Discursos João Paulo II 1980 - Sexta-feira, 30 de Maio de 1980

Receba, Senhor Presidente da Câmara Municipal, os votos ferventes do seu hóspede pelo pesado encargo que as personalidades eleitas devem assumir. Peço ao Senhor que o assista em todos os esforços que serão empreendidos ao serviço do bem comum, a fim de que o Povo de Paris, tão caro ao meu coração, encontre sempre em maior número as condições para o seu desenvolvimento, e torne assim maior o nosso vigor.



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE A PARIS E LISIEUX

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS REPRESENTANTES DE OUTRAS CONFISSÕES CRISTÃS


Nunciatura Apostólica de Paris

Sábado, 31 de Maio de 1980



Caros Irmãos em Cristo

Agradeço-vos este encontro que desejei ter convosco durante a minha primeira vista à França. Em primeiro lugar saúdo muito cordialmente os nossos irmãos ortodoxos, vindos em grande número de diversas regiões do Oriente para viverem neste, país que os acolhe, continuando deste modo a longa tradição de que Santo Ireneu foi uni dos primeiros exemplos. Não me esqueço do representante da Igreja anglicana. E agora dirijo-me aos representantes do protestantismo francês que estão aqui presentes.

Neste momento do esforço que fazemos em comum para restaurar entre todos os cristãos a unidade querida por Cristo, é necessário, com efeito, que tomemos consciência das exigências que nos traz hoje o facto de sermos cristãos.

Antes de tudo, e na dinâmica do movimento pela unidade, é preciso purificar a nossa memória pessoal e comunitária, com a recordação de todas as tensões, injustiças e ódios do passado Esta purificação realiza-se mediante o perdão recíproco, desde o fundo do coração, condição do crescimento em plenitude de uma verdadeira caridade fraterna, de uma caridade que não se irrita e que tudo desculpa (1Co 13,5 1Co 13,7). Digo isto aqui, porque conheço os dolorosos acontecimentos que no passado caracterizaram neste país as relações dos católicos com os protestantes. Sermos cristãos, hoje, exige que nos esqueçamos do que fica para trás, a fim de estarmos completamente disponíveis para a missão à que o Senhor nos chama (Ph 3,13). Vós estais a enfrentar esta missão e alegro-me de modo particular pela qualidade colaboração existente entre vós, sobretudo no que se refere ao serviço do homem, serviço compreendido em toda a sua dimensão e que exige, com urgência e desde já, um testemunho de todos os cristãos, sobre cuja necessidade já insisti na encíclica Redemptor hominis.

Mas, hoje talvez mais do que nunca, o primeiro serviço a ser prestado ao" homem é testemunhar a verdade, toda a verdade "alithevondes en agapi, "praticando a verdade pela caridade" (Ep 4,15). Não devemos descansar até não sermos novamente capazes de confessar juntos a verdade total, para a qual o Espírito nos guiará (cfr. Jn 16,13). Sei como é sincera também a vossa colaboração neste âmbito: as mudanças realizadas por ocasião da assembleia do protestantismo francês, em 1975, são um exemplo desta sinceridade. É preciso que cheguemos a confessar juntos toda a verdade, para juntos podermos testemunhar verdadeiramente Jesus Cristo, o único em quem e por meio de quem o homem pode ser salvo (cfr. Ac 4,12).

Quis manifestar-vos alguns sentimentos que me animam neste momento, mas não quis ir mais além a fim de evitar que o tempo disponível para o diálogo mais pessoal e para a oração, que concluirá o nosso encontro, se tornasse mais curto.

Antes de recitar a Oração do Senhor, poderemos colocar-nos juntos diante do plano salvífico de Deus, meditando a magnífica confissão do Apóstolo Paulo no exórdio da sua carta aos Efésios.

"Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, do alto dos Céus, nos abençoou com toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo. Foi assim que n'Ele nos escolheu antes da constituição do mundo, para sermos santos e imaculados diante dos Seus olhos. Predestinou-nos para sermos Seus filhos adoptivos por meio de Jesus Cristo, por Sua livre vontade, para fazer resplandecer a Sua maravilhosa graça, pela qual nos tornou agradáveis em Seu amado Filho. É n'Ele que temos a redenção, pelo Seu sangue, a remissão dos pecados, segundo a riqueza da Sua graça, que abundantemente derramou sobre nós, com plena sabedoria e discernimento, dando-nos a conhecer o mistério da Sua vontade, segundo o beneplácito que n'Ele de antemão estabelecera, para ser realizado ao completarem-se os tempos: Reunir sob a chefia de Cristo todas as coisas que há no Céu e na Terra. N'Ele é que fomos escolhidos, predestinados, conforme o desígnio d'Aquele que tudo opera segundo a decisão da Sua vontade, para servir à celebração da Sua glória, nós que, desde o começo, tínhamos esperado em Cristo. Foi n'Ele que vós também, depois de terdes ouvido a Palavra da verdade — o Evangelho da vossa salvação, no qual acreditastes —, fostes marcados com o selo do Espírito Santo, que tinha sido prometido, o qual é penhor da nossa herança, enquanto esperamos a completa redenção daqueles que Deus adquiriu para louvor da Sua glória" (Ep 1,3-14).

Pai Nosso que estais no céu, santificado seja o vosso nome. Venha a nós o vosso reino, seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu. O pão nosso de cada dia nos dai hoje. Perdoai-nos as nossas ofensas assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido. E não nos deixeis cair em tentação. Mas livrai-nos do mal. Amém.



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE A PARIS E LISIEUX

PRECE DO PAPA JOÃO PAULO II

NA CAPELA DA MEDALHA MILAGROSA


Paris, 31 de Maio de 1980



Ave, Maria,
cheia de graça,
o Senhor é convosco
bendita sois vós entre as mulheres
bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus.

Santa Maria, Mãe de Deus,
rogai por nós, pecadores, agora e na hora da nossa morte.
Amen.

Ó Maria concebida sem pecado,
rogai por nós que recorremos a vós.

Esta é a oração que vós inspirastes, ó Maria, a Santa Catarina Labouré, neste mesmo lugar há 150 anos; e esta invocação, agora impressa na medalha, e actualmente levada e pronunciada por tantos fiéis no mundo inteiro!

Neste dia em que a Igreja celebra a visita que vos fizestes a Isabel quando o Filho de Deus já tomara carne no vosso seio a nossa primeira oração será para vos louvar e vos bendizer. Vós sois bendita entre todas as mulheres! Bem-aventurada vós que acreditastes! O Poderoso fez por vós maravilhas! A maravilha da vossa maternidade divina! E em previsão dela, a maravilha da vossa Imaculada Conceição! A maravilha do vosso Fiat! Vós fostes associada tão intimamente a toda a obra da nossa Redenção, associada à cruz do nosso Salvador, o vosso Coração foi por isso trespassado, ao lado do Seu Coração. E agora, na glória do vosso Filho, vós não cessais de interceder por nós, pobres pecadores. Vós velais pela Igreja de que sois Mãe. Vós velais por cada um dos vossos filhos. Vós obtendes de Deus, para nós, todas estas graças, simbolizadas pelos raios de luz que irradiam das vossas mãos abertas. Apenas sob a condição de que nos atrevamos a pedir-vo-las, que nos aproximemos de vós com a confiança, a ousadia e a simplicidade duma criança assim que vós nos levais sem cessar a caminho do vosso divino Filho.

Neste lugar abençoado, gosto de vos repetir eu próprio, hoje, a confiança, o apego profundíssimo de que vós me fizestes sempre a graça. "Totus tuus". Venho como peregrino, depois de todos os que vieram a esta capela a partir de há 150 anos; como todo o povo cristão que em grande número está aqui todos os dias para vos dizer a sua alegria, a sua confiança e a sua súplica. Venho como o Beato Maximiliano Kolbe: antes da sua viagem missionária ao Japão; precisamente há 50 anos, veio ele aqui procurar o vosso apoio particular para propagar aquilo a que chamou depois "A Milícia da Imaculada" e veio lançar a sua obra prodigiosa de renovação espiritual, sob o vosso patrocino, antes de dar a vida pelos seus irmãos. Cristo pede hoje a sua Igreja uma grande obra de renovação espiritual. E eu, humilde sucessor de Pedro, é esta grande obra que venho confiar-vos; como o fiz em Jasna Gora, em Nossa Senhora de Guadalupe em Knock, em Pompéia, em Éfeso, e como o farei no próximo ano em Lourdes.

Consagramo-vos as nossas forças e a nossa disponibilidade para servirmos o desígnio de salvação operada pelo vossa Filho. Pedimo-vos que, graças ao Espírito Santo, a fé se aprofunde e robusteça em todo o povo cristão, para a comunhão vencer todos os germes de divisão e para a esperança ser revigorada em todos os desanimados. Pedimo-vos especialmente por este povo da França, pela Igreja que está na França, pelos seus Pastores, pelas almas consagradas, pelos pais e mães de família, pelas crianças e pelos jovens, pelos homens e pelas mulheres da terceira idade. Pedimo-vos por aqueles que sofrem duma miséria particular, física ou moral, que sentem a tentação de infidelidade, que estão abalados pela dúvida num clima de incredulidade, e pedimo-vos também pelos que sofrem perseguição por causa da fé. Nós confiamo-vos o apostolado dos leigos, o ministério dos Sacerdotes e o testemunho das Religiosas. Nós vos pedimos que o apelo da vocação sacerdotal e religiosa seja muitas vezes ouvido e seguido, para glória de Deus e vitalidade da Igreja neste país, e pela dos países que esperam ainda uma ajuda fraternal missionária.

Recomendamo-vos especialmente a multidão das Irmãs da Caridade, cuja Casa-Mãe está neste lugar estabelecida, as quais, no espírito do fundador São Vicente de Paulo e de Santa Luísa de Marillac, estão tão prontas para servir a Igreja e os pobres em todos os meios em todos os países. Nós vos pedimos por aquelas que habitam esta Casa e acolhem, no coração desta capital febril, todos os peregrinos que sabem qual o preço do silêncio e da oração.

Ave, Maria,
cheia de graça,
a Senhor é convosco,
bendita sois vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus.

Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores,
agora e na hora da nossa morte.

Amen.



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE A PARIS E LISIEUX

ENCONTRO DO PAPA JOÃO PAULO II

COMO AS RELIGIOSAS


Paris, 31 de Maio de 1980



Queridas Irmãs

1. Durante as minhas viagens apostólicas, sinto felicidade profunda e sempre nova quando me encontro com as Religiosas, cuja existência consagrada, mediante os três votos evangélicos, "pertence inseparavelmente à vida e à santidade da Igreja" (Lumen Gentium LG 44). Bendigamos juntos ao Senhor que permitiu este encontro! Bendigamos-Lhe pelos frutos que surgirão na vossa vida pessoal, nas vossas Congregações e no povo de Deus! Obrigado por terdes vindo tão numerosas, de todos os bairros de Paris e da região parisiense, e até da província! Sinto-me feliz de vos exprimir a vós que estais aqui, como a todas as Religiosas da França, a minha estima, o meu afecto e encorajamento.

Esta reunião, mais ou menos campestre, faz-me pensar naqueles momentos de pausa e de repouso que Jesus Cristo reservava aos seus primeiros discípulos, ao voltar de algumas viagens apostólicas. Também vós, queridas irmãs, viestes das vossas sedes e dos vossos trabalhos de catequese ou de assistência aos jovens; serviços paroquiais ou inserção nos ambientes pobres. Alegro-me ao repetir-vos as palavras do Senhor:

"Vinde à parte... e descansai um pouco" (cfr. Mc 6,31). Juntos meditaremos sobre o mistério e o tesouro evangélico da vossa vocação.

2. A vida religiosa não é propriedade vossa, assim como não é propriedade de um Instituto. Ela é "dom divino que a Igreja recebeu do seu Senhor e com a sua graça conserva sempre fielmente" (Lumen Gentium LG 43). Em resumo, a vida religiosa é uma herança, uma realidade vivida na Igreja desde há séculos, por uma multidão de homens e de mulheres. E a experiência profunda que dela fizeram, transcende as diferenças sócio-culturais que podem existir de um país para o outro, supera também a imagem que deixaram e situa-se para além das realizações e das pesquisas do nosso tempo. É importante ouvir e imitar aqueles e aquelas que têm encarnado melhor o ideal da perfeição evangélica e que, em tão grande número, santificaram e dignificaram a terra da França.

Até ao fim da vossa vida, conservai-vos em êxtase e acção de graças pelo chamamento misterioso que ressoou um dia no fundo dos vossos corações: "Segue-me (cfr. Mt 9,9 Jn 1,43). "Vende os teus bens, dá-os aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem e segue-me" (Mt 19,21). Levastes primeiramente este apelo como um segredo, depois submeteste-lo ao discernimento da Igreja. Com efeito, é um risco bem grande, deixar tudo para seguir Cristo. Mas já percebíeis — e experimentastes depois — que a Igreja podia encher o vosso coração. A vida religiosa é uma amizade, uma intimidade de ordem mística com Cristo. O vosso itinerário pessoal deve ser como uma reedição original do célebre poema do Cântico dos Cânticos. Queridas irmãs, na maior intimidade da oração, absolutamente vital para cada uma de vós, como também por ocasião dos vossos diversos encontros apostólicos, escutai o Senhor a murmurar-vos o mesmo convite: "Segue-me". O ardor da resposta conservar-vos-á no vigor da vossa primeira oblação: Caminhais assim de fidelidade em fidelidade!

3. Seguir Cristo é bem outra coisa que a admiração de um modelo, mesmo se tiverdes bom conhecimento das Escrituras e da Teologia. Seguir Cristo é alguma coisa de existencial.

É querer imitá-1'O a ponto de se deixar configurar com Ele, assemelhar-se a Ele, a ponto de Lhe ser — segundo as palavras da Irmã Elisabeth da Trinidade "uma humanidade suplementar". E isto no próprio mistério de castidade, de pobreza e de obediência. Este ideal supera a compreensão, supera-as forças humanas! Não é realizável senão graças a tempos fortes de contemplação silenciosa e intensa do Senhor Jesus. As Religiosas chamadas "activas" devem ser em certas horas "contemplativas", a exemplo das monjas às quais me dirigirei em Lisieux.

A castidade religiosa, minhas Irmãs, é verdadeiramente querer ser como Cristo; todas as outras razões que se podem apresentar se esvanecem diante desta razão essencial: Jesus era puro. Este modo de ser de Cristo era não somente a superação da sexualidade humana, prefígurando o mundo futuro; mas igualmente a manifestação, uma "epifania", da universalidade da sua oblação redentora. O Evangelho não cessa de mostrar como Jesus viveu a castidade. Nos seus contactos humanos, singularmente amplos em relação às tradições do seu ambiente e da sua época, Ele conquista perfeitamente a personalidade do outro, a sua simplicidade, o seu respeito, a sua bondade, a sua arte de suscitar o melhor no coração das pessoas encontradas, convertem a Samaritana, a mulher adúltera e tantas outras pessoas. Oxalá o vosso voto de virgindade consagrada — aprofundado e vivido no mistério da pureza de Cristo — e que já transfigura as vossas pessoas, vos leve a conquistar verdadeiramente os vossos irmãos e irmãs nas situações concretas em que se encontram! Tantas pessoas, no nosso mundo, estão como que perturbadas, humilhadas, desesperadas! Na fidelidade às regras de prudência, fazei-lhes sentir que as amais à maneira de Cristo, colocando-lhes no coração a ternura humana e divina que ele lhes traz.

Prometestes igualmente a Cristo ser pobres com Ele e como Ele. É verdade, a sociedade de produção e de consumo apresenta problemas complexos à prática da pobreza evangélica. Não é este nem o lugar nem o momento de discutir o problema. Parece-me que cada Congregação deve ver neste fenómeno económico um convite providencial para dar uma resposta, ao mesmo tempo tradicional e .. totalmente nova, a Cristo pobre contemplando-O com frequência e a longo na sua vida radicalmente pobre, é estando muitas vezes com os humildes e com os pobres, que são também o rosto d'Ele, que podereis dar tudo o que sois e o que tendes. A Igreja tem necessidade de ser animada pelo vosso testemunho. Avaliai a vossa responsabilidade.

Quanto à obediência de Jesus, ela ocupa um lugar central na sua obra redentora. Meditastes muitas vezes as páginas em que São Paulo fala da desobediência inicial que foi como que a porta de entrada do pecado e da morte no mundo e fala do mistério da obediência de Cristo que atrai de novo a elevação da humanidade para Deus. O despojamento de si mesmo e a humildade são mais difíceis à nossa geração atraída pela autonomia e também pelos caprichos. Não se pode portanto imaginar uma vida religiosa sem obediência aos superiores, que são os guardiães da fidelidade ao ideal do Instituto. São Paulo salienta o ligame de causa e de efeito entre a obediência de Cristo até à morte de cruz (cfr. Ph 2,6-11) e a sua glória de Ressuscitado e de Senhor do universo. Do mesmo modo a obediência de toda a Religiosa — que é sempre um sacrifício da vontade por amor — traz abundantes frutos de salvação para o mundo inteiro.

4. Aceitastes, então, seguir Cristo e imita-1'O de perto, para manifestar a sua verdadeira face tanto àqueles que já O conhecem como aos que não O conhecem. E isto, através de todas as actividades apostólicas às quais eu fazia alusão no início deste encontro. Sobre o plano dos compromissos a assumir, salvaguardando-se a espiritualidade própria dos vossos Institutos, exorto-vos intensamente a integrardes-vos no imenso conjunto das tarefas pastorais da Igreja universal e das dioceses (cfr. Perfectae Caritatis PC 20). Sei que algumas Congregações, por falta de membros, não podem responder a todos os apelos que lhes são feitos pelos bispos e sacerdotes.

Contudo, fazei o possível a fim de assegurar os serviços vitais das paróquias e das dioceses. Quantas Religiosas, devidamente preparadas, colaboram na pastoral das realidades novas, que são imensas! Numa palavra, aplicai ao máximo todos os vossos talentos naturais e sobrenaturais na evangelização contemporânea.

Estai sempre e em toda a parte presentes no mundo sem ser do mundo (cfr. Jn 17,15-16). Não temais nunca deixar de reconhecer claramente a vossa identidade de mulheres consagradas ao Senhor. Os cristãos, e aqueles que o não são, têm direito de saber quem sois. Cristo, Mestre de todos nós, fez da sua vida manifestação corajosa da sua identidade (cfr. Lc 9,26).

Coragem e confiança, minhas queridas Irmãs! Sei que há muitos anos estais a reflectir bastante sobre a vida religiosa e sobre às vossas Constituições. Chegou o tempo de viver, na fidelidade ao Senhor e para os vossos encargos apostólicos. Peço de todo o coração por que o testemunho das vossas vidas consagradas e a imagem das vossas Congregações religiosas despertem no coração de tantas jovens o ideal de seguir Cristo como vós. Abençoo-vos, como também a todas as Religiosas da França que trabalham no solo da Pátria ou nos outros continentes. E abençoo também todos os que trazeis no vos-so coração e na vossa oração.



VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE A PARIS E LISIEUX

ENCONTRO DO PAPA JOÃO PAULO II

COM A COMUNIDADE POLACA EM PARIS


Paris, 31 de Maio de 1980



1. Alegra-me muitíssimo o facto de poder encontrar-me com a numerosa "Polónia" francesa, com os meus Compatriotas que vivem em terra da França ou que vieram dos países limítrofes, porque sei que se encontram presentes alguns deles.

Deus vos pague pela vossa presença neste momento particular. Este encontro foi uma necessidade do meu coração e é o nosso comum dever para com a Pátria. Saúdo-vos fervorosa e cordialmente, caros Irmãos e Irmãs, e mediante Vós saúdo todos os Filhos e Filhas da nossa Pátria, que o destino trouxe para aqui e ligou com a França.

Desejo por conseguinte, neste encontro, dar testemunho a Cristo, perante Vós, queridos Irmãos e Irmãs, e a todas as gerações de polacos a quem coube a sorte de viver, actuar, trabalhar, combater e morrer aqui em terra francesa. E desejo também aceitar este testemunho do passado e o Vosso testemunho contemporâneo e hodierno.

Disse num discurso que Paris é um lugar de onde se vê todo o mundo. Aqui posso dizer que Paris é também um lugar de onde se vê, de modo particular, a Polónia, a sua história ou pelo menos alguns fragmentos dela, mais dramáticos, quando tinha sido decidido o seu destino, o seu "ser ou não ser" sobre a carta geográfica do mundo: momentos dramáticos que despedaçaram os corações das gerações passadas, mas também momentos que reforçaram e, por vezes; talvez tenham restituído e aprofundaram o sentido da identidade nacional; foram o grito diante dos seus filhos e dos estrangeiros para o direito da nação à existência; na dimensão das justas fronteiras e no seus quadro da existência estatal

2. O Povo francês, que sempre apreciou muito própria liberdade, soube ser sensível pelos outros, quando eles se encontraram numa situação difícil. Portanto aqui, nesta terra nesta cidade, realizou-se em notável medida, a nossa grande reflexão nacional, que foi ao mesmo tempo a reflexão da fé. E embora estes nobres desejos, estas grandes intenções e visões nem sempre tenham podido realizar-se, foi aqui, todavia; nos diversos momentos da história, que se renovou o nosso ideal nacional, se construiu o esqueleto do novo perfil da Pátria e da nação. Aqui encontraram refúgio exilados políticos, patriotas, pensadores, poetas, escritores e artistas. Aqui nasceram muitas das maiores obras-primas da cultura. Tudo isto é geralmente bem conhecido e não há necessidade de insistir sobre este ponto; mas como deixar, chegado a a este ponto, de referir-me e mencionar comovidamente pelo menos a Grande Emigração e aqueles que a criaram e animaram? Como deixar de mencionar Mickewicz, Norwid, Chopin? Desculpai se recordo aqui só alguns nomes. Como poderia deixar de recordar, neste momento, que aqui em Paris, foi fundada a Congregação dos Padres Ressurreicionistas para salvar moralmente a emigração e para construir a Polónia católica — como diz o seu programa. Todos consideraram a própria estadia em Paris como um serviço prestado à Pátria e à Nação. Foi isto que constituiu a finalidade da sua actividade criativa, política e religiosa, e o motivo da sua existência. Aqui, no clima da liberdade, o passado cristão da nação, a nossa tradição cristã foram cunhados de novo segundo a medida das necessidades do momento e da situação concreta. Aqui voltaram-se a ler, diria, os sinais dos tempos de então, mas leram-se à luz das palavras de Cristo: "É o Espírito que dá a vida" (Jn 6,53). É precisamente este Espírito que dá a vida ao homem, à Nação, à Pátria, foi ele que procurou despertar, amparando-as, desenvolvendo-as e criando-as, as obras-primas da cultura polaca, da prosa, da poesia, da música e da arte, organizando instituições, bibliotecas — é renomada a Biblioteca polaca em Paris; que apesar das numerosas dificuldades a enfrentar continua tal tradição e é um centro cultural importante no Ocidente — e também institutos educativos e religiosos.

Mas os Polacos encontraram o caminho para a França e para Paris não só nos momentos difíceis. Os grandes e menos grandes artífices da nossa cultura sempre aqui vieram de bom grado e encontraram inspiração e um clima favorável.

Aqui a emigração renascia moralmente e aprofundava a consciência da sua missão de serviço pela Pátria: Assim foi então, e assim deve ser sempre, porque o pensamento da emigração, o seu trabalho criativo, o seu contributo na fé, na cultura, e no desenvolvimento do homem da Polónia... do mundo, constituem um suplemento precioso e necessário. Se isto viesse a faltar, se faltasse este contributo, viria a faltar um fio essencial no conjunto tão complexo e tão difícil. E se a Polónia vive com uma vida própria, se conservou a própria cultura, a soberania e a identidade nacional, a liberdade espiritual se tem o seu lugar no mundo e, também, se hoje aqui em Paris, capital da França Vos fala um Papa Polaco — isto é também mérito de todos aqueles homens que, com a fé na força das palavras de Cristo: "É o Espírito que dá a vida", souberam defender e desenvolver os valores divinos e humanos, que se encontram como fundamento do nosso ser nacional e cristão.

3. Desculpem-me se, por necessidade, nomeei apenas alguns homens e alguns factos; houve e há muitos outros, não menos importantes. Trago-os todos no coração, sem excepções, e cada um tem a própria parte. E não só os grandes. Penso também na multidão dos Vossos avós e dos vossos pais, homens simples, honestos, corajosos e laboriosos que foram constrangidos a procurar o pão no estrangeiro, o pão que a pátria não lhes assegurou.

Aqui encontraram este pão, pelo menos tiveram mais do que lhes podia dar a própria terra. Mas também aqui os esperava vida difícil e trabalho árduo: Encontraram-se desenraizados num país desconhecido. Com a sua laboriosidade e honestidade granjearam confiança e estima. Muitos entre os presentes trazem estas experiências dentro de si. Estão inscritas nas Vossas almas e no Vosso corpo. Inicialmente havia os trabalhadores temporários, que traçaram o caminho para os trabalhadores fixos e deram início a emigração em forma de colónias agrícolas. Portanto, o duro trabalho nos campos, nas herdades e nas plantações. (A Sociedade Polaca dos Emigrantes tinha as suas sedes em Paris, Soisson e Nancy ).

Outra grande parte é a emigração dos trabalhadores: mineiros polacos e operários nas fábricas, que se radicaram principalmente no Norte da França, e lá, no jazigo carborífero, não tinham medo de enfrentar a dura realidade e, com o pensamento na Pátria, na família e nos vizinhos que ali haviam, ficado, empreenderam a fadiga do trabalho quotidiano nas minas, nas fábricas, pensando num amanhã melhor:

Em particular, nos Departamentos não só de Calais e do Norte, mas também de Seine, Moselle, Metirthe e Moselle, Seine e Oise, Aisne e outros, até hoje são numerosas as colónias de Polacos, sois numerosos.

E assim, como os Vossos pais, constituís um grande potencial criativo da economia deste país, dais notável contributo para o seu desenvolvimento e progresso, no seu poder económico e espiritual, em conformidade com as palavras do Profeta Jeremias: "Procurai o bem-estar do pais para onde vos mandei deportar. Pedi por ele ao Senhor, porque do seu bem-estar depende o vosso bem-estar" (Jr 29,7).

Penso na geração que se encontrou fora da Pátria, devido aos terríveis acontecimentos da segunda guerra mundial. Geração que não pendurou as suas cítaras nos chorões daquela terra numa hora trágica da história.

4. Penso com gratidão em tantos sacerdotes polacos, que em momentos bons e momentos maus serviram e servem a emigração com sacrifício e dedicação. Graças a eles, a emigração polaca não perdeu a fé. Precisamente eles, apesar de diversas dificuldades e obstáculos, contribuíram em grande medida para a conservação da identidade, da língua e do laço com a terra nativa, haurindo inspiração e procurando apoio na cultura natal e cristã da Polónia.

Como não recordar aqui o Seminário Maior na Rua dos Irlandeses? Ele desempenha um papel importante no trabalho pastoral, na preparação dos pastores polacos para o conforto espiritual das almas. Nesta ocasião, desejo exprimir a minha gratidão à Igreja na Irlanda, que correspondeu com tanta compreensão às necessidades da pastoral polaca para a emigração e pôs à disposição o edifício em que se encontra e trabalha.

Penso em tantas organizações e associações em emigração que na fé de Deus procuram a inspiração para a própria actividade. Uma delas, a Associação Católica da Juventude Polaca, celebra precisamente o seu quinquagésimo aniversário. Com amor particular, mas também com solicitude porque conheço as vossas dificuldades e ameaças — penso em Vós, jovens, em todos Vós, Meninas e Rapazes, e dir-vos-ei apenas o que já em muitas outras ocasiões disse a tantos jovens: Vós sois a geração da Igreja e o seu futuro, sois a esperança do país em que viveis, do mundo, da Euro Emigração, da Pátria dos Vossos antepassados, sois a minha esperança. Não cedais aos complexos, não corteis aquela raiz de que crescestes. Sabei ler o que está em Vós, em redor de Vós. Sabei ler, discernir e escolher.

A integração é sem dúvida um problema importante para todos é necessário. Deveis servir o país em que viveis, trabalhar para ele, amá-lo e contribuir para o seu progresso, desenvolvendo-vos Vós mesmos, a Vossa humanidade, aquilo que reside em Vós; que Vos forma, sem falsificar nem apagar aquelas forças de vida que trazeis do passado e que, através dos Vossos pais — talvez já muitas — radicam numa realidade mais modesta, mais pobre do que aquela em que hoje viveis, mas grande e preciosa. Não vos deixeis enganar por palavras fáceis, por circunlocuções, por opiniões pouco profundas. Lede esta realidade, aprendei-a, amai-a, transformai-a e dai-lhe uma nova dimensão contemporânea. Conhecê-la e vivê-la quotidianamente ajudar não raro a compreendermo-nos a nós próprios e ao próximo, ajuda a aproximarmo-nos de Deus mediante a fé e o amor.

A medida das coisas e das vicissitudes do mundo criado é o homem, mas a medida do homem é Deus. Portanto o homem deve voltar sempre a esta fonte, a esta medida única que a Deus encarnado em Jesus Cristo, se quer ser homem, e se o mundo deve ser humano. Precisamente desta verdade fundamental e mais importante, quero dar testemunho com esta minha visita à França e neste encontro hodierno convosco, queridos Irmãos e Irmãs. Voltai a esta verdade, meditai nela, e nela reencontrar-vos-eis a Vós e todos os outros, todos os acontecimentos que fazem parte da vida, humana, da Vossa vida concreta e dos vossos deveres em todos os sentidos. Cristo entretanto pertence-nos, por fazermos nosso o seu ensinamento, a sua mensagem salvífica de amor. Crescei e multiplique-se a vossa fé, a esperança e a caridade. Esta invocação dirijo-a hoje a Vós com especial intensidade.

E agora permiti que todos nós, Vós e eu, dirijamos os nossos pensamentos e os nossos corações para Jasna Gora; para a Mãe de Cristo e de cada homem, para a Mãe e Rainha da Polónia, e confiemos a Ela nós próprios, as Vossas Famílias, as Vossas mães e os Vossos pais, maridos e esposas, filhos e filhas, os Vossos sacerdotes e párocos, os Vossos vizinhos, a Igreja na nossa Pátria e em todo o mundo, e a França com a qual Deus ligou a Vossa vida.

Do íntimo do coração dou a Bênção Apostólica a todos Vós aqui presentes, às Vossas famílias; e a todos aqueles que se unem a nós com o afecto, com o pensamento e com a oração.

VIAGEM APOSTÓLICA DO SANTO PADRE A PARIS E LISIEUX

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS REPRESENTANTES


DA COMUNIDADE ISLÂMICA DA FRANÇA


Sábado, 31 de Maio de 1980



É com grande alegria que vos dirijo a minha saudação, a vós Muçulmanos, nossos irmãos na fé em Deus único. Por vosso intermédio saúdo todos os vossos irmãos e irmãs que vivem também neste país.

Se o motivo que vos levou a deixar as vossas respectivas pátrias, seja ele o trabalho ou o estudo, dá ao vosso gesto um carácter de dignidade incontestável, não é menos verdade que a vossa condição de emigrados vos causa, como também a este país que vos acolhe, importantes problemas sociais, culturais e religiosos.

Sei que esforços têm sido feitos para compreender os vossos problemas e procurar soluções satisfatórias, e aqui penso de modo particular nas numerosas organizações sócio-profissionais e culturais, sensibilizadas pela vossa situação como por aquela dos outros emigrados que vivem na França.

Também a Igreja está consciente desta problemática. Citarei apenas duas iniciativas tomadas por ela: a Declaração conciliar de 28 de Outubro de 1965, onde afirma a sua vontade não só de procurar de novo o diálogo com o Islão, mas também de promover em conjunto para todos os homens, a justiça social, os valores morais, a paz e a liberdade", e a criação, a 19 de Maio de 1964, do "Secretariado para os Não-Cristãos". Recentemente, reafirmei esta vontade da .Igreja durante a viagem a África, ao encontrar-me com os representantes do Islão, em Nairobi e Acra.

Este pensamento sobre o plano da Igreja universal encontra expressão mais próxima de vós, no Secretariado para as relações com o Islãos constituído pela Igreja na França.

Não é que com isto todos os vossos problemas venham a ser resolvidos, tenho consciência disso, nem também os de outros trabalhadores no mundo e os de numerosos cristãos que vivem e trabalham nalguns países muçulmanos. Contudo, cremos que a boa vontade, o sincero esforço de compreensão, e a busca comum das soluções num real desejo de conciliação, podem com a ajuda do Deus único em quem todos nós acreditamos, contribuir para encontrar soluções satisfatórias.

O nosso comum ideal é uma sociedade, em que os homens se reconhecem como .irmãos que caminham à luz de Deus na emulação para o bem.

Agradeço-vos a vossa presença aqui.



Discursos João Paulo II 1980 - Sexta-feira, 30 de Maio de 1980