Discursos João Paulo II 1979 - Sábado, 20 de Novembro de 1979

Assim pois, se a dimensão missionária é consequência necessária da vocação cristã e se "A Igreja inteira é missionária e a obra da evangelização dever fundamental do Povo de Deus" (Ad gentes AGD 35), cada comunidade diocesana — com o seu respectivo Pastor, sacerdotes, religiosos, religiosas, seminaristas e leigos — tem de tornar realidade essa amplitude de vistas eclesiais que se estendem às outras comunidades, irmãs na fé.

Está aqui uma bonita tarefa evangelizadora para todos e mais especificamente para os Pastores, pois, como bem recorda o Concílio Vaticano II, "suscitando, promovendo e dirigindo a obra missionária na sua diocese, o Bispo torna presente e como que visível o espírito e o ardor missionário do Povo de Deus, de forma que toda a diocese se faça missionária" (Ibid., 38).

4. Ao concluir a vossa visita à Sé de Pedro, dispondes-vos agora a regressar às vossas comunidades, para continuar a obra evangelizadora. Essa obra em que se harmonizam as duas facetas: de pregação perseverante da mensagem salvadora de Cristo e de ajuda aos que vivem em dificuldades e privações.

Quereria que a palavra do Papa chegasse, pessoal e cheia de afecto, a cada membro eclesial que trabalha convosco na vinha do Senhor. Para o confortar na sua luta pelo reino de Cristo, pela difusão da fé, pela vivência da mesma, e pela firmeza alegre aguardando a realização da nossa esperança. E, ao mesmo tempo, para manifestar o meu aplauso pela louvável dedicação prestada aos mais necessitados, aos mais pobres e a todos aqueles a quem talvez só chegue o apoio e o socorro inspirados pela caridade exercida em nome de Cristo. Saibam todos, os que tornam realidade a presença solícita da Igreja, que o Papa os acompanha, os anima e está junto deles.

Termino, amados Irmãos, assegurando-vos que estas intenções as terei presentes na oração, para que a graça divina se difunda em abundância sobre cada membro das vossas Igrejas locais e sabre as suas iniciativas.

Seja o Dador de todo o bem perfeito quem, leve à plenitude a obra começada. Seja a Mãe da Igreja — a Estrela da evangelização e modelo perfeito de vida cristã — quem afague a animosa caminhada e faça que ela vá deixando uma estela fecunda de realizações evangélicas e humanas, numa projecção total no sentido de Cristo e do próximo. Para que assim seja, dou-vos a minha Bênção, que torno extensiva a todos os vossos colaboradores e fiéis.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS DELEGADOS DAS COMISSÕES


ECUMÉNICAS NACIONAIS


23 de Novembro de 1979



Traz-me particular alegria saudar tantos Bispos e Sacerdotes que se estão dedicando pessoalmente ao grande trabalho da unidade cristã em muitas regiões diferentes do mundo. Viestes a Roma a convite do Secretariado para a União dos Cristãos, e a vossa vinda exprime energicamente a íntima colaboração que deve existir, entre as Igrejas locais e a Santa Sé, nesta e em tantas outras matérias.

Há anos o Secretariado, no seu documento sobre a colaboração ecuménica, realçou, por um lado, a própria iniciativa de cada Igreja local no trabalho ecuménico a nível local, e, por outro, a necessidade de se tomar consciência de que iniciativas deste género se hão-de pôr em execução dentro dos limites da doutrina e da disciplina de toda a Igreja Católica. Princípios que se reflectem claramente no carácter e na composição dos que fazem parte deste encontro.

Vós, que viestes de tão diferentes terras, e o corpo directivo do Secretariado, deveis ter tirado, estou seguro, imenso benefício destes dias de discussão e oração. A vossa tarefa é difícil e por vezes desanimadora; por isso, bom é que vos sintais entre irmãos. Estou também reconhecido pela presença de três observadores — da Igreja Ortodoxa, da Comunhão Anglicana e da Federação Mundial Luterana. Dou-lhes alegres boas-vindas como a irmãos em Cristo.

Como sabeis, dentro de breves dias farei visita a Sua Santidade o Patriarca Ecuménico Dimítrios I. «Na verdade, a restauração da unidade entre todos os cristãos era um dos fins principais do Concílio Vaticano II (Cfr. Unitatis Redintegratio UR 1) e, desde a minha eleição, comprometi-me formalmente a promover a execução das suas normas e orientações, considerando estar nisto para mim um dever primordial» (Alocução ao Secretariado para a União dos Cristãos, 18 de Novembro de 1978). A minha primeira viagem ecuménica irá dar expressão eloquente a tal compromisso e há-de levar-me à Primeira Sé da Igreja Ortodoxa. Espero continuar a ter oportunidades de me encontrar com outros pastores e líderes cristãos, tencionando cooperar com eles e intensificar os nossos esforços comuns no sentido da unidade.

O aspecto positivo e esperançoso da actividade ecuménica parece estar implícito em cada palavra do tema escolhido para o vosso encontro: «O Ecumenismo como prioridade pastoral na actividade da Igreja». Durante alguns minutos gostaria de vos comunicar alguns pensamentos que me sugere o referido tema desta semana, em que celebramos o 15.° aniversário de três importantes documentos do Concílio Vaticano II: Lumen Gentium, Orientalium Ecclesiarum e Unitatis Redintegratio.

Estais aqui para discutir sobre o ecumenismo. Esta palavra não deveria trazer consigo falso receio dos necessários ajustamentos para qualquer renovação genuína da Igreja (Cfr. Directório Ecuménico, I, 2). Mas ainda menos é o ecumenismo um passaporte para o indiferentismo ou para esquecer tudo o que é essencial para a nossa tradição sagrada. É antes apelo, vocação, para se trabalhar sob a direcção do Espírito Santo pela unidade visível e perfeita — na fé e no amor, na vida e no trabalho — de todos os que professam crer no nosso único Senhor Jesus Cristo. Apesar do rápido progresso dos últimos anos, muito fica ainda por fazer.

Neste particular, deve continuar o empenho de favorecer o diálogo teológico e a cooperação com outras Igrejas e Comunidades. Além de que, dificilmente se encontrará país em que a Igreja católica não se prodigue, cooperando com outros cristãos, em promover a justiça social, os direitos humanos, o progresso e o auxílio aos necessitados; este trabalho já constitui testemunho comum, prestado a Cristo, a fim de «a cooperação de todos os cristãos exprimir vivamente aquela união que já existe entre eles e colocar em luz mais plena a face de Jesus Cristo, o Servo» (Unitatis Redintegratio UR 12).

Mas o vosso trabalho tem outro aspecto, igualmente vital. «O cuidado de restabelecer a união diz respeito a toda a Igreja, tanto aos fiéis coma aos Pastores» (Ibid., 5). Mas, como ainda não se pode dizer que todos os membros da Igreja Católica tenham assimilado este ensinamento como deveriam, um dos principais encargos das comissões ecuménicas, a cada um dos níveis, está em promover a unidade, colocando diante do povo católico a meta ecuménica, ajudando-o a responder a este chamamento urgente que ele deveria considerar parte integrante da sua vocação baptismal. Esta vocação é apelo para renovamento, para conversão e para aquela oração que é meio único que nos aproxima de Cristo e de cada um dos nossos próximos; por isso, com tanta razão lhes chama o Concílio «ecumenismo espiritual» e «alma do movimento ecuménico» (Ibid., 8) . Cada cristão é chamado a trabalhar pela unidade da Igreja. Duas actividades são especialmente urgentes hoje. Uma está em ajudar os padres e os que estudam para o sacerdócio a apreciarem a dimensão ecuménica deste estado de vida e a tornarem conhecida tal dimensão ao povo que têm ou terão confiado aos seus cuidados. A outra, como disse no mês passado na minha Exortação Catechesi Tradendae, diz respeito à dimensão ecuménica da catequese: «A catequese terá dimensão ecuménica se souber suscitar e alimentar verdadeiro desejo de unidade; e, mais ainda, se inspirar esforços sérios — incluindo o esforço de purificação com humildade e fervor do Espírito, a fim de tornar mais desimpedidos os caminhos — não em vista dum irenismo fácil ... mas em vista da unidade perfeita, quando o Senhor a quiser e pelas vias que Ele quiser» (Catechesi Tradendae CTR 32).

Por estes motivos fundados, deve a tarefa de promover a unidade ser vista como tarefa essencialmente pastoral. É pastoral porque os Bispos são os principais ministros da unidade dentro das Igrejas locais e portanto «têm a especial responsabilidade de promover o movimento ecuménico» (Directório Ecuménico, II, 65). É pastoral, também porque todos os que estão encarregados deste trabalho devem considerá-lo como primariamente ordenado para construir o Corpo de Cristo e promover a salvação do mundo., Enquanto os cristãos estiverem divididos, o trabalho de pregar o Evangelho encontrará especiais dificuldades: as divisões entre os cristãos diminuem a credibilidade do próprio Cristo (Cfr. Evangelii Nuntiandi EN 77). Servir a unidade é servir a Cristo, ao Evangelho e à humanidade inteira. Trata-se, portanto, de serviço verdadeiramente pastoral.

Especial prioridade assinala este trabalho deveras pastoral. O Concílio Vaticano afirmou claramente a urgência do trabalho ecuménico. A desunião é escândalo e é obstáculo à expansão do Evangelho; é dever nosso esforçarmo-nos, com a graça de Deus, por que ela desapareça o mais depressa possível. O renovamento interior da Igreja Católica é contributo indispensável para o trabalho em favor da unidade cristã. Devemos portanto apresentar este chamamento à santidade e à renovação, como coisa central para a vida da Igreja. Ninguém se iluda julgando que o trabalho, pela unidade perfeita na fé, constitui em certo modo coisa secundária, facultativa, periférica, coisa que se pode adiar indefinidamente. A nossa fidelidade a Jesus Cristo urge-nos a trabalhar mais, a rezar mais e a amar mais. O caminho pode ser longo e requer paciência; e temos de pedir que «a legítima paciência em esperar a hora de Deus nunca se transforme em inerte aceitação do 'status quo' da divisão na fé» (João Paulo II, Alocução ecuménica nos Estados Unidos, 7-10-1979) . Vós, portanto, que tendes especial responsabilidade quanto ao trabalho ecuménico da Igreja católica nas vossas próprias terras, deveis sempre considerá-lo como uma das coisas mais urgentes na missão da Igreja nos nossos dias.

Esta finalidade tem em vista o trabalho da Igreja. A obrigação, imposta pelo Concílio Vaticano da Igreja Católica, de se trabalhar pelo ecumenismo foi frequentemente reafirmada por Paulo VI como por mim. Trabalhar pela unidade não é simplesmente deixar-se levar pela simpatia sentida, pela preferência pessoal; significa seguir com fidelidade e encarar verdadeiramente a posição da Igreja Católica. O Concílio recordou-nos que «a acção ecuménica não pode ser senão plena e sinceramente católica, quer dizer, fiel à verdade que recebemos dos Apóstolos e dos Padres ..., e tendente para aquela plenitude com a qual o Senhor quer que o Seu Corpo cresça no decorrer dos séculos» (Unitatis Redintegratio UR 24). Impõe-vos isto pesada responsabilidade: mas lembrai-vos que vos conforta graça abundante.

Bem sabeis que a vocação vos chama ao trabalho, e eu espero que durante esta semana vos tenhais animado ao saber quanto labor se está fazendo em tantos países do mundo e quanto vai sendo feito cada dia pelo Secretariado, aqui em Roma. E afinal este trabalho é trabalho de Deus. Deus é que procura a nossa cooperação, e nós devemos pôr toda a nossa confiança n'Ele, porque só Ele pode levar-nos à unidade que deseja, unidade que é o reflexo criado da unidade entre as Pessoas Divinas. Então não é Igreja de Cristo «povo congregado na unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo» (São Cipriano, De oratione dominica, 23, PL 4, 553, citado em Lumen Gentium LG 4)?

É à luz desta profunda e orante confiança no poder de Deus que eu vos incito a enfrentar — com coragem, fé e perseverança — as dificuldades e obstáculos inevitáveis no vosso trabalho. Nenhuma dificuldade nos há-de fazer afastar nunca do trabalho pela causa de Deus. O caminho da verdade e da fidelidade levará sempre a marca da Cruz: como disse o Apóstolo, temos de sofrer muitas tribulações para entrar no Reino de Deus (Ac 14,22).

Por último, agradeço-vos de novo a todos terdes vindo a esta reunião no Secretariado e terdes contribuído para ela. Ao voltardes para as vossas diversas terras e ao retomardes o vosso trabalho com renovada perspicácia e novo zelo, eu entrego todos vós, e todos os que trabalham convosco, à intercessão de Maria, Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo e Mãe da Sua Igreja. Peço-lhe que vos conforte na grande causa da unidade cristã para glória da Santíssima Trindade: Pai, Filho e Espírito Santo.



SAUDAÇÃO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS FLORISTAS ITALIANOS


Sábado, 24 de Novembro de 1979



É com satisfação que vos recebo e saúdo, queridos sócios do "Clube dos Floristas da Itália", reunidos aqui em Roma para o vosso Congresso anual; desejastes vir encontrar-vos com o Papa para receber uma palavra de encorajamento e benevolência.

O meu pensamento, neste momento, dirige-se cordialmente para vós aqui presentes e para todos os vossos consócios, que desempenham um serviço tão gentil para a convivência humana. De facto, a troca de sentimentos, afectos e intenções entre os homens, realiza-se sempre mediante sinais e figuras, de que a palavra é o mais nobre e representativo. Mas também as coisas, todas as realidades da criação, e as flores com especial evidência, possuem uma particular força evocativa, uma capacidade expressiva, especialmente quando chegam até aos Altares, como manifestação de amor e de fé.

Na sua delicada e perfumada elegância, as flores testemunham a magnificência do Criador. A Sagrada Escritura vale-se frequentemente da linguagem das flores, para convidar o homem a louvar a Deus. Recordo as palavras de Sirácides: Uma voz me diz: Ouvi-me, rebentos divinos, desabrochai como roseira plantada à beira das águas.., dai flores como o lírio, exalai perfume e entoai cânticos e bendizei ao Senhor nas suas obras (Si 39,17-19).

Mas, sobretudo, como não vos lembrar, a vós que viveis entre as flores, a inesquecível recordação que delas fez o Senhor Jesus no Evangelho, para nos convidar à confiança em Deus Pai? Olhai coma crescem os lírios do campo! Não trabalham nem fiam. Pois Eu vos digo: Nem Salomão, em toda a sua magnificência, se vestiu como qualquer deles. Ora, se Deus veste assim a erva do campo que hoje existe e amanhã é lançada ao fogo, como não fará muito mais por vós, homens de pouca fé? (Mt 6,28-30). A flor do campo, alimentada apenas com as linfas fecundas da terra que a mantém, é apontada pelo Senhor como imagem e exemplo de abandono sereno e corajoso à Providência, atitude necessária aos homens de todas as épocas, sempre submetidos à tentação da falta de confiança e do desânimo em consequência das adversidades pessoais e das perturbações da natureza e da história.

Daqui tiro os meus votos para vós: sabei basear o vosso trabalho em sentimentos de gratidão, de louvor, de veneração, e particularmente nesta confiança em Deus e ao mesmo tempo em propósitos de bondade e disponibilidade para com o próximo, de modo que a vossa actividade se torne cada vez mais uma iniciativa apta a levar aos homens uma mensagem de serena beleza e de fraternidade.

Acompanhe-vos a minha Bênção!



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS SÓCIOS DA UNIÃO CRISTÃ


DOS EMPRESÁRIOS DIRIGENTES


Sábado, 24 de Novembro de 1979



Caros e ilustres Senhores!

É-me muito grato receber-vos nesta Sala das Bênçãos, vós qualificados membros do Conselho Nacional, e vós Dirigentes Regionais e Provinciais da União Cristã de Empresários e Dirigentes. Saúdo em vós todos os altos representantes do vasto e complexo mundo dos organizadores de empresas industriais, agrícolas e comerciais, ou seja os criadores de trabalho, de empregos e de aprendizagem profissional.

Uma saudação particular dirige-se sobretudo ao Cardeal Giuseppe Siri, vosso Consultor Moral Nacional: que há mais de trinta anos vos acompanha e encoraja no esforço nobre, sim, mas tão delicado e difícil, de animação cristã do mundo da economia. Saúdo também o vosso Presidente, que desejou, com todos vós, este encontro, para me exprimirdes, como já fizestes em numerosas outras ocasiões com os meus venerados Predecessores Pio XII, João XXIII e Paulo VI, os sentimentos de fé e devotada dedicação à sé de Pedro, sentimentos estes que inspiram e sempre inspiraram esta União desde o seu nascimento, no longínquo 1947.

1. O meu primeiro pensamento para vós, hoje, não pode deixar de ser de estima, de aplauso e encorajamento pela significativa presença que vós, evitando qualquer ostentação, fazeis efectivamente sentir na sociedade. É tarefa, a vossa, em que vejo delineado um "serviço" civil e social propriamente dito: serviço a todos aqueles que estão comprometidos nos vários campos da actividade empresarial. Naturalmente, não estou em condições de entrar no assunto das características especificamente técnicas de tal actividade; nem vós, penso eu, o esperais de mim, a quem o Senhor confiou o múnus pastoral de indicar em todas as formas activas da vida humana a norma suprema para alcançar a salvação eterna. Nesta perspectiva, que não é de ordem económica, mas nem por isso se alheia de qualquer realidade que se refira ao homem, li com a devida atenção a Nota explicativa que o Senhor Presidente, ao pedir esta Audiência, quis gentilmente enviar, acompanhada de abundante documentação. Congratulo-me vivamente com esta vossa actividade, que, no rasto luminoso dos beneméritos fundadores da Instituição, leva avante o esforço para dar a conhecer, tornar aceites e fazer que se apliquem, por parte dos operadores económicos, as orientações da doutrina social da Igreja nas empresas, para que se encontrem nela as razões capazes de justificarem, ou melhor, promoverem, aquela ordem nova da sociedade fundada sobre o respeito da pessoa humana e sobre a promoção harmoniosa e efectiva do bem comum, que responde às exigências do Evangelho e está na ambição dos povos, desiludidos com tantas promessas e tantas experiências, alheias ou contrárias às inspirações da fé, que é a vossa. Para isto tende o trabalho quotidiano da vossa União, amparada, neste campo, pela presença dos seus Consultores Morais, que entre os Sócios, têm função de animadores e guias espirituais, discretos e activos.

Tive conhecimento, com igual prazer, do valioso contributo que dais às análises das transformações tecnológicas, económicas, políticas e culturais que estão a realizar-se na Itália, para lhes imprimirdes uma visão orientada cristãmente. Fazeis tudo isto mediante congressos, encontros, debates e apreciadas publicações. Entre estas últimas, é-me grato recordar a revista "Operare", cujo espírito de perspicácia foi louvado por Paulo VI de venerável memória, por ter sabido também ela superar muitas dificuldades "com a competência dos seus colaboradores, com a paciência das investigações em todos os aspectos da realidade considerada, com a sinceridade das opiniões, com a moderação das afirmações: com a amplitude dos pontos de vista" (Cfr. Paulo VI, Discurso à UCID em 7 de fevereiro de 1966). Com não menos satisfação tive conhecimento do empenho por vós dedicado à promoção da busca metódica para a qualificação dos futuros dirigentes, ou para a requalificação dos actuais, mediante cursos de actualização empresarial, seminários e actividades conjuntas com as Universidades. Esta nobre intenção, destinada a abrir os espíritos à concepção moderna da sociedade e a robustecer as forças morais dos vossos associados, e ainda de outros, a fim de que, para possuírem uma rigorosa preparação técnica, aprendam a ser homens cristãmente honestos, leais e generosos, merece o apreço e o reconhecimento público. Para vós vai, portanto, toda a minha gratidão e a minha paternal benevolência!

2. Mas tudo isto não basta! Vós considerais também dever o esforço para dar satisfação às legitimas exigências apresentadas pelos trabalhadores das vossas Empresas. É necessário que o empresário e os dirigentes de empresas façam tudo o que está em seu poder para escutar, escutar devidamente!, a voz do operário subalterno e para compreender as suas legítimas exigências de justiça e equidade, superando toda a tentação egoísta tendente a tornar a economia norma em si mesma. Vós sabereis e querereis recordar a todos: qualquer falta de atenção neste sector é culpável; toda a demora, fatal. Tantos conflitos e antagonismos entre trabalhadores e dirigentes mergulham não raro as raízes no terreno infecundo da falta de audição, de diálogo recusado ou indevidamente adiado. Não é tempo perdido o que dedicais a encontrar-vos pessoalmente com os vossos empregados, coisa que vos permite tornar as vossas relações com eles mais humanas, e as vossas empresas mais à "medida do homem". A vós não passa despercebida a situação de tantos operários das fábricas que, se forem constrangidos a viver como numa rede artificial, correm o perigo de sentir-se atrofiados na sua espontaneidade interior. A máquina, com os seus automatismos rígidos, é ingrata e avara em distribuir satisfações. As próprias relações entre colegas de trabalho, quando se tornam despersonalizadas, não podem dar o necessário conforto ou amparo; e as organizações de produção, distribuição e consumo não raro constringem os operários a viverem de modo "massificado", sem iniciativas próprias, sem opções. A este nível de desumanização pode chegar-se quando o quadro dos valores é invertido e e eleva o "produtivismo" a único parâmetro do fenómeno industrial, quando é negligenciada a dimensão interior dos valores, quando se olha mais à perfeição da obra do que à perfeição de quem a realiza, privilegiando assim a obra em lugar do realizador, o objecto em vez do sujeito. Aqui o assunto, que por outro lado, vos é familiar, tenderia a ampliar-se, e levaria a falar da questão mais geral e universal dos direitos da homem. Mas chegaríamos longe demais; limito-me, por conseguinte, a recordar uma breve passagem da minha primeira Encíclica, em que afirmava que a violação dos direitos fundamentais do homem, "não pode de maneira alguma pôr-se de acordo com qualquer programa que se autodefina 'humanístico'. E qual seria o programa social, económico, político e cultural que poderia renunciar a esta definição?" (Redemptor hominis RH 17).

Vós estais bem certos que só nesta perspectiva o homem — cada homem, quer empresário ou dirigente, quer colaborador nos diversos sectores, empregado ou operário — pode encontrar o seu sentido profundo, sendo assim posto em condições de exprimir os seus talentos, de colaborar, de participar e de cooperar para o recta funcionamento da empresa, de que todos são, conjuntamente, colaboradores e agentes.

Deste modo readquire também importante significado o tempo destinado ao trabalho, não menos que o tempo destinado ao repouso. Trabalho e repouso fazem que o homem se descubra a si mesmo e também aqueles valores superiores do amor e da solidariedade que lhe permitem realizar um desenvolvimento integral, que o liberte de possíveis e sempre iminentes frustrações.

Eis, caros Irmãos, algumas indicações, que vos poderão ser úteis no cumprimento da vossa não fácil e responsável actividade de empresários e dirigentes. Ao concluir, é-me grato fazer meu o voto que o meu grande Predecessor, Paulo VI, vos dirigiu no seu último discurso, voto que vos deixou como testamento: "Que o vosso testemunho cristão contribua verdadeiramente para difundir no ambiente empresarial a convicção do destino universal dos bens criados, os quais devem chegar equitativamente às mãos de todos, segundo a, regra da justiça inseparável da caridade (Gaudium et Spes GS 69). Oxalá o vosso exemplo estimule a um uso dos rendimentos disponíveis, não arbitrário nem egoísta; oxalá sobretudo a orientação impressa na vossa actividade dentro da empresa faça dela uma comunidade de pessoas, na qual 'cada' um se sinta valorizado na própria dignidade, mediante uma participação responsável na obra comum" (Cfr. Paulo VI, Discurso à UCID, em 12 de Fevereiro de 1977). Este voto, desejo corroborá-lo com a oração, enquanto — invocando o auxílio do Senhor sobre as vossas pessoas, sobre os vossos entes queridos, sobre todos os sócios desta União e sobre as suas famílias — a todos concedo, de coração, a Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS VENCEDORES DO «CONCURSO VERITAS»


Domingo, 25 de Novembro de 1979



Caríssimos Jovens,
vencedores do "Concurso Veritas"!

É com alegria muito particular que vos acolho neste encontro especial, reservado de propósito para vós, e vos dou as minhas paternais e afectuosas boas-vindas.

Vós, de facto, sois os vencedores daquela interessante e significativa iniciativa — lançada pela Acção Católica no início de cada ano, em todas as dioceses da Itália, entre os estudantes das Escolas Superiores, e que atingiu já a sua trigésima edição — para tornar mais dinâmico, apaixonante e fecundo o estudo da fé cristã. Exprimo-vos, portanto, a minha satisfação pela diligência que empregastes no estudo e no aprofundamento do tema estabelecido; e, ao mesmo tempo, estendo a minha saudação agradecida a todos os sacerdotes e professores que vos esclareceram e conduziram com método e com amor.

Damos graças ao Senhor pela vossa juventude límpida e ardente, que soube e sabe ainda entusiasmar-se com as realidades sublimes e salvíficas! Sabei que o Papa está contente convosco; mas sobretudo está contente Jesus, o amigo divino, que a liturgia de hoje nos faz contemplar como "Rei do Universo".

A este respeito, vós recordais o episódio do Evangelho de São João. Ao Governador Pôncio Pilatos, que lhe pergunta a sua real identidade, Jesus responde: "Sou Rei. Se nasci, se vim a este mundo foi para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz". E Pilatos, pensativo, replicou: Que é a verdade? (Jn 18 Jn 57-58).

Caros Jovens: sede no mundo os portadores da "mensagem da Verdade", sede as testemunhas de Cristo, caminho, verdade e vida, luz do mundo e salvação da humanidade! Diante de todos, sabei demonstrar, com o vosso exemplo, que a verdade deve ser amada! Que a verdade deve ser conhecida e, por isso, procurada com amor, com dedicação e com método. Sobretudo que a verdade deve ser vivida. O Cristianismo não é apenas uma doutrina, é, antes de mais, uma pessoa: Jesus Cristo, que deve ser amado e, consequentemente, imitado e tornado presente na vida de cada dia, mediante a fé total na Sua palavra, a vida da graça, a oração e a caridade para com os irmãos.

Caríssimos Jovens! Continuai a viver na Verdade e pela Verdade. Maria Santíssima, Sede da Sabedoria, Mãe do Verbo que ilumina todo o homem, vos assista, vos dê luz e vos conforte.

Com estes votos, dou-vos a minha Bênção Apostólica, que, com particular benevolência, estendo aos vossos Sacerdotes e a todas as pessoas que vos são queridas.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES


NO «CERTAMEN VATICANUM»


Segunda-feira, 26 de Novembro de 1979



Venerável Irmão Nosso
e dilectos Irmãos e Irmãs

Deu-nos gosto aquilo que acaba de dizer, com palavras amabilíssimas, o Cardeal Péricle Felici. Foi ocasião de recordarmos o tempo em que o ouvimos falar latim, improvisando com a maior facilidade, na Basílica Vaticana, quando era Secretário do Concilio Ecuménico Vaticano II.

E, passado mais um ano, temos o gosto de saudar novamente os directores e os membros da "Fundação Latinitas", e também os vencedores do Concurso Vaticano, a quem do fundo da alma felicitamos. Saudamo-vos, a vós que, nesta época, mantendes com vigilância a chama da Latinidade, a alimentais com diligência e a defendeis intrepidamente.

Ficai sabendo que Nós acompanhamos com favor e bons votos, as vossas pessoas e trabalhos. Nós próprio, como sabeis, publicámos este ano uma Constituição Apostólica, escrita, como é costume, em latim e que inicia com as palavras "Sapientia Christiana", a qual se destina a ordenar de novo as Universidades e Faculdades Eclesiásticas. A essa Constituição foram acrescentadas Disposições da Sagrada Congregação para a Educação Católica, entre as quais se encontra esta norma: "Nas Faculdades de Ciências Sagradas requer-se conveniente conhecimento da língua latina, para os alunos poderem compreender e usar as fontes de tais Ciências e os documentos da Igreja" (Disposição para a exacta aplicação da Const. Ap. Sapientia Christiana, IV, art. 24, parágrafo 3; AAS 71, 1979, p. 507). Portanto aqueles alunos que vão frequentar centros de estudos superiores eclesiásticos, se não tiverem já terminado o curso de latim, é necessário que aprendam esta língua, quase compensando o que lhes falta, como já se faz, por exemplo, nas Universidades e Ateneus Romanos.

Sabemos que a "Fundação Latinitas" deseja promover o estudo e uso da língua do Lácio. Se nos fixamos neste uso, levanta-se o problema: é ainda admissível a língua latina, que não poucos julgam afastada das relações humanas como língua morta, segundo dizem? A Igreja Latina, se bem que por vantagens pastorais tenha admitido também as línguas modernas, não deixa de afirmar que a sua língua própria é o latim.

E os principais documentos da Sé Apostólica continuam a ser redigidos nesta língua. Podem todavia expressar-se com vocábulos latinos todas as noções e invenções que utiliza a nossa época, sujeita a contínuas mudanças? Não parece fácil responder a esta pergunta.

Na verdade, durante toda a Idade Média e mesmo depois, o uso do latim era bastante comum nas escolas, nos livros e nos documentos públicos: por isso, esta língua ia-se adaptando para significar coisas novas ou admitia palavras novas. Se portanto queremos no nosso tempo que a língua latina refloresça, não só como exercício particular de literatos mas também e sobretudo, embora dentro de limites determinados, na comunicação entre os homens cultos, e se queremos se torne assim vinculo de unidade, é necessário que ela constitua instrumento apto para dar a conhecer tudo o que os nossos contemporâneos pensam, enunciam com interesse e põem em execução. Já o Nosso venerando Predecessor Paulo VI o reconheceu, ao perguntar se era caso de esperar e trabalhar a fim de a língua latina poder conservar e mesmo ampliar as posições que antigamente ocupava. Respondeu ele próprio: "Não se pode negar que é tarefa grave, trabalhosa e cercada de dificuldades. Mas, ao menos parcialmente e com utilidade comum, ela levar-se-á a efeito procurando que, semelhantemente ao que se fez com as antigas invenções, também as novas de maior importância sejam expressas com palavras latinas" (Paulo VI, Alocução de 16 de Abril de 1966; AAS 58, 1966, p. 36). Eis um campo bem vasto que solicita o vosso talento. Soubemos aliás que vós já tomastes nas mãos este empreendimento, em colaboração de esforços. Fazemos, pois, votos por que o êxito corresponda aos desejos.

Coragem e para a frente! Cultivai com diligência e fazei avançar de comum acordo em todas as direcções a língua latina, insigne pela majestade romana e pela concisão, apta para esculpir por assim dizer a verdade e a rectidão! Seguindo os preceitos dos antigos, esforçai-vos por falar e escrever em latim de maneira clara e simples e, quanto possível, com beleza e harmonia, e também de modo exacto e conveniente.

Por último, implorando para vós o auxílio divino, de todo o coração vos concedemos a Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DO CONSELHO DA UNIÃO


DOS SUPERIORES-GERAIS


26 de Novembro de 1979

: Irmãos e filhos caríssimos

1. Permiti-me que vos manifeste sinceramente a minha alegria ao receber-vos hoje, nesta casa, como Membros qualificados do Conselho da União dos Superiores-Gerais e, por isso, representantes de numerosos Religiosos dispersos pelo mundo. Agradeço que tenhais desejado este encontro, pois me permite dirigir-vos a minha palavra cordial.

O Organismo, de que sois expressão e que representais, favorece não só maior comunhão entre as várias Famílias religiosas, mas também uma acção mais compacta dentro da santa Igreja e para a edificação dela. É isto o que desejo aconteça sempre na realidade.

A minha intenção, aqui e agora, é unicamente recordar ao vosso lado alguns aspectos mais importantes da vida religiosa, que por sua natureza inspiram também comportamentos de vida. O Decreto Conciliar «Perfectae caritatis», sobre a renovação da vida religiosa, traz escrito logo na introdução o seguinte: «Todos os que são chamados por Deus à prática dos conselhos evangé licos e fielmente os observam ... vivem cada vez mais para Cristo e para o Seu Corpo que é a Igreja (cfr. Col Col 1,24). Portanto, quanto mais ardentemente se entregarem a Cristo com esta doação de si mesmos por toda a vida, tanto mais se enriquecerá a vida da Igreja e mais vigorosamente fecundo se tornará o seu apostolado» (Perfectae caritatis PC 1).

2. Caríssimos, vós representais na Igreja um estado de vida, que vem desde os primeiros séculos da sua história e foi produzindo sempre, no âmbito das várias Famílias religiosas, frutos abundantes e saborosos de santidade, de vigoroso testemunho cristão, de apostolado eficaz e mesmo de contributo notável para que se formasse um rico património de cultura e civilização. Pois, tudo isto foi e é ainda possível, precisamente se baseado naquela total e fiel união a Cristo, de que fala o Concílio, sendo ela não só requerida por este, mas também facilmente realizável graças à especial condição de Religiosos consagrados ao Senhor.

O carisma próprio de cada um dos Institutos por vós representados é sinal eloquente de participação na multiforme riqueza de Cristo, de que a largura, o comprimento, a altura e a profundidade (Ep 3,18). muito ultrapassam sempre tudo o que nós podemos realizar bebendo da Sua plenitude. E a Igreja, que é no tempo o rosto visível de Cristo, acolhe e alimenta no próprio seio Ordens e Institutos de estilos muitos diversos, contribuindo tais Ordens e Institutos, no seu conjunto, para revelar a variegada natureza e o dinamismo polivalente do Verbo de Deus encarnado e da própria Comunidade dos que n'Ele acreditam.


Discursos João Paulo II 1979 - Sábado, 20 de Novembro de 1979