Discursos João Paulo II 1980 - Domingo, 23 de Março de 1980


VISITA PASTORAL DO SANTO PADRE À REGIÃO DA ÚMBRIA (ITÁLIA)

ENCONTRO DO PAPA JOÃO PAULO II

COM OS JOVENS REUNIDOS


NA PRAÇA DE SÃO BENTO EM NÓRCIA


Domingo, 23 de Março de 1980



Caríssimos Jovens

Agora, ao concluir-se este dia tão intenso e rico de comoções vivas e de alegria interior, apraz-me o encontro convosco, jovens do Valnerina e da Úmbria inteira, e com todos nós que vos reunistes aqui para confirmar o vosso espírito naquela generosa dedicação, de que destes unanimemente prova no dia seguinte ao catastrófico sismo que flagelou, o ano passado, estas laboriosas gentes. Vós destes então testemunho inconteste, tanto mais apreciável quanto mais brotou da vossa espontaneidade, da vossa dedicação dinâmica e serena, imitando, na obra de assistência e solidariedade, o exemplo de precoce maturidade oferecido pelo jovem Bento, cujo bom senso — como afirma São Gregório Papa — atingiu a maturidade logo na infância, adiantando-se aos anos com as virtudes (Cfr. São Gregório Papa, Diálogos, II, Prol.).

Vós, animados pela mesma vontade de cooperação para bem da comunidade, especialmente de todos os que se encontram em condições penosas de mal-estar, colocais-vos na verdadeira luz do "humanismo cristão", proposto e vivido pelo Santo de Nórcia, o qual se resume em autêntico respeito pelo homem seja qual for a expressão do seu valor, num amor eficaz para com ele, especialmente quando revela o rosto e a voz do sofrimento.

Recebei, pois, caros jovens, da Cáritas, do Agesci, da Comunidade de Santo Egídio, de Comunhão e Libertação, dos Focolarinos, da Acção Católica e dos vários grupos eclesiais, a minha afectuosa saudade nesta terra natal de São Bento, e aceitai sobretudo a expressão do gosto que senti por tudo o que realizastes com juvenil entusiasmo.

O vosso esforço de caridade e altruísmo inseriu-se perfeitamente na corrente de séculos da mensagem beneditina, válida e actual hoje ainda, porque ligada a valores perenes que, se necessitam de manifestações novas e de verificações, são capazes de vivificar e elevar a experiência humana de todos os tempos. Esta mensagem pode atrair e cativar, mesmo os jovens da geração presente, muitas vezes desiludidos e desorientados no labirinto de uma sociedade hedonista e permissiva.

De facto, também os tempos tristes, em que foi inserida a existência espiritual de São Bento, eram densos de aspirações ambíguas e utópicas, de vãos propósitos de grandeza; também aqueles tempos estavam caracterizados por uma palidez moral desoladora e por um teor de vida miserável, debaixo do choque de povos em expansão, mas ainda dominados por sugestões de violência. O Santo de Nórcia, todavia, alimentado pelas certezas da fé, reafirmou a força de um Cristianismo mestre de dignidade moral, de liberdade espiritual e ao mesmo tempo construtor de civilização.

Como vós experimentastes, a conquista dos espaços interiores, que oferecem a Deus o lugar justo no espirito humano, todo aquele empenho, numa palavra, que poderemos distinguir com o primado do "ORA", do "reza", não é de maneira nenhuma contrastante, mas pelo contrário concede respiração e dá intuição criadora, à verdadeira abertura para a esfera social, para o doloroso dever quotidiano e para as forças vivas do trabalho e de cultura, animando assim com alento vivo e com espírito de serviço o grande e angustiado mundo do "LABORA", do "trabalha".

Que vos posso dizer de especial, nesta sugestiva moldura de penhascos e vales, que deram têmpera ao ânimo forte e corajoso do predestinado jovenzinho, e numa hora tão cheia de fraternidade e comunhão, penetrada pela espiritual presença do Pai da nossa civilização europeia?

Continuai, caros jovens, o testemunho que generosamente dais, porque ele, ao mesmo tempo que em sintonia com os valores da tradição beneditina, é fiel aos homens de hoje, interpretando-lhes as aspirações mais profundas.

1) Advertistes a urgente necessidade de vos encontrar com o Absoluto e portanto descobristes a importância da interioridade, do silêncio e da meditação, a fim de poderdes compreender o sentido definitivo e pacificante da existência de cada um. Saboreastes a doçura da oração e daquela sempre renovada e perseverante reconciliação de amizade, com o Senhor, estabelecida nos corações por uma atitude existencial de humilde e operosa obediência ao Pai Celeste. Com São Bento vos dirigirei então o paternal convite: "Ausculta, fili, verba magistri": escuta, ó filho, o que te ensinam os verdadeiros mestres, e tornai atentos os vossos corações no silêncio da oração, para, graças ao esforço de uma obediência dócil aos sãos preceitos, voltardes Aquele de quem nos afasta uma posição de indolência ou de rebelião (Cfr. São Bento, Regra, Prol RB 1). Colocai-vos muitas vezes diante do Mestre interior e de quem o representa, na atitude de verdadeiro discípulo, que sabe calar-se e escutar.

2) Vós, caros jovens, descobristes a caridade e o amor, que se manifestam na solicitude pelo próximo e num diálogo franco com os irmãos, respeitando-lhes a dignidade e mostrando disponibilidade para uma osmose de contributos recíprocos. São valores que São Bento estabeleceu num contexto sócio-económico em que predominavam a exploração e o arbítrio, opondo ele à violência o espírito de fraternidade e à preguiça o esforço operoso, para colocar os pressupostos de uma restauração humana integral. O mosteiro beneditino será quase um prenúncio da nova "sociedade"; dentro dos seus muros apagam-se as discriminações entre nobres e plebeus, entre ricos e pobres, entre livres e escravos; nele encontram refúgio colonos perseguidos e bárbaros opressores, depondo diante de Deus rivalidades antigas e rancores recentes, paia se dedicarem à oração, ao trabalho e ao apoio mútuo. Cheio de delicadeza em tratar os monges, em acolher os peregrinos e em curar os doentes, o Santo enu, mera entre os instrumentos para proceder rectamente: "Pauperes recreare,... infirmum visitare,... in tribulatione subvenire, dolentem consolari, ... nihil amori Christi praeponere": socorrer os pobres,... visitar os doentes,... ajudar os atribulados, consolar os aflitos,... nada antepor ao amor de Cristo (São Bento, Regra, Cap. RB 4).

3) Vós amais a beleza, que é o esplendor da ordem e, por conseguinte, prevalentemente inocência de vida e harmonia do espírito. A Regra, cuja redacção ocupou o Santo por longo tempo, indica com sabedoria e medida as modalidades e os tempos da oração e do trabalho.Mostra quanto ele tinha a peito essa beleza que deriva de um ritmo ordenado de vida. Ele, de facto, harmoniza em si mesmo o sentido da autoridade, dá ordem e da disciplina, recebido do mundo clássico, com uma delicadeza de alma amadurecida no decurso do seu longo caminho de perfeição.

É a ordem, primariamente espiritual, que nele reina e permite aos mosteiros serem, grandes centros de vida e actividade criativa, na consciência desenvolvida de o Cristianismo ser ao mesmo tempo ascese para com Deus e compromisso terrestre, de maneira que a oração leve ao trabalho, não só como meio para assegurar aos monges o necessário sustento, mas também como ocasião valiosíssima de disciplina pessoal e de promoção social.

O veemente apelo da mensagem beneditina para se procurar Deus e a Sua vontade, para estabelecer um contexto social, dominado pela fraternidade e pela ordem, apresenta-se hoje como voz de singular actualidade neste dia de oração e reflexão a respeito do gravíssimo problema do terrorismo na Itália.

A violência, que está arruinando a ordem social da Nação italiana, não é casual: origina-se num programa concreto, nasce do espírito de ódio. A matriz da :violência está nisto; só nisto. Urge não nos deixarmos enganar por outras motivações. Vedes como é necessário, por parte dos cristãos, saber discernir este espírito e compreender a perversidade intrínseca do mesmo (Cfr. 1Jn 3,15), não deixar-se contaminar pelo espírito do ódio, para conseguir subtrair-se com vigor ao crescimento dele e não deixar que as suas sugestões enganem. Aplicai-vos, pelo contrário, a ser pespicazes e generosos apóstolos do amor.

Caros jovens, os ideais e os valores dominantes do testemunho de São Bento, vós conhecei-los e, com a graça de Deus, estais empenhados em vivê-los; continuai a interpretá-los e a encarná-los com ânimo, generosidade e entusiasmo, convencidos que o Senhor mesmo é o único abonador, como diz o Salmista, de um edifício de fundamentos sólidos, portanto de um futuro justo e humano, de uma sociedade pacífica e produtiva e de uma ordem harmoniosa e fraternal. Com a minha afectuosa Bênção.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS NEO-SACERDOTES DA CONGREGAÇÃO


DOS JOSEFINOS DE MURIALDO


Segunda-feira, 24 de Março de 1980



Caríssimos neo-Sacerdotes,
Filhos de São Leonardo Murialdo!

Há pouco ordenados "Ministros do Senhor" e depois de terdes celebrado a vossa Primeira Santa Missa, desejastes este encontro com o Papa, para manifestar a vossa fidelidade à Igreja, ouvir a sua palavra e receber a sua Bênção.

Alegro-me por vos acolher e dirigir a mais afectuosa saudação: agradeço-vos este acto de filial obséquio e compartilho plenamente a vossa grande alegria por terdes sido configurados mais estreitamente a Cristo, mediante o Sacramento da Ordem, chamados a servi-1'O na Igreja com os seus mesmos poderes divinos.

E convosco quero também cordialmente saudar os vossos Superiores e Mestres, os vossos Pais e parentes.

Neste momento, tão impressionante para vós, uma só é a minha exortação: perseverai no Amor! perseverai na "graça sacramental" e na missão austera mas estupenda da salvação das almas!

E para perseverar, não tendes mais que, inspirar-vos na figura do vosso Fundador, São Leonardo Murialdo, cuja vida repleta de zelo e escritos apaixonantes certamente conheceis.

Seja para vós o anseio apostólico o primeiro meio de perseverança. O Sacerdote deve ter uma visão "escatológica" da existência e da história e viver nessa perspectiva. As almas devem ser evangelizadas, salvas e santificadas: esta é a vontade de Deus! O Sacerdote é o responsável por este anúncio e por esta salvação. Não esqueçai nunca o anseio apostólico de Murialdo que dizia: "Não queiramos ter o remorso de vir a temer que alguma alma, remida pelo sangue de Cristo, se perca, em parte por nossa negligência, preguiça ou egoísmo".

Um segundo meio de perseverança é o sentido do realismo cristão. Murialdo, espírito eminentemente equilibrado e concreto, em tempos atribulados e sombrios, tinha uma grande fé e confiança no homem. Vós conheceis os seus lemas-programas: "Calemos e façamos". "Fazei-vos santos e depressa". Depois dos acontecimentos de 1870, escrevia: "A nossa época tem o bem e o mal como todas as épocas; mas o mal não se muda sacudindo os ombros nem, reparando-nos debaixo da tenda de Aquiles... A Igreja e os cristãos estarão sempre em estado de combate nesta terra... Nós, por nosso lado, às orações unamos as boas obras, o zelo católico, a união das forças, o ardor da salvação das almas; mas imediatamente, sem esperar intervenções celestes nem triunfos imaginários" (São Leonardo Murialdo, Carta de Maio de 1872).

É realmente um óptimo programa e "mais que nunca actual: não optimismo irreal, nem sequer pessimismo, que ofende a Providência; mas um sadio realismo cristão, que aceita a realidade do homem e da história para a amar e salvar no nome de Cristo, com esforço e paciência.

E finalmente, um terceiro meio de perseverança é a pureza do pensamento, mediante o estudo ordenado e as boas leituras. O vosso Fundador, no fermento das novas filosofias racionalistas e materialistas de século, tinha-se sentido profundamente educador, especialmente dos jovens, mediante sobretudo a "boa imprensa". A um século de distância; a preocupação pela "pureza do pensamento" multiplicou-se desmedidamente. É muito importante mantermo-nos na "intimidade divina" mediante a meditação de livros sérios e profundos, que aqueçam a alma no fogo do amor de Deus e a mantenham serena e entusiasta em qualquer situação ou incumbência em que venha a encontrar-se.

Caríssimos neo-Sacerdotes! Imitai São Leonardo Murialdo também na devoção a Maria Santíssima e perguntai-vos sempre: "Nossa Senhora está contente com esta minha decisão? Que me sugere? Como agiria no meu lugar?".

Ide pois, agora, alegres e corajosos para o lugar onde a obediência vos manda e perseverai no amor, com o auxílio do vosso Santo e o conforto da minha Bênção Apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES DO SÍNODO EXTRAORDINÁRIO


DA IGREJA CATÓLICA UCRANIANA


24 de Março de 1980



Senhor Cardeal,
Veneráveis Irmãos

Com a minha carta «Probe nostis» de 1 de março de 1980, convoquei-vos para um Sínodo extraordiário e tenho o prazer de dirigir uma saudação fraterna ao Senhor Cardeal Josyf Slipyj, Arcebispo-mor de Leópolis dos Ucranianos, e a Vós Metropolitas, Exarcas, Eparcas e Auxiliar e ao Visitador Apostólico; e envio um pensamento de bons votos, unido à oração, aos Ex.mos Prelados — Dom Vladimiro Malanczuk, Dom José Martenetz e Dom Jaroslav Gabro — que, por votivos de saúde, não puderam vir a Roma.

Na capela sixtina dirijo-vos esta manhã — como pastor da Igreja Universal umas palavras de exortação e ânimo sobre o mandamento que nos foi confiado primeiramente, a nós sucessores de Pedro e dos Apóstolos: o mandamento de nos amarmos uns aos outros como Nosso Senhor Jesus nos amou; mandamento que é vivido, à volta da Eucaristia, na unidade de coração e de alma, a todos os níveis do nosso ser humano cristão e eclesial.

Desde já no princípio desta solene sessão, desejo manifestar-vos, a Vós Prelados e à Igreja Católica Ucraniana inteira, a profunda estima que alimento por ela e assegurar que sigo com particular atenção as notícias que me chegam a respeito das condições dos fiéis na Ucrânia e na diáspora. Com viva admiração sigo o vosso caminho já milenário na fé, e tive ocasião de tratar de tal assunto na carta que dirigi ao Arcebispo-Mor de Leópolis, há um ano precisamente. Quero também assegurar-Vos que as vossas preocupações são as minhas e que as vossas solicitudes pastorais como as dos vossos colaboradores, sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos — são intimamente partilhadas por mim e pelos diversos organismos da Santa Sé.

O motivo deste Sínodo Extraordinário é-Vos conhecido: a indicação de candidatos que sejam efectivamente idóneos, segundo as exigências dos sagrados Canônes, para a nomeação daquele que possa validamente coadjuvar hoje o Arcebispo-Mor de Leópolis dos Ucranianos, o nosso dilecto Cardeal Josyf Slipyj, e possa depois dignamente suceder-lhe.

Tudo isto quis eu que fosse objecto de um Sínodo, quer pela importância do acontecimento, quer para levar a Igreja Ucraniana católica, mediante a minha intervenção, a gozar de um momento de unidade sinodal como manifestação da sua comunhão à volta do Vigário de Cristo.

Sinto de facto vivamente convosco a exigência de assegurar a continuidade do alto cargo do Arcebispo-Mor de Leópolis.

Este Sínodo, que se realiza por minha convocação e sob a minha presidência, é Sínodo extraordinário, porque se trata de considerar a nomeação de um Coadjutor, com direito de sucessão, para o Arcebispo-Mor, acto que requer o exercício da autoridade pontifícia; e ainda porque se trata de uma convocação, neste caso vinculativa, dos Bispos ucranianos que se encontram fora do território do Arcebispo-Mor de Leópolis. Realiza-se aqui em Roma, na Sé do Papa, junto de quem todos os Bispos e os fiéis católicos estão como «em casa do Pai»; na Sé de Roma, a que todas as outras Igrejas devem juntar-se, segundo a expressão de Santo Ireneu: «Ad hanc enim Eclesiam propter potiorem principalitatem necesse est omnem convenire ecclesiam» (Adversus haereses 3, 3, 2. ).

Tenho consciência de proceder como humilde sucessor do Bem-aventurado apóstolo Pedro, em virtude do divino mandato confirma fratres tuos (Lc 22,32), e sinto-me feliz de poder-Vos amparar nas vossas angústias, proteger-Vos contra tantas dificuldades quer externas quer internas e dar-Vos uma prova de especial predilecção. A este Sínodo Extraordinário outros aliás poderão seguir-se, como já tive ocasião de explicar ao Arcebispo-Mor: trata-se de Sínodos que ele poderá convocar, quando haja necessidade, uma vez obtido o assentimento do Sumo Pontífice.

A comunhão com Roma foi por séculos, e é hoje mais que nunca, elemento fundamental e distintivo da fé da Igreja Católica Ucraniana. O Bispo de Roma, no seu ofício de «princípio e fundamento da unidade da comunhão eclesial» (Lumen Gentium LG 23), tem especial dever de reconhecimento e solicitude para com os seus irmãos no Episcopado ucraniano, entre os quais sobretudo o venerando Arcebispo-Mor Cardeal Slipyj, e para com toda a Igreja Católica Ucraniana, tão provada, tão fiel.

Quero dirigir uma palavra de especial respeito a Si, Senhor Cardeal. Desejo prestar-Lhe homenagem por tantos anos de serviço e sacrifício em favor da causa de Cristo e do Seu Evangelho. Desejo recordar a estima e consideração manifestadas por meus predecessores à Sua venerada Pessoa: o Papa Pio XII que O nomeou Coadjutor com direito de sucessão para a Sé arquiepiscopal de Leópolis dos Ucranianos; o Papa João XXIII que Lhe obteve a liberdade depois de longa prisão; o Papa Paulo VI, que desejou prestar reconhecimento aos Seus méritos e aos Seus sofrimentos promovendo-O a Arcebispo-Mor (1963) e elevando-O à dignidade Cardinalícia (1964). Quero agradecer ao Senhor — juntamente com os Irmãos Ucranianos presentes e ausentes, e com toda a Igreja Católica — aquilo que em si operou. Pedimos com fervor que O encha de todas as graças, a fim de poder continuar a recolher com júbilo todas as bênçãos «ad multos annos». Convoquei este Sínodo como pastor da Igreja Universal, para dar sustentáculo às suas forças e renovado vigor à vida religiosa da Igreja Católica Ucraniana.

O Papa exorta os Pastores e os fiéis a não perderem a esperança: há uma providência que dirige os povos e toma cuidado de modo especial das comunidades dos crentes. Deus é fiel como diz São Paulo (1Co 10,13). As penas, as privações e as hostilidades são circunstâncias de prova, mas também estímulo para uma fidelidade maior: fidelidade à própria fé católica, ao apego ao próprio rito, às antigas tradições, numa palavra, à própria identidade espiritual, que tem na comunhão com o Papa e com todos os Bispos da Igreja Católica Romana o elemento distintivo do seu património de fé e de vida.

Quereria o Papa que esta identidade não aparecesse aos olhos dos irmãos da Igreja Ortodoxa como sinal de antagonismo e quase como desconhecimento da vida e das tradições gloriosas da Igreja do Oriente; espera-o em virtude exactamente do espírito ecuménico de hoje que segue o caminho do diálogo, da compreensão mútua e de nos considerar-mos como de facto somos irmãos na comum fé em Cristo Salvador, membros de Igrejas que tendem a restabelecer a plena comunhão querida por Cristo.

Esta é a esperança com que os nossos dilectos filhos ucranianos devem alimentar a sua vida eclesial, confiando que um dia essa constância frutificará in laudem gloriae gratiae Christi (Ep 1,6).

Veneráveis irmãos, antes de nos lançarmos ao trabalho, queremos pedir a Deus Pai Omnipotente que este Sínodo Extraordinário seja verdadeiramente de grande fruto na história milenária da Igreja Católica Ucraniana, tão rica de tradições religiosas e fecunda de tantos beneméritos confessores e mártires da fé, cuja mais ilustre figura é São Josafat. Pedimos com insistência a Nosso Senhor Jesus Cristo, Cabeça do Corpo Místico — que nos chamou ao serviço de amor e me confiou o encargo de «confirmar os irmãos» abençoe este acontecimento importante e histórico na Igreja Católica Ucraniana. Abramo-nos sem reservas ao Espírito Santo para que nos ilumine e guie nas nossas deliberações e decisões. Invoquemos, por último, o patrocínio da Bem-aventurada Virgem Maria, Mãe de Deus. Amanhã comemoraremos o mistério da Anunciação, que dá início ao plano de Redenção. A liturgia bizantina sublinha-lhe de maneira especial a importância na economia divina, tanto que a Sexta-feira Santa deixa de ser alitúrgica quando as duas comemorações coincidem, porque a Paixão e morte de Cristo não se teriam realizado se o Verbo não se tivesse feito carne no seio virginal de Maria. Imploremos, pois, a Mãe de Deus sempre Virgem Maria, Mãe da Igreja, para que interceda propícia para o nosso bem e consiga da Santíssima Trindade copiosos favores e graças para nós e para a Igreja Católica Ucraniana, na Mãe-pátria e dispersa por todo o mundo.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR RICARDO AUGUSTIN PETERS SILVA


NOVO EMBAIXADOR DA NICARÁGUA


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Quinta-feira, 27 de Março de 1980



Senhor Embaixador

Ao receber as Cartas que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da Nicarágua junto da Santa Sé, quero dar a Vossa Excelência as minhas cordiais boas-vindas, ao mesmo tempo que formulo os melhores votos para um feliz cumprimento da missão que hoje inicia.

Vem Vossa Excelência como representante de um País, a Nicarágua, que sempre teve perante a Santa Sé um lugar de grande consideração e profunda estima, em consonância com os sentimentos do Povo nicaraguano que, sendo católico na sua grande maioria, olha com especial atenção para esta Sé de Pedro. A ela se sente unido por vínculos de particular solidez, que tocam o íntimo das suas mais profundas convicções e modos de viver.

Por isso, será uma satisfação para esse Povo saber que, sensível à origem e às aspirações do mesmo, quererá Vossa Excelência dedicar os melhores esforços para promover boas e harmoniosas relações entre a Nicarágua e a Santa Sé, em benefício humano e espiritual desse mesmo Povo.

Fez, Vossa Excelência, no seu discurso, alusão às condições presentes do seu País e à vontade das Autoridades de alcançarem novos objectivos para os cidadãos, procurando o desenvolvimento de cada pessoa, num clima social de participação activa de todos os nicaraguanos.

Como tive ocasião de expor recentemente à Delegação da Junta de Governo da Nicarágua, durante a visita que se aprouveram fazer-me, a Igreja apoia todas as iniciativas que servem a verdadeira causa do homem, a sua dignificação e promoção humanas, e que, ao mesmo tempo, respeitem e favoreçam a dimensão religiosa e espiritual da pessoa, no seu aspecto individual e familiar, e nas legítimas manifestações da sua sociabilidade.

A este respeito é de sumo interesse saber que — como o pôs em relevo Vossa Excelência — se está a colocar grande esmero e empenho na preparação de programas orientados para canalizar e distribuir as tarefas que permitem uma constante elevação de todos os cidadãos, com particular atenção aos estratos sociais menos favorecidos.

O Povo da Nicarágua, dotado de valiosas reservas de ordem cultural, moral e espiritual, faz-se credor de tão nobres desvelos. Espera deles não só um progressivo melhoramento das condições materiais da existência, mas também um renovado impulso interior, para que as pessoas e as instituições se realizem cada vez mais nas suas legítimas aspirações, conforme a dignidade própria do ser humano; aspirações que correspondem, no sentir do Povo, aos frutos tangíveis de uma tradição profundamente cristã. Neste sentido a Igreja espera poder contar, para continuar a sua missão de serviço, com a devida liberdade no exercício do seu ministério eclesial.

Senhor Embaixador: peço Àquele que dá todo o bem que o assista ria sua missão, e agradeço-lhe os votos que amavelmente formulou também em nome do Povo e do Governo da Nicarágua. Retribuo, cordialmente, tais desejos.

Queira Deus conceder ao seu nobre Povo que atinja metas cada vez mais altas de justiça, fraternidade e progresso, facultando, ao mesmo tempo, as relações conseguidas ao longo da sua história cristã.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DO ENCERRAMENTO DO SÍNODO


EXTRAORDINÁRIO DA IGREJA CATÓLICA UCRANIANA


Quinta-feira, 27 de Setembro de 1980



Veneráveis Irmãos no Episcopado

Com a assistência do Senhor, felizmente chegámos à meta que tínhamos prefixado com a convocação deste Sínodo Extraordinário, ou seja, a nomeação de um Arcebispo Coadjutor, com direito de sucessão, do nosso venerado Irmão, o Senhor Cardeal Josyf Slipyj, Arcebispo-Mor de Leópolis dos Ucranianos.

Desejo manifestar-vos, antes de tudo, a minha viva satisfação por ter podido ver com que sentido de responsabilidade cumpristes o vosso dever.

O Senhor certamente vos recompensará.

Vendo a Vossa Assembleia, espontaneamente recordei-me da frase do Salmista: Ecce quam bomum et quam jucundum habitare fratres in unum (Ps 132,1). Oh! como é bom, como é agradável para irmãos unidos viverem juntos.

Depois de ter longamente reflectido e invocado na oração o auxílio do Senhor, cheguei à determinação de nomear Coadjutor com direito de sucessão do Em.mo Cardeal Josyf Slipyj, Sua Ex.cia Rev.ma D. Myroslav Ivan Lubachivsky, Metropolita de Filadélfia dos Ucranianos. Ele é o primeiro da lista apresentada.

Tornam-no digno de encargo tão elevado, além disso, a sua notável piedade, o seu zelo apostólico, a sua preparação científica e os belos dotes de mansidão e humildade que adornam a sua alma. Nele deposito a minha confiança, desejando-lhe os mais vivos e cordiais votos. Ele será para Vossa Eminência um digno e idóneo Coadjutor.

Vós todos, veneráveis Irmãos, retornais agora para os vossos cuidados pastorais, contentes por ter podido contribuir, de maneira tão evidente, para a provisão que constitui urna valiosa protecção e uma singular honra para a Vossa Igreja.

Este feliz momento sinodal deverá permanecer, como sinal de unidade de acção e comunhão de almas "in vinculo pacis", e orientar o vosso apostolado em estreita união de sentimentos e propósitos com todos os fiéis desta porção da Igreja Universal.

Na comum preocupação do meu e do vosso ânimo para o bem da Igreja Ucraniana, recomendo ao vosso zelo pastoral a "santa causa" das vocações sacerdotais, com o voto e a oração por que os candidatos "in sorte Domini vocati" cresçam e se formem "in spem Ecclesiae Ucrainae".

Pela intercessão da Mãe de Deus, imploro do Senhor, sobre todos Vós, sobre o clero, religiosos, religiosas e todos os fiéis da Igreja Ucraniana, a alegria do amor pascal e a plenitude de toda a consolação.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


A UMA DELEGAÇÃO DO CENTRO DANTESCO


DOS FRADES MENORES CONVENTUAIS DE RAVENA


Sábado, 29 de Março de 1980



Ilustres Senhores
e Filhos caríssimos

Ao dirigir-vos a minha saudação cordial, quero assegurar-vos também a alegria que sinto, quer ao receber-vos, quer ao aceitar a apreciável homenagem que me é oferecida pela vossa devoção e pela vossa cortesia.

O incunábulo da Editio princeps da "Divina Comédia" de Dante Alighieri, impressa em Foligno no ano de 1472 é, com certeza, preciosidade de altíssimo valor, de tal modo que se reflecte sobre o fac-símile por vós publicado. Agradeço cordialmente, portanto, quer ao Centro Dantesco dos Frades Menores Conventuais de Ravenna, depositários do precioso documento, quer a quantos, nos diversos níveis governamentais e regionais, contribuíram generosa e inteligentemente para a louvável empresa editorial.

Esta é, sem dúvida, mais uma ocasião para fazer conhecer e apreciar a maior obra desse génio e desse crente, que não é apenas o maior dos poetas da literatura italiana, mas está também incluído entre os máximos expoentes da literatura mundial.

Fico contente, por isso, em poder formular votos por ,que o vosso esforço sirva para estimular aquilo a que o próprio Dante chama "o longo estudo e o grande amor" (Dante Alighieri, Inferno, I, 83), isto é, a dedicação apaixonada na procura do verdadeiro e do belo, tal que esta publicação seja um contributo válido para a cultura e para a arte.

E a bênção, que de coração vos concedo, seja penhor da assistência celeste para o vosso trabalho quotidiano.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR PROF. GIOVANNI GALASSI


NOVO ENVIADO EXTRAORDINÁRIO E MINISTRO


PLENIPOTENCIÁRIO DE SÃO MARINHO


JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO


A APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS


Quinta-feira, 27 de Março de 1980



Senhor Ministro Plenipotenciário

As nobres expressões, com que Vossa Excelência quis acompanhar a apresentação das Credenciais que O acreditam como Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário da República de São Marinho junto da Santa Sé, confirmaram-me a profunda simpatia e sincero respeito, que os meus Predecessores sempre demonstraram para com a pequena e gloriosa Comunidade do Monte Titano.

O meu pensamento dirige-se neste momento para os ilustres Capitães-Regentes, que Vossa Excelência representa, e também para cada um dos habitantes da República de São Marinho, a fim de expressar o meu sentido apreço pela intrépida fidelidade, por eles manifestada através dos séculos, a valores fundamentais do convívio civil, tais como o desejo sincero e tenaz da liberdade e da justiça, vividas e defendidas não como bens a possuir egoisticamente, mas, ao contrário, a partilhar numa atitude interior de abertura, de disponibilidade e de respeito para com os outros.

Não posso, portanto, deixar de exprimir a minha cordial estima por todos os Sanmarinhenses nos quais — como disse o meu Predecessor Paulo VI (3 de Julho de 1963) — "a nobre herança de um passado livre e generoso, a índole aberta e honesta, a célebre hospitalidade feita de gentileza e distinção — e sobretudo a fidelidade aos grandes ideais de rectidão, de liberdade e de paz — acrescentam notáveis méritos à pureza da antiga fé católica, recebida do santo fundador da cidade torreada".

Faço pois votos por que a República de São Marinho, às suas belezas naturais e artísticas saiba sempre unir aqueles dotes de laboriosidade e sabedoria, como também de cordial e generosa hospitalidade, de que deu magnífica demonstração durante os tempos tristes e sombrios do segundo conflito mundial oferecendo seguro asilo e desinteressada protecção a tantos refugiados políticos; por que deseje igualmente permanecer sempre ligada às nobres e seculares tradições, que mergulham as raízes da sua fecunda vitalidade espiritual histórica, cultural e politica, na fé cristã, cuja profissão aberta e serena foi e é ainda hoje motivo de legítimo orgulho de quem se regozija em considerar como iniciador e fundador da própria comunidade política um Santo.

E que seja ainda ele, São Marinho, a indicar aos seus filhos o caminho seguro a percorrer nestes tempos difíceis e perigosos: o caminho da honestidade, do respeito pelos valores do espírito e do amor, a fim de que todo o povo da República viva em perfeita serenidade, em fraterna concórdia, continuando a ser para os outros povos um exemplo digno de admiração.

Desejo de coração à República de São Marinho um futuro de prosperidade e paz e, sobretudo, um crescimento dos elementos constitutivos da sua fé e da sua tradição católica, em benefício da sua própria vida civil.

Com estes votos, é-me grato invocar sobre a sua pessoa, Senhor Ministro, e sobre a sua delicada Missão, a abundância das graças divinas e concedo-lhe a implorada Bênção Apostólica, que faço extensiva também a todo o povo de São Marinho e às Autoridades que Vossa Excelência aqui representa.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS SÓCIOS DO MOVIMENTO


«SERRA INTERNACIONAL»


PARA AS VOCAÇÕES SACERDOTAIS


29 de Março de 1980



Venerados e caros Irmãos!

Exprimo-vos, antes de mais, a minha sincera alegria por poder encontrar-me hoje com um grupo tão numeroso e qualificado de Bispos, Sacerdotes e leigos, pertencentes ao Movimento «Serra Internacional», tão benemérito pelo espírito eclesial que anima as suas finalidades e as suas múltiplas iniciativas de bem.

1. Vós estais idealmente ligados aos exemplos e aos ensinamentos desse ilustre filho de São Francisco, o Padre Junípero Serra que, entre 1769 e 1784, desenvolveu um incansável e fecundo apostolado missionário na zona Oeste dos Estados Unidos que hoje corresponde à Califórnia. Quisestes conservar dele duas características salientes, que qualificam o vosso movimento: o amor pelas vocações sacerdotais, e o empenho constante por um testemunho de fé cristã no ambiente em que decorre a vossa actividade.

Em nome da Igreja devo mostrar-vos o meu agrado, a minha estima e o meu encorajamento pelas numerosas iniciativas em favor das vocações. E verdadeiramente admirável que haja Leigos que profundamente convencidos de que a Igreja e a sociedade têm necessidade de Deus, ponham como principal finalidade do seu compromisso cristão a oração assídua e a acção laboriosa pela difusão, desenvolvimento, perseverança, incremento e ajuda das vocações, lembrados, a este propósito, das palavras de Jesus: A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Rogai, portanto, ao Senhor da messe que envie trabalhadores para a Sua messe (Mt 9,37-38 Cfr. Lc 10,2). Estas palavras divinas adquirem, neste período de crise e de transição, uma actualidade impressionante: a messe é grande; aumentaram, de facto, necessidades espirituais da Igreja e da humanidade. Haverá ainda jovens que queiram consagrar-se totalmente a Deus para serem transmissores e testemunhas da mensagem de Jesus? Eu tenho uma grande confiança nas extraordinárias capacidades de generosidade e de doação escondidas no coração dos jovens. Talvez eles esperem uma centelha, uma ajuda ou uma ocasião para serem encorajados e impulsionados a seguirem a Cristo.

Não posso portanto deixar de louvar o trabalho constante, paciente e capilar que o vosso Movimento realiza em todo o mundo para explicar e difundir a beleza, o valor e a dignidade da vocação sacerdotal, no âmbito do Povo de Deus, e para ajudar, por outro lado, muitos jovens a abraçarem serenamente o sacerdócio.

2. Esta alta e específica finalidade do Movimento Serrano, em grande parte formado por Leigos, traz como consequência um ulterior aprofundamento pessoal em todos os seus membros, acerca do significado e das exigências do próprio «ser cristão». O vosso compromisso de rezar, promover e ajudar as vocações sacerdotais estimula-vos continuamente a reflectir sobre as exigências da Palavra de Deus, que é dirigida a todos quantos pretendem seguir Jesus no seu caminho para o Pai. Por tal motivo vós quisestes corresponder à vossa «vocação cristã», e eu, servindo-me das palavras de São Paulo, exorto-vos «a que vos comporteis de maneira digna do chamamento que recebestes, com toda a humildade, mansidão e paciência, ...solícitos em conservar a unidade de espírito mediante o vínculo da paz» (2 Ep 4,1-3).


Discursos João Paulo II 1980 - Domingo, 23 de Março de 1980