AUDIÊNCIAS 1980 - AUDIÊNCIA GERAL

Aos jovens na Basílica de São Pedro




Caros Jovens
Caros rapazes e meninas

Viestes numerosos e talvez de longe a Roma, para rezar sobre o túmulo de São Pedro, para ver o Seu Sucessor e ouvir a Sua palavra. Saúdo-vos muito do coração e agradeço a vossa visita, da qual faço votos por que leveis às vossas casas uma recordação e um sentimento que sejam eficazes na vossa vida.

Estamos no tempo litúrgico da Quaresma, isto é, naquele período particular do ano, de mais reflexão e austeridade, que nos leva dia após dia à Semana Santa e especialmente a Sexta-feira Santa, dia que recorda a morte do Senhor na Cruz pela nossa salvação.

São Paulo, escrevendo aos cristãos da cidade de Filipos, afirmava: Cristo Jesus... humilhou-se a Si mesmo, jeito obediente até à morte e morte de Cruz (Ph 2,8). Humilhou-se a si mesmo; sim, fez-Se obediente: são palavras que hoje parecem desactualizadas, especialmente se ditas a jovens, quando há grande oposição sistemática à obediência, que é apresentada como humilhação da própria personalidade, derrota da inteligência e da vontade, abdicação da própria dignidade humana; e prega-se a autonomia, a revolta e a rebelião...

Ao contrário, Jesus deu-nos precisamente o exemplo da obediência até à morte de Cruz! E por isso vos exorto à obediência, falando-vos em nome de Jesus.

Certamente, na sociedade em que temos de viver, há quem não saiba mandar de maneira justa: e por isso a obediência, quando necessária, deve ser respeitosamente crítica.

Mas há também, e quão numerosos são!, aqueles que formam ensinamento vivo do que é bem: óptimos pais e óptimas mães, que vos amam e só desejam guiar-vos pelo caminho recto; mestres, professores e directores que vos seguem com delicado empenho; sacerdotes equilibrados e prudentes, ansiosos unicamente pela vossa verdadeira felicidade e pela vossa salvação: irmãs e catequistas, dedicadas unicamente à vossa autêntica formação... Ora, eu digo-vos, obedecei-lhes.

Como bem sabeis, todos os Santos passaram através da prova, às vezes mesmo heróica, da obediência: como Maria Santíssima, como São José, que não fizeram senão obedecer à voz de Deus que os chamava a uma missão bem sublime, mas também desconcertante e misteriosa.

Porque deveis obedecer?

Primeiro que tudo, porque a obediência é necessária no quadro geral da Providência: Deus não nos criou ao acaso, mas para um fim bem claro e linear: a Sua glória eterna e a nossa felicidade. Os pais e todos aqueles que têm responsabilidade sobre nós, devem, em nome de Deus, ajudar-nos a alcançar o fim que tem em vista o Criador.

Além disso, a obediência eterna ensina também a obedecer à lei interior da consciência, ou seja, à vontade de Deus expressa na lei moral.

Por último, deveis obedecer também porque a obediência torna serena e consoladora a vida: quando sois obedientes em casa, na escola e no trabalho, estais mais satisfeitos e comunicais a alegria ao ambiente.

E como deveis obedecer?

Com amor e também com santa coragem, sabendo bem que a obediência, quase sempre difícil, custa sacrifícios, exige esforço e às vezes requer mesmo esforço heróico.

É necessário olhar para Jesus Crucificado. É preciso também obedecer confiadamente, estando convencido que não falta nunca a graça de Deus e que depois a alma se enche de imensa alegria interior. O esforço da obediência é pago com alegria pascal contínua.

Eis aqui, ó caríssimos, a exortação que desejava fazer-vos enquanto vivemos o tempo da Quaresma. Ajude-vos e acompanhe-vos sempre a Bênção Apostólica, que de coração concedo a vós, aos vossos pais e aos vossos professores.


Quarta-feira, 26 de Março de 1980 O ciclo do conhecimento-geração e a perspectiva da morte



1. Aproxima-se do fim o ciclo de reflexões com que procurámos seguir a observação de Cristo que nos foi transmitida por Mateus (Mt 19,3-9) e Marcos (Mc 10,1-12): Não lestes que o Criador, desde o principio, os fez homem e mulher e disse: «Por isso, o homem deixará o pai e a mãe, e unir-se-á à sua mulher, e serão os dois uma só carne»? (Mt 19,4-5). A união conjugal, no Livro do Génesis, é definida como «conhecimento»: Adão conheceu Eva, sua mulher. Ela concebeu e deu à luz... e disse: «Gerei um homem com o auxilio do Senhor» (Gn 4,1). Procurámos já, nas nossas precedentes meditações, esclarecer o conteúdo daquele «conhecimento» bíblico. Com ele o homem, isto é ,o varão e a mulher, não só impõe o próprio nome, como fez impondo o nome a outros seres vivos (animalia) tomando assim posse deles, mas «conhece» no sentido de Génesis 4, 1 (e doutras passagens da Bíblia), isto é, realiza o que o nome «homem» exprime: realiza a humanidade no novo homem gerado. Em certo sentido, portanto, realiza-se a si mesmo, quer dizer, o homem-pessoa.

2. Deste modo, fecha-se o ciclo bíblico do «conhecimento-geração». Este ciclo do «conhecimento» é constituído pela união das pessoas no amor, que lhes permite unirem-se tão intimamente entre si que se tornam uma só carne. O Livro do Génesis revela-nos plenamente a verdade deste ciclo. O homem, varão e mulher, que, mediante o «conhecimento »de que fala a Bíblia, concebe e gera um ser novo, semelhante a ele, a quem pode impor o nome de «homem» («gerei um homem»), toma, por assim dizer, posse da humanidade mesma, ou melhor, retoma-a em posse. Todavia, isto acontece de modo diverso de quando tomou posse de todos os outros seres vivos (animalia), de quando lhes impôs o nome. Com efeito, então tinha-se ele tornado o senhor deles, tinha começado a cumprir o conteúdo do mandato do Criador: Enchei e dominai a terra (Cfr. Gén Gn 1,28).

3. Pelo contrário, a primeira parte do mesmo mandato crescei e multiplicai-vos, enchei a terra (Gn 1,28) encerra outro conteúdo e indica outro elemento. O varão e a mulher neste «conhecimento», em que dão início a um ser semelhante a eles, do qual podem ambos dizer, é o osso dos meus ossos, e a carne da minha carne (Gn 2,24), são quase juntamente «raptados», juntamente colocados ambos de posse da humanidade que eles, na união e no «conhecimento» recíproco, querem exprimir novamente, tomar novamente de posse, tirando-a deles mesmos, da própria humanidade, da admirável maturidade masculina e feminina dos seus corpos e enfim — através de toda a sequência das concepções e das gerações humanas desde o princípio — do mistério mesmo da Criação.

4. Neste sentido, pode-se explicar o «conhecimento» bíblico como «posse». É possível ver nela algum equivalente bíblico do «eros»? Trata-se aqui de dois âmbitos conceituais, de duas linguagens: bíblica e platónica; só com grande cautela podem elas ser interpretadas uma pela outra (1). Parece, ao contrário, que na revelação original não está presente a ideia da posse da mulher por parte do homem, ou vice-versa, como de um objecto. Por outro lado, é sabido que, baseados na pecaminosidade contraída depois do pecado original, o homem e a mulher devem reconstruir, com canseiras, o significado do dom recíproco desinteressado. Este será o tema das nossas próximas análises.

5. A revelação do corpo, encerrado no Livro do Génesis, especialmente no capítulo 3, mostra com impressionante evidência que o ciclo do «conhecimento-geração», tão profundamente radicado na potencialidade do corpo humano, foi submetido, depois do pecado, à lei do sofrimento e da morte. Deus-Javé diz à mulher: Aumentarei os sofrimentos da tua gravidez, os teus filhos hão-de nascer entre dores (Gn 3,16). O horizonte da morte abre-se diante do homem, juntamente com a revelação do significado gerativo do corpo no acto do «conhecimento» recíproco dos cônjuges. E eis que o primeiro homem, varão, impõe à sua mulher o nome de Eva, porque ela seria mãe de todos os vivos (Gn 3,20), quando já ele tinha ouvido as palavras da sentença, que determinava toda a perspectiva da existência humana «dentro» do conhecimento do bem e do mal. Esta perspectiva é confirmada pelas palavras: Voltarás à terra de que foste criado; porque tu és pó e em pó te hás-de tornar (Gn 3,19).

O carácter radical dessa sentença é confirmado pela evidência das experiências de toda a história terrena do homem. O horizonte da morte estende-se a toda a perspectiva da vida humana sobre a terra, vida que foi inserida naquele original ciclo bíblico do «conhecimento-geração». O homem que violou a aliança com o seu Criador, colhendo o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, é por Deus-Javé apartado da árvore da vida: Agora é preciso que ele não estenda a -mão para se apoderar também do fruto da árvore da vida, comendo do qual, viva eternamente (Gn 3,22). Deste modo, a vida dada ao homem no mistério da criação não foi tirada, mas restringida pelo limite das concepções, dos nascimentos e da morte, além disso agravada pela perspectiva da pecaminosidade hereditária; é-lhe, porém, em certo sentido, novamente dada como encargo, no mesmo ciclo sempre a repetir-se. A frase Adão uniu-se («conheceu») Eva, sua mulher. Ela concebeu e deu à luz (Gn 4,1) é como selo impresso na revelação original do corpo no «princípio» mesmo da história do homem sobre a terra. Esta história forma-se sempre de novo na sua dimensão mais fundamental quase desde o «princípio», mediante o mesmo «conhecimento-geração», de que fala o Livro do Génesis.

6. E assim cada homem traz em si o mistério do seu «princípio» intimamente ligado à consciência do significado generativo do corpo. Génesis 4, 1-2 parece calar-se sobre o tema da relação que medeia entre o significado generativo e o significado esponsal do corpo. Talvez agora nem seja tempo nem haja lugar para esclarecer esta relação, embora na futura análise isso pareça indispensável. Será necessário, então, levantar de novo as perguntas relacionadas com o aparecimento da vergonha no homem, vergonha da sua masculinidade e da sua feminilidade, anteriormente não experimentada. Neste momento, todavia, isto passa para segunda ordem. No primeiro plano mantém-se, na verdade, o facto de «Adão se ter unido («conhecido») a Eva, sua mulher e ela ter concebido e dado à luz» Este é verdadeiramente o limiar da história do homem. É o seu «princípio» na terra. Sobre este limiar o homem, como varão e mulher, tem a consciência do estado generativo do próprio corpo: a masculinidade encerra em si o significado da paternidade e a feminilidade o da maternidade. Em nome deste significado, um dia dará Cristo resposta categórica à pergunta que lhe fizerem os fariseus (Mt 19 Mc 10). Nós, todavia, penetrando o simples conteúdo desta resposta, procuramos ao mesmo tempo pôr em realce o contexto daquele «princípio», a que se referiu Cristo. Nele mergulha as raízes a teologia do corpo.

7. A consciência do significado do corpo e a consciência do seu significado generativo tomam contacto, no homem, com a consciência da morte, de que trazem em si, por assim dizer, o inevitável horizonte. Todavia, sempre volta na história do homem o ciclo «conhecimento-geração», em que a vida luta, sempre de novo, com a inexorável perspectiva da morte, e sempre a domina. É como se a razão desta inflexibilidade da vida, que se manifesta na «geração», fosse sempre o mesmo «conhecimento», com que o homem ultrapassa a solidão do próprio ser e, mais ainda, de novo se decide a afirmar tal ser num «outro». E ambos, homem e mulher, o afirmam no novo homem gerado. Nesta afirmação, o «conhecimento» bíblico parece adquirir uma dimensão ainda maior. Isto é, parece inserir-se naquela «visão» de Deus mesmo, com que termina a primeira narrativa da criação do homem acerca do «varão» e da «mulher» feitos «à imagem de Deus»: Deus, vendo toda a sua obra, considerou-a muito boa (Gn 1,31). O homem, não obstante todas as experiências da própria vida, não obstante os sofrimentos, as desilusões de si mesmo, a sua pecaminosidade, e não obstante, enfim, a perspectiva inevitável da morte, coloca todavia, sempre de novo o «conhecimento» no «início» da «geração»; ele, assim, dir-se-ia que participa naquela primeira «visão» de Deus mesmo. Deus Criador «viu..., e toda a sua obra a considerou muito boa». E, sempre de novo, confirma ele a verdade destas palavras.
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Nota

1. Segundo Platão, o «eros» é o amor sedento do Belo transcendente e exprime a insaciabilidade tendente ao seu eterno objectivo; eleva, portanto, sempre o que é humano para o divino, que é o único a ser capaz de saciar a ansiedade da alma aprisionada na matéria; é amor que não recua diante do maior esforço, para atingir o êxtase da união; portanto é amor egocêntrico, é cobiça, embora dirigida para valores sublimes (cfr. A. NYGREN, Erôs et Agapé, Paris 1951, vol. 11, PP 9-10).

No decorrer dos séculos, através de muitas transformações, o significado do «eros» foi abaixado até assumir notas meramente sexuais. Característico é, a este propósito, o texto de P. Chauchard, que parece mesmo negar ao «eros» as características do amor humano:

«La cérébralisation de la sexualité ne réside pas dans'les trucs techniques ennuyeux, mais dans la pleine reconnaissance de sa spiritualité, du fait qu'Erôs n'est humain qu'animé par Agapé et qu'Agapé exige l'incarnation dans Erôs» (P. CHAUCHARD, Vices des vertus, vertus des vices, Paris 1963, p. 147).

A comparação do «conhecimento» bíblico com o «eros» platónico revela a divergência das duas concepções. A concepção platónica baseia-se na ansiedade do Belo transcendente e na fuga da matéria: a concepção bíblica, pelo contrário, dirige-se à realidade concreta e alheia-se do dualismo do espírito e da matéria, como também da hostilidade específica contra a matéria («E Deus viu que isto era bom»: Gn 1,10 Gn 1,12 Gn 1,18 Gn 1,21 Gn 1,25).

Ao passo que o conceito platónico de «eros» ultrapassa o alcance bíblico do «conhecimento» humano, o conceito contemporâneo parece demasiado restrito. O «conhecimento» bíblico não se limita a satisfazer o instinto ou o gozo hedonístico, mas é acto plenamente humano, dirigido conscientemente para a procriação, e é também a expressão do amor interpessoal (cfr. Gén Gn 29,20 1S 1,8 Sam 1S 12,24).

Anúncio da visita à África

É-me grato, hoje, comunicar oficialmente a nova viagem apostólica, que tinha já sido anunciada no início do mês passado, por ocasião da Audiência especial concedida aos Representantes das comunidades das várias Nações Africanas, residentes em Roma. Trata-se da visita à Africa, que, acolhendo o convite feito pelos respectivos Episcopados e vários Chefes de Estado, realizarei de 2 a 12 do próximo mês de Maio, e, se Deus quiser, me levará a seis diversos Países daquele grande e promissor Continente: Zaire, República Popular do Congo, Quénia, Gana, Alto Volta e Costa do Marfim.

Agradeço cordialmente, também, ao Episcopado e às Autoridades civis dos outros Paises, cujo convite, gentilmente feito, não me é possível atender. Desejo assegurar-lhes que apreciei o seu gesto e que, com esta minha visita, me proponho homenagear toda a Africa e exprimir o meu sincero afecto a todos os habitantes daquele querido Continente.

O adjectivo apostólico, com o qual logo qualifiquei esta viagem, claramente indica qual seja a intenção essencial que move os meus passos. A finalidade, de facto, consiste em corresponder à minha missão de ministério universal e também em me encontrar com os Pastores e Fiéis daquelas florescentes comunidades, há tempo iluminadas pela fé em Cristo, que hoje se apresentam abertas ao sopro do seu Espírito: Recordarei, a propósito, que dois daqueles Países — o Zaire e o Gana — celebram este ano o centenário da evangelização: é necessário, portanto, o reconhecimento que, da parte da Igreja, se inspire nos sentimentos de alegria, satisfação e esperança pelo vigoroso desenvolvimento que a semente da Palavra de Deus teve naquelas regiões, encontrando ali o "bom terreno" que — como explica a parábola evangélica — garante abundantes frutos (Cfr. Lc Lc 8,11 Lc 8,15 Mt 13,23).

Por outro lado, como poderia esquecer o secular e generoso esforço, tão frequentemente levado até ao heroísmo e ao martírio, que numerosos grupos de Missionários e Missionárias — Sacerdotes, Religiosas e Leigos — envidaram no vasto Continente?

E como poderia, além disso, esquecer o impulso dado pelo Magistério pessoal e pelo ministério dos Sumos Pontífices deste século, para um mais intenso e incisivo trabalho em terras de África? Entre tantos exemplos, desejo pelo menos recordar a Encíclica Fidei donum do Papa Pio XII (1957), que deu vida a várias iniciativas benéficas, e também a obra do meu Predecessor mais próximo, Paulo VI, de sempre venerada memória, que, tendo presente a Constituição conciliar Ad Gentes, em Outubro de 1968, dirigiu uma calorosa Mensagem ao Episcopado e aos Povos da África, efectuando em seguida uma importante viagem ao Uganda.

É do coração que faço votos por que, com o auxílio do Senhor, a minha visita possa contribuir para o incremento da fé cristã naquelas regiões que estão brancas para a ceifa (Jn 4,35), e, ao mesmo tempo, estimule todas as populações do Continente a trabalharem, com empenho confiante e decidido, pelo autêntico progresso humano ao serviço da fraternidade e da paz.

Pesar pela morte de D. Romero

Neste particular momento de perturbação e de ansiedade, convido-vos a unirdes-vos à minha dor e oração, por causa do assassínio do Arcebispo de San Salvador, D. Oscar Arnulfo Romero y Galdamez. A notícia de que o Prelado tinha sido barbaramente assassinado durante a celebração da Santa Missa, chegou ontem: ele foi ferido mortalmente no momento mais sagrado, durante a função mais excelsa, mais divina.

Todos estamos sem palavras, perante uma tal violência, que não se deteve nem mesmo diante dos umbrais de uma Igreja, para levar a termo o seu cego programa de morte.

Caríssimos irmãos e irmãs, deixai que o Papa exprima todo o seu pesar por este novo episódio de crueldade, loucura e ferocidade. Foi morto um homem, que se acrescenta à já tão numerosa sequência de vitimas inocentes: foi morto um Bispo da Igreja de Deus, no exercício da sua missão santificadora, ao oferecer a Eucaristia (Cfr. Lumen Gentium, LG 26). É um irmão no Episcopado que foi extinto, e por isso não só a sua Arquidiocese, mas toda a Igreja está sofrendo por uma tal iníqua violência, que se acrescenta a todas as outras formas de terrorismo e de vingança, que hoje no mundo degradam a dignidade do homem — pois a vida de cada homem é sagrada! — exterminam a bondade, a justiça, o direito, e sobretudo ofendem o Evangelho e. a sua mensagem de amor, de solidariedade e de fraternidade em Cristo.

Para onde vai o mundo? E repito ainda hoje: para onde vamos?

Não se melhora a sociedade, nem se eliminam os contrastes ou se constrói o amanhã com a barbárie. A violência destrói. Não substitui valores, mas corre para a beira de um abismo: o profundo abismo do ódio.

Somente o amor constrói, somente o amor salva!

Ao renovar o meu amargurado apelo a fim de que em todas as Nações finalmente triunfe a concórdia da paz operosa, reafirmo o meu pesar por esta nova e trágica acção sanguinária; e particularmente exprimo a minha participação de afecto e de oração à querida Igreja de San Salvador, enviando a todos, Bispos, sacerdotes e fiéis, a minha Bênção de irmão e de pai.

Saudações

A uma peregrinação de Cagliari (Itália)

Desejo dirigir uma calorosa saudação à peregrinação da Arquidiocese de Cagliari; ela vem acompanhada pelo Arcebispo D. Giuseppe Bonfiglioli, encontrando-se também presente o seu predecessor, Cardeal Sebastiano Baggio.

Caríssimos Irmãos e Filhos, agradeço-vos esta visita, que me é particularmente querida porque testemunha a fé e a dedicação não só dos Calharitanos, mas também de toda a nobre ilha da Sardenha; a dez anos de distância da visita ali realizada pelo inesquecível Papa Paulo VI. Espero que a vossa presença em Roma contribua quer para consolidar cada vez mais a vossa adesão ao Senhor, aqui onde se conservam os túmulos dos primeiros Apóstolos e Mártires, quer para aumentar o sentido da vossa pertença à grande comunidade eclesial, da qual este agrupamento é já, de per si, sinal eloquente. Faço votos por que a vossa vida de cada dia seja acompanhada da alegria de uma fé autêntica, que se torne também estimulo e força para superar todas as dificuldades que a existência nesta terra reserva a cada um de nós.

O Senhor vos proteja sempre, juntamente com Nossa Senhora de Bonaria. Da minha parte, concedo-vos de coração a Bênção Apostólica a fim de que sirva de conforto para vós e para todos os que vos são queridos, especialmente os que sofrem, as crianças e todos os que se encontram em necessidades particulares.

A uma peregrinação de Pompeia (Itália)

Merece uma palavra particularmente afectuosa a numerosa peregrinação da Prelatura de Pompeia, acompanhada pelo Bispo D. Domenico Vacchiano, juntamente com a Delegação Pontifícia, com o Presidente da Câmara da Cidade e com a Junta Municipal. Sei que também se encontra presente a Banda Musical dos Alunos das Obras do Santuário. Para todos, indistintamente, a minha cordial saudação.

Caríssimos, a vossa presença hodierna faz-me recordar com prazer o meu encontro convosco o ano passado no mês de Outubro, e da entusiástica recepção que nessa ocasião me reservastes. Agradeço-vos sinceramente esta visita que une idealmente o célebre Santuário de Nossa Senhora do Rosário com esta Sede Pedro num único acto de devoção a Nosso Senhor Jesus Cristo, que está no centro da nossa comum fé cristã e que tanto Maria como Pedro, de modos diversos, amaram, serviram e testemunharam. Aos numerosos jovens que se encontram entre vós, faço votos paternais por que saibam estimular todos os dias o seu entusiasmo num contacto confidente com Jesus e com Sua Mãe, de modo a implantarem fundamentos sólidos para uma vida de empenho sério em favor da sociedade e da Igreja.

Para todos faço votos de prosperidade cristã e de todo o bem; seja disso penhor a minha Bênção Apostólica, que de coração vos concedo, convidando-vos a torná-la extensiva a todos os que vos são queridos.

A peregrinação paroquial de Portovenere (Itália)

A afectuosa saudação que vos dirijo caríssimos participantes na peregrinação paroquial de Portovenere, deseja ser uma resposta cordial à visita que quiseste: fazer-me, na alegre ocorrência do 850º aniversário da dedicação da vossa igreja de São Lorenço, realizada pelo meu predecessor Inocêncio II. Estou informada da vossa actividade, inspirada pelos ensinamentos do Evangelho, e também da vossa devoção ao Apóstolo Pedro. Faço votos por que as solenes manifestações em programa, favoreçam cada vez mais a vossa orientação para Cristo, nosso Salvador, e o empenho de dar sempre generoso testemunho, a Ele e ao seu Evangelho.

Com a minha Bênção Apostólica, que concedo de coração a vós e àqueles que vos são queridos.

Ao Coro dos "Intonati e stonati" de Siena (Itália)

Dirijo agora à "`Associação Coral" de Siena, que alegrou esta Audiência, uma saudação e uma palavra de cordial apreço. Filhos caríssimos, é digna de louvor a finalidade que guia o vosso empenho: tornar proveitosos para o canto coral também aqueles a quem a natureza não favoreceu particularmente. Não há nisto um símbolo e uma lição para todos os outros sectores da vida? A generosidade, a humildade e a constância podem ajudar a levar a um "acorde" pacificador, que se revela, depois, fonte de alegria para todos. Desejo, pois, que sejais apóstolos de paz e de acordo em família, na escola e em todos os ambientes em que vos encontrardes.

Com a minha Bênção Apostólica!

A vários grupos de jovens

E agora uma palavra para os jovens. Caríssimos; sede bem-vindos! A vossa presença, tão alegre e espontânea, testemunha que a Igreja é jovem e está projectada para o futuro. Sede conscientes das vossas responsabilidades: a mensagem de Cristo está confiada à vossa generosidade e ao vosso entusiasmo. Vós deveis levá-la para o novo milénio, que se delineia no horizonte. É uma mensagem empenhativa: anuncia a redenção mediante a cruz, a vida e a alegria através do sofrimento e da morte; anuncia Cristo crucificado, morto e ressuscitado.
Se quereis ser disso testemunhas críveis, empenhai-vos em encarná-la antes de tudo na vossa vida: quem de vós se aproxima deve poder recolher nas vossas palavras, nos vossos gestos, em tudo aquilo que sois, um reflexo do rosto luminoso de Cristo ressuscitado. Jesus quer caminhar convosco pelos caminhos do mundo, que se apresentam nestes anos difíceis: não vos esqueçais disso! Dou-vos a minha Bênção Apostólica.

A dois grupos do Movimento dos Focolares

Saúdo com imenso prazer os dois numerosos grupos, aqui presentes, que fazem parte do Movimento dos Focolares, e que participaram, há dias, no Centro Mariapoli de Rocca di Papa, num congresso sobre a caridade, na qual se devem inspirar como ideal de vida, animando o ambiente paroquial e social com o testemunho concreto do amor mútuo e procurando ser o seu fermento de comunhão e de unidade.

Caríssimos, ao dizer-vos o meu cordial obrigado pela vossa visita e pelos vossos sentimentos de dedicação, exorto-vos a continuardes no empenho de oferecer testemunho genuíno de vida cristã.

O Redentor confirme os vossos generosos propósitos com a sua graça, em penhor da qual concedo a minha Bênção.

Aos Doentes Caríssimos Doentes!

Como sempre, chegue até vós a minha saudação sempre sincera e afectuosa.

Como infelizmente na sociedade actual há tanta violência, dirijo-me de modo especial a vós, a fim de que, nestes dias santos que nos aproximam da Páscoa, olheis para o Crucifixo para cooperar com amor mais intenso na Redenção da humanidade, segundo os misteriosos mas sempre sapientes desígnios da Providência.

A minha Bênção vos acompanhe.

Aos jovens Casais

Caríssimos jovens Casais!

Viestes à Audiência do Papa nesta circunstância para vós tão bela e encantadora do matrimónio; sede bem-vindos e aceitai a minha saudação e os meus mais cordiais votos de felicidade.

Ao iniciardes agora a vossa nova vida, levai para o mundo o vosso amor e a vossa fidelidade com alegria e coragem, como um ramo de oliveira e uma lâmpada acesa em sinal de paz e de fraternidade.

De todo o coração invoco sobre vós a bênção do Senhor.

Aos Representantes do Movimento Internacional de Apostolado e de Ambientes Sociais Independentes

Tenho o prazer de saudar os Membros do "Bureau du Mouvement International d'Apostolat des Milieux Sociaux Indépendants". Formulo os melhores votos, queridos Amigos, para a Assembleia geral que estais a preparar e que terá por tema: "Sinais dos tempos — Anúncio de Jesus Cristo". Sim, as pessoas dos meios em que estais naturalmente inseridos têm, às vezes, grandes responsabilidades humanas que monopolizam as suas preocupações; é ali que Jesus Cristo lhes deve ser anunciado, por meio de leigos cristãos que estão junto deles, que souberam renovar e fortificar as próprias convicções de fé, que as afirmam, e que testemunham com a sua vida o espírito do Evangelho. Agradeço-vos o trabalho que realizais ao serviço do Movimento, e levai a todos os vossos colegas do MIAMSI o encorajamento do Papa que os abençoa de todo o coração.

Aos paroquianos de Montmartre (França)

Tenho também a dizer urna palavra sincera aos paroquianos de Saint Pierre de Montmartre e ao seu pároco.

Felicito-vos por amardes a vossa bela igreja romana, tão rica de recordações, e por quererdes embelezá-la ainda mais, oferecendo-lhe três portas de bronze esculpidas por Tommaso Gismondi e fundidas em Anagni, em honra de São Pedro, de São Dionísio, primeiro Bispo de Paris, e da Virgem Maria. Os meus parabéns ao artista que empregou neste tríptico o melhor do seu talento e da sua fé! E obrigado a todos por me terem dada a alegria de benzer estes trabalhos!

Permiti-me também que vos encoraje a construir constantemente a vossa comunidade paroquial. Que cada um se torne cada vez mais responsável da sua unidade na caridade, do seu avanço nos caminhos da fé concretamente vivida e dignamente celebrada, da sua atenção evangélica por aqueles que vivem ou passam pela célebre colina de Montmartre! Peço ao Senhor que vos ampare e abençoe.



                                                                          Abril de 1980

JOÃO PAULO II

AUDIÊNCIA GERAL

Quarta-feira, 2 de Abril de 1980




Os interrogativos sobre o matrimónio na visão integral do homem

O nosso encontro de hoje efectua-se no coração da Semana Santa, na véspera imediata daquele «Tríduo pascal» em que tem o seu apogeu e se ilumina todo o Ano litúrgico. Estamos para reviver os dias decisivos e solenes em que se realizou a obra da redenção humana: nesses dias Cristo, morrendo, destruiu a nossa morte e, ressuscitando, deu-nos de novo a vida.

É necessário que cada um se sinta pessoalmente envolvido no mistério que a Liturgia, também este ano, renova para nós. Exorto-vos pois, cordialmente, a participardes com fé nas sagradas funções dos próximos dias e a comprometerde-vos a morrer para o pecado e ressuscitar cada vez mais plenamente para a vida nova que nos trouxe Cristo. Retomamos, agora, o tema de que nos temos ocupado desde há tempos.

1. O Evangelho segundo Mateus e o Evangelho segundo Marcos apresenta-nos a resposta dada por Cristo aos fariseus, quando eles O interrogavam acerca da indissolubilidade do matrimónio, referindo-se à lei de Moisés que admitia, em certos casos, a prática do chamado libelo de repúdio. Recordando-lhes os primeiros capítulos do Livro do Génesis, Cristo respondeu: «Não lestes que o Criador, desde o princípio, fê-los homem e mulher e disse: 'Por isso, o homem deixará o pai e a mãe, e se unirá à sua mulher, e serão os dois uma só carne?' Portanto, já não são dois, mas uma só carne. Pois bem, o que Deus uniu, não o separe o homem». Depois, referindo-se à pergunta deles sobre a lei de Moisés, Cristo acrescentou: Por causa da dureza do vosso coração, Moisés permitiu que repudiásseis as vossas mulheres; mas no princípio não foi assim (Mt 19,3 ss.; Mc 12,2 ss). Na sua resposta Cristo referiu-se duas vezes ao «princípio», pelo que também nós, no decurso das nossas análises, procurámos esclarecer do modo mais profundo possível o significado desse «princípio», que é a primeira herança de cada ser humano no mundo, homem e mulher, primeira certidão da identidade humana segundo a palavra revelada, primeira fonte da certeza da sua vocação como pessoa criada à imagem do próprio Deus.

2. A resposta de Cristo tem um significado histórico — mas não apenas histórico. Os homens de todos os tempos fazem esta interrogação sobre o mesmo tema. Fazem-na também os nossos contemporâneos que, porém, nas suas perguntas não se referem à lei de Moisés, que admitia o libelo de repúdio, mas a outras circunstâncias e outras leis. Estas suas interrogações estão carregadas de problemas, desconhecidos dos interlocutores do tempo de Cristo. Sabemos as perguntas a propósito do matrimónio e da família que foram dirigidas no último Concílio ao Papa Paulo VI, e que são continuamente formuladas no período pós-conciliar, dia a dia, nas mais diversas circunstâncias. Formulam-nas as pessoas individualmente, casais, noivos, jovens, e também escritores, jornalistas, políticos, economistas, demógrafos, enfim — a cultura e a civilização contemporânea.

Penso que entre as respostas que Cristo daria aos homens do nosso tempo e às sua interrogações, muitas vezes tão impacientes, seria ainda fundamental a que deu aos fariseus. Respondendo àquelas interrogações, Cristo referir-se-ia, antes de mais, ao «princípio». Fá-lo-ia talvez de modo ainda mais decidido e essencial, dado que a situação interior e, ao mesmo tempo, cultural do homem de hoje parece afastar-se daquele «princípio» e assumir formas e dimensões que divergem da imagem bíblica do «princípio» em pontos evidentemente cada vez mais distantes.

Todavia, Cristo não ficaria «surpreendido» com nenhuma destas situações, e suponho que continuaria a referir-se sobretudo ao «princípio».

3. E por isso que a resposta de Cristo exigia uma análise particularmente profunda. De facto, naquela resposta foram recordadas verdades fundamentais e elementares sobre o ser humano, como homem e mulher. E a resposta através da qual entrevemos a própria estrutura da identidade humana nas dimensões do mistério da criação e, ao mesmo tempo, na perspectiva do mistério da redenção. Sem isto não se pode construir uma antropologia teológica e, no seu contexto, uma «teologia do corpo», da qual tenha origem também a visão, plenamente cristã, do matrimónio e da família. Isto foi salientado por Paulo VI, quando da sua encíclica dedicada aos problemas do matrimónio e da procriação, no seu significado humana e cristãmente responsável, se referiu à «visão integral do homem» (Humanae Vitae HV 7). Pode dizer-se que, na resposta aos fariseus, Cristo revelou aos interlocutores também esta «visão integral do homem», sem a qual não pode ser dada nenhuma resposta adequada às interrogações relacionadas com o matrimónio e com a procriação. Precisamente esta visão integral do homem deve ser construída desde o «princípio».

Isto é igualmente válido para a mentalidade contemporânea, tal como o era, se bem que de modo diferente, para os interlocutores de Cristo. Com efeito, somos filhos de uma época em que, para o desenvolvimento de várias disciplinas, esta visão integral do homem pode ser facilmente rejeitada e substituída por múltiplas concepões parciais que, detendo-se sobre um outro aspecto do compositum humanum, não atingem o integrum do homem, ou deixam-no fora do próprio campo visual. Nelas inserem-se diversas tendências culturais que — baseadas nestas verdades parciais — formulam as suas propostas e indicações práticas sobre o comportamento humano e, ainda com maior frequência, sobre como comportar-se com o «homem». O homem torna-se, então, mais um objecto de determinadas técnicas do que sujeito responsável da própria acção. A resposta dada por Cristo aos fariseus quer também que o homem, varão e mulher, seja esse sujeito, isto é, um sujeito que decida as próprias acções à luz da verdade integral sobre si mesmo, enquanto verdade original, ou seja, fundamento das experiências autenticamente humanas. E esta a verdade que Cristo nos faz haurir do «princípio». Referimo-nos assim aos primeiros capítulos do Livro do Génesis.

4. O estudos destes capítulos, talvez mais que o de outros, torna-nos conscientes do significado e da necessidade da «teologia do corpo». O «princípio» diz-nos relativamente pouco sobre o corpo humano, no sentido naturalista e comtemporâneo da palavra. Sob este ponto de vista encontramo-nos, no presente estudo, a um nível totalmente pré-científico. Não sabemos quase nada sobre as estruturas internas e sobre os métodos que regulam o organismo humano. Todavia, ao mesmo tempo — talvez precisamente devido à antiguidade do texto — a verdade importante para a visão integral do homem revela-se de modo mais simples e pleno. Esta verdade diz respeito ao significado do corpo humano na estrutura do sujeito pessoal. Em seguida, a reflexão sobre estes textos arcaicos permite-nos estender esse significado a toda a esfera da intersubjectividade humana, em especial na permanente relação homem-mulher. Graças a isto, adquirimos, a respeito desta relação, uma óptica que devemos necessariamente colocar na base de toda a ciência contemporânea acerca da sexualidade humana, em sentido biofisiológico. Isto não quer dizer que devemos renunciar a esta ciência ou privar-nos dos seus resultados. Pelo contrário: se eles devem servir para nos ensinar alguma coisa sobre a educação do homem, na sua masculinidade e feminilidade e sobre a esfera do matrimónio e da procriação, é necessário - através de cada um dos elementos da ciência contemporânea — chegar sempre ao que é fundamental e essencialmente pessoal, tanto em cada indivíduo - homem ou mulher — como nas suas relações recíprocas.

E é precisamente neste ponto que a reflexão sobre o arcaico texto do Génesis se revela insubstituível. Ele constitui realmente o «princípio» da teologia do corpo. O factor de a teologia compreender também o corpo não deve maravilhar nem surpreender ninguém que seja consciente do mistério e da realidade da Encarnação. Pelo facto de o Verbo de Deus se ter feito carne, o corpo entrou, eu diria, pela porta principal na teologia, isto é, na ciência que tem por objecto a divindade. A encarnação — e a redenção que dela provém — tornou-se também a fonte definitiva da sacramentalidade do matrimónio de que, em tempo oportuno, trataremos mais amplamente.

5. As interrogações feitas pelo homem contemporâneo são também as dos cristãos: daqueles que se preparam para o Sacramento do Matrimónio ou daqueles que já contraíram o matrimónio, que é o sacramento da Igreja. Estas não são apenas as perguntas das ciências, mas ainda mais as perguntas da vida humana. Muitos homens e muitos cristãos procuram no matrimônio o cumprimento da sua vocação. Muitos querem encontrar nele o caminho da salvação e da santidade.

Para eles é particularmente importante a resposta dada por Cristo aos fariseus, zeladores do Antigo Testamento. Aqueles que procuram a realização da própria vocação humana e cristã no .matrimónio, são chamados, antes de mais, a fazer desta «teologia do corpo», cujo «princípio», encontramos nos primeiros capítulos do Livro do Génesis, o conteúdo da própria vida e do próprio comportamento. Com efeito, quanto é indispensável, no caminho desta vocação, a profunda consciência do significado do corpo, na sua masculinidade e feminilidade! Quanto é necessária uma precisa consciência do significado esponsal do corpo, do seu significado gerador — dado que tudo isto, que forma o conteúdo da vida dos esposos, deve encontrar constantemente a sua dimensão plena e pessoal na convivência, no comportamento e nos sentimentos! E isto, ainda mais no contexto de uma civilização que permanece sobre a pressão de um modo de pensar e de julgar materialista e utilitário. A biofisiologia contemporânea pode oferecer muitas informações precisas sobre a sexualidade humana. Todavia, o conhecimento da dignidade pessoal do corpo humano e do sexo pode ser obtido ainda noutras fontes. Uma fonte particular é a palavra do próprio Deus, que contém a revelação do corpo, a que remonta ao «princípio».

Quanto é significativo que Cristo, na resposta a todas estas perguntas, ordene ao homem que retorne, de certo modo, ao início da sua história teológica! Ordena-lhe que se coloque no limite entre a inocência-felicidade original e a herança da primeira queda. Porventura não lhe quererá dizer, deste modo, que o caminho por onde Ele conduz o homem, varão e mulher, no Sacramento do Matrimónio, isto é o caminho da «redenção do corpo», deve consistir em recuperar esta dignidade em que se realiza, simultaneamente, o verdadeiro significado do corpo humano, o seu significado pessoal e «de comunhão»?

6. Terminamos, por ora, a primeira parte das nossas meditações dedicadas a este tema tão importante. Para dar uma resposta mais completa às nossas perguntas, por vezes ansiosas, sobre o matrimónio — ou ainda mais exactamente: sobre o significado do corpo — não pode-mos apenas deter-nos sobre aquilo que Cristo respondeu aos fariseus, fazendo referência ao «princípio» (Cfr. Mt Mt 19,3 ss.; Mc 10,2 ss.). Devemos tomar também em consideração todas as suas outras afirmações, entre as quais sobressaem, de modo especial, duas, de carácter particularmente sintético: a primeira, do Sermão da Montanha, a propósito das possibilidades do coração humano em relação à concupiscência do corpo (Cfr. Mt Mt 5,8), e a segunda, quando Jesus se referiu à ressurreição futura (Cfr. Mt Mt 22,24-30 Mc 12,18-27 Lc 20,27-36). Pensamos fazer destes dois enunciados o objecto das nossas ulteriores reflexões.

Pesar pela morte de D. Romero

Também hoje os nossos pensamentos, repletos de viva solicitude, continuam a dirigir-se para El Salvador.

A morte do Arcebispo Romero, que foi barbaramente ferido por mão assassina, enquanto celebrava o Santo Sacrifício, tem particular eloquência. A Igreja suplica, ajoelha-se em oração junto dos restos mortais do saudoso Pastor, a fim de que Deus aceite o sacrifício da sua vida, que foi unido de modo tão singular ao Sacrifício de Cristo.

Todos respeitem neste acontecimento doloroso o particular testemunho do Evangelho, que Dom Romero se comprometeu a dar em toda a sua vida de pastor, procurando Cristo especialmente naqueles a quem Ele está mais próximo. Assim também o Arcebispo de San Salvador dedicou a sua vida ao serviço dos mais pobres e dos mais marginalizados.

Após a notícia dos novos trágicos acontecimentos, que se verificaram durante o funeral do Arcebispo D. Romero (acontecimentos causadores de numerosas vítimas entre as pessoas que assistiam ao rito), dirigimo-nos mais uma vez a Deus com humilde súplica, a fim de que o sacrifício do pastor obtenha a justa paz para a sua pátria. Retornem à recta razão todos os que crêem alcançar os próprios fins mediante a morte de seres humanos.

A morte de D. Romero traga um sinal de paz e de reconciliação, urna espécie de purificação espiritual que dissipe o ódio, a violência e às tensões entre os concidadãos.

Envio a toda a Comunidade de San Salvador, ao decorrerem estes santos dias que nos aproximam da Páscoa, a expressão da minha particular participação e da minha solidariedade em Cristo crucificado e ressuscitado.

Saudações

A peregrinos da Croácia

Vejo aqui um grupo de peregrinos da Croácia. Sede bem-vindos aqui junto do Pai comum. Saúdo-vos a todos e desejo-vos felizes festas pascais.

A um grupo de jovens austríacos

Dirijo uma saudação especialmente cordial aos numerosos jovens da Áustria e, ao mesmo tempo, através da televisão austríaca, a todos os jovens católicos do vosso país. O afecto mais profundo do Papa e a sua grande esperança concentram-se sempre em vós e em todos os jovens do mundo. A humanidade de amanhã será mais justa, mais pacífica e sobretudo mais humana e cristã na medida em que vos esforçardes desde já por que assim seja e continuardes sem interrupção por este caminho.

Como jovens católicos sede portadores de uma mensagem de alegria, daquela alegria tão necessária aos homens da sociedade actual, tão cheia de possibilidades extraordinárias, mas também de perigos pavorosos. Para vós vale hoje o mandato de Cristo de serdes sal da terra no vosso ambiente, de vos contrapordes à degradação social e moral, de dardes testemunho de Cristo ressuscitado, princípio e fim de toda a história, e que é o mesmo hoje, amanhã e sempre.

Peço-vos, queridos jovens, que sejais cada vez mais conscientes da vossa vocação e da vossa missão no mundo hodierno, correspondendo-lhe generosamente com palavras e obras, como é próprio da juventude. Sede verdadeiramente jovens católicos. Sede cristãos dignos deste nome! E este o meu desejo e é o que, com a minha especial Bênção Apostólica, vos peço a todos, àqueles que estão aqui presentes e aos que, do vosso país ouvem a minha voz.

A vários grupos de língua francesa

Não podendo dirigir uma saudação especial a todos os grupos de língua francesa, saúdo, entre os jovens, os estudantes belgas de retórica dos Institutos católicos das províncias de Antuérpia e de Limburgo. A vossa cultura, queridos amigos, permite-vos conhecer melhor Roma e a sua história, e também os testemunhos da vitalidade da Igreja. E por meio da Igreja que podeis descobrir cada vez melhor a verdade de Cristo, a certeza do seu amor, a libertação interior que ele oferece, o seu poder de renovação. A todos, a minha afectuosa Bênção Apostólica.

A peregrinos provenientes do Japão

Aos peregrinos do Japão desejo dirigir uma calorosa saudação. Invoco sobre vós as graças de Cristo, que por meio da sua morte venceu a morte. Que Ele vos guie no vosso caminho e vos prepare para a felicidade eterna.

Aos jovens

Dirijo agora uma cordial saudação e uma paternal exortação aos vários grupos presentes nesta Audiência. Sei que são particularmente numerosos os que pertencem a Institutos escolares. Limito-me a mencionar o mais numeroso: os estudantes do Liceu-Ginásio Estatal de Viterbo.

Caríssimos jovens, a Liturgia deste período faz-nos viver, de modo muito particular, unidos a Cristo que sofre, que se oferece por nós na Última Ceia e se imola no Calvário, para ressuscitar na alegria da Páscoa. Esta contemplação, séria e devota, vos ajude a serdes "ressuscitados" com Cristo Ressuscitado, e vos estimule a caminhardes sempre "em novidade de vida", isto é, a progredir na vida da fé, da esperança e do amor cristão.

Tudo isto vos desejo de coração. Com a minha Bênção Apostólica.

Aos Doentes

O breve pensamento pelos doentes presentes, que são a parte mais predilecta desta assembleia, não pode deixar de ser sugerido pela Sexta-feira Santa, já próxima, dia único, pela recordação da morte de Cristo, Filho de Deus. O adorável Salvador, pregado na Cruz, imolado no abandono e no sofrimento para salvar o mundo, demonstra-nos, mais do qualquer outro argumento, quanto é precioso o sofrimento à presença de Deus. Dele, aceite pelas mãos da Providência, nasce sempre uma imensa riqueza espiritual. Assim, o sofrimento torna-se alegria, conforto e redenção. A todos os que provêm de Cáorte, na diocese de Veneza, e a todos os outros doentes concedo de coração a minha Bênção.

Aos jovens Casais

A contemplação do Crucifixo, erguido entre o céu e a terra na Sexta-Feira Santa, tem qualquer coisa a dizer também a vós, jovens Casais, a quem um profundo amor uniu na vida e na morte. O esposo, segundo o Apóstolo Paulo (Ep 5,25), representa Cristo; a esposa, a Igreja. E como Cristo morreu para tornar pura e imaculada a sua esposa, também o esposo deve estar disposto até mesmo à morte, por aquela a quem ama. E a esposa, como a Igreja, deve dar tudo, afecto e assistência, numa atitude perene de amor pelo esposo.

Que Deus vo-lo conceda.



AUDIÊNCIAS 1980 - AUDIÊNCIA GERAL