Discursos João Paulo II 1980

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR GASTON FÉLICIEN OLOUNA


NOVO EMBAIXADOR DO GABÃO


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Quinta-feira, 20 de Março de 1980



Senhor Embaixador

As minhas primeiras palavras serão para apreciar as vossas expressões tão cordiais e o espírito com que vos dispondes a realizar a vossa missão. Faço votos por que esta missão seja frutuosa, para as relações entre a Santa Sé e o Gabão em primeiro lugar, para tudo o que possa contribuir para consolidar a compreensão e para estreitar os laços recíprocos, e ainda para a Pessoa de Vossa Excelência, a fim de tirar daí numerosas satisfações.

Peço-vos que queirais agradecer ao Presidente Omar Bongo os seus sentimentos de consideração, e lhe assegureis que os meus colaboradores e eu próprio não temos outro desejo que não seja o de vos permitir exercer as vossas funções nas melhores condições. Por vosso intermédio poderão as Autoridades do vosso Pais continuar o diálogo que têm em mente, e eu não duvido que sabereis tornar-vos junto delas um avisado intérprete, um eco da vida da Igreja católica e dos esforços que esta leva a cabo para servir fundamentalmente o homem à luz de Deus.

Esta circunstância oferece-me ocasião agradável para me dirigir ao Povo Gabanês. Saúdo hoje esta Nação que me é cara, cada um dos seus habitantes, as famílias e os jovens. Os jovens porque o país é ainda novo e revela-se cheio de promessas; é sobre eles que se alicerça o futuro, a utilização equilibrada dos recursos naturais e a orientação do desenvolvimento num espírito de coragem, de honestidade e de justiça, para que a totalidade da população dele beneficie.

Deixai-me recordar também, com um natural orgulho, os católicos do Gabão, e ter um pensamento para o clero, os religiosos, as religiosas e os catequistas dedicados que os exortam a dar um testemunho cada vez mais conforme com a sua exigente vocação. Neste momento o Papa está-lhes próximo pelo afecto e pela esperança que neles deposita. As tarefas não faltam, aliás, pois podem colaborar como bons cidadãos para o progresso espiritual, cultural e social da sua pátria, como o fazem já.

Mas vós quisestes falar-me sobre os princípios que guiam a acção dos responsáveis Gabaneses no campo internacional. Além do diálogo, propõem-se como objectivo a tolerância e a paz. Aqui, em Roma, pelos contactos que sereis levado a ter junto dos Dicastérios da Cúria, e igualmente pelo estudo dos documentos da Santa Sé, vereis como e quanto se preocupa a Igreja para os promover. Não só para favorecer a reflexão, a este propósito, dos homens de boa vontade, mas também para encontrar traduções concretas e dar remédio, deste modo, a problemas particularmente difíceis de resolver no nosso século, tais como o da fome e o da violência. Possa o Gabão encontrar-se sempre entre as Nações que têm a peito o entendimento e a amizade, disponíveis a prestarem o seu concurso para a realização deste ideal e prontas a tomarem, elas próprias, iniciativas neste sentido!

Renovo cordialmente, Senhor Embaixador, os meus votos de bom êxito no cumprimento da vossa missão, um sucesso de que eu não duvido dada a vossa experiência diplomática. Sobre vós, os vossos familiares e todos os vossos compatriotas imploro a assistência e as bênçãos do Omnipotente.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II À COMISSÃO DE EDIÇÃO EUROPEIA DA BÍBLIA INTERCONFESSIONAL

20 de Março de 1980



Venerados irmãos e filhos caríssimos

Ao exprimir um cordial agradecimento pela homenagem e pelas palavras que me foram dirigidas, desejo também manifestar-vos a minha alegria sincera por me encontrar hoje convosco. O feliz acontecimento da impressão do milionésimo exemplar da Tradução Interconfessional do Novo Testamento em língua corrente, dá-nos motivo para este encontro e faz que seja ainda maior a nossa alegria.

Congratulo-me, portanto, com todos vós, não apenas por tal acontecimento editorial, mas sobretudo pelo que ele significa. Ele é, de facto, sinal confortante daquela fome e sede da palavra de Deus, de que falava já o profeta Amós (Am 8,11) e que continua a ser garantia segura de renovação e de robustecimento da fé. Por outro lado, está, de certo, presente neste facto uma difusa aprovação do empenhamento ecuménico com que foi conduzida a vossa iniciativa; de facto, a Palavra do Senhor é a única para todas as Igrejas, e estas poderão aproximar-se cada vez mais entre si medida em que se unirem «escutando religiosamente» (Dei Verbum DV 1) essa mesma Palavra.

Por tudo isto agradeço convosco ao Senhor, e formulo votos de que os vossos trabalhos neste sector sejam por Ele amplamente fecundados e recompensados, para que a Sua palavra se difunda e seja glorificada (2Th 3,1) e nunca a Ele retorne sem ter dado fruto (Cfr. Is 55,11).

Acompanhe-vos também a minha Bênção que, de coração, concedo a vós e aos vossos colaboradores.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR DR. KEITH JOHNSON


PRIMEIRO EMBAIXADOR DA JAMAICA


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Sexta-feira, 21 de Março de 1980



Senhor Embaixador

É com muito prazer que dou as boas-vindas a Vossa Excelência como primeiro Embaixador da Jamaica junto da Santa Sé e saúdo por meio de si o Povo e o Governo do seu País. Nova afinidade está a iniciar-se entre a Santa Sé e a Jamaica, que tornará possível mais intima cooperação tanto a nível local como internacional.

Vossa Excelência mencionou o entendimento e a colaboração que felizmente existem já, entre a Igreja Católica e o seu país. Com a ajuda de Deus, a sua missão fará que se aprofunde mais esse entendimento e se reforce tal colaboração, com frutuosos resultados para o bem, do Povo da Jamaica e do mundo inteiro.

A sua missão, na verdade, destina-se não só ao benefício do seu país mesmo, mas também ao da única família humana a que todos os povos pertencem. Espero com ansiedade a cooperação a fim de se promoverem os direitos humanos e a liberdade, se defender a paz, aumentar a possibilidade de viver cada um em conformidade com a dignidade humana — numa palavra — para o serviço do homem na sua totalidade, dentro das variadas riquezas da sua existência espiritual e material.

Tenho profundo respeito pelas tradições cristãs do povo da Jamaica. Essas tradições são promessa de cooperação ainda mais íntima no reconhecimento da preeminência do espiritual sobre o material. Elas garantirão também, por meio do conhecimento dos valores do espírito, que os progressos nos campos da prosperidade material, da tecnologia e das ciências estejam ao serviço daquilo que realmente constitui o ser humano.

Oxalá Deus torne prósperas as relações entre a Jamaica e a Santa Sé. Peço-Lhe que ilumine Vossa Excelência no desempenho da sua alta missão e invoco as bênçãos divinas sobre si, sobre o Governo e todo o Povo da Jamaica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR DR. JOHN BERNARD MOLI


NOVO EMBAIXADOR DO UGANDA JUNTO


À SANTA SÉ POR OCASIÃO DA APRESENTAÇÃO


DAS CARTAS CREDENCIAIS


Sexta-feira, 21 de Março de 1980



Senhor Embaixador

Alegremente lhe dou as boas-vindas ao Vaticano e, ao receber as Cartas por meio das quais é acreditado como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República do Uganda junto da Santa Sé, peço-lhe que transmita a Sua Excelência o Presidente Binaisa, ao Governo e ao Povo do Uganda as minhas saudações e os meus melhores votos.

Ao receber Vossa Excelência hoje, garanto-lhe que a Santa Sé vai seguindo de perto os progressos que se vão realizando no seu Pais, e está sinceramente interessada no bem-estar de todo o povo ugandês. Por este motivo, eu de bom grado reafirmo a obrigação de a Igreja continuar a ocupar-se ao mesmo tempo da assistência material e espiritual por meio do clero local e dos missionários e por meio das próprias escolas e muitas outras instituições.

Tive muito prazer em ouvir-lhe fazer referência aos mártires do Uganda que sacrificaram corajosamente as suas vidas por Cristo, Quanto a este facto, é-me grato que vá brevemente ser consagrada aqui em Roma urna nova igreja à memória deles. Espero que tal igreja venha a servir de símbolo da profunda estima do Bispo de Roma pelo Amado povo ugandês. E também meu fervoroso desejo que os mártires do Uganda, que deram testemunho dos valores supremos do espírito, nos lembrem sempre a dignidade inviolável de cada ser humano.

Senti prazer ao ouvi-lo expressar a satisfação por ter sido nomeado Embaixador junto da Santa Sé e também o desejo de contribuir para a busca da paz e harmonia internacional. Desejo que tenha bom resultado na sua missão e para o desempenho dela, conte com toda a necessária ajuda por parte da Santa Sé.

Aprecio os desejos que tem o Presidente do Uganda de visitar a Santa Sé, e espero com antecipado gosto ter a oportunidade de o receber. Entretanto, peço-lhe tenha a amabilidade de comunicar a Sua Excelência os meus cordiais votos e preces pelo desenvolvimento espiritual e material do Povo do Uganda.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR DR. RAYMOND TOTO PRAWIRA SUPRADJA


NOVO EMBAIXADOR DA INDONÉSIA JUNTO DA SANTA SÉ


POR OCASIÃO DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Sábado, 22 de Março de 1980



Senhor Embaixador

E com prazer que recebo as Credenciais com que Sua Excelência o Presidente Suharto o acredita como Embaixador do próprio país junto da Santa Sé. E expresso a minha gratidão pelos amáveis bons votos que me enviou, retribuindo-os cordialmente.

As mudanças em cada campo da vida humana a que Vossa Excelência se referiu são certamente notáveis. São causadoras de confusão em muitos espíritos, quer nos países considerados economicamente mais avançados, quer nos menos progredidos sob este aspecto. A confusão junta-se o temor: temor não só do estranho e desconhecido, mas também dos perigos reais provenientes das produções do próprio génio humano.

Mas estas mudanças também oferecem novas possibilidades de melhoramento, possibilidades que predominarão se os progressos da ciência e da tecnologia forem acompanhados de um correspondente desenvolvimento dos comportamentos morais, de modo que o homem se torne de facto melhor, isto é, mais amadurecido espiritualmente, mais ciente da sua humanidade, mais responsável, mais aberto no que diz respeito aos outros, especialmente os mais necessitados e os mais fracos, e mais pronto a partilhar com os outros e a prestar-lhes assistência.

Dada a mensagem de verdade e amor que a Igreja tem o dever de levar ao mundo, é sua obrigação procurar assegurar este progresso moral e fazer todos os esforços para que o justo caminho seja inteiramente empreendido em favor do desenvolvimento e do progresso.

Na Indonésia, a Igreja trabalhará com a maior boa vontade pelo bem do povo e pelo seu progresso humano. Desde há muito tempo que o vem fazendo mediante instituições como hospitais e escolas e com a generosa colaboração pessoal e desinteressada dos missionários que assistem a Igreja local.

Permita Deus que o vosso nobre povo continue a progredir em prosperidade material e, acima de tudo, em riquezas espirituais, unindo harmoniosamente os seus esforços na busca do verdadeiro bem-estar de todos. Invoco as Suas bênçãos sobre toda a Indonésia e sobre os seus governantes, bem como sobre Vossa Excelência e a sua importante missão.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A UM GRUPO DE ESTUDANTES DE MEDICINA


DA CIDADE DE CÓRDOVA (ESPANHA)


Sábado, 22 de Março de 1980



Queridos Jovens

Soube da vossa presença em Roma para uma breve permanência, e com muito prazer quis oferecer-vos a oportunidade deste encontro com o Papa.

Formais um grupo de Estudantes de Medicina da Universidade de Córdova e estais prestes a terminar o vosso curso.

A vossa dupla condição de jovens e de estudantes de Medicina, sugere-me muitos pensamentos sobre os quais longamente me deteria, mas o tempo não mo permite. Quero apenas dizer: preparai-vos com aspiração e seriedade para a futura tarefa, tão importante para a sociedade!

Tende grande cuidado em não fazer da vossa vida mera profissão, mas verdadeira vocação de serviço, de ajuda aos outros. Procurai sempre ver nos doentes que acorrerem a vós, não só corpos necessitados de assistência, mas também almas a que, ao mesmo tempo, deveis dirigir uma boa palavra que dá serenidade, encoraja no humano caminhar, respeita e faz respeitar a lei moral, e sabe abrir o coração à voz de Deus e ao sentido transcendente da existência.

Cultivai estes grandes valores com toda a generosidade da vossa juventude e pedi a Jesus, o amigo mais íntimo, que vos oriente nesse caminho. Assim vivereis em plenitude o presente e preparais-vos solidamente para o futuro. Faço acompanhar estes votos de uma cordial Bênção, extensiva às vossas famílias.



VISITA PASTORAL DO SANTO PADRE À REGIÃO DA ÚMBRIA (ITÁLIA)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

ÀS VÍTIMAS DO TERREMOTO


EM «CASTEL SANTA MARIA»


Domingo, 23 de Março de 1980



É com grande alegria que me encontro hoje no meio de vós, caríssimos fiéis do Valnerina e das zonas limítrofes, que o recente sismo provou tão duramente. Estou-vos sinceramente agradecido por este acolhimento festivo e cordial, que me atesta, com simpática espontaneidade, o apego desta terra ao Sucessor de Pedro.

Saúdo com deferência o deputado Clélio Dárida, Ministro para as Relações com o Parlamento, e agradeço-lhe o gentil desvelo com que quis estar presente no meu primeiro contacto com a dilecta população deste Vale.

Desejo, de igual modo, exprimir o meu vivo reconhecimento pela saudação que o Senhor Presidente da Câmara Municipal me quis gentilmente dirigir: nas suas nobres palavras senti vibrar a altivez e a coragem de uma população habituada a enfrentar, com ânimo forte e paciente, os duros acontecimentos de uma existência não fácil.

Vim ao meio de vós, irmãs e irmãos caríssimos, para vos trazer o testemunho da minha participação nas vossas dificuldades e nos vossos sofrimentos; vim para vos afirmar o meu apreço pela dignidade com que soubestes enfrentar esta provação e pela generosidade e tenácia com que demonstrastes querê-la superar; vim para compartilhar a esperança que vos acompanhou na provação e para vos assegurar que o Papa está particularmente perto de vós; vim para vos encorajar a perseverardes nas tradições da fé, da honestidade e do trabalho que sempre distinguiram os vossos antepassados, consentindo-lhes não sucumbirem mesmo nos momentos mais adversos da sua história.

Na minha pessoa está perto de vós toda a Igreja e, de modo especial, a de Roma, que, depois do que já fez nos meses passados, deseja testemunhar-vos de forma concreta a sua solidariedade fazendo-vos chegar, através das minhas mãos, um novo contributo em dinheiro, fruto da colecta feita entre os fiéis durante o "Advento de caridade 1979".

Perante o triste espectáculo das ruínas causadas pelo terramoto, estendo o meu pensamento a todas as zonas da terra onde semelhantes e quiçá mais graves fenómenos sísmicos levaram a destruição e a morte. Por todos se eleva a minha oração: Que Deus omnipotente, sempre bom, mesmo quando permite que os seus filhos sejam atingidos pela dor, conceda o repouso eterno às vitimas, resignação e fortaleza aos sobreviventes, e largueza de coração a todos para irem ao encontro das necessidades de tantos irmãos em dificuldade.

A minha oração dirige-se, em particular, a São Bento, a cuja terra natal venho como peregrino. Quinze séculos atrás, apesar dos tristíssimos tempos, ele soube oferecer à Itália e ao mundo uma original proposta de vida cristã, que se revelaria extraordinariamente fecunda, sob o ponto de vista não só de uma reanimação de vida religiosa e moral, mas também económica e social. Que São Bento esteja ao vosso lado neste momento difícil e ampare a vossa vontade de reconstrução, de tal modo que este vosso vale, apagados os sulcos das feridas deixadas pelo sismo, possa voltar a exibir o seu rosto risonho a quantos vêm aqui admirar as suas belezas sugestivas.

Mais uma vez vos agradeço, caríssimos filhos, pela cordialidade com que vos reunistes à minha volta, fazendo-me sentir o calor do vosso afecto. Com afecto igual vos saúdo um por um, e asseguro a todos que levo no meu coração as trepidações, as necessidades, os anseios e as esperanças de cada um. Sobre vós que estais aqui presentes, sobre os vossos familiares que não puderam unir-se a vós, e especialmente sobre os doentes e sobre os anciãos, desça, propiciadora de cada bem desejado, a minha Bênção Apostólica.



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DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NA CERIMÓNIA DE BOAS-VINDAS A NÓRCIA


Domingo, 23 de Março de 1980



Senhor Ministro,
Senhor Presidente da Câmara Municipal

As palavras que, cortesmente, quisestes dirigir-me, em nome da População de Nórcia e de todo o povo italiano, são para mim motivo de honra. Agradeço-vo-las cordialmente, bem como, com a mesma viva cordialidade, saúdo em vós todos aqueles que as vossas pessoas e as vossas responsabilidades dignamente representam.

Como é sabido, a minha presença aqui em Nórcia deve-se a duas ordens de considerações. Antes de mais quis vir visitar os irmãos e irmãs postos em particulares apuros e necessidades materiais pelos recentes fenómenos sísmicos; e a este propósito é um dever de justiça exprimir o desejo de que tais condições de necessidade sejam o mais provisórias possível, de tal modo que, com a ajuda de Deus e com a boa vontade de todos, se chegue depressa a uma adequada solução das situações precárias actualmente suportadas, se bem que tão dignamente, pelos infortunados.

Em segundo lugar, a minha vinda a Nórcia é motivada pela ocorrência do décimo quinto Centenário do nascimento do Abade São Bento, que, precisamente aqui, viu a luz do dia no ano de 480. Ele foi e continua a ser um dos melhores filhos desta terra que é umbra e ao mesmo tempo italiana; e foi e continua a ser, também, um dos filhos mais insignes da Igreja de Cristo. A sua estatura humana e cristã permanece na história como um dos mais luminosos pontos de referência. Numa época de mudanças profundas, quando a antiga estrutura romana começava a derruir e estava para nascer uma sociedade nova sob o impulso de novos povos que apareciam no horizonte da Europa, ele assumiu responsavelmente a própria parte, que foi proeminente, de compromisso não só religioso, mas também social e civil. Promoveu o cultivo racional das terras, contribuiu para a salvaguarda do antigo património cultural literário, influiu na transformação dos costumes dos chamados "bárbaros" e instaurou um original tipo de vida comunitária submetida a uma "Regra" por ele escrita para tal fim. E isto não ao nível de um mesquinho e então desconhecido nacionalismo, mas, através dos seus Monges, em dimensões continentais, pelo que, e justamente, o meu Predecessor Paulo VI o proclamou "Padroeiro da Europa". Tudo isto se passou não contra, mas tendo por base e por força uma vida espiritual, de fé e de oração, absolutamente intensa e exemplar. Por isso, temos nele um exemplo verdadeiramente típico de fecunda e feliz conjugação entre os deveres humanos e cristãos, os quais, longe de se oporem, antes agem reciprocamente numa mesma pessoa, enriquecendo-a de maneira imprevisível.

Estes ideais de progresso e de paz, fecundados pelo Cristianismo, são actuais hoje como então. Por isso estou seguro de que a maior honra que podemos tributar a São Bento é a de o acolhermos ainda e sempre como mestre de vida.

isto que desejo a mim próprio, aos habitantes de Nórcia e a todos os Italianos, corroborando tais votos com a minha sentida bênção.



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DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

ÀS AUTORIDADES CIVIS DA REGIÃO UMBRA


Sede Episcopal de Nórcia

Domingo, 23 de Março de 1980



Ilustres Senhores

1. Neste ano, em que se celebra o décimo quinto centenário do nascimento de São.Bento, desejei vivamente vir a esta cidade que foi seu berço e lugar da sua primeira formação.

Grande é, por isso, a minha alegria por me encontrar aqui, em Nórcia, para honrar, de modo mais solene e significativo, a doce e austera figura de São Bento, glória e orgulho desta nobre terra.

Estou contente, portanto, por vos dirigir, Autoridades Civis da Região Umbra, da Província de Perugia e dos 15 Conselhos do Valnerina, a minha saudação deferente e cordial, sinal da minha profunda estima e do meu encorajamento para os não fáceis deveres que sois chamados a realizar. E agradeço vivamente ao Presidente da Junta Regional pelas palavras corteses com que interpretou os vossos sentimentos.

Enquanto se vêem ainda nesta Região as dramáticas consequências do terramoto de Setembro passado, a minha presença quer manifestar também a participação do Papa e de toda a Igreja no infortúnio de tantas pessoas atingidas pelo recente sismo; vim para trazer aos amados habitantes desta cidade e de toda a Úmbria o meu afecto, o meu conforto e a minha oração.

Ao dirigir-me a vós, como que vejo diante de mim as populações trabalhadoras e fortes, a quem se destina a vossa solicitude, e penso nos seus problemas, nos seus sofrimentos, nas suas dificuldades, nas suas esperanças e na sua tenacidade.

A todos dirijo os meus votos sinceros, que nascem de um coração que os ama a todos com particular intensidade, porque provados mais que os outros: votos de reconstrução e de progresso, em harmonia de intenções, votos de que se não perca o ânimo neste momento difícil, votos de trabalho e de concórdia, votos de elevação social e sobretudo de fidelidade às suas tradições de fé, tão profundamente enraizadas.

Neste vigoroso esforço de ressurgimento e de reorganização económica, social e religiosa, invoco a ajuda da Bondade Divina, enquanto desejo do coração o empenhamento cuidadoso e efectivo por parte de todos, apoiado pelo trabalho das Autoridades civis, com vista a uma pronta e adequada solução dos problemas que atormentam esta região.

2. Daqui o meu sentimento alarga-se ao mundo inteiro. De Nórcia, da terra natal de São Bento, quis, uma vez mais, sublinhar a sua grandeza e importância de "Homem de Deus e da humanidade", venerado nos séculos, e a maravilhosa actualidade da sua mensagem própria para esta nossa época tão desordenada.

Desta terra cristã, forte e austera e, ao mesmo tempo, doce e gentil, extraiu São Bento o seu humanismo tão profundamente sensível e programático.

A cruz, o livro e o arado foram os instrumentos da sua obra de beneficiação e de renascimento. O louvor a Deus, em Cristo e com a comunidade, mediante a liturgia assídua, diligente e exaltante; o trabalho manual, intelectual e artístico, fielmente realizado no silêncio exterior e interior; a caridade recíproca, e em especial para com os que sofrem e os mais pobres, na obediência e na humildade: eis, em síntese, a mensagem e o programa de vida que São Bento recomendou e praticou, e pela qual a Europa se pôde dizer "cristã".

E é isto que propõe, ainda hoje, ao mundo para a felicidade e para o bem de todos. O homem moderno; atormentado por tantos problemas familiares, sociais e internacionais, sente necessidade de silêncio, de reflexão e de meditação para reencontrar os verdadeiros valores, o significado da própria existência, o horizonte da história humana e o diálogo com o Absoluto: O homem moderno sente uma necessidade essencial de paz, de certeza e de salvação.

Ilustres Senhores!

Oxalá a Região e as suas históricas cidades, sejam sempre iluminadas, conduzidas e ajudadas pela intercessão e pelo exemplo de São Bento como dos outros Santos que encheram esta terra. São estes os votos que, com paternal afecto, vos deixo.

E acompanhe-vos, de igual modo, a minha propiciadora Bênção Apostólica que, com grande efusão, Lanço sobre vós e as vossas famílias.



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DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

NO ENCONTRO COM AS RELIGIOSAS


DAS DIOCESES DE SPOLETO E NÓRCIA


Basílica de São Bento

Domingo, 23 de Março de 1980



Na série de encontros desta jornada singular, é para mim especial motivo de consolação encontrar-me com as Religiosas de vários mosteiros beneditinos das mais próximas regiões da Itália.

Dirijo, com igual afecto, a minha saudação a todas as Religiosas pertencentes a outras Ordens e Institutos, pelo acto de filial homenagem que me quiseram prestar.

Uma presença tão qualificada, ao mesmo tempo que torna mais alegre o início das celebrações do XV centenário do nascimento de São Bento, oferece ao Papa, vindo para lhe venerar a terra natal, a ocasião de recordar alguns princípios da espiritualidade beneditina, de que tantas famílias religiosas puderam beneficiar ao longo dos séculos. Ela gravou, com efeito, um sulco desde o início, foi uma pista segura para a vida cenobítica e religiosa, suscitando santos entusiasmos em almas generosas, que nela sempre se inspiraram; e; ainda no presente, com o seu elemento predominante — a contemplação , está destinada a inflamar nas mentes e nos corações abertos o influxo da graça da vocação e o ardor pelas ascensões espirituais.

1. Olho, portanto, com sincera admiração para todos os mosteiros das Beneditinas e, com viva satisfação, uso a seu respeito a imagem, cara a São Bento, que os considerava "Escolas do serviço de Deus".

Dirijo, de igual modo, o meu pensamento de agrado a todas as Casas religiosas femininas espalhadas por esta região umbra, sempre dócil, durante os séculos, aos sugestivos apelos do espírito. Vós, caríssimas irmãs, não desejais outra coisa que não seja prestar atenção a Deus com pureza de coração, na solidão, no silêncio e na oração: a da mente e a coral, "opus cui nihil praeferendum", procurando que, para este santo fim, não entre nem saia do vosso espírito nada que não seja "deiforme" e que não conduza a Deus.

Nos vossos cenóbios realizou-se, por deliberação pessoal, a mais importante escolha da vossa vida: renunciastes generosamente a todas as coisas ou seduções que o mundo vos podia oferecer, afastastes-vos de todo o afecto terreno para vos unirdes exclusivamente a Deus e para O possuirdes, com firmeza, no vosso coração.

Neste plano de vida mística, que é o ponto mais alto da perfeição, é-vos concedido, quando absortas "nos pensamentos contemplativos" (Dante, Par.XXI, 117), experimentar, provar e sentir Deus, através da continua aplicação dos poderes espirituais, mesmo que na obscuridade da fé; e vós sabeis par experiência, que quanto mais íntima é a conversação com o Pai celeste, tanto mais se reconhece que o tempo nunca é suficiente para este altíssimo acto de caridade.

Como deixar de recordar, a este propósito, a intensa jornada passada pelos dois santos irmãos nos louvores de Deus e em santa conversação, como nos conta São Gregório Magno, a que se seguiu a famosa vigília nocturna obtida com a oração de Santa Escolástica, pelo que passaram toda aquela noite a saciar-se de suaves colóquios a a contarem os dois santos, um ao outro, as experiências da vida espiritual? (Diálogos, 2, 33; PL 66, 194-196).

2. Estimulante para fomentar o espírito contemplativo e para lhe amparar um empenhamento perseverante, foi e continua a ser a grandiosa Regra, ditada pelo Santa Patriarca; e tida por todos os sucessivos legisladores como um monumento de sabedoria e de perene actualidade, por que os seus ensinamentos oferecem garantias de segurança de fecundidade e de clareza enquanto derivam da perfeita adesão de São Bento ao Evangelho e ao magistério da Igreja.

As prescrições, ordenadas de modo a fazer considerar Deus e Cristo no centro do universo e a afirmar-lhes o primado absoluto sobre todas as coisas, não poderiam ter descrito mais eficazmente o itinerário espiritual da Monja beneditina e têm sido fonte de inspiração para tantas outras almas desejosas de se consagrarem totalmente a Deus e aos irmãos.

Habitualmente disponível junto de Deus pela graça santificante, a Religiosa beneditina é levada a considerar-se perante o seu Senhor, seu único amor e bem, com extrema sinceridade e verdade, e em tal situação deve explicar a própria actividade interior e exterior. Isto supõe o desejo resoluto e constante de conformar a própria vontade com a de Deus. São Bento previu-o: na sua Regra é contínuo, com efeito, o chamar de atenção para a obediência, como sendo a virtude mais apropriada para atingir a santidade.

3. Ao convidar-vos, caríssimas irmãs em Cristo, a terdes em consideração as prescrições e os carismas dos vossos Fundadores e Fundadoras, desejo expressar-vos o reconhecimento da Igreja pela actividade que realizais em seu beneficio.

Vós, de facto, não só ofereceis a Deus um excelente sacrifício de louvor, honrais o Povo de Deus com copiosos frutos de santidade e o movimentais com o exemplo (Cfr. Perfectae caritatis PC 7), mas também realizais, com a vossa vida de imolação escondida, uma acção propiciadora junto do Pai das Misericórdias, a favor da Igreja, nas dificuldades, que atravessa na hora presente.

Confio em particular, caríssimas irmãs em Cristo, na vossa preciosa colaboração, neste dia em que a Igreja italiana, recolhida em oração, apresenta ao Senhor o próprio sofrimento pela ordem moral e social agitada pela subversão e pelo terrorismo, pelas muitas vítimas que pagaram com a vida a fidelidade ao próprio dever é aos ideais da humana e civil convivência, pela desolação de tantos familiares privados dos mais legítimos afectos. A Paixão de Cristo, que nos aprestamos a reviver nos dias já próximos da Semana Santa, continua no sofrimento e no sangue destes nossos irmãos e irmãs, atingidos pelo ódio homicida. A Igreja chora-os ao chorar sobre as chagas do seu Senhor.

Fazendo votos de que, finalmente, seja banida toda a forma de violência e que se chegue à justiça e à paz por meio da razão e da compreensão recíproca, peço-vos que ofereçais hoje a vossa súplica a Cristo Senhor, corroborada com especiais e íntimos sacrifícios, para que na dilecta Nação italiana possa triunfar a bondade natural, a actividade serena e a coesão humana e civil, fruto de um exemplar e coerente costume cristão.

Confio a Igreja e as minhas intenções universais de Pastor e de Pai à vossa oração continua que suplica, adora e apazigua a Majestade Divina.

Por minha vez, confio-vos a Maria, à Virgem, modelo das almas contemplativas e activas, à Mãe da Igreja, e deixo-vos a minha Bênção, estendendo-a a cada uma e a todas as Irmãs dos vossos Institutos, bem como aos vossos respectivos familiares.



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DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AO CLERO DO VALNERINA


Catedral de Santa Maria Argentea, Nórcia

Domingo, 23 de Março de 1980



Caros Irmãos no Sacerdócio

Desejo expressar-vos, com grande sinceridade, a minha alegria por vos falar, sacerdotes da diocese de Nórcia e Espoleto, num encontro de pessoas, exactamente neste lugar privilegiado, onde viram a luz São Bento e Santa Escolástica. Há um conjunto de circunstâncias e emoções interiores, que nos chamam, a mim e a vós, para uma breve e serena reflexão sobre o significado da vossa presença sacerdotal nesta cidade, nesta Região, nesta Nação, isto é, na sociedade contemporânea.

1. A sociedade de hoje não é certamente a do quinto e sexto século depois de Cristo. Mas os problemas fundamentais do homem — como o de Deus e da religião, o do significado global e definitivo da vida, o do comportamento ético, da justiça e da dignidade do homem — mantêm ainda hoje analogia com aqueles que enfrentou o jovem Bento. São os problemas que vós, sacerdotes desta década de 80, viveis, às vezes dramaticamente, quer no segredo da vossa consciência ou do confessionário, quer quando tendes de dizer uma palavra de orientação ou dar um exemplo concreto aos vossos irmãos.

Sois e deveis ser sacerdotes para a Igreja e para os jovens de hoje, que vivem num contexto sócio-cultural, que pretende tudo pôr em discussão, que levanta dúvidas e semeia incertezas, ou pretende soluções imediatas em todos os campos em que o homem se encontra a trabalhar ou a desenvolver a sua personalidade.

E como entre o quinto e o sexto século a presença de São Bento e dos seus monges foi providencial para a sociedade de então, assim não há dúvida que a sociedade contemporânea, que vive entre o poente do segundo e a aurora do terceiro milénio do Cristianismo, necessita de sacerdotes precisamente porque necessita de Deus.

E vós, caros irmãos, sois "ministros de Cristo e administradores dos mistérios de Deus" (Cfr. 1Co 4,1); fostes "escolhidos dentre os homens" e "constituídos a favor dos homens nas coisas concernentes a Deus" (Cfr. He 5,1). Nisto está toda a vossa grandeza e dignidade.

Com o sacramento do presbiterado fostes configurados a Cristo Sacerdote como ministros da Cabeça, com o fim de fazer edificar e crescer todo o seu Corpo que é a Igreja, na qualidade de cooperadores da Ordem episcopal — recordou-vo-lo o Concílio Vaticano II —; mediante a consagração fostes elevados à condição de instrumentos vivos de Cristo, eterno Sacerdote, para continuar no tempo a Sua admirável obra, que reintegrou com divina eficácia o género humano inteiro (Cfr. Decr. Presbyterorum Ordinis PO 12).

2. Na estrutura do Povo de Deus vós, caros Irmãos no Sacerdócio, ocupais um cargo e um lugar fixo, específico e qualificado, que tem explicação, a exemplo da vida de Cristo, numa variada gama de serviços relativamente ao Corpo Místico; serviços que são a expressão do admirável florescimento do Sacerdócio mesmo de Cristo, no qual participais. "Diversos são os caminhos segundo os quais, caros Irmãos — escrevia eu na Carta aos Sacerdotes para a Quinta-feira Santa de 1979 —, realizais a vossa vocação sacerdotal. Uns na ordinária pastoral paroquial; outros nas terras de missão; outros ainda no campo das actividades relacionadas com o ensino, com a instrução e a educação da juventude, trabalhando nos vários ambientes e organizações, e acompanhando o desenvolvimento da vida social e cultural; outros, por último, junto dos que sofrem, dos doentes, dos abandonados; às vezes, vós mesmos, presos a um leito de dor. Diversos são estes caminhos... Apesar de tudo, em todas estas diferenciações, vós sois, sempre e em toda a parte, portadores da graça de Cristo, eterno sacerdote, e do carisma do bom Pastor. Isto não podeis nunca esquecê-lo; a isto não podeis nunca renunciar; isto deveis em todos os tempos e lugares e, em todos os modos, praticar" (João Paulo II, Carta aos Sacerdotes, 1979, n. 6).

A consequência, que há-de deduzir-se da profunda realidade teológica do sacerdócio ministerial, é esta: para o sacerdote, o centro e ponto fundamental de referência de toda a vida e de toda a actividade deve ser Deus: Deus adorado constantemente, em particular na beatificante presença sacramental da Eucaristia, confiada de maneira especial ao ministério dos sacerdotes; Deus invocado e interpelado na oração litúrgica, comunitária e pessoal, num diálogo afectuoso entre filho e pai; Deus amado e servido nos nossos irmãos, especialmente nos que sofrem e nos pobres. Este sentido da presença de Deus, este primado do espiritual, que deve orientar toda a vida e o ministério pastoral do sacerdote, é o grande e sempre actual ensinamento de São Bento: "Ubique credimus divinam esse praesentiam... maxime tamen hoc sine aliqua dubitatione credamus cum ad Opus divinum adsistimus..., ergo consideremus qualiter oporteat in conspetu Divinitatis et angelorum eius esse" (São Bento, Regula, cap. RB 19). E ainda: "Nihil Operi Dei praeponatur" (Ibid., cap. RB 43).

À luz desta essencial visão teocêntrica iluminam-se os vários encargos do Sacerdote, as exigências das suas funções, que provêm do Evangelho e são a medida mesma da vocação sacerdotal.

O Sacerdote é dom imenso que Deus faz à Sua Igreja; e a alegre resposta do sacerdote à chamada de Jesus é, como afirma São João Crisóstomo, a maior prova de amor a Cristo: "O Mestre pergunta ao discípulo (Pedro) se o ama, não para o saber Ele mesmo..., mas fá-lo para nos ensinar quanto tem a peito o cuidado do rebanho... Não pretendia então demonstrar quanto Pedro O amava,... mas queria demonstrar quanto Ele amava a Sua Igreja, e ensinava a Pedro e a todos nós quanto cuidado devíamos dedicar a esta obra" (Cfr. Diálogo sobre o Sacerdócio, II, 1).

3. Caríssimos Irmãos. O vosso serviço elevado e exigente não poderá ser prestado — como eu disse aos Sacerdotes do México na Basilica de Nossa Senhora de Guadalupe — "sem clara e profunda convicção acerca da vossa identidade de Sacerdotes de Cristo, depositários e administradores dos mistérios de Deus, instrumentos de salvação para os homens, testemunhas de um reino que principia neste mundo mas se completa no além. Diante destas certezas de fé, porque duvidar da própria identidade? porque titubear acerca do valor da própria vida? porque hesitar perante o caminho encetado? (João Paulo II, Discurso de 27 de Janeiro de 1979).

Segui com alegria a Cristo, que vos amou e chamou; embora, com o passar dos anos, o corpo sinta o cansaço e o desgaste do tempo, o coração esteja sempre vigilante e pronto e ardente de zelo pelas almas, que Deus colocou no vosso caminho. Ministros de Cristo, amai e sede fiéis à Igreja, sua Esposa; não a uma Igreja utópica e abstracta, mas à Igreja concreta e histórica. Estai sempre solidamente ligados, em serena concórdia e leal obediência, ao Bispo, de quem sois os colaboradores imediatos; estai fraternalmente unidos entre vós, de modo que o Presbitério seja sinal visível de comunhão. Nestes tempos de crise de valores e certezas, sede, para todos, "educadores na fé" (Cfr. Presbyterorum Ordinis PO 6). E como o poderíeis ser mais — disse eu a todos os Sacerdotes na minha recente Exortação Apostólica acerca da Catequese no nosso tempo — do que "dedicando o melhor dos vossos esforços ao crescimento das vossas Comunidades na fé? Quer sejais encarregados de uma paróquia, ou professores de escola, de liceu ou de universidade, responsáveis pela pastoral em qualquer nível, animadores de pequenas ou grandes Comunidades e sobretudo de grupos de jovens, a Igreja espera de vós que nada descuideis em ordem a uma obra catequética bem estruturada e bem orientada... Todos os crentes têm direito à catequese, todos os Pastores têm o dever de a assegurar" (Catechesi Tradendae CTR 64).

4. Um pensamento último, Irmãos caríssimos, que muito tenho a peito. O sacerdote, disse eu há pouco citando a Carta aos Hebreus, é escolhido dentre os homens e constituído a favor dos homens (Cfr. He 5,1). Deveis estar portanto perto do povo, ao lado do povo, vivendo intensamente os seus problemas quotidianos, especialmente quando ele sofre e se encontra em momento e em situações difíceis. E o momento presente, caros Irmãos no Sacerdócio, é verdadeiramente difícil para o bom povo italiano, por causa da crescente tentação de ódio e violência, que invade o país. O Conselho Permanente da Conferência Episcopal Italiana estabeleceu precisamente para hoje, 23 de Março, um dia de oração e reflexão contra o furor da violência e pela vitória do amor. "Obrigação dos cristãos — diz a Mensagem — é de modo especial a educação da consciência, própria e alheia, na família, na escola, nos locais de trabalho e nas associações eclesiais. Na consciência dá-se a primeira e mais decisiva oposição à violência e ao terrorismo, oposição que deve brandir os valores da democracia, da paz e do amor. Obrigação dos cristãos é o esforço solidário, a participação, o sentir os problemas e a sorte de quem sofre, em humildade e coragem, aceitando, como Cristo, pagar por si mesmo e encarnando em si próprio e no mundo um Evangelho de paz". E vós, sacerdotes, deveis ser os primeiros a educar as consciências na rejeição do ódio e da violência; os primeiros a participar e partilhar nos problemas daqueles que sofrem.

Abri-vos o meu coração, caros irmãos, sobre alguns aspectos da vida e do ministério sacerdotal. Sobre os compromissos que tomastes e sobre os vossos propósitos, invoco, por intercessão de São Bento e Santa Escolástica, a graça de Deus.

A Virgem Santíssima vos ajude sempre com a sua maternal protecção.

Com a minha Bênção Apostólica.



Discursos João Paulo II 1980