Discursos João Paulo II 1980 - Sexta-feira, 23 de Maio de 1980

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DA MALÁSIA, SINGAPURA


E BRUNEI EM VISITA


«AD LIMINA APOSTOLORUM»


Sexta-feira, 23 de Maio de 1980



Meus caros Irmãos Bispos

1. Com profundo afecto fraternal em Cristo Jesus, dou-vos hoje as boas-vindas ao Vaticano. A vossa presença aqui — como Pastores da Igreja dispersa pela Malásia, Singapura e Brunei — dá-nos a oportunidade de exprimir a nossa unidade em Cristo e na hierarquia da Igreja. E é ao mesmo tempo alegre ocasião para reflectirmos brevemente sobre o mistério da Igreja, tal como é vivido nas vossas terras e pelos vossos fiéis.

Nesta reflexão, a que nos aplicamos com a graça do Espírito Santo, encontramos ânimo para o nosso ministério pastoral e fortaleza para as nossas vidas. A nossa missão apostólica de evangelização está relacionada com problemas complexos, relativos à vida diária do povo, à dignidade humana e à eterna salvação dele. Embora não haja fáceis soluções para os pontos controversos que se nos apresentam, considerar o mistério esclarece as nossas responsabilidades e dá-nos alto sentido da nossa missão eclesial. Por outro lado, tornamo-nos mais efectivamente capazes de sustentar os nossos irmãos na vocação cristã que têm, e portanto desempenharemos o mandato pastoral recebido: Pascite qui est in vobis gregem Dei (1P 5,2).

2. De suma importância no mistério da Igreja é estar Cristo vivo no Seu povo. A Sua vida continua nas comunidades de fiéis através do mundo, em todas as que pela fé e pelo baptismo receberam a justificação no Seu nome. A vida de Cristo continua na Igreja hoje, em todos aqueles irmãos e aquelas irmãs do Senhor que vós fostes enviados a servir. Mesmo o que é tão basilar para a pessoa de Cristo — a Sua filiação divina — é vivido na Igreja por meio da graça da adopção divina (cfr. Ga 4,5 Ep 1,5).

E porque os fiéis estão configurados a Cristo, Filho de Deus, estão capazes, por meio do Espírito Santo, de exprimir os sentimentos de Cristo ao Pai. Além disso, a oração de Cristo continua em todas as gerações; o Seu continuado louvor do Pai é realidade na Sua Igreja.

Sim, Cristo está a viver nos Seus membros, e Ele portanto deseja sofrer neles, permitindo-lhes completar o que falta aos Seus sofrimentos por amor do Seu Corpo, que é a Igreja (cfr. Col 1,24). Este mistério entrou na consciência dos cristãos, que percebem dever alegrar-se ao serem participantes dos sofrimentos de Cristo (cfr. 1P 4,13), e, se é a vontade de Deus, ser melhor padecer praticando o bem do que fazendo o mal (cfr. 1P 3,17).

Uma vez mais em concordância com o plano do Pai — Cristo cresce em sabedoria, idade e graça (cfr. Lc 2,52) na Sua Igreja, nos Seus membros, por meio da Sua palavra e da acção dos Seus sacramentos até à medida da estatura completa d'Ele mesmo (cfr. Ep 4,13).

No Corpo de Cristo, o Seu zelo perpetua e a Sua Igreja está a arder no desejo do Seu coração: "Tenho de anunciar também a Boa Nova do Reino" (Lc 4,43). Os doentes são visitados, é oferecido conforto aos abatidos pela dor, e aos pobres é pregado o Evangelho. A catequese do Reino continua nos jovens"e nos anciãos.

E como Cristo está vivo, o amor que tem conserva-se vivo acima de tudo na Igreja. Jesus continua o Pai e o Pai continua a amar o Filho em todos aqueles que o Filho tomou para si como irmãos e irmãs. E o mistério de um amor, recebido do Pai e retribuído ao Pai, é o legado de todos os discípulos de Cristo: "E por isto que todos saberão que sois Meus discípulos: Se vos amardes uns aos outros" (Jn 13,35).

3. Este mistério de Cristo vivo na Igreja está estabelecido em cada comunidade. E mistério que prossegue de geração em geração, e tornou-se parte das vidas do vosso povo por meio da actividade missionária, que a graça de Deus tornou frutuosa. Este desígnio universal de Cristo, estabelecido em cada comunidade do mundo inteiro, cria um laço de união entre todas as comunidades, dando--lhes uma unidade essencial — unidade em viver a vida de Cristo. Cada Igreja particular, desde que permaneça firme nesta unidade, é capaz de transportar o tesouro da fé para a vida concreta de cada dia, na qual tem as suas próprias aspirações, riquezas, limitações, e maneiras de orar, amar e olhar para a vida e para o mundo (cfr. Evangelii Nuntiandi, EN 3). Como as Igrejas locais se esforçam por assimilar a verdade mais e mais, estão constantemente obrigadas a preservar inalterado o conteúdo da fé apostólica que o Senhor confiou aos Apóstolos. Esta missão constitui, acima de tudo, a responsabilidade dos Bispos que será exercida em união com o Sucessor de Pedro e com todos os Bispos da Igreja Católica.

4. Em cada conjuntura da vida da Igreja está presente o Espírito Santo, porque Ele foi enviado por Cristo para habitar na Igreja e para a conservar viva. Numa palavra, o Espírito Santo perpetua a vida de Cristo na Igreja. A dignidade da vida cristã e o valor do comportamento cristão estão ligados à realidade de Cristo, a viver para sempre na Sua Igreja. E é no contexto desta realidade que nós somos enviados para servir como Bispos.

Os meios à nossa disposição os únicos meios que podiam talvez proporcionar-se com os fins sobrenaturais, alvos das actividades da Igreja — são os instrumentos da fé. Nas palavras de São Paulo, eles são "a armadura de Deus" e "a espada do Espírito, que é a palavra de Deus" (Ep 6,13 Ep 6,17). Como Bispos somos chamados a dar ao nosso povo a palavra de Deus, para lhe expor todo o mistério de Cristo (cfr. Christus Dominus CD 12) a exemplo do Apóstolo que não hesitou em anunciar "todos os desígnios de Deus" (Ac 20,27).

5. Caros Irmãos, a compreensão de o nosso ministério ser totalmente dedicado à vida de Cristo nos seus membros — que é perpetuada graças ao anúncio da palavra, especialmente na renovação sacramental da morte de Cristo — dá-nos profunda alegria e confiança. Cristo está connosco hoje e sempre, e diz-nos e a todo o Seu povo: "Não temas; Eu sou o Primeiro e o Último, O que vive; conheci a morte, mas eis-Me aqui vivo pelos séculos dos séculos" (Ap 1,17-18).

6. Sim, amados Irmãos, Cristo está vivo na Malásia, em Singapura e em Brunei — em toda a Ásia. Está vivo pelos séculos dos séculos nas vossas paróquias, em todas as vossas comunidades e nas vossas dioceses. E oxalá encontreis fortaleza e esperança na compreensão de que, tudo o que vós fazeis como Bispos, está destinado a perpetuar a vida de Jesus Cristo na Sua Igreja.

7. E agora desejaria eu pedir-vos que levais as minhas especiais saudações aos vossos sacerdotes e religiosos, e que faleis com eles da importante missão que têm no Corpo vivo de Cristo. Desejaria pedir-vos que animeis os seminaristas na vocação que têm, e que façais todo o possível com o fim de promover vocações ao sacerdócio. Dizei por favor aos catequistas quanto depende a Igreja da generosa cooperação e da santidade de vida dos mesmos. E oxalá a todas as famílias cristãs seja muitas vezes lembrado quão intimamente elas estão ligadas com o ministério da vida de Cristo na Igreja.

Oxalá a Mãe de Cristo vivo, a Estrela da evangelização, esteja sempre ao vosso lado para vos iluminar no caminho e levar o vosso amado povo à plenitude de vida em Jesus Cristo nosso Deus salvador.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


DURANTE A VISITA AO SEMINÁRIO MENOR DE ROMA


Sábado, 24 de Maio de 1980



Irmãos e filhos caríssimos

Como hei-de manifestar-vos a minha grande alegria por me encontrar hoje aqui no meio de vós? É uma visita, esta, que vos devia desde há tempo. Sem dúvida, de todas as que fiz em vários pontos da Diocese de Roma, esta inclui-se entre as mais desejadas e significativas. De facto, oferece-me a possibilidade de me encontrar pessoalmente com os componentes e os responsáveis da comunidade, que desenvolve, como num viveiro, aqueles rebentos destinados a tornarem-se os ministros indispensáveis à vida cristã desta Igreja local, que é a Diocese do Papa.

Portanto, é com especialíssimo calor que saúdo todos vós, Seminaristas internos e externos, e Educadores do Seminário Menor Romano, aos quais é reservado o meu afecto paterno mais genuíno.

O encontro de hoje dá-me a ocasião de dirigir, antes de mais, uma palavra especial de encorajamento aos adolescentes da comunidade seminarística interna. A eles digo que procedam sempre solícitos e alegres para a meta do Presbiterado. Ali há já quem vos espera com ansiedade: há o Senhor, a quem vos conformais de maneira totalmente singular; há o Bispo, com o qual sois chamados a compartilhar as responsabilidades pastorais; e há a comunidade cristã inteira, em favor da qual consumais a vossa vida para a ajudar a caminhar no crescimento da fé e do testemunho no mundo.

Quero, em seguida, dedicar um pensamento particular aos numerosos rapazes e adolescentes da Comunidade Vocacional diocesana, que constituem como que a "reserva" da "equipa" mais directamente comprometida na consagração a Cristo e à Igreja. A eles digo que se mantenham sempre generosamente disponíveis para assumirem o seu papel no campo, prontos a porem as próprias energias e o próprio entusiasmo ao serviço do Senhor e do povo de Deus, acolhendo docilmente o seu convite, quando Ele disser com clareza: "Segue-me"! Sabei, todavia, que também o Papa espera realmente muito de vós.

Não posso, além disso, deixar de falar sobre o problema efectivo das vocações, cujos termos e cuja urgência estão aos olhos de todos. O cuidado amoroso e inteligente das vocações é uma das primeiras necessidades de toda a Igreja e devem-no ter a peito os membros mais vivos da comunidade diocesana. Desejo, portanto, estimular e encorajar os Sacerdotes e as Religiosas, já empenhados neste difícil e precioso apostolado nas Paróquias e nas Escolas católicas, a intensificarem os próprios esforços para uma eficaz catequese vocacional: Especial e importante função da pastoral das vocações compete também aos pais e às famílias, que são frequentemente ponto de partida e favorável ambiente de maturação para uma total consagração ao sacerdócio ministerial.

A todas estas categorias de pessoas asseguro a minha estima cordial e o meu sentido agradecimento. A sua actividade diuturna, juntamente com a necessária graça de Deus, é o sinal mais concreto e o fundamento mais seguro da esperança e confiança que nunca nos abandona: isto é, a de ver que o Senhor não deixa nunca que faltem "operários para a sua messe" (Mt 9,38).

Os meus votos mais espontâneos, por conseguinte, são por que todos juntos prossigamos com alegria e abnegação pelo caminho empreendido, bem conscientes de que a aposta em jogo merece todos os esforços.

E queira o Senhor, a quem devemos elevar assíduas orações, fecundar com generosidade os nossos propósitos que são inteiramente orientados para a sua maior glória e para o bem da sua santa Igreja.

Destes votos — por mim confiados à maternal intercessão de Maria Santíssima — é penhor a Bênção Apostólica, que de coração concedo a todos vós aqui presentes e faço extensiva aos vossos amigos e colaboradores, em sinal da minha benevolência e também da minha serena confiança.

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

AOS BISPOS DA INDONÉSIA

EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM»


Segunda-feira, 26 de Maio de 1980



Veneráveis e caros Irmãos no Episcopado

1. Em nome de Jesus Cristo, o Bom Pastor, vós e eu partilhamos, de modos diferentes, uma comum responsabilidade pelo povo de Deus na Indonésia. Esta comum responsabilidade pastoral é desejada por Cristo e pesa sobre nós pois somos Bispos da Igreja Católica, sucessores dos Apóstolos e membros do Colégio Episcopal.

Esta comum responsabilidade pastoral é que nos reúne hoje no serviço da Igreja, porque nós estamos ansiosos de ver a luz do esplendor de Cristo na face da Igreja. Estamos ansiosos de ver a Igreja como sacramento de salvação penetrar cada vez mais profundamente na construção da sociedade da Indonésia e desempenhar uma parte nos diferentes aspectos da vida do vosso povo. Sei com que louvável patriotismo vós suportastes a Pancasila ou Cinco Princípios Básicos da filosofia do Estado da Indonésia e quanto vos esforçastes por mostrar o amor de Cristo a todos os vossos irmãos sem qualquer distinção fosse qual fosse. Como o meu predecessor Paulo VI, que foi pessoalmente à Indonésia para reforçar a fé dos pastores e do povo, e para animar todos vós na esperança e na perseverança, também eu declaro a minha solidariedade eclesial convosco no ministério que tendes, quando construís a comunidade de fé e consolidais o vosso povo na sua vocação cristã.

2. Quando nos reunimos aqui hoje, recebemos força vinda da nossa unidade católica, de que o nosso encargo pastoral é um aspecto no mistério da Igreja de Cristo. É a unidade católica que ilumina o nosso encargo pastoral nas suas várias dimensões; dá-nos conhecimentos das mais profundas verdades das nossas actividades apostólicas.

As vossas Igrejas locais são expressões individuais do único povo remido de Deus, liberto do domínio das trevas e transferido para o Reino do Seu amado Filho, no qual nós temos a redenção, o perdão dos nossos pecados (cf. Col 1,13-14). O povo de que vós sois pastores é chamado para viver nova vida, de Cristo, dando expressão a ela nos seus costumes e cultura, e para manifestar fielmente o seu carácter original na existência diária. Deste modo encontram-se as pessoas capazes de enriquecer todo o Corpo de Cristo pela única contribuição que prestam.

Com efeito, é a única, santa, católica e apostólica fé que forma a grande herança do vosso povo, e que todos vós como Bispos estais encarregados de anunciar "oportuna e inoportunamente" (2Tm 4,2). Como Sucessor de Pedro, serei chamado a dar especial conta "da presença de Deus e de Jesus Cristo que há-de julgar os vivos e os mortos" (2Tm 4,1) pela maneira como eu satisfaço ao encargo, a mim confiado por Cristo, de ser garantia da pureza da fé de toda a Igreja e de desempenhar devidamente o papel de Romano Pontífice como "a perpétua e visível fonte e fundamento da unidade dos Bispos e da multidão dos fiéis" (Lumen Gentium LG 23).

3. A comunhão eclesial, que nós partilhamos e alimentamos, traz-nos imensa consolação e alegria no nosso ministério como Bispos da Igreja Católica. Sabemos que somos, juntamente com os nossos fiéis, a única Igreja de Jesus Cristo, unida n'Ele e vivendo pelo Seu Espírito Santo.

A nossa comunhão é, primeiro que tudo, comunhão de fé. É a fé apostólica que nos une, fé apostólica com que o Espírito de verdade assiste o Magistério, a fim de este se transmitir intacto e puro de uma geração para a seguinte. Quanto a isto, como Bispos, devemos constantemente entregar-nos de novo à plena profissão da fé católica, que de longe transcende os conhecimentos do nosso saber humano e o raciocínio teológico. Só o Espírito de verdade, o Espírito de Jesus, pode suficientemente garantir a nossa fé, e isto fá-lo por meio do Magistério que nós somos chamados a aceitar e por nossa vez a anunciar aos outros.

Nossa é também uma comunhão de amor — amor que tem a sua origem e modelo na Santíssima Trindade. Nós fomos o objecto do amor de Deus, e este amor une-nos todos juntos na comunidade da Igreja. Entre as tarefas de um Bispo, que importante é para ele reflectir o amor de Jesus, o Bom Pastor, numa base pessoal! A cada momento das nossas vidas de pastores, há uma pessoa que precisa do nosso amor, outra que merece o nosso amor. Os nossos padres, em particular, têm especial título a este amor. São nossos amigos, nossos irmãos e nossos filhos em Jesus Cristo. Para com o rebanho inteiro manifesta-se o nosso amor em compreensão e em serviço generoso e perseverante das suas necessidades — especialmente a sua necessidade da palavra de Deus em toda a sua pureza e energia.

A nossa comunhão é comunhão de oração, em que nós todos vamos buscar fortaleza a todo o Corpo de Cristo orante. A actividade da oração é, muitíssimo, parte da vida da Igreja, que nos une com os vivos e com os mortos na Comunhão dos Santos. Os Santos de Deus são os nossos intercessores. Em particular, a Mãe de Jesus, que é a Mãe do Corpo inteiro, intercede por todos quantos receberam vida no seu Filho. Legiões de fiéis cristãos desempenham um papel eclesial de valor inestimável orando pela Igreja e pela sua missão. Nós contamos com todas estas orações e ficamos especialmente agradecidos pela contribuição dos doentes e dos que sofrem.

A nossa comunhão envolve a solidariedade da Igreja universal. As Igrejas locais estão todas responsabilizadas umas pelas outras, de maneira que é a única Igreja Católica que subsiste em todas elas. A nossa comunhão hierárquica é expressão dos laços de um só Colégio Episcopal que nos une na proclamação do Evangelho de Cristo. Pela colegialidade os pastores da Igreja na Indonésia oferecem a própria solidariedade a toda a Igreja e todos os outros pastores da Igreja oferecem a própria solidariedade às Igrejas locais na Indonésia. Em todas elas se esforça a Santa Sé por exercer um papel de trabalho, coordenando actividades e serviços para benefício de todas. Acima de tudo, está a Santa Sé encarregada do serviço da unidade e verdade, na caridade. Em concordância com a vontade do Senhor, o Sucessor de Pedro esforça-se por ser sempre o servo de todos.

Vivendo esta comunhão de fé e amor, de oração e solidariedade, façamos tudo, amados Irmãos, para dirigir o conhecimento das Igrejas locais para o grande mistério da unidade católica. Desta unidade católica tanto recebeu o vosso povo! E para ela oferece a sua própria contribuição característica, que é a encarnação do Evangelho na sua vida e cultura.

4. Veneráveis Irmãos, mostremos sempre ao nosso povo uma mensagem sobrenatural de esperança, fundada na salvação em Jesus Cristo, Filho de Deus, e comunicada por meio da Sua Igreja. Jesus Cristo que nos chama para irmos ter com Ele na Sua Igreja, e por meio d'Ele com o Pai no Espírito Santo. É Cristo que insiste connosco para que façamos avançar o nosso povo segundo o caminho da fé. É Cristo que nos convida a abrirmo-nos, com todas as nossas limitações e os nossos pecados, à Sua imensa misericórdia. Com a esperança da misericórdia apresentamo-nos a nós mesmos diante de "Cristo Jesus, nossa esperança" (1Tm 1,1). Na esperança consagramos a Ele o nosso ser e todo o nosso ministério. Para Ele devemos dirigir as nossas Igrejas locais; devemos falar d'Ele aos nossos sacerdotes, religiosos e leigos; devemos anunciar a Sua pessoa e as Suas promessas, o Seu Reino e a Sua Vinda. Esta esperança dá grande ânimo ao nosso ministério e às nossas vidas; sustém-nos e incita-nos. Segundo as palavras de São Paulo, "Se nos afadigamos e recebemos ultrajes, é porque pusemos a nossa esperança em Deus vivo, Salvador de todos os homens, principalmente dos fiéis" (1Tm 4,10).

Caros Irmãos: no amor de Cristo, na comunhão da Sua Igreja e na responsabilidade partilhada da nossa missão pastoral, eu abraço todos os fiéis das vossas Igrejas locais. Envio também as minhas saudações às autoridades civis e a todos os vossos concidadãos, a todos os que formam a única família do vosso extenso país. Abençoe Deus a Indonésia e o vosso próprio ministério ao serviço do Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO POVO FRANCÊS ANTES DA VIAGEM APOSTÓLICA




Três dias antes de partir para Paris, quero em primeiro lugar exprimir a minha gratidão a todos os que me convidaram: a UNESCO, o Episcopado francês, o Presidente da República e as Autoridades civis; àqueles que também manifestaram a sua expectativa. Pois, além das instâncias oficiais citadas, numerosas pessoas, de todas as condições, e em particular muitos jovens, exprimiram os seus sentimentos, sobretudo o seu desejo deste encontro, muitas vezes até por cartas. Que elas se sintam recompensadas! Tudo isto pôde criar um clima favorável, que sinto já, e quero corresponder da melhor maneira a esta expectativa.

Ocorre que esta viagem à França se realiza algumas semanas apenas após a visita pastoral à África e a um mês de igual visita ao Brasil. Tenho confiança de que a Providência e a luz do Espírito Santo me ajudarão a realizar esta viagem pastoral, como um serviço que me impõe o meu ministério de Sucessor de São Pedro, e também segundo o espírito do São Paulo que ia fortalecer a fé das Igrejas, receber o seu testemunho e colocá-las em comunhão entre si.

Esta viagem interessa-me por muitos motivos. Ela constitui para mim uma honra, mas sobretudo um dever e uma responsabilidade.

Antes de tudo, a França é a Filha primogénita da Igreja. E ela gerou tantos santos! Poderia acrescentar que há no solo francês muitos lugares a que muitas vezes me dirijo em peregrinação pela oração e pelo coração. Entre estes, Lisieux pôde ser incluído no itinerário da presente visita. Mas há ainda Ars e muitos outros lugares aos quais estou ligado espiritualmente e de onde recebi convites.

Como não evocar também, nesta perspectiva, a obra cultural do vosso país, o seu contributo à cultura geral e no âmbito propriamente católico? Quantos nomes ilustres na vossa secular tradição! Sim, ao longo mesmo deste século, quantas figuras cujo esplendor ultrapassou as vossas fronteiras, e quantas delas me estão pessoalmente próximas. Por outro lado é, significativo que a UNESCO, como Organização internacional, destinada a promover a cultura em todos os países, tenha estabelecido a sua sede em Paris.

Assim, quando penso na influência que a cultura francesa, nos domínios da filosofia, da história e da literatura, e que o pensamento de teólogos franceses exerceram e exercem sobre tantos homens e tanta sociedades, não posso deixar de pensar no momento particular que vive a Igreja neste grande país.

Sei muito bem que a Igreja na França e o catolicismo francês se encontrarm, ao longo destes últimos anos, após o Concílio, numa situação especial. Não pretendo descrevê-la aqui, nem sobre ela fazer uma apreciação. Todos bem sabem que se trata daquilo que se chama uma "crise de crescimento". Espero que aqui esteja a chave para interpretar esta situação particular que se verifica na França desde o Concílio.

Com efeito, estou bem convencido de que há sempre na França, na Igreja, na nação e na sociedade, imensas forças, grandes recursos, que lhe permitirão não só continuar a ser ela mesma, mas também colocar-se ao serviço dos outros.

Sim, a Igreja deve ao povo da França, que muito recebeu e muito deu também, algumas das suas mais belas páginas: desde as grandes Ordens religiosas, tais como a dos Cistercienses e a dos Cartuxos, às catedrais ou à epopeia missionária iniciada no século passado. A generosidade das suas obras e do seu pensamento valeu-lhe a amizade de numerosos povos, e entre os mais pobres! Oxalá possa a França continuar a encontrar ai as suas razões de ser!

Há já mais de um ano que fui convidado a ir a Lourdes para o Congresso eucarístico, que assinalará o centenário destes congressos, em Julho de 1981. No entanto importantes circunstâncias convergentes, como disse, obrigaram-me a antecipar esta visita e chegar a Lourdes passando primeiramente por Paris.

Tendo sido convidado, também eu, da minha parte, convido todos os Franceses para este grande encontro de oração, na comum reflexão e na comunhão espiritual.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA


EPISCOPAL ITALIANA


29 de Maio de 1980



Venerados e caros Bispos da Itália

1. Tenho a satisfação de encontrar-me novamente no meio de vós, irmão entre irmãos, durante esta 17.a Assembleia Geral da Conferência Episcopal Italiana. E verdade que a proximidade da minha peregrinação a Paris e a Lisieux, e as obrigações destes dias, só me permitem deter-me entre vós uma vez, ao contrário do que se deu o ano passado. Mas supra a intensidade do afecto a escassez do tempo! Desde já vos manifesto toda a minha alegria e a consolação que experimento ao encontrar-me convosco nesta circunstância privilegiada da anual actividade, colegialmente orientada e realizada, da vossa Conferência; manifesto-vos a espiritual participação que tomei na preparação e na realização desta Assembleia, e o interesse com que lerei, ao regressar da França, os resultados conclusivos destes dias de estudo. Sobretudo estou perto de vós na oração: se, como disse de maneira estupenda Clemente Alexandrino, «a Igreja tem uma só respiração à volta do altar» (Strom. VII, 6), nós encontramo-nos continuamente unidos, a respirar juntos na celebração eucarística de cada dia: «quoniam unus panis, unum corpus multi sumus, omnes qui de uno pane participamus» (1Co 10,17). E momento privilegiado, experiência de comunhão, a desta tarde, que nos permite experimentar mais a fundo a realidade de doação e de serviço do nosso episcopado em favor da Igreja de Deus que está na Itália, e que o Espírito Santo vos deu a vós e a mim a missão de governar e santificar.

2. «Somos os bispos desta Igreja», dizia-vos a 18 de Maio do ano passado, na homilia da concelebração na Capela Sixtina (Insegnamenti, 2, 1979, p. 1126). Sim, Irmãos, somos os Bispos da Igreja na Itália, recebemos de Deus essa enorme e exaltadora responsabilidade: vós, que fostes agregados aos Sucessores do Colégio Apostólico para ser os guias espirituais, os Mestres, os Sacerdotes desse povo italiano, a que pertenceis por destino de nascimento, por forma de mentalidade e educação, por cultura humana e eclesial, e do meio do qual fostes chamados para o cumprimento da vossa missão; e eu que, provindo embora de outra Nação, me tornei, por imperscrutável disposição divina, Bispo de Roma, Sucessor de Pedro na Sé Romana, recebendo assim aquele Primado, precisamente em virtude do qual tenho o mandato de Vigário de Cristo e de pastor da Igreja Universal, sem por isto esquecer as particularíssimas solicitudes, os vínculos e as obrigações que requer o cuidado da minha diocese de Roma.

Bispos da Igreja na Itália, vós e eu. A nós portanto foi confiado directamente por Deus o cuidado pastoral de um povo, cuja história civil e religiosa, de todos conhecida, esteve sempre entretecida inseparavelmente e ligada com a da Santa Sé, em relações únicas que a distinguem das vicissitudes históricas de todos os outros Países; um povo sobretudo cuja alma religiosa, cuja profunda matriz católica inspirou e marcou por si, indubitavelmente, as manifestações da vida quotidiana, as formas da piedade, a convivência familiar e civil, o surgir das instituições caritativas, como as expressões mais altas da arquitectura religiosa, da arte figurativa e também da literatura.

Tenho ainda diante dos olhos, e conservá-los-ei esculpidos no coração, os espectáculos de fé autêntica, de recolhida piedade litúrgica, de manifesta cordialidade humana, que, desde os inícios do meu Pontificado, este povo italiano me ofereceu naqueles encontros, riquíssimos de fervor e de alegria, que tive até agora — e foi grande graça! — em várias cidades e santuários italianos: Assis, Montecassino, Canale d'Agordo e Belluno, Treviso, Nettuno, Loreto e Ancona, Pomézia, Pompeia e Nápoles, Nórcia e Turim, são outras tantas imagens de Igreja, de povo, de instituições e de pessoas em particular, que todas me falam da bondade e da fé do povo italiano, e, melhor que outra definição verbal, testemunham com extraordinária eficácia em favor do animus religioso dos vossos fiéis: nem posso deixar despercebido que grande número dos participantes nas Audiências semanais das quartas-feiras provém das dioceses da Itália — das vossas dioceses! — como também outras numerosas peregrinações, que recebo no decurso do ano, favorecidas certamente pela vizinhança geográfica em confronto com outras Nações, mas sempre tão indicativas da convicção de fé católica que pulsa nas populações das várias regiões italianas. E que deveria dizer dos encontros agora habituais com as paróquias da minha diocese, aqui em Roma?

Por vir de outro País — cujas tradições religiosas são tão vivas, embora numa situação tão diversa de história, de cultura e de fisionomia psicológica leva-me a descobrir cada dia mais e a apreciar com tanta maior comoção a riqueza, antiga e nova, da vida Cristã neste País, escolhido pelos caminhos inefáveis de Deus para hospedar no seu centro a Sé de Pedro, para guardar as relíquias dos Apóstolos, para difundir no mundo a Palavra libertadora do Evangelho.

Tudo isto deve infundir, em vós e em mim, sentimentos, a renovarem-se cada dia, de gratidão a Deus por nos ter encontrado dignos, apesar dos nossos limites, de ser constituídos Pastores no meio deste povo; tudo isto deve inspirar-nos grande confiança, profunda alegria e crescente ânimo em prosseguir sem hesitação a nossa missão, procurando sempre novas aberturas, novas possibilidades e novos modos de acção; isto deve portanto suscitar propósitos de esforço nunca fatigado, nem fraco em enfrentar a nossa missão, que é missão de reforço da fé num momento de morte e de crise: e deve dar-nos sempre maior clareza de vistas e organização de planos pastorais para responder à nossa vocação, que é «de representar de forma eminente e conspícua o próprio Cristo, mestre, pastor e pontífice e actuar na pessoa d'Ele», como disse o Vaticano II (cfr. Lumen Gentium LG 21). Não tenhamos medo! O Senhor está connosco a dar-nos coragem, e, com São Paulo, oxalá digamos: «Omnia possum in eo qui me confortat» (Ph 4,13). A inegável e magnífica realidade eclesial em que e pela qual trabalhamos, infunde muita esperança, especialmente para o futuro.

3. Na perspectiva do nosso ministério, colocado concretamente na sua situação histórica, desejaria propor à vossa atenção, meus venerados Irmãos no Episcopado, alguns pontos que me parecem mais significativos e importantes para o desenvolvimento do vosso apostolado nas necessidades do mundo presente, melhor, no quadro geral da vida da Igreja Italiana.

Primeiramente, o problema de uma justa e bem entendida autonomia da Conferência Episcopal, para a definição e execução dos próprios encargos pastorais. E problema característico da Itália, pois pode parecer que os especiais laços, mediante os quais ela esteve e está em relação com o Pontificado e com a Sé Apostólica, tenha posto ou ponham talvez na sombra a própria Conferência Episcopal. Para dissipar portanto o equívoco, que talvez possa explicar-se historicamente mas falsificaria no fundo a realidade das ditas relações, é necessário que ela, consciente da própria actividade e da própria autonomia, saiba fazer plenamente reviver a tradição colegial, vigente na Igreja desde a mais remota antiguidade. Por outro lado, o Concílio Vaticano II sublinhou com novo vigor que as Conferências Episcopais, vistas na colegialidade vigente na «catolicidade de Igreja indivisa, ...podem hoje oferecer uma contribuição múltipla e fecunda para que o sentimento colegial leve a aplicações concretas» (Lumen Gentium LG 23).

Vós sois portanto os responsáveis, e deveis sê-lo de modo cada vez mais consciente e activo, pela Igreja que está em Itália: independentemente de o Papa ser ou não ser de origem italiana mas tendo também conta, evidentemente, de que ele é Bispo de Roma e Primaz da Itália — a Conferência Episcopal deve proceder de modo cada vez mais orgânico e seguro, para tomar as próprias responsabilidades, para a valorização de todas as forças presentes na comunidade eclesial da Itália, em toda a Nação, em que a mesma Conferência deve existir e trabalhar, ser e operar.

O quadro que oferece a Itália é o de um País essencialmente católico no seu estrato profundo, mas que à superfície teve de enfrentar ataques, que, das opostas frentes do laicismo e do materialismo — segundo as directrizes que analisei no meu discurso à cidade de Turim — causaram grandes danos à vida espiritual da Nação: pensemos na dessacralização em acto, com reflexos pavorosos no plano da vida familiar e da moralidade pública e privada, e com a difusão de modelos de comportamento reprováveis, que se gravaram profundamente nas formas da vida individual e associada. Não vem a propósito analisar completamente agora o fenómeno (aborto, droga, pornografia, delinquência juvenil, permissivismo em todas as suas formas de persuasão, encoberta e oculta, etc.). Mas isto apresenta à vida pastoral horizontes nunca antes explorados, e interrogações dramáticas e inadiáveis.

Neste inegável contraste de posições radicalmente opostas — tradições católicas sãs que devem opor-se à secularização — a Conferência Episcopal italiana tem o dever de assumir autonomamente todas as próprias responsabilidades, para favorecer a afirmação dos valores sãos, que formam a honra genuína do povo italiano, e levantar barreira aos perigos que procuram miná-lo interiormente, praticando ela uma unidade de acção e de programas acerca da pastoral de conjunto, que, oportunamente graduada e adaptada à exigências de cada Igreja local, possa levar à frente, com alegria e decisão, o «opus ministerii» a que fostes chamados. A unidade entre os Bispos não é só primeira garantia para o bom resultado da própria actividade, mas é também fonte de coragem, de optimismo e de confiança.

4. A coesão das formas no âmbito da legítima e frutuosa autonomia deve garantir, no interior da Nação em que opera a Conferência Episcopal, aquele prestigio, aquela influência e aquela credibilidade que se requerem para a eficácia da acção pastoral em favor do povo. É este o segundo aspecto, que me parece merecer particular atenção, pois os Bispos são representação legítima e qualificada do povo italiano, são força social que tem responsabilidade na vida da Nação inteira. A Igreja não vive desenraizada das condições em que se encontra, não é abstracção, não é símbolo. A Constituição pastoral «Gaudium et Spes» sublinhou, desde o princípio, que «é dever permanente da Igreja investigar a todo o momento os sinais dos tempos, e interpretá-los à luz do Evangelho; para que assim possa responder, de modo adaptado a cada geração, às eternas perguntas dos homens acerca do sentido da vida presente e da futura, e da relação entre ambas. É, por isso, necessário conhecer e compreender o mundo em que vivemos, as sua esperanças e aspirações, e o seu carácter tantas vezes dramático» (Gaudium et Spes GS 4).

Quer isto dizer que num País Católico como a Itália, mas às vezes imerso e ameaçado por uma atmosfera hostil, devido à qual a Igreja se arrisca a encontrar-se num complexo de inferioridade e de suportar ainda, em certo modo, condições de injustiça e discriminação, os Bispos devem tornar-se presentes, a todos os níveis, no contexto da vida italiana, ser efectivamente os animadores activos e conscientes das forças que representam, formar o centro de coesão, a bandeira de identidade e o ponto de referência.

A Igreja, nos seus Bispos, nos seus sacerdotes e no seu laicado mais generoso, deve saber descobrir que possibilidades concretas tem para o bem da comunidade, e, consciente da própria força, encontrar sempre novos campos em que lançar-se para corresponder ao mandato de Cristo: «vos estis sal terrae,... vos estis lux mundi» (Mt 5,13 s.). Na sua história milenária, a Igreja nunca teve falta de ideias para excogitar e penem execução obras requeridas pelos tempos, recorrendo ao próprio potencial imenso de energias, votadas a Deus e às almas. Foi sempre como que uma «dadora de sangue», que proveu continuamente à troca de energias e iniciativas, num mundo que sempre esperou a sua presença urgentemente e em todos os campos. E se hoje tomada de certos encargos, por parte do Estado, interveio em campos que, noutra época, eram objecto de solicitude quase exclusivamente da Igreja, não faltam certamente nem sequer hoje — e a experiência bem o mostra — espaços de caridade e de entusiasmo generoso para chegar aonde outras forças não chegam. Na hodierna sociedade pluralista, tem maior esfera de acção quem sabe tomar, com esforço e continuidade, maiores responsabilidades pelos irmãos. Muito mais deve isto valer para a Igreja.

Esta, por outro lado, enquanto opera com iniciativas próprias, não pode eximir-se, perante os fiéis e toda a sociedade, de exprimir, quando seja necessário, a própria apreciação sobre problemas de natureza ética, que influam no sentido que tem a vida pessoal e comunitária.

É preciso, portanto, ir para a frente, sem temores, propondo As nossas comunidades os pontos programáticos de uma visão cristã e católica da vida terrena segundo o Evangelho, e de uma acção que lhe seja consequente, provendo às necessidades mais urgentes que isto requer de nós Pastores.

5. E uma das primeiras responsabilidades do momento presente é a da catequese. Foi sempre fundamental direito da Igreja e é-o sobretudo hoje, porque, por vários motivos, notam-se graves carências na formação religiosa e moral do laicado, em especial do que se ocupa a nível profissional e social.

Ao mesmo tempo há porém um despertar, favorecido e incrementado pela Conferência Episcopal italiana, que nestes últimos anos procedeu a um sério trabalho de estudo e de programação catequética, mesmo com a edição de novos textos adequados: e são também estes, em escala nacional, os frutos da atenção que o Episcopado da Igreja Universal aplicou ao problema especialmente tratado a propósito do tema da catequese na terceira e na quarta Assembleia Geral do Synodus Episcoporum.

Mas é necessário proceder, com incansável solicitude, a pôr em prática aquela que, juntamente com o dever de santificar e de pastorear o Povo de Deus, é a nossa missão específica: o ensino da sã doutrina. Que actuais que são ainda as palavras de Paulo: «Praedica verbum, insta opportune, importune, argue, obsecra, increpa in omnia patientia et doctrina. Erit enim tempus, cum sanam doctrinam non sustinebunt, sed ad sua desideria coacervabunt sibi magistros prurientes auribus... Tu vero vigila, in omnibus labora, opus fac evangelistae» (2Tm 4,3 2Tm 4,5). A nossa ordenação episcopal impõe-nos a obrigação especial de anunciar, com todo o empenho da nossa vida, aquele Evangelho que então nos foi colocado na cabeça: e isto deve recordar-nos que estamos consagrados, até à última respiração, ao seu anúncio, para que os nossos fiéis dele vivam e se deixem guiar por essa luz em todos os seus comportamentos, gerais e especiais, da vida pessoal, familiar, profissional e social.

Na minha Exortação Apostólica «Catechesi tradendae», ao sublinhar o primado desta obra evangelizadora, e ao desejar a todos os responsáveis «a coragem, a esperança e o entusiasmo» que para ela se requerem, dirigi-me de modo especial aos irmãos Bispos, e permito-me recordar-lhes que «a preocupação de promover uma catequese activa e eficaz não ceda nada diante de qualquer outra preocupação seja ela qual for. Tal solicitude vos levará a transmitir vós próprios a doutrina da vida aos vossos fiéis. Mas o mesmo cuidado há-de levar-vos a assumir nas vossas Dioceses, em correspondência com os planos da Conferência Episcopal de que fazeis parte, a superior direcção da catequese, rodeando-vos de colaboradores competentes e merecedores de confiança. O vosso papel principal há-de ser suscitar e alimentar nas vossas Igrejas verdadeira paixão pela catequese; paixão, todavia, que se encarne numa organização adequada e eficaz, que empenhe na actividade as pessoas, os meios e Os instrumentos, e também os recursos financeiros necessários. Podeis ter a certeza disto: se a catequese for bem dada nas vossas Igrejas locais, tudo o mais será feito com maior facilidade» (CTR 62-63; AAS 71, 1979, PP 1328 s.).

Também nisto, esteja exemplarmente empenhado o Episcopado Italiano, continuando aquelas tradições de ensino, de catequese orgânica e capilar, que estiveram na origem do florescimento espiritual das vossas dioceses, e devem prosseguir e ser mesmo aumentadas; a vida diocesana deve estar de facto à altura dos problemas hodiernos e da situação de crise e dúvida, que põe os católicos diante do dever de cada vez aprofundar mais a. própria fé e de dar dela razão, com ardor de convicção e torça de persuasão, diante de um mundo que tem sempre grande saudade das coisas de Deus!

6. Uma palavra, agora, sobre o tema prioritário da Assembleia Geral, escolhido para o próximo Sínodo dos Bispos: o argumento tão importante e urgente dos «encargos da família cristã no mundo contemporâneo». Se recordei à vossa sensibilidade quanto estais especialmente responsáveis pela catequese, é exactamente porque ela encontra na família o primeiro banco de prova, o destino principal e o terreno mais propício. Por outro lado, vi com prazer que, entre as partes em que se divide o documento de trabalho desta vossa reunião, figura precisamente «o encargo primário da evangelização», além dos da hodierna situação social e cultural em relação à família, e aos encargos de promoção humana e social a ela respeitantes. Dando preferência, no âmbito da família, à temática da evangelização, atingistes o alvo e demonstrastes assim que a missão magisterial da Igreja deve dirigir-se de modo particular às famílias e a todos os seus elementos, para que estes, por sua vez, sejam capazes de corresponder, em plena consciência e maturidade de formação, àquela participação na missão profética de Cristo, que propôs o Concílio Vaticano II como definição específica dos encargos do laicado católico, no seu testemunho cristão (Lumen Gentium LG 35 Apostolicam Actuositatem AA 2).

Paulo VI pôs em realce, com tons inolvidáveis, esta característica própria da família, que está na missão evangelizadora. A família, escreveu o meu Predecessor na Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi, «nos diversos momentos da história da Igreja, bem mereceu a bela designação sancionada pelo Concílio Vaticano II, de 'Igreja doméstica': isto quer dizer que, em cada família cristã, deveriam encontrar-se os diversos aspectos da Igreja inteira. Por outras palavras, a família, como a Igreja, tem por dever constituir espaço onde o Evangelho seja transmitido e donde o Evangelho irradie. No seio de uma família que tem consciência desta missão, todos os membros da mesma família evangelizam e são evangelizados. Os pais, não somente comunicam aos filhos o Evangelho, mas podem receber deles o mesmo Evangelho profundamente vivido. E uma família assim torna-se evangelizadora de muitas outras famílias e do ambiente em que ela se insere» (EN 71; AAS 68,1976, pp. 60 s.). Continuando esta clara linha de pensamento, eu mesmo recordei depois esta verdade, tão grande e bela, no já citado documento; e acrescentei que «a catequese familiar... precede, acompanha e enriquece todas as outras formas de catequese» (Catechesi tradendae CTR 68, AAS 71, 1979, p. 1334).

7. Bem se pode dizer portanto que a família, entendida como locus privilegiado da catequese, pode oferecer, às vossas discussões e aos vossos trabalhos, como que o centro focalizador para que o desenvolvimento e a discussão geral tenham a sua interior e lógica unidade. Efectivamente, numa recta concepção das funções da comunidade familiar, entendida como «ambiente de fé» — onde os pais exercitam, com a ajuda da graça sacramental do matrimónio, e na função que têm de testemunhas de Cristo, já assumida no sacramento da Confirmação, o seu mais importante dever — assegurando-se a presença e a continuidade dos maiores valores, no plano humano e cristão: a educação dos filhos; serem eles «provocados» constantemente a um estilo coerente de vida, mediante o exemplo e a palavra; a garantia e a defesa de uma saúde moral, que partindo do ambiente familiar se torna bem comum e geral da sociedade inteira; o poder de reacção contra os germes de desagregação ideológica e moral, de que o hodierno ambiente permissivo se torna portador nefasto junto dos adolescentes e dos jovens; e a disponibilidade para acolher a vida e para se tornarem apóstolos do amor à vida.

Destas simples alusões resulta de modo evidente a necessidade de restituir à família, no seu conjunto, aquela atenção primária que lhe é devida no conjunto da solicitude pastoral. É urgente uma pastoral da família.

Talvez, e por motivos plausíveis, tenha havido outrora excessivo fraccionamento, se tenham criado demasiadas divisões sectoriais na pastoral de conjunto, fixando a atenção em idades, em camadas sociais e campos diversos, tudo isto merecedor de cuidados, mas fez-se deste modo perder de vista — ou pelo menos afrouxar no interesse devido — a solicitude atinente à família na sua totalidade. Daí resultou uma dispersão de energias, e talvez não se tenham conseguido os resultados adequados ao esforço empregado; e o núcleo da unidade familiar, que se deve considerar sagrado em todos os seus elementos, como no-lo atestam as páginas da Revelação do Antigo e do Novo Testamento, sofreu com isso dando resultados que principiam a fazer-se sentir. Pense-se; por exemplo, na pastoral do casal, no quadro das dificuldades que ela sente quer pela força de choque das ideologias anticristãs, do hedonismo e da evasão, quer também pelos limites que a sociedade de consumo e a conjuntura económica apresentam, com gravíssimas consequências pessoais (individualismo, fuga das responsabilidades, limitação dos sentimentos, instabilidade afectiva e dificuldade em assumir um laço institucional). Pense-se ainda, para dar outro exemplo, no enorme potencial humano — de sabedoria, de experiência, de conforto e de ajuda — que representam os anciãos, hoje infelizmente postos de lado pela inexorável lei da produtividade, mas que a Igreja não pode e não deve esquecer na sua acção quotidiana.

Cada diocese não pode deixar de considerar a fundo todos os problemas relacionados com a vida familiar, tendo sempre muito presente, como disse o Concilio Vaticano II, que «a família — na qual se congregam as diferentes gerações que reciprocamente se ajudam a alcançar uma sabedoria mais plena e a conciliar os direitos pessoais com as outras exigências da vida social — constitui assim o fundamento da sociedade» (Gaudium et Spes GS 52). E esta realidade exige uma solicitude pastoral de primeira ordem.

Olhando sempre para a função evangelizadora da família, não posso esquecer também aquela actividade de promoção vocacional, que deve estar na base dos vossos esforços pastorais: de facto, só da acção conjunta da Igreja e da família podem nascer aquelas condições favoráveis, graças às quais seja acolhida mais facilmente, pelos jovens, a voz de Cristo que chama a que se dediquem a Ele e às almas.

8. Os jovens! Falta-me tempo para dedicar o discurso aos vários planos, a que se dirige nestes dias a vossa atenção. Mas não posso permitir que falte ao menos uma palavra precisamente sobre o problema da juventude, que requer de Vós Pastores os cuidados mais assíduos e generosos. Pensai neles. Não se podem sem dúvida esquecer as outras idades, no conjunto de uma pastoral atenta e orientada. Mas são os jovens que devem atrair, primeiro que todos os outros, a atenção, também porque a chegada à maturidade das gerações é cada vez mais rápida e corre-se o risco de chegar sempre atrasado se não se orientam todos os esforços para a formação global das gerações juvenis que incessantemente se apresentam à sociedade humana e eclesial, e querem tomar nela o seu posto de presença e de responsabilidade.

Segui-os com os vossos sacerdotes melhores, não deixeis que as formas associativas, em que lhes apraz associarem-se, sejam fogos de palha que depressa se apagam, desbaratando energias preciosas, nem menos ainda que se desenvolvam à margem da Igreja ou, não o queira Deus, em contraposição a ela. No respeito das legítimas formas pluralistas de associacionismo, de espiritualidade e de apostolado, sabei orientar rectamente as extraordinárias energias da juventude de hoje, que sabe ainda olhar para a Igreja como para a autêntica forma de vida onde há a garantia, encontrando a Cristo, de gastar-se generosamente por «alguma coisa que vale».

Recomendo a cada um de vós a pastoral juvenil como o ponto mais precioso do próprio ministério.

9. Venerados e caros Irmãos, Bispos da Itália!

Ao deixar à vossa reflexão os pontos que me permiti expor-vos simplesmente neste colóquio familiar, é-me agradabilíssimo reafirmar vos a minha estima profunda e manifestar-vos ainda o meu incitamento para a delicada e árdua obra, a que fostes enviados pelo Espírito Santo.

Estou perto de vós nas dificuldades e sobretudo no trabalho apostólico: estamos todos juntamente empenhados na santificação, no magistério e ria guia do Povo de Deus. As nossas débeis forças humanas nada poderiam sem o auxílio, sem a presença de Cristo. Ë Ele o nosso modelo, o nosso estímulo e a nossa força. Como Ele se consumiu até à morte pela humanidade, assim também nós, por Ele escolhidos sem qualquer mérito nosso, como Pedro, como Paulo, como André; como os Apóstolos todos, sigamo-l'O, com eles e como eles, até ao extremo das forças, para completar a obra do Pai: «Me oportet operari opera Eius, qui misit Me, donec dies est» (Jn 9,4). Sim, irmãos caríssimos, trabalhemos enquanto temos força, enquanto é dia.

A Virgem Santíssima, Mãe da Igreja, Rainha dos Apóstolos, está ao nosso lado, como esteve nos dias do Pentecostes, fortificando a coragem e a alegria no coração daqueles homens, que se preparavam para evangelizar o mundo, segundo a ordem de Cristo. Ela não abandonará nenhum de nós. E com os olhos fixos naquele Cenáculo, do qual partiram os Apóstolos, recomendo-vos um a um a Ela, e com muito afecto a todos vos abençoo, ao mesmo tempo que às vossas caríssimas dioceses.



Discursos João Paulo II 1980 - Sexta-feira, 23 de Maio de 1980