor à vossa nobre vocação franciscana, com afecto paterno e dedicado vos concedemos a Bênção Apostólica, a vós aqui presentes e a toda a vossa Família religiosa.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS SACERDOTES DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS


Sexta-feira, 22 de Junho de 1979



Irmãos caríssimos

1. Quero manifestar-vos a minha sincera alegria por este encontro de hoje, primeiramente pela circunstância peculiar, que interessa toda a vossa Congregação: decorre há cerca de um mês o Capítulo Geral, em que elegestes o novo Conselho Geral, como também o novo Superior-Geral (o Padre António Panteghini), a quem dirijo as minhas cordiais e afectuosas congratulações. Além disso, confortados pela oração de todos os vossos Confrades espalhados pelo mundo, e animados pelo vosso carisma específico, meditastes sobre a vida da vossa Congregação, que há um século oferece o seu contributo de espiritualidade e iniciativas apostólicas à vida de todo o Povo de Deus.

Mas este vosso encontro com o Papa adquire hoje particular e novo significado porque se realiza na solenidade litúrgica do Sacratíssimo Coração de Jesus, de quem o vosso Instituto tira o nome e a inspiração. Toda a Igreja celebra hoje o Amor divino e humano do Verbo encarnado e o Amor que o Pai e o Espírito Santo alimentam para com o homem. É a festa do Amor infinito de Deus, Uno e Trino, do qual Jesus, com o lado aberto na cruz (Cfr. Jo Jn 19,31-37), é a Revelação suprema e definitiva.

2. Vós sois — e deveis sempre ser — "Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus". Assim quis que fôsseis o vosso Fundador, o Servo de Deus Leão João Dehon, que desejou instituir uma Congregação toda dedicada ao amor e à reparação do Sagrado Coração. O vosso Fundador, que viveu — como é sabido — de 1843 a 1925, num período histórico de várias e extensas mudanças espirituais, culturais, políticas e sociais, soube ser um Sacerdote de profunda e intensa vida interior e, ao mesmo tempo, um apóstolo infatigável da acção social, sob as directrizes das grandes Encíclicas do meu Predecessor Leão XIII.

"O espírito da Congregação — escrevia o Padre Dehon aos seus filhos numa sua Carta Circular — é um amor ardente para com o Sagrado Coração, uma fiel imitação das suas virtudes, principalmente da humildade, do zelo, da doçura, do espírito de imolação; e um zelo incansável em suscitar-lhe amigos e reparadores, que o consolem com o próprio amor". São palavras estas que sintetizam admiravelmente todo o programa do vosso Instituto, e mantêm intacto o forte sentido que encerram e a sua perfeita actualidade.

Desejo sinceramente que todos os filhos do Padre Dehon sigam estes exemplos, para darem início ao segundo século de vida da sua Congregação com juvenil e renovado fervor apostólico, para a glória de Deus e para a edificação da Igreja.

Ao novo Superior-Geral, ao Conselho Geral, a vós Padres Capitulares, e a todos os vossos confrades espalhados em todos os continentes, especialmente nas Missões, a minha palavra de ânimo e a certeza da minha oração para que os Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus sejam sempre fiéis ao seu carisma original e repitam sempre com alegria e entusiasmo: "Vivat Cor Iesu, per Cor Mariae".

Com a minha particular Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A UMA DELEGAÇÃO DA IGREJA COPTA-ORTODOXA


23 de Junho de 1979



Meus queridos Irmãos em Cristo

É com alegria que vos saúdo, distintos hóspedes e respeitáveis delegados do meu irmão, Sua Santidade o Patriarca de Alexandria, o Papa Shenouda III. Estou agradecido por vos ter enviado e pelas palavras calorosas de saudação e amor fraterno que me dirigiu por vosso meio. São fonte de conforto e de ânimo.

Que maravilhosos são os caminhos do Senhor! Permitem-nos professar hoje a nossa fé comum em Jesus Cristo, Seu divino Filho, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, que morreu e ressuscitou e por meio do Seu Espírito Santo vive na Sua Igreja e a guia, Igreja de cujo corpo Ele é a cabeça. Alegramo-nos juntos de que as dúvidas e suspeitas do passado tenham sido superadas de maneira que podemos, de coração dilatado, proclamar juntos uma vez mais esta verdade fundamental da nossa fé cristã.

Desde os primeiríssimos dias da minha eleição para Bispo de Roma considerei como um dos meus principais encargos procurar conseguir a unidade de todos os que têm o santo nome de cristãos. O escândalo da divisão deve ser resolutamente vencido, de maneira que possamos todos realizar, nas vidas das nossas Igrejas e no nosso serviço ao mundo, a oração do Senhor da Igreja «para que todos sejam um». Já tenho insistido nisso em numerosas ocasiões. Repito-vo-lo agora, uma vez que se trata presentemente da comunhão entre duas Igrejas apostólicas.

Sei que uma das questões fundamentais do movimento ecuménico é a natureza dessa comunhão plena que estamos procurando com cada uma das outras e o papel que o Bispo de Roma há-de desempenhar por vontade de Deus, em servir essa comunhão de fé e de vida espiritual, que é alimentada pelos sacramentos e expressa em caridade fraterna. Grande progresso se conseguiu em aprofundar o nosso conhecimento desta questão. Muito falta ainda porém fazer. Considero a vossa visita a mim e à sé de Roma contributo significativo para se resolver esta questão definitivamente.

A Igreja Católica baseia o seu diálogo de verdade e caridade com a Igreja Copta-Ortodoxa nos princípios enunciados pelo Concílio Vaticano II, especialmente na Constituição sobre a Igreja, Lumen Gentium, e no Decreto sobre o Ecumenismo, Unitatis Redintegratio. Tenho o gosto de tomar como meus próprios os termos da Declaração comum assinada pelo meu venerável predecessor o Papa Paulo VI com o Papa Shenouda III em 1973 e o consequente apoio que a Santa Sé prestou até agora a esse diálogo. Fundamental para o diálogo é reconhecer que a riqueza desta unidade na fé e na vida espiritual deve ser expressa em diversidade de formas. A unidade - seja a nível universal seja a nível local — não significa uniformidade ou absorção dum grupo pelo outro. Reverte antes em serviço de todos os grupos, ajudar cada um a que viva melhor os próprios dons que lhe foram reservados pelo Espírito de Deus. Isto anima a levantar a cabeça com alegria e confiança sob a direcção do Espírito Santo. Quaisquer que sejam as amarguras herdadas do passado, quaisquer que sejam as dúvidas do presente e as tensões que podem existir, o Senhor chama-nos a ir avante com mútua confiança e mútuo amor. Se a verdadeira unidade há-de completar-se, deve ser o resultado da cooperação entre os pastores a nível local, da colaboração a todos os níveis da vida das nossas Igrejas de maneira que o nosso povo cresça no entendimento mútuo, na confiança e no amor recíproco, Não procurando nenhum dominar os outros mas servi-los, todos juntos cresceremos na perfeição da unidade pela qual Nosso Senhor orou na noite antes de morrer (Jn 17) e pela qual o Apóstolo Paulo nos exortou a trabalhar com a maior diligência (Ep 4,11-13).

De novo os meus agradecimentos por terdes vindo. Os meus pensamentos e orações vão para o meu irmão o Papa Shenouda III, para os Bispos, o clero e os fiéis da vossa Igreja, como também —com os meus irmãos os Bispos e os fiéis das Igrejas Católicas do Egipto — vós orais e trabalhais pela perfeita comunhão eclesial que será dom de Deus para todos nós.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DA ÍNDIA, DA REGIÃO TAMIL NADU,


EM VISITA "AD LIMINA APOSTOLORUM"


Sábado, 23 de Junho de 1979



Queridos Irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo

Torna-se difícil expressar devidamente a alegria que sinto ao encontrar-me com os meus irmãos Bispos durante as visitas ad limina. Cada reunião dessas é um encontro com o pastor duma Igreja local, com o chefe espiritual duma comunidade eclesial no conjunto da unidade católica. A Igreja una, santa, católica e apostólica subsiste em cada uma das vossas dioceses e nelas todas juntas. Uma visita ad limina é portanto verdadeira celebração da unidade católica e manifestação de fidelidade a Jesus Cristo, o príncipe dos Pastores (1P 5,4) da Igreja universal.

Como Sucessor de Pedro e Vigário de Cristo, desejo hoje saudar nas vossas pessoas todos os católicos da Região de Tamil Nadu, como também os representados por outros Bispos que se juntaram a este grupo. Desejo, além disso, prestar respeitosa homenagem à cultura antiga da vossa terra cultura que está penetrada de sabedoria, é rica de experiência humana e cheia de valores espirituais que mostram Deus e a Sua providência na história humana.

Num dado momento da vida do vosso povo, uma mensagem única e original de revelação foi oferecida e livremente recebida por aqueles que estavam para basear as próprias vidas nas obras e ensinamentos de Jesus, desde o princípio até ao dia em que... foi arrebatado ao céu (Ac 1,1). O nome de Jesus Cristo foi pregado e o seu Evangelho proclamado no vosso meio. A Sua pessoa divina tornou-se para muitos o centro das suas vidas, e a Sua mensagem de ternura e humildade tornou-se a inspiração para as actividades que exerciam. Graças à acção do Espírito Santo, a semente da palavra de Deus, caída em bom terreno, produziu frutos de santidade, justiça e amor. E Deus continua a ser louvado nas obras maravilhosas que a Sua graça realiza na Índia.

A palavra de Deus, que encerra a Boa Nova da salvação em Jesus Cristo, tornou-se para sempre rica herança para ser preservada e transmitida. Foi recebida como tesouro que havia de ser passado de geração em geração. Por Seu lado, Jesus falou como o Pai o ensinara; por Ele nada fez (Cfr. Jo Jn 8,28). Na verdade, Jesus insiste em que fala com a autoridade do Seu Pai: A Minha doutrina não me pertence, é d'Aquele que Me enviou (Jn 7,16). A transmissão da doutrina está entregue à acção do Espírito Santo; deve manifestar-se sempre por meio da Igreja. O Espírito Santo, que o Pai envia em nome de Jesus, desperta na Igreja a realização da Sua vocação como comunidade que é chamada a ouvir, conservar e pôr em prática a palavra de Deus. A transmissão do Evangelho torna-se responsabilidade comum da comunidade inteira, vivendo e operando sob a direcção do Espírito Santo.

O mesmo Espírito Santo, que penetra todo o Corpo de Cristo e o consolida na unidade, insere na comunidade um carisma de especial serviço — o cargo do Bispo — que se torna o instrumento próprio da salvaguarda e da proclamação da palavra de Deus. Este papel característico é o vosso hoje, queridos Irmãos, chamados como sois a governar a Igreja, juntamente com o Sucessos de Pedro e na unidade do Colégio Episcopal. Cada um de vós experimenta a importância e urgência das palavras de Paulo a Timóteo: Guarda o bom depósito da fé pela virtude do Espírito Santo que habita em nós (2Tm 1,14). Este cargo constitui aspecto vital do vosso próprio ministério no íntimo da Igreja e para seu benefício, benefício que na sua integridade é ordenado ao serviço da palavra viva de Deus.

No desempenho do vosso cargo, sois ajudados primeiramente pelos vossos sacerdotes, que são na verdade merecedores de todo o vosso amor fraterno e atenção pastoral. Como vossos colaboradores, eles têm "como primeiro dever a proclamação do Evangelho de Deus a todos" (Presbyterorum Ordinis PO 4) Peço-vos que os certifiquei, cada vez mais, quanto é importante o papel que exercem na realização do trabalho da redenção.

Nas vossas igrejas locais sei que os catequistas têm papel particularíssimo na grande tarefa pertencente a toda a comunidade — a tarefa de transmitir a palavra de Deus. A vossa direcção neste campo é vital: providenciar quanto à preparação doutrinal e espiritual dos catequistas, cuidar que eles sejam instruídos na palavra de Cristo, sejam penetrados pelo mistério do amor de Cristo e repartam o seu zelo servindo. Sob a vossa direcção, hão-de os catequistas compreender que o núcleo da missão que têm consiste na urgência de comunicar Cristo: transmitindo a Sua palavra aos próprios irmãos e extraindo uma resposta sobrenatural de fé, esperança e caridade. Só recebendo a palavra de Deus pode a comunidade dos fiéis atingir a plena maturidade em Cristo que é a Cabeça. O bom êxito no campo catequético pressupõe consciência da responsabilidade comum da Igreja — a compreensão de que todos os fiéis, por meio do Baptismo e da Confirmação que receberam, estão chamados pelo próprio Senhor Jesus a tomar parte no apostolado desta Igreja (Cfr. Lumen Gentium LG 33). Estai certos que o Papa vos apoia e anima nos vossos esforços para preparar, sustentar e aperfeiçoar os vossos catequistas. E peço que o Espírito Santo vos leve a encontrar novas oportunidades para fomentar esta grande actividade apostólica nas vossas Igrejas locais.

De maneira especialíssima depende a transmissão da fé da formação dada aos estudantes para o sacerdócio. A fidelidade da Igreja à sua vocação de ouvir, conservar e praticar a palavra de Deus depende da eficácia dos seminários. É a razão por que o Concílio Vaticano II pôde falar do seminário como sendo "o coração da diocese" (Optatam Totius OT 5). Cada comunidade eclesial é influenciada pela condição dos seminários que lhe preparam os sacerdotes. Os efeitos da educação no seminário duram por gerações. Por este motivo, falei eu recentemente em Roma a um grupo de Reitores de Seminários, exprimindo claramente as minhas piedosas esperanças quanto a este importante aspecto da vida da Igreja. Nessa ocasião disse eu: "Numa palavra, a prioridade dominante para os seminários, é hoje o ensinamento da palavra de Deus em toda a sua pureza e integridade, com todas as suas exigências e em toda a sua eficácia... Um segundo problema de grande importância... é o da disciplina eclesiástica" (João Paulo II, Alocução de 3 de Março de 1979, L'Oss. Rom. língua port. Rm 11 Rm 3 Rm 79, Rm 4). E estes dois aspectos — doutrina e disciplina — recomendo-os hoje ao vosso zelo pastoral para que os promovais cuidadosamente. As vocações para o sacerdócio são alto dom de Deus à comunidade da sua Igreja. Como Bispos devemos concretizar o chamamento de Cristo à juventude; devemos animar os nossos jovens a aceitarem corajosa e generosamente uma vocação; e devemos pedir ao Senhor da messe que mande trabalhadores para a Sua messe (Mt 9,38). E com profunda responsabilidade havemos de formar as vocações que já recebemos, promovendo o ensino e a disciplina dos nossos seminários. Esta solicitude, queridos Irmãos, manifestei-a na última Quinta-feira Santa, ao dizer: "A reconstituição plena da vida dos Seminários em toda a Igreja há-de ser o melhor meio de se aquilatar da realização do renovamento, para o qual o Concílio orientou a Igreja" (João Paulo II, Carta a todos os Bispos da Igreja, em L'Oss. Rom. língua port. Rm 15 Rm 4 Rm 79, I).

A actividade catequética e os seminários: eis verdadeiramente os dois meios privilegiados para a Igreja desempenhar a sua vocação de transmitir a palavra de Deus. Hoje associo-me aos vossos zelosos esforços nestes campos, e a todas as vossas outras iniciativas para bem do Evangelho.

Tenho também confiança de que gozareis da benevolência e da estima de todos os homens e mulheres de boa vontade na questão da liberdade religiosa. O Concílio Vaticano encarregou de novo a Igreja de promover a dignidade da pessoa humana, enumerando as exigências da dignidade natural. E assim declarou que a pessoa humana "tem direito à liberdade religiosa" (Dignitatis humane, 2): Neste documento sente-se o Concílio aliado a milhões de pessoas no mundo, que muito sinceramente abraçam em todas as suas aplicações práticas o artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas: "Cada um tem o direito à liberdade de. pensamento, consciência e religião...".

Com estas esperanças e com orações, queridos Irmãos no Episcopado, renovo eu a expressão da minha profunda solidariedade convosco, em Cristo e na Igreja. Peço a Maria, Mãe de Deus e Mãe da Igreja, que vos conserve na alegria e na fortaleza, para glória do seu Filho "e para o serviço generoso do vosso povo., Quanto ao mais, Irmãos: fixemos os nossos olhos em Jesus, que inspira e aperfeiçoa a nossa fé (He 12,2).



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS CAPITULARES COMBONIANOS


Sábado, 23 de Junho de 1979



Caríssimos Irmãos

1. É para mim motivo de grande consolação dar hoje as boas-vindas na Casa do Pai a vós, beneméritos Missionários Combonianos, no início do vosso Capítulo Geral que — depois do Decreto promulgado ontem pelo Cardeal Prefeito de "Propaganda Fide" — vê as vossas duas famílias, o ramo italiano e o alemão, divididas pelos conhecidos incidentes de 1923, novamente reunidas na caridade do Coração Sacratíssimo de Jesus, de quem, por iniciativa providencial do vosso venerado Fundador, Dom Daniele Comboni, sois Filhos escolhidos, porque d'Ele tomais o nome e n'Ele vos inspirais, como "Congregação dos Filhos do Sagrado Coração de Jesus".

Agradeço vivamente a vossa presença e, mais ainda, o belo testemunho evangélico que destes, regressando à unidade duma só Família religiosa, assim como a fez surgir o carisma original do piedoso Fundador, que, no seu zelo missionário, tinha constantemente nos lábios e no coração o Unum sint da oração sacerdotal de Jesus ao Pai celeste (Cfr. Jo Jn 17,11). Que importante motivo este, queridos Irmãos, para congratular-me e felicitar-me por causa de vós! Deus vos abençoe por isto.

Um pensamento reconhecido e reverente vai também e sobretudo para as esplêndidas, mesmo heróicas figuras de Missionários Combonianos, que no decurso dos anos passados, e também recentemente, souberam dar testemunho de total abnegação pela causa de Cristo, até enfrentarem graves provas e até ao sacrifício da vida, honrando assim o Instituto inteiro e merecendo o elogio evangélico: Bem-aventurados vós quando vos insultarem e perseguirem... Alegrai-vos e exultai porque é grande a vossa recompensa nos céus (Mt 5,11-12).

2. O Capítulo Geral, por vós iniciado ontem sob o olhar de bênção de Jesus, na solenidade litúrgica do seu Sagrado Coração, assinala para vós o fim dum período coroado com muitos frutos e o início, mais que nunca prometedor, dum novo período de serviço eclesial nos territórios de missão. Pois bem, muito espera a Igreja de vós: do vosso exemplo e da vossa generosa dedicação apostólica. Desejo por isso que os trabalhos deste Capítulo sejam corajosa actualização das Constituições e das Regras, para dar à vossa Congregação missionária aquela fisionomia espiritual que requerem os ensinamentos do Concílio Vaticano II, as necessidades dos tempos e as exigências dos lugares aonde sois chamados a exercer o ministério apostólico. Nestes dias de reflexão e debates, deixai-vos conduzir sobretudo pela figura luminosa de Cristo manso e humilde de coração (Mt 11,29), que pela salvação das almas, de todas as almas, sem diferença de língua, raça e nação (Cfr. Apoc Ap 5,9), se fez criança com as crianças, pobre com os pobres, sofredor com os que sofrem, caminho para os transviados, verdade para os que erram e vida para todos os homens; fez-se, numa palavra tudo para todos (Cfr. 1Co 15,28), como afirma São Paulo, para todos poderem senti-lo próximo, benfazejo e salvador, e poderem dizer com o mesmo Apóstolo das Gentes: Ele amou-me e sacrificou-se por mim (Ga 2,10).

3. Propusestes-vos remontar às origens da vossa Congregação religiosa para viver cada vez melhor a vossa vocação missionária segundo o espírito original, a vós dado pelo Fundador com a sua vida virtuosa e com o seu exemplo de Sacerdote zeloso e de Bispo infatigável, totalmente consagrado à salvação dos infiéis nas vastas e distantes plagas da África, tornada sua pátria de adopção. Tende cuidado que nada venha a alterar-se de tudo quanto ele quis imprimir no rosto do seu e vosso Instituto. A educação dos jovens, o cuidado dos doentes, a assistência aos pobres, a instrução aos catecúmenos e a devoção ao Sagrado Coração de Jesus, estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência (Col 2,3), devem continuar a ser, embora com a necessária actualização, os traços característicos das vossas Comunidades religiosas. É necessário, por isso, que, diante do risco do activismo, em vez da actividade e da agitação, em vez da acção, a que um zelo desordenado poderia arrastar também o missionário, se dê o primado à vida interior, à oração, à meditação, ao espírito de pobreza e de sacrifício, para não ceder à subtil tentação de ajustamento ao mundo, talvez com o pretexto de o conhecer melhor, mas na realidade com o perigo de ficar preso nas suas malhas. Lembrados das palavras do Mestre, Vós estais no mundo, mas não sois do mundo (Cfr. Jo Jn 15,19), tende cuidado de ser, onde quer que estejais, sinais distintivos de Cristo, interior e exteriormente: no modo de viver e de vos comportardes, até mesmo no hábito que vos subtraia ao anonimato e indique a vossa presença no meio do povo.

Nas sessões do vosso delicado trabalho sustente-vos o espírito abençoado do vosso Fundador: ele que foi tão aberto às necessidades das almas, mas sempre unido a Deus, vos inspire e obtenha as graças necessárias para a verdadeira reforma da vossa vida consagrada e para o adequado conhecimento das urgentes e múltiplas necessidades do mundo missionário de hoje.

Sobre cada um de vós, sobre vossos trabalhos e sobre a vossa Congregação reunificada, desça a minha especial Bênção Apostólica que agora concedo com paternal benevolência.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS REPRESENTANTES DA ASSOCIAÇÃO


DOS JORNALISTAS CATÓLICOS DA BÉLGICA


Quinta-feira, 28 de Junho de 1979



Senhor Presidente
Minhas Senhoras e meus Senhores

A tradição que vos conduz a trazer-me o produto dos "Presentes Pontificais" pertence ao grupo daquelas que honram a Associação dos Jornalistas católicos Belgas representada pela vossa delegação, a União dos Jornais católicos da Bélgica que nela se associa, e se posso dizer, o povo belga que responde tão largamente aos vossos pedidos.

A iniciativa que retomais cada ano, com um sucesso crescente, manifesta sobretudo a vossa leal fidelidade à Sé de Pedro, uma fidelidade que não receais testemunhar na vossa imprensa e que, de facto, constitui um exemplo que arrasta os vossos compatriotas. Isso sensibiliza-me muito. A comunhão do espírito e do coração com o Papa, a solidariedade com ele nas imensas necessidades que se lhe deparam na sua caridade, são sinais apreciáveis de espírito católico.

Exprimo-vos pois as minhas felicitações, e a minha viva gratidão. E para além das vossas pessoas agradeço os tão numerosos doadores que, pela sua resposta e oferta, entraram nesta imensa cadeia de solidariedade. Agradeço-lhes em nome de todos os que vão beneficiar da sua generosidade e vós adivinhais até que ponto é solicitada a caridade do Papa!

No que -vos diz respeito, formulo votos para o cumprimento da vossa função de jornalistas. um trabalho difícil, dele tomei melhor consciência no decurso das minhas recentes viagens! Encorajo-vos a servir deste modo a verdade e a fraternidade, com um espírito livre, simultaneamente respeitador das convicções dos outros e forte das vossas convicções de homens e de cristãos.

Abençoo-vos de todo ó coração, bem como as vossas famílias e a grande família daqueles que se associaram à campanha do "Presente Pontifício" e do qual vós sois aqui os intérpretes.

Sensibilizou-me também a evocação delicada que fizestes dos laços de amizade e de solidariedade que . se teceram, desde longa data, entre os filhos da Bélgica e os filhos da Polónia. Que Deus abençoe todo o povo belga!



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES DO CONGRESSO NACIONAL


DE ESTUDOS PROMOVIDO PELAS


PONTIFÍCIAS OBRAS MISSIONÁRIAS


28 de Junho de 1979



Dilectos Irmãos no Episcopado,
filhas e filhos caríssimos

E com particular efusão de sentimentos que hoje vos recebo, agradecendo-vos também o desejo que manifestastes por este encontro. A todos apresento a minha mais cordial saudação, reconhecendo em vós e nos numerosos filiados das Pontifícias Obras Missionárias, que aqui representais, membros particularmente activos da Igreja italiana, amadureceram o próprio sentido de responsabilidade em relação às exigências missionárias do Povo de Deus.

No 60.° aniversário da Encíclica «Maximum Illud», promulgada pelo meu Predecessor Bento XV de venerada memória, o vosso Congresso escolheu oportunamente como tema de estudo «A missão no coração da Igreja».

A Igreja, de facto, nasceu missionária. Precisamente no dia do primeiro Pentecostes, segundo nos narram os Actos dos Apóstolos (Ac 2), povos de várias proveniências foram espectadores e ao mesmo tempo destinatários e os primeiros a beneficiar daquilo que o Espírito de Deus poderosamente operou nos Discípulos reunidos no Cenáculo de Jerusalém. Irresistivelmente investidos por aquele Espírito, eles não podiam deixar de proclamar em diversas línguas as maravilhas de Deus (Ibid. 2, 11). A estes primeiros arautos faz eco o Apóstolo das Gentes quando afirma: Anunciar o evangelho ... é para mim uma obrigação: ai de mim se não evangelizar!(1Co 9,16). Tudo isto vale, em primeiro lugar e pessoalmente para cada missionário, com base na sua vocação específica. Mas vale também, em extensão, para toda a comunidade cristã cujos membros já à luz da própria vocação baptismal devem brilhar como astros no mundo, ostentando a Palavra de Vida (Ph 2,15-16), isto é, irradiar e partilhar aquele tesouro de fé e de comunhão que cada cristão possui.

O Concílio Vaticano II exprimiu-se, pois, justamente: «A actividade missionária flui intimamente da própria natureza da Igreja, cuja fé salvífica propaga, cuja unidade católica dilatando aperfeiçoa, em cuja apostolicidade se apoia, cujo afecto colegial da Jerarquia exerce, cuja santidade testemunha, difunde e promove» (Ad Gentes AGD 6). E é neste sentido de participação comum que é interpretada também a citada Encíclica do Papa Bento XV quando, antecipadamente aos tempos, convidava os Bispos a concederem algumas Vocações Presbiterais diocesanas para as necessidades mais vastas e urgentes da Igreja universal (Cfr. AAS 11, 1919, p. 452).

A missão, por conseguinte, não é um compromisso marginal nem tão-pouco supérfluo. Dizer que está no coração da Igreja significa sublinhar que se trata de questão vital para a comunidade cristã. Não é sem razão que São Paulo compara o anúncio do Evangelho com a acção de plantar (Cfr. 1Cor 1Co 3,6) de assentar os alicerces (Ibid.3, 10) e de gerar (Ibid. 4, 15) São tudo imagens que descrevem outras tantas actividades de importância primária, e que convergem no evidenciar o valor fundamental da missão evangelizadora. E não são actividades que se realizem de uma vez para sempre, visto que se trata de cultivar a semente distribuída, completar a construção iniciada, educar aquilo que nasceu, até que Cristo seja formado em vós (Ga 4,19). Isto requer uma atenção constante e cuidadosa; de facto, segundo a parábola de Jesus, não é, infelizmente, impossível adormecermos e favorecer assim a intervenção do «inimigo» semeador de joio (Cfr. Mt Mt 13, 24ss).

Certamente vós, membros das Pontifícias Obras Missionárias, fazeis parte daqueles que vigiam com diligência e solicitude, a fim de que a acção missionária da Igreja seja verdadeiramente fecunda e contínua, e nunca diminua nela a consciência viva da sua responsabilidade a este propósito. A vós, pois, dirijo os meus mais cordiais elogio e encorajamento, com votos sinceros e confiados às mãos do Senhor, por uma incidência cada vez maior da vossa acção providente.


Discursos João Paulo II 1979 - Segunda-feira, 18 de Junho de 1979